A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira
Coutinho e Gonçalo Sampaio.
João Paulo Cabral*
*
Professor Associado do Departamento de Botânica da Faculdade de Ciências da Universidade do
Porto e Investigador do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental da Universidade
do Porto. Rua do Campo Alegre, 1191, 4150-181 Porto. E-mail: jpcabral@fc.up.pt. URL: http://
www.fc.up.pt/pessoas/jpcabral/
ÍNDICE
página
I. Introdução .............................................................................................................................................. 4
II. A Academia Politécnica do Porto – da fundação ao dealbar do século XX ........................................ 9
1. A criação da Escola Politécnica de Lisboa ....................................................................................... 9
2. A criação da Academia Politécnica do Porto .................................................................................. 10
3. O ensino das ciências naturais nos primeiros anos da Academia ................................................... 12
4. O Jardim Botânico e Experimental da Academia ........................................................................... 15
5. O Regulamento da Academia em 1864 .......................................................................................... 17
6. O Decreto de 1865 estabelece normas para o recrutamento dos professores ................................. 18
7. A Academia nas décadas de 1870-1880 ......................................................................................... 18
8. O Regulamento da Academia de 1888............................................................................................ 19
9. O ensino da Botânica na Academia Politécnica no dealbar do século XX ..................................... 21
III. Gonçalo Sampaio, aluno e naturalista da Academia Politécnica do Porto ....................................... 23
1. G. Sampaio aluno da Academia Politécnica ................................................................................... 23
2. Contactos iniciais com Júlio Henriques e a Sociedade Broteriana ................................................. 23
3. G. Sampaio naturalista adjunto da Academia Politécnica .............................................................. 25
4. Contactos com A. X. Pereira Coutinho ........................................................................................... 26
5. Panorama dos estudos da flora portuguesa, 1880-1910 .................................................................. 27
6. A crise de 1906 ............................................................................................................................... 29
7. G. Sampaio e o Congresso de Botânica de Bruxelas ...................................................................... 35
IV. Gonçalo Sampaio e o estudo dos Rubus portugueses ....................................................................... 37
1. A obra-chave de G. Sampaio .......................................................................................................... 37
2. Data efectiva de publicação ............................................................................................................ 37
3. Análise geral da monografia ........................................................................................................... 38
4. Como organiza G. Sampaio o estudo dos Rubus? .......................................................................... 40
4A. O método de trabalho descrito na própria monografia ............................................................ 41
4B. As colecções de exemplares de Rubus existentes no Herbário da Academia .......................... 42
4C. A documentação epistolar ........................................................................................................ 44
5. Reacções ao trabalho....................................................................................................................... 56
6. Mais estudos dos Rubus portugueses .............................................................................................. 60
V. A importância da Sociedade Broteriana e do seu Boletim................................................................. 64
1. Fundação da Sociedade e seus objectivos ....................................................................................... 64
2. As distribuições de plantas aos sócios ............................................................................................ 67
4. O Boletim da Sociedade Broteriana ................................................................................................ 69
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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VI. A importância da Broteria e dos jesuítas botânicos na Botânica sistemática ................................... 74
1. A fundação da Broteria em 1902 .................................................................................................... 74
2. O Colégio de São Fiel ..................................................................................................................... 78
3. A Broteria em 1907 ......................................................................................................................... 79
4. Os fundadores da Broteria e a Sociedade Broteriana...................................................................... 79
5. G. Sampaio e Alphonse Luisier ...................................................................................................... 79
6. Os Herbários dos Colégios de S. Fiel, Setúbal e Campolide .......................................................... 82
7. A implantação da República ........................................................................................................... 84
VII. A República e as Universidades. Gonçalo Sampaio, professor da Faculdade de Ciências da
Universidade do Porto............................................................................................................................. 89
1. A República e as Universidades ..................................................................................................... 89
2. Os cursos livres ............................................................................................................................... 89
3. A criação das Universidades de Lisboa e Porto .............................................................................. 90
4. A criação das Faculdades de Ciências de Lisboa, Coimbra e Porto ............................................... 92
5. Os regulamentos das Faculdades de Ciências ................................................................................. 94
6. A crise de G. Sampaio de 1912 ....................................................................................................... 94
7. G. Sampaio, nomeado professor ordinário da Faculdade de Ciências do Porto ............................. 97
8. G. Sampaio encarcerado durante a Monarquia do Norte ................................................................ 99
VIII. Gonçalo Sampaio e a Flora Ibérica. As exsicatas ........................................................................ 101
1. As exsicatas no início do século XX............................................................................................. 101
2. G. Sampaio e a Universidade de Montpellier ............................................................................... 101
3. G. Sampaio e Carlos Pau .............................................................................................................. 104
4. G. Sampaio e Fr. Sennen............................................................................................................... 105
5. G. Sampaio e Font Quer................................................................................................................ 108
6. Outras exsicatas ............................................................................................................................ 109
7. O projecto da Flora Ibérica ........................................................................................................... 111
IX. Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho, Gonçalo Sampaio e as Floras de Portugal .................... 113
1. A necessidade de uma flora moderna de Portugal ........................................................................ 113
2. As personalidades de J. Henriques e A. X. Pereira Coutinho através do espólio epistolar .......... 113
3. A Flora de Portugal de A. X. Pereira Coutinho ............................................................................ 116
4. A Flora do Mondego de J. Henriques ........................................................................................... 126
5. O estudo da flora portuguesa por G. Sampaio .............................................................................. 126
6. A construção das Floras de Portugal ............................................................................................. 129
7. O contributo de António Machado ............................................................................................... 130
8. A contribuição de Clemente Lourenço Pereira ............................................................................. 131
9. A contribuição de J. M. Miranda Lopes ....................................................................................... 136
10. Carlos França e o estudo das plantas carnívoras ......................................................................... 142
X. Gonçalo Sampaio e a Liquenologia Ibérica ..................................................................................... 146
1. G. Sampaio e M. Bouly de Lesdain .............................................................................................. 146
2. Arthur Ricardo Jorge e a exsicata «Lichenes de Portugal» de G. Sampaio .................................. 147
3. Os contactos com Zahlbruckner e A. H. Magnusson.................................................................... 154
4. G. Sampaio e Luis Crespí ............................................................................................................. 156
5. O projecto do Catálogo de líquenes de Portugal ........................................................................... 157
XI. Gonçalo Sampaio e a Micologia Ibérica ......................................................................................... 159
XII. Gonçalo Sampaio e a nomenclatura botânica................................................................................ 162
1. A nomenclatura botânica no fim do século XIX .......................................................................... 162
3. G. Sampaio e a nomenclatura botânica ......................................................................................... 166
4. O Congresso do Porto de 1921 e a nomenclatura botânica .......................................................... 169
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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XIII. Gonçalo Sampaio: uma análise retrospectiva da sua obra ........................................................... 174
1. Cronologia..................................................................................................................................... 174
2. 1.° Período: 1895-1908 ................................................................................................................. 174
3. 2.° Período: 1909-1915 ................................................................................................................. 182
4. 3.° Período: 1916-1923 ................................................................................................................. 185
5. 4.° Período: 1924-1937 ................................................................................................................. 189
6. Obras póstumas ............................................................................................................................. 194
XIV. Gonçalo Sampaio. A consagração. O drama de uma obra inacabada? ........................................ 196
1. A criação do «Instituto de Investigações Botânicas» na Faculdade de Ciências do Porto ........... 196
2. A fundação do «Instituto de Botânica Dr. Gonçalo Sampaio ....................................................... 198
3. Drama de uma obra inacabada? .................................................................................................... 199
XV. Resumo e conclusões .................................................................................................................... 201
Anexo I. «Lichenes de Portugal». A exsicata de G. Sampaio .............................................................. 205
Anexo II. Táxones novos de líquenes publicados por G. Sampaio ...................................................... 214
Bibliografia citada ................................................................................................................................. 218
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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I. Introdução
Depois do período áureo do fim do século XVIII com as figuras de Vandelli1, Brotero2, Link e
Hoffmansegg3, e apesar do trabalho do Conde de Ficalho4, do Barão de Castelo de Paiva5 e de
1
Domingos Vandelli (1730–1816) nasceu em Pádua em 1730 e faleceu em Lisboa a 27 de Junho de 1816. Doutorou-se em
Filosofia na Universidade de Pádua, onde seu pai, Jerónimo Vandelli, doutor em Medicina, era lente. Na Universidade de
Pádua foi discípulo de Pontedera. Entre 1761 e 1764 percorreu a região de Modena e da Lombardia, colhendo espécimes de
história natural que mais tarde ofereceu à Universidade de Coimbra. Manteve correspondência com Lineu entre 1759 e
1773. Em 1772 é nomeado, pelo governo de D. José I, professor de História Natural e Química da Universidade de
Coimbra. Em Coimbra, dirigiu os primeiros trabalhos para a criação do Jardim Botânico, conjuntamente com o professor de
Física Dalla-Bella. O projecto foi considerado ambicioso e caro pelo Marquês de Pombal, tendo por isso sido executado só
parcialmente. Foi jubilado em 1793, mas deixara já de ensinar desde 1787. Depois de jubilado, passou para Lisboa como
Director do Real Museu e Jardim Botânico da Ajuda. Uma das suas grandes preocupações foi criar discípulos que pudessem
efectuar as explorações que se impunham. Preparou assim Alexandre Rodrigues Ferreira, o afamado explorador do Brasil,
Manoel Galvão da Silva, que procedeu ao reconhecimento de Goa e Moçambique, e provavelmente também Joaquim José
da Silva e João da Silva Feijó, que fizeram colheitas respectivamente em Angola e Cabo Verde. Além de ter reeditado o
«Viridarium» de Griesley publicado em 1789, estabelecendo a correspondência entre os nomes que ali figuram e os da
nomenclatura binomial, Vandelli elaborou vários trabalhos originais de Botânica, entre os quais avultam: «Dissertatio de
Arbore Draconis» (1768), «Sobre a utilidade dos Jardins Botanicos» (1770), «Fasciculus plantarum, cum novis generibus et
speciebus» (1771) e «Florae Lusitanicae et Brasiliensis specimen» (1788) e o «Diccionario dos Termos Technicos de
Historia Natural» (1788). Entre 1789 e 1812, publicou nas «Memórias Económicas da Academia Real das Ciências de
Lisboa» alguns trabalhos entre os quais: «Sobre o sal virgem da Ilha de Cabo Verde», «Sobre as aguas de Lisboa», «Sobre
produtos naturais do Reino e das Colonias». Vandelli é também reputado pela sua actividade na indústria. Fundou uma
fábrica de faiança em Coimbra. À sua fábrica se deve o florescimento conquistado pela indústria de cerâmica conimbricense
nos fins do século XVIII e princípios do século XIX. A loiça produzida pela sua fábrica ficou conhecida pelo nome de
«Louça de Vandelles» ou «Louça de Bandelli». Acusado de simpatia com as tropas francesas invasoras de Junot, foi preso
em 1810 com 80 anos de idade e com outros presos conduzido a bordo da fragata «Amazona» para a Ilha Terceira. No
entanto, pouco tempo depois de chegar à ilha, e graças à interferência da Sociedade Real de Londres, foi concedida
transferência para Inglaterra onde residiu até 1815, quando após a paz geral, regressou a Portugal. A sua saúde mental tinhase entretanto deteriorado, morrendo já na ausência das suas faculdades mentais. Foi comendador da Ordem de Cristo,
deputado da Real Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação. Sócio da Academia Real das Ciências de Lisboa,
e das Academias de Uppsala, Pádua e Florença (GEPB; CABRAL & FOLHADELA, 2006). Sobre a vida e obra de Vandelli ver
o detalhado trabalho de BRIGOLA (2003).
2
Felix de Avellar Brotero (1744–1828) nasceu em Santo Antão do Tojal, e morreu em Alcolena de Belém. Orfão desde os
primeiros anos de idade, vivia amparado por um tio de modestos recursos. As suas ideias filosóficas e a amizade que o
ligava a Filinto Elísio tornaram-no suspeito ao Santo Ofício, e assim, aos 33 anos de idade, viu-se obrigado a emigrar para
França. Em Paris assistiu ao curso de História Natural de Valmont de Bomare e às lições de Botânica no Colégio de
Farmácia. Foi discípulo de Buffon, Jussieu, Aubenton e Lamark. Doutorou-se na Escola de Medicina de Reims. Publicou
em Paris, em 1788, o «Compendio de Botanica». Brotero regressou a Lisboa em 1790. Pela reputação que já ganhara, foi
nomeado, em 1791, lente de Botânica e Agricultura na Universidade de Coimbra, por decreto de D. Maria I. Era imperioso
proceder-se à elaboração de uma flora do nosso país. Brotero inicia então herborizações, recolhendo plantas em diversos
locais, ao mesmo tempo que se ocupava do ensino e da instalação do Jardim Botânico de Coimbra. O facto de saber que os
botânicos alemães Hoffmansegg e Link preparavam também uma Flora de Portugal, levou Brotero, embora contrariado por
não a considerar completa, a publicar em 1804 a sua «Flora lusitanica». Com as invasões francesas, viu a sua casa
incendiada e o desaparecimento da sua livraria e do seu herbário. Depois de jubilado em 1811, Brotero passou para Lisboa,
onde foi ocupar o lugar de Director do Real Museu e Jardim Botânico da Ajuda, sucedendo assim a Vandelli. Aí prosseguiu
os seus trabalhos sobre a flora de Portugal, elaborando os dois magníficos tomos da «Phytographia Lusitaniae selectior»,
publicados respectivamente em 1816 e 1827. Brotero também publicou trabalhos sobre a flora do Brasil (GEPB;
FERNANDES, 1944; PIRES DE LIMA, 1944; VEIGA, 1945; CABRAL & FOLHADELA, 2006). Sobre a vida e obra de Brotero ver
ainda CASTEL-BRANCO (2004). Parte da bibliografia de Brotero está disponível em http://bibdigital.rjb.csic.es/
3
Link (1767–1851) após ter terminado os seus estudos em Medicina e Ciências Naturais em Göttingen, leccionou em
Rostock (1792), Breslau (1811) e Berlim (1815). Publicou, em 1795, um trabalho sobre os líquenes das rochas calcárias. Na
companhia do Conde de Van Hoffmansegg (grande apaixonado pelos estudos botânicos, e grande mecenas), Link viajou em
Portugal e na Grécia nos anos de 1797-1799. O relato da viajem a Portugal aparece numa obra em três volumes «Voyage au
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
5
Welwitsch6, a botânica portuguesa no início do século XX estava sedenta de modernização7 (PIRES DE
LIMA, 1944; FERNANDES, 1963).
Portugal». Como resultado dessas explorações foi publicada a monumental «Flore Portuguaise» que acabou por ficar
incompleta. Os dois volumes publicados ficaram caríssimos, devido ao luxo da edição. Os dois volumes são ornados de
magníficas estampas. Parte dos desenhos feitos em Portugal a partir das plantas frescas, são da autoria do próprio Conde. Os
restantes foram executados na Alemanha por um dos melhores pintores da especialidade, a partir de plantas de herbário.
Link publicou, ainda, em 1807, o seu trabalho «Grundlehren der Anatomie und Physiologie der Pflanzen» («Principios
fundamentais da anatomia e fisiologia das plantas»). Este trabalho contém ideias inovadoras sobre a anatomia das plantas,
referentes à estrutura dos vasos, das glândulas excretoras e dos estomas. Link foi director do Jardim Botânico de Berlim de
1815 a 1851. Publicou ainda três fascículos sobre a anatomia das plantas, entre 1837 e 1847. Adquiriu uma reputação
durável de anatomista, de fisiologista e de sistemata, e estudou tanto talófitos como plantas vasculares (CABRAL &
FOLHADELA, 2006). Parte da bibliografia de Link e Hoffmansegg está disponível em http://bibdigital.rjb.csic.es/
4
Francisco Manuel de Melo Breyner (1837-1903), 4.° Conde de Ficalho, termina o curso na Escola Politécnica de Lisboa
em 1860. É nomeado lente substituto em 1861, e lente proprietário de Botânica da Escola Politécnica em 1890. Foi por sua
influência que começaram, em 1874, as relações entre o Jardim Botânico da Escola Politécnica e o Jardim de Kew. Deu
também um grande impulso aos museus adstritos às Cadeiras da Politécnica, fundando o Museu Nacional de Lisboa. Foi
também director do Instituto Geral de Agricultura de Lisboa, de 1864 a 1877. Publicou trabalhos sobre a flora continental e,
especialmente, a ultramarina (GEPB; PALHINHA, 1953; MELO, 1987).
5
Antonio da Costa Paiva nasceu no Porto a 12 de Outubro de 1806. Era Doutor em Medicina e Bacharel em Filosofia pela
Universidade de Coimbra. Foi nomeado lente proprietário da 10.ª Cadeira e Director do Jardim Botânico e Experimental por
Decreto de 11 de Junho de 1838 e Carta Régia de 28 de Julho de 1838, tendo tomado posse do cargo em 14 de Junho de
1839. Foi nobilitado a 1.º Barão de Castelo de Paiva em 1854. Em 1855 passou a viver na Ilha da Madeira, por causa
«d’uma affecção pulmonar, mas tem vindo frequentes vezes a Lisboa». Foi jubilado por Decreto de 31 de Dezembro de
1858 e Carta Régia de 19 de Janeiro de 1859. Doou à Academia Real das Ciências de Lisboa um herbário madeirense
composto de 600 espécies, e outro herbário com 372 espécies recolhidas nas Ilhas Canárias. Deu ao Jardim Real de Kew um
herbário contendo plantas do Continente e dos Açores. Foi Cavaleiro das Ordens de Cristo e de Nossa Senhora da
Conceição, sócio da Academia Real das Ciências de Lisboa e de outras academias e corporações científicas nacionais e
estrangeiras e Vogal extraordinário do Conselho Geral de Instrução Pública até à sua extinção em 1868. «Adquiriu uma
fortuna avultada, que tem distribuido pelos hospitaes, e outros estabelecimentos de beneficiencia do paiz, reservando para si
o usofructo ou antes accumulando nas suas mãos os rendimentos até os repartir segundo os impulsos da sua piedade».
Falecido em 4 de Junho de 1879, legou, «uma inscripção [...] de divida publica portugueza do capital de um conto de reis
para se applicar o seu juro anual á cultura no Jardim Botanico de mesma Academia de plantas medicinaes do territorio
portuguez». As publicações do Barão de Castelo de Paiva revelam o perfil típico de um naturalista do século XVIII-XIX - o
estudo de animais, plantas, agricultura, medicina, filosofia, e até política e economia. Publica, em 1837, «Aphorismos de
medicina e cirurgia practicas», em 1855, «Relatorio do Barão de Castello de Paiva, encarregado pelo governo de estudar o
estado da Ilha da Madeira sob as relações agricolas e economicas», em 1866, «Novissimos ou ultimos fins do homem», e
ainda publica diversos trabalhos sobre coleópteros e moluscos (AAPP, 1880-1881). A vida e obra do Barão de Castelo de
Paiva foram sintetizadas no discurso de abertura do ano lectivo de 1879-1880, a 17 de Outubro, pelo Director interino da
Academia, Arnaldo Anselmo Ferreira Braga: «Antonio da Costa Paiva foi um dos distinctos professores [...] d’esta
Academia [...] Logo que entrou no excercício da sua cadeira, deu-se exclusivamente ao estudo da botanica, tornando-se em
poucos annos um dos primeiros botanicos do nosso paiz e talvez o primeiro como professor, pela sua clareza, concisão e
methodo de ensino. Dispondo de poucas forças, por causa de uma terrivel molestia pulmonar que lhe foi minando pouco a
pouco a sua existencia [...] abandonou o magisterio por causa dos seus padecimentos, e foi para a Madeira incumbido pelo
governo de estudar esta ilha sob as relações agricolas e economicas; o que foi objecto d’um bem elaborado relatorio que
publicou em 1855. Desde este anno em diante residiu alli a maior parte do tempo, [...] no estudo da fauna e flora do
archipelago madeirense e das Canarias. [...] O herbario do archipelago madeirense [...] contem 700 exemplares de plantas
indigenas, representando 545 especies e o canariense comprehende 400 exemplares que representam 372 especies da flora
d’este archipelago [...]» (AAPP, 1879-1880, 1880-1881). Ver também PIRES DE LIMA (1942:27-30) e SANTOS (1996).
6
Frederico Artur Welwitsch (1806-1872), médico austríaco, cedo se interessou pelas ciências naturais. Numa missão
botânica aos Açores e Cabo Verde, passa por Lisboa, onde acaba por residir durante alguns anos. Foi conservador do Jardim
Botânico da Ajuda. Herborizou frequentemente no continente, recolhendo muitos exemplares para herbário. Antes de partir
para África, o seu herbário é vendido à Academia Real das Ciências. Posteriormente, em 1853, o herbário de Welwitsch
passa para a Escola Politécnica de Lisboa, onde ainda hoje se encontra. Em 1853, por iniciativa do visconde de Sá da
Bandeira, parte para uma grande viagem científica a África. No deserto de Moçâmedes descobre a planta notável que em
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
6
Por toda a Europa publicavam-se floras nacionais e regionais, distribuíam-se colecções de
plantas secas e identificadas (exsicatas). As floras de Brotero e de Link e Hoffmansegg, notáveis no
contexto do fim do século XVIII – início do século XIX, um século passado, estavam obviamente
desactualizadas (FERNANDES, 1963). Era urgente a sua profunda revisão e actualização. Tal desiderato
caberá a três figuras excepcionais das Universidades de Coimbra, Lisboa e Porto – Júlio Henriques,
António Xavier Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio, em colaboração com uma rede de botânicos
nacionais e estrangeiros.
A incúria, a inveja e o desleixo arruinaram muitos dos nossos arquivos históricos. O
Departamento de Botânica da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto tem a fortuna de possuir
um vasto legado documental deixado por G. Sampaio8. O estudo do espólio documental de G.
Sampaio, da exegese das suas próprias obras, complementado com o estudo das colecções do Herbário
que organizou9, permitiram conhecer melhor o homem e a sua obra10, a sua geração, e a fundação da
botânica moderna em Portugal. Foi este o principal objectivo do presente trabalho11.
Considerámos como espólio documental de G. Sampaio, todo o conjunto de documentos
manuscritos da sua autoria ou consigo directamente relacionados. A maioria dos documentos estudados
foram cartas e bilhetes-postais recebidos de colegas investigadores e cartas escritas por G. Sampaio
mas não-enviadas (ou rascunhos de enviadas)12. Também analisámos documentação não-epistolar
sua homenagem será designada de Welwitschia Bainesii Hooker. Os géneros Welwitschella O. Hoffm. e Welwitschiina
Engl. também lhe foram dedicados. Após a sua morte, gerou-se uma séria disputa entre os governos inglês e português
sobre as suas colecções africanas, mas estas acabaram por chegar a Lisboa em 1878. Algumas foram estudadas pelo Conde
de Ficalho (GEPB; PALHINHA, 1953; MELO, 1987).
7
É também necessário referir a depredação das colecções de História Natural portuguesas pelas tropas francesas invasoras
(FERNANDES, 1963). A relativa pobreza dos estudos de História Natural no século XIX em Portugal está provavelmente
relacionada com a grande instabilidade política e social que o país viveu nas primeiras décadas deste século.
8
Uma palavra de especial agradecimento à Dra. Elisa Folhadela, Assessora do Departamento de Botânica da Faculdade de
Ciências da Universidade do Porto (FCUP), que tem carinhosamente velado pela preservação do espólio documental de G.
Sampaio e pelo Herbário do Departamento.
9
Foi recentemente incorporado na Biblioteca Nacional de Portugal um importante conjunto de cartas e bilhetes-postais
escritos por G. Sampaio a A. Ricardo Jorge (BN Esp. A/1987-2099). São 113 documentos manuscritos preciosos para a
compreensão da vida e obra de G. Sampaio. À data da conclusão do presente trabalho não estava ainda disponível a sua
reprodução, pelo que só nos foi possível realizar um estudo preliminar destes documentos.
10
As biografias de G. Sampaio publicadas (MORAIS, 1937; ROZEIRA, 1946; PIRES DE LIMA, 1938, 1952; SALEMA, 1991)
são simplistas e incompletas. Parte da bibliografia de G. Sampaio está disponível em http://bibdigital.rjb.csic.es/ e
https://museuvirtual.up.pt/up/jsp/pesquisas.faces.
11
Uma palavra de agradecimento a diversas entidades e personalidades que contribuiram para a realização do presente
trabalho: ao Conselho Científico da FCUP pela concessão de uma licença sabática durante a qual o trabalho foi elaborado;
aos editores desta revista pela receptividade e apoio à publicação deste trabalho; ao Dr. João Manuel Martins e ao Professor
P.e João Marques pelas discussões críticas e sugestões ao texto; ao Professor José Pissarra, actual presidente do
Departamento de Botânica (FCUP) pelo apoio que lhe tem merecido o Museu do Departamento; à Sílvia pela cuidadosa
revisão do texto final.
12
Incluímos as cartas escritas com máquina de escrever na categoria de manuscritos.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
7
diversa, nomeadamente, manuscritos de obras não-publicadas e apontamentos seus em obras impressas,
suas e de outros botânicos13.
A correspondência com J. Henriques é de longe a mais vasta, tanto em amplidão cronológica,
como em número de espécimes. É a única que abrange quase toda a vida científica de G. Sampaio. A
correspondência com A. Luisier, A. Ricardo Jorge e J. S. Tavares também abrange um dilatado período
de tempo, mas o número de documentos é muito inferior aos relativos a J. Henriques. A
correspondência com os restantes investigadores é relativamente circunscrita no tempo e em número de
exemplares. Estes factos estão relacionados com a actividade de investigação e produção científica de
G. Sampaio. Alguns assuntos mereceram a sua atenção durante uma fracção da sua vida científica.
Naturalmente que estes assuntos, os líquenes por exemplo, são tema de discussão sobretudo durante os
anos em que se dedica ao seu estudo. A maioria dos espécimes espitolares corresponde a
correspondência recebida por G. Sampaio. Foram datados pela data escrita pelo seu autor, ou na sua
ausência, pela data do carimbo do correio. Na ausência destas indicações, foi possível, em alguns
casos, fazer uma datação aproximada através da análise do seu conteúdo. O maior volume de
correspondência refere-se a botânicos portugueses. Seguem-se os botânicos espanhóis, e depois os
investigadores franceses. As restantes nacionalidades são esporádicas.
G. Sampaio incorporou muitos comentários e apontamentos nas obras que escreveu. Uma
exegese das suas obras revela muito da sua personalidade e do seu método de trabalho.
Finalmente, analisámos as colecções do Herbário organizado por G. Sampaio. Durante a sua
actividade científica foram incorporados, no herbário, muitos espécimes. A maioria são plantas
recolhidas por si, mas também muitos exemplares foram recebidos de fora, por permuta. O estudo de
algumas destas colecções permitiu complementar e enriquecer o estudo do espólio documental.
Os 12 capítulos iniciais foram baseados na análise do espólio documental de G. Sampaio. O
13.° capítulo é uma exegese das suas obras mais importantes14. O 14.° capítulo é um balanço e
13
Seguindo as recomendações de COSTA (1982), transcrevemos os manuscritos exactamente de acordo com os originais, em
que a acentuação das palavras é muito irregular. Limitámo-nos a desdobrar as abreviaturas e a acrescentar alguma
pontuação quando era indispensável para uma melhor leitura do texto. Para tornar o texto mais claro, em algumas
transcrições omitimos algumas palavras. Estas foram substituídas por: [...]. Também utilizámos este símbolo para substituir
palavras que não conseguimos transcrever. Todavia estas omissões em nenhum caso puseram em causa o sentido do texto
transcrito. Comentários nossos intercalados nas transcrições encontram-se em letra redonda, entre parêntesis rectos.
Sublinhámos os nomes de táxones. Mantivemos geralmente a ortografia original dos nomes de pessoas. A ortografia dos
nomes dos táxones no texto principal segue SAMPAIO (1946). As transcrições encontram-se entre aspas, as de manuscritos
em itálico, as de documentos impressos, em letra redonda.
14
A análise das obras de G. Sampaio podia ter sido intercalada no texto, no respectivo contexto cronológico. Optámos por
mantê-la separada porque permite uma leitura mais técnica da produção científica do investigador portuense. Deve no
entanto ser lida em permanente diálogo com os capítulos anteriores.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
8
avaliação que fazemos da obra do professor portuense. O último capítulo sintetiza o conteúdo de todo o
trabalho. Em anexos apresentamos algumas análises mais técnicas da produção científica de G.
Sampaio.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
9
II. A Academia Politécnica do Porto – da fundação ao dealbar do século XX15
1. A criação da Escola Politécnica de Lisboa
As duas escolas superiores de Lisboa e Porto foram criadas quase em simultâneo. O Decreto
que instituía a Escola Politécnica de Lisboa era assinado pela Rainha a 11 de Janeiro de 1837 e
publicado no Diário do Governo de 16 deste mês (DG 1837 01 16). O objectivo principal era «habilitar
alumnos com os conhecimentos necesarios para seguirem os differentes cursos das Escholas de
applicação do Exercito, e da Marinha; offerencendo ao mesmo tempo os meios de propagar a instrução
geral superior, e de adquirir a subsidiaria para outras profissões scientificas» (artigo 1.°). Existiam os
seguintes cursos na Escola: A. Curso preparatório para oficiais de Estado Maior, de Engenharia Militar
e de Engenharia Civil. B. Curso preparatório para oficiais de Artilharia. C. Curso preparatório para
oficiais de Marinha. D. Curso preparatório para engenheiros constructores de Marinha. E. Curso Geral
(artigo 5.°). A 7.a Cadeira era de «Mineralogia, Geologia, e principios de Metallurgia». A 8.a Cadeira
era de «Anatomia, e Physiologia comparadas, e Zoologia». A 9.a Cadeira era «Botanica, e principios de
Agricultura» (artigo 2.°). No ano lectivo de 1838-1839, o programa da Botânica era o seguinte: A.
Objecto da botânica, e inter-relação com outras disciplinas. B. Anatomia vegetal. Tecidos vegetais. C.
Organografia vegetal. Raiz, caule, folhas, flores e frutos. D. Fisiologia vegetal. Seivas. Crescimento.
Teoria da enxertia e mergulhia. E. Taxonomia. Lineu. Tournefort e Jussieu (DG 1839 01 04).
Cada Cadeira tinha o seu «lente proprietario» e o «lente substituto» (artigo 8.°). O lente
substituto substituía o lente proprietário «nos seus impedimentos, e para os ajudar nos casos, e pelo
modo que o Conselho da Eschola determinar» (artigo 9.°). O Conselho da Escola era formado por
todos os lentes proprietários e substitutos, sendo presidido pelo Director (artigo 20.°). O director era
«Official General, ou Official Superior de qualquer das Armas scientificas do Exercito, nomeado pelo
Governo» (artigo 19.°). Aos lentes era conferida grande autoridade e independência pelo artigo 17.°:
«O magisterio é vitalicio. Nenhum Lente poderá ser suspenso sem audiencia previa sobre queixa de
individuo, ou informação de authoridade, nem demittido sem preceder sentença proferida em Tribunal
competente». O Conselho da Escola deliberava sobre «a administração scientifica da Escola»,
nomeadamente sobre os programas das Cadeiras (artigo 21.°). A Escola Politécnica de Lisboa teria
como estabelecimento, «Um Gabinete de Historia natural» e «Um Jardim Botanico» (artigo 4.°) (DG
1837 01 16).
15
Sobre a história da Escola Politécnica de Lisboa ver GIL & CANÊLHAS (1987). Sobre a história da Universidade do Porto
ver a obra monográfica de SANTOS (1996). Sobre a história do ensino nas Universidades portuguesas consultar o exaustivo
trabalho de CARVALHO (1996).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
10
Como se ensinavam as ciências naturais na Escola Politécnica? O ensino encontrava-se bem
regulamentado no próprio diploma que criava a Escola Politécnica. As lições iniciavam-se com uma
recapitulação, feita pelos alunos, da matéria dada na aula anterior: «um, ou mais estudantes fazerem
uma exposição sobre a lição explicada no dia antecedente. Sendo o fim principal desta exposição
habituar os alumnos a exprimirem methodica, e correctamente em público as suas idéas» (artigo 41.°).
Seguidamente «explicará o Lente a lição do dia, fazendo elle mesmo os calculos, experiencias, e
demonstrações relativas a essa lição sem dependencia dos alumnos» (artigo 40.°). Ao fim de algumas
lições, geralmente, uma vez por semana, uma aula era de «repetição das materias ensinadas», fazendo o
lente «ao maior numero de alumnos possivel, as interrogações que julgar convenientes sobre os
objectos ensinados desde a ultima repetição» (artigo 41.°). Como eram avaliados os conhecimentos dos
alunos? De forma regular e laboriosa. Todos os meses, a aula das «repetições» era substituída por
«exercicios por escripto, feitos pelos alumnos na presença do respectivo Lente sobre a materia dada
nesse mez [...] consistindo na resposta de dez até quinze perguntas» (artigo 42.°). De dois em dois ou
de três em três meses, existiam exames orais «sobre todos os objectos ensinados dentro dos respectivos
períodos», em que «o Lente se limitará a fazer interrogações, mas nunca argumentará com os alumnos»
(artigo 43.°). Estes exames orais eram classificados em «máo, soffrivel, sufficiente, bom e optimo»,
mas a classificação não era transmitida ao aluno. No fim do ano existia um exame final, designado de
«annual», «sobre todas as materias estudadas em cada aula». Só podiam realizar o exame final os
alunos que tivessem feito todos os exames orais bi- ou trimestrais. Numa urna eram colocados 10
pontos diferentes, cada um contendo 50 perguntas. Um ponto era tirado à sorte. O aluno tinha quatro
horas para responder «por escripto», não sendo permitido «ao alumno conferenciar com pessoa alguma,
nem poderá levar para o exame livro, ou escripto algum com o fim de o consultar» (artigo 47.°). A
aprovação no exame final exigia pelo menos metade das respostas correctas. Se o aluno não fosse
aprovado no exame final, mas tivesse nos exames orais «qualificações a [...] seu favor [...] terá direito a
um novo exame, que servirá para decidir definitivamente da sua sorte» (artigo 49.°). A assistência às
aulas era obrigatória, e «nenhum alumno será admitido ao exame annual se tiver commetido, em causa
justificada perante o Conselho da Eschola, um numero de faltas igual á decima parte do numero das
lições que houverem em todo o anno, ou á quinta parte, ainda que seja por causa justificada» (artigo
52.°). A carta de curso exigia a aprovação em todas as disciplinas constantes do curso (DG 1837 01
16).
2. A criação da Academia Politécnica do Porto
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
11
A Academia Politécnica do Porto é fundada em 1837 por transformação da Academia Real da
Marinha e Comércio do Porto. O Decreto da criação da Academia é assinado por Passos Manuel e pela
Rainha em 13 de Janeiro de 1837, dois dias depois do diploma que instituía a Escola Politécnica e
publicado no Diário do Governo de 18 e 19 de Janeiro, (DG 1837 01 19). No preâmbulo é justificada a
criação da nova instituição de ensino superior na cidade nortenha: «Attendendo á necessidade de
plantar no paiz as sciencias industriaes, que differem muito dos Estudos classicos e puramente
scientificos, e até dos estudos theoricos contendo simplesmente a discripção das Artes; e offerencendo
para este fim a populosa e rica cidade do Porto a localidade mais appropriada por seu extenso
commercio e outras muitas circumstancias; podendo a Academia Real da Marinha e Commercio
satisfazer até certo ponto a este importante objecto, logo que receba uma organisação mais
conveniente» (AAPP, 1879-1880). O objectivo principal da Academia era «o ensino das Sciencias
industriaes» (DG 1837 01 19). As habilitações para os alunos serem admitidos à Academia eram: «14
annos de idade completos, approvação em leitura, escripta, e Grammatica Portugueza, e nas quatro
operações fundamentais d’Arithmetica» (AAPP, 1880-1881).
Existiam os seguintes cursos na Academia: A. Engenheiros. B. Oficiais de Marinha. C.
Directores de fábricas. D. Pilotos. E. Comerciantes. F. Agricultores. G. Artistas. H. Cursos
preparatórios para os oficiais do Exército. A 10.ª Cadeira - Botânica, Veterenária e Agricultura, era
ministrada em três anos, nos seguintes cursos: Engenheiros, de minas; Engenheiros, constructores de
navios; Engenheiros, de pontes e estradas; Directores de fábricas; Agricultores; Cursos preparatórios
para os oficiais do Exército. O seu programa era o seguinte: 1.º Ano. Botânica teórica: glossologia;
anatomia; fisiologia; taxonomia segundo Brotero. Botânica prática: exposição do sistema sexual de
Lineu feita no Jardim Botânico. Veterinária teórica: princípios de patologia aplicados ao estudo das
doenças animais. Veterinária prática: demonstração das referidas doenças feita no jardim experimental,
ou por auxílio de estampas. 2.º Ano. Botânica teórica e prática: continuação das matérias do 1.º ano.
Agricultura teórica: descrição dos terrenos; método de adubar, semear, cultivar, plantar, e afolhar as
terras. Agricultura prática: explicação e uso prático dos instrumentos empregues nesta ciência.
Exercícios dos processos operatórios. Teorias gerais da ciência. 3.º Ano. Botânica teórica e prática:
continuação das matérias do 1.º e 2.º anos. Economia rural teórica: noções gerais acerca do método
para que se tirem da agricultura as maiores vantagens possíveis. Economia rural prática: exposição
prática dos melhores edifícios rurais e quintais, feita por estampas e no jardim experimental. As obras
de referência eram as de Brotero, para a Botânica, e as de Huzard, para a veterinária (DG 1837 01 19;
AAPP, 1880-1881; SANTOS, 1996).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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O Regulamento da Academia estabelecia os princípios orientadores do funcionamento da escola
e das aulas, e do recrutamento dos professores. O artigo 162.º determinava que: «Haverá para cada um
dos cursos um Professor Proprietario, e seis substitutos. [...] Os Substitutos são demonstradores natos
[...] ordenado dos lentes cathedraticos 700$000 réis anuais, dos substitutos 400$000 réis». Era
instituído o Conselho da Academia pelo artigo 114.º: «A reunião de todos os professores proprietarios
e substitutos, convocada e presidida pelo Director, fórma o Conselho da Academia, a quem pertence a
inspecção scientifica e economica do Estabelecimento com subordinação ao Ministerio do Reino, com
quem o Director se corresponderá directamente». A admissão dos lentes era também regulamentada
neste artigo 114.º: «todas as cadeiras tem de ser [...] providas por meio de concurso publico [...] os
concorrentes devem apresentar o seu requerimento instruido com certidão do gráo de doutor, ou de
licenciado pela Universidade de Coimbra, ou Carta de capacidade passada pela Academia [...] o acto de
habilitação consiste na lição de um ponto sobre cada uma das disciplinas de tres Cadeiras designadas
pelo Conselho da Academia [...] os pontos são formados pelo Conselho academico, iguaes, pouco mais
ou menos, a uma lição academica [...] O oppositor lê pelo tempo de uma hora em cada uma das
disciplinas do ponto [...] No fim do acto corre o escrutinio secreto pelo Conselho academico» (DG
1837 01 19; AAPP, 1879-1880).
O Regulamento, no seu artigo 165.º, também determinava (e regulamentava) a criação de
estabelecimentos anexos à Academia, nomeadamente um Gabinete de História Natural e um Jardim
Botânico e Experimental: «Além dos Estabelecimentos, que actualmente pertencem á Academia, terá
mais um Gabinete de Historia Natural industrial [...] um Jardim botanico e experimental [...]. O Jardim
botanico servirá tambem para uso da Escóla medico-cirurgica; porém a sua intendencia pertence ao
Lente de Botanica [...] Haverá n’este Estabelecimento uma parte destinada para os ensaios de
Agricultura». «O Gabinete de Historia Natural é formado pela collecção de productos que pertencem
aos tres Reinos da Natureza. [...] A intendencia do Gabinete pertence ao Professor de Historia Natural
[...] Para a intendencia do Jardim botanico, o Lente de Botanica deve ter á sua ordem um Official ou
Jardineiro habil para o tratamento e cultura das plantas». É Antonio da Costa Paiva, Barão de Castelo
de Paiva, quem assumirá logo no primeiro ano, a regência da 10.ª Cadeira, e manter-se-à como seu
lente proprietário durante duas décadas (DG 1837 01 19; AAPP, 1880-1881).
3. O ensino das ciências naturais nos primeiros anos da Academia
Como se ensinavam as ciências naturais nas primeiras décadas de vida da Academia
Politécnica? O método de ensino – aulas teóricas e práticas - e avaliação de conhecimentos, eram,
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
13
naturalmente, muito semelhantes aos seguidos na Escola Politécnica de Lisboa. Os textos descritivos
que são publicados no seu órgão oficial (AAPP) revelam-nos um ensino das ciências naturais correcto
para a época, porque alicerçado no primado da experiência e da observação sobre a teorização, e com
uma carga horária intensa e uma avaliação de conhecimentos exigente. A importância da prática é bem
exemplificada neste texto publicado no órgão oficial da Academia: «Ha nas sciencias a considerar duas
partes distintas, ainda que mutuamente dependentes, e de tal fórma entrelaçadas que em alguns pontos
parecem confundir-se: são a theoria e a prática. A primeira, filha da profunda meditação, alimentada
com as vigilias dos Sabios, resumindo em si a metaphisica e a força da sciencia, fórma a sua alma, ou
essencia. A segunda, procedente da necessidade, aperfeiçoada com o uso, indispensavel ao mesmo
tempo nos Observatorios, e nas humildes Officinas, sempre porém obediente aos ditames da primeira, e
seguindo os seus influxos, parece formar o corpo, ou porção mechanica da mesma sciencia. Quanto
mais progredimos no estudo, mais nos convencemos da necessidade de sua estreita alliança: e a
nenhuma d’ellas podemos rasoavelmente dar a preferencia; pois o que uma tem de sublime, tem a outra
de indispensavel, e qualquer d’ellas independente mal poderia utilisar-nos. A prática sem a theoria era
apenas um cégo entregue ao cégo acaso, marchando por tentativas, tropeçando e cahindo a cada passo;
a theoria sem a prática não passava de bella concepção, habitando alguns cerebros privilegiados, ou
quando muito as paginas de dourados livros para ornar pomposas bibliothecas. É preciso portanto unilas para lhes dar uma existencia proveitosa á sociedade; e foi isso o que se pretendeu n’estes exercicios
scientificos. Comprehende-se sob a denominação de exercicios scientificos tudo quanto tende a fixar os
Estudantes nos conhecimentos adquiridos, e a guial-os na progressiva acquisição d’outros. No estudo
da theoria, exercitando sua memoria, desenvolvendo sua intelligencia, dilatando sua imaginação,
excitando n’elles o amor da verdade, finalmente ensinando-os a exprimir suas ideas com rigor e
justeza, e a represental-as por signaes convencionaes, e linguagem propria. No emprego da práctica,
fazendo que n’elles se torne acto mechanico o que ao principio dependia de esforço de espirito,
familiarisando-os com os instrumentos, operações, e processos proprios das sciencias a que se
dedicarem, e habilitando-os para conhecel-os, corrigil-os, e melhoral-os, qualquer que seja a sua fórma
ou circumstancias acessorias» (AAPP, 1880-1881).
Como decorria o ensino teórico? Nas cadeiras de Filosofia Natural, as lições teóricas consistiam
em o lente ouvir «um ou mais Estudantes [...] sobre as materias que se tiverem explicado no dia lectivo
antecedente, pelo menos durante o primeiro quarto d’hora. No resto do tempo explicarão as materias
que se seguirem, não podendo os Estudantes interromper a sua prelecção para lhes apresentarem
duvidas; mas reservando-as para as occasiões em que os Lentes lhes perguntarem se tem sido
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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entendidos». Ao fim de um determinado número de aulas teóricas, resumia-se e concluía-se a matéria
dada, eram as «recordações»: «Depois d’um numero indeterminado de lições que possam considerar-se
por sua ligação, e série de principios que encerram, como secção ou divisão natural da Sciencia, o
Lente determinará uma recordação, em que sejam apresentados esses principios separados de
demonstrações, e ligados entre si segundo a sua deducção e ordem mais natural, formando uma
synopsis. Estas recordações devem ser de tal maneira ordenadas que a sua totalidade forme o resumo
das disciplinas proprias de cada Cadeira. N’estes exercicios, o Lente interrogará o maior numero
possivel de Estudantes [...]» (AAPP, 1880-1881).
Como decorria o ensino prático? Os exercícios práticos incluiam a aplicação de fórmulas, o uso
de máquinas, ensaios e experiências, manipulações, trabalhos gráficos e topográficos. Na 10.ª Cadeira,
as aulas práticas seguiam o seguinte programa: «Classificação dos vegetaes, precedendo o necessario
exame e descripção de seus orgãos principaes e acessorios, tanto de reproducção como de vegetação.
Observações minuciosas feitas a olhos nus, ou com instrumentos proprios, sobre a estrutura interna dos
vegetaes, arranjos, dimensões, e posições relativas das differentes partes que os compõem. [...]
Investigações e experiencias sobre o progresso gradual da germinação, crescimento, inflorescencia [...]
Finalmente todos os trabalhos experimentaes que tendam a firmar as theorias, e a fortificar, ou destruir
as hypotheses até hoje admittidas [...] (AAPP, 1880-1881). Como era ensinada a matéria prática?
«Todos estes trabalhos serão executados pelos Estudantes, [...] o respectivo Lente, que a elles presidirá,
[...] limitando-se a indicar-lhes os processos, a esclarecêl-os em suas duvidas, e a dirigil-os onde
errarem; insistindo no escrupulo e circumspecção com que devem marchar de degráo em degráo até
chegarem ao conhecimento do vegetal, e mostrando-lhe a excellencia do methodo analytico de que
devem usar principalmente nas classificações [...] Estes exercicios serão feitos no Jardim Botanico, ou
no Campo, n’este ultimo caso, o Lente instruirá os Estudantes no conhecimento dos terrenos, [...]
fazendo-lhes notar os defeitos que houverem [...] nos trabalhos agricolas, como na escolha das
sementeiras. [...] Ensinará o methodo de construção dos predios ruraes e finalmente fará conhecer
práticamente as doenças dos animaes, e os meios de as curar [...]» (AAPP, 1880-1881).
Como eram avaliados os conhecimentos dos alunos? Através de exercícios escritos, e de um
exame final, oral, designado de «acto». Existiam exercícios escritos ordinários e extraordinários: os
«Exercicios por escripto. [...] terão logar ou em épocas fixas e se denominarão ordinarios, ou fóra
d’essas épocas quando as materias que se tratarem o exijam, e então se dominarão extraordinarios».
Nos «Exercicios ordinarios, todos os Estudantes são obrigados a apresentar, no fim de cada mez, um
exercicico ou dissertação por escripto que versará sobre a resolução d’algum problema geral que
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envolva difficuldade, demonstração d’alguma theoria, ou finalmente sobre qualquer materia das que
estudarem, a qual pela sua importancia reclama uma attenção particular. Poderá tambem ser objecto
d’estes exercicios, quando o Lente julgar conveniente, a synopsis d’uma grande divisão, ou secção já
completamente estudada das doutrinas que ensinar. [...] O Conselho Academico determinará
mensalmente, na primeira reunião, quaes devem ser os Lentes, que no seguinte mez devem exigir estes
exercicios, afim de não serem sobrecarregados os Estudantes com mais d’um no mesmo mez.». Os
exercícios extraordinários eram realizados «quando os Lentes julgarem necessario, ou para exercitar a
intelligencia dos Estudantes, ou para os familiarisar com alguns principios mais interessantes pelas suas
applicações, lhes proporão alguns problemas para resolverem por escripto á sua vista, ou para lh’os
entregarem depois d’algum dia feriado, segundo a difficuldade do objecto. [...] Estes exercicios porém
devem ser sempre de mais fácil execução do que os ordinarios, e não demasiados frequentes». «Tanto
os Exercicios Ordinarios como Extraordinarios serão datados e assignados pelos seus Auctores, e
apresentados aos respectivos Lentes, os quaes poderão interogal-os sobre qualquer ponto d’elles, e
declarar o seu juizo sobre os mesmos, mostrando as inexactidões aonde as houver [...]». Os actos eram
«feitos sobre pontos [...] previamente feitos pelos Lentes [...] e authorisados pelo Conselho
Academico». Cada aluno podia dar um número máximo de faltas às aulas. Excedendo este número,
ficava impedido de realizar os actos. A reprovação em duas cadeiras implicava a anulação da
frequência do respectivo ano lectivo (AAPP, 1880-1881).
4. O Jardim Botânico e Experimental da Academia
O Jardim Botânico e Experimental previsto no Decreto de 1837 que instituía a Academia
Politécnica, só viria a ser autorizado por Decreto de 20 de Setembro de 1844 (AAPP, 1879-1880;
SANTOS, 1996). No entanto, só em 1852, por Decreto de 20 de Outubro, foi concedido um terreno para
o estabelecimento do Jardim. O terreno, com 6.265 metros quadrados, localizava-se na cerca do extinto
Convento das Carmelitas da cidade do Porto (Praça Duque de Beja). Todavia, as obras necessárias para
o funcionamento do Jardim só começaram em Dezembro de 1864, e durante anos, continuaram «com
muita lentidão [...] por ser mui diminuta a respectiva dotação». Em fins de 1865 principiou finalmente
a plantação no Jardim, tendo sido utilizadas muitas plantas provenientes do Jardim Botânico da Ajuda
em Lisboa (AAPP, 1878-1879). Mesmo antes do seu funcionamento efectivo, era aprovado, em 1860,
o Regulamento do Jardim Botânico e Experimental. O seu artigo 2.º estabelecia claramente a sua
função didática: «O Jardim botanico da Academia Polytechnica do Porto, tem por fim a instrucção
prática dos alumnos da Cadeira de Botanica e suas dependencias». Dado que a sua vocação era o
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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ensino (e não o lazer por exemplo), determinava-se a sua composição e organização: «Haverá no
Jardim exemplares de diferentes plantas, tanto indigenas como exoticas, no maior numero possivel, e
como o comportar a grandeza e circumstancias do terreno, havendo ao menos uma especie de cada
genero em todas as familias naturaes» (artigo 3.º). «As plantas serão collocadas no Jardim segundo a
ordem e classificação natural, e numeradas todas com uma etiqueta [...]» (artigo 4.º). «Haverá no verso
da etiqueta um M, para determinar as plantas medicinaes; igualmente se marcarão as plantas venenosas
com um signal convencional no verso da etiqueta [...]» (artigo 5.º). «Haverá um catalogo [...] aonde se
escreverão pela ordem natural e lineana todas as plantas do Jardim [...]» (artigo 6.º). E finalmente: «A
entrada do Jardim é vedada a todas as pessoas estranhas á Academia Polytechnica e Escóla MedicoCirurgica [...] Aos estudantes [...] será permitida a entrada, ás horas e dias que todos os annos fôr
fixada, e sempre compativel com as lições theoricas» (artigo 7.º). Como era determinado no
regulamento inicial de 1837, «O Lente de Botanica é o Director do Jardim [...]» (artigo 9.º) (AAPP,
1881-1882). Em 1878, o Jardim Botânico e Experimental continha 1.301 espécies distribuídas por 138
famílias (AAPP, 1878-1879). Todavia, a manutenção de tão elevado número de plantas em boas
condições (muitas seriam anuais, e portanto exigiam intensa mão-de-obra) esbarrava com dificuldades,
como se deduz pelo discurso de abertura do ano lectivo de 1881-1882, proferido pelo Director
Interino16: «a Academia [...] seus gabinetes continuam [...] quasi desprovidos de tudo. Concede-se-lhe,
é verdade, em 1852, um minguado terreno para jardim, mas nenhuma subvenção lhe é dada. Porque
tam menosprezo? Seria porque o corpo docente não a reclamasse? Não, porque em seus relatorios e
varias representações que correm impressas bem fazia sentir o conselho a urgente necessidade de uma
dotação qualquer. Seria porque o corpo docente deixasse de cumprir os seus deveres, e fossem
improficuos os resultados de seus trabalhos? Tambem não, porque as provas estão nos seus
discipulos». Referia ainda o Director: «É tambem no orçamento geral do Estado, de 1857 para 1858
que [...] é cossignado pela primeira vez o subsidio de 650$000 reis para conservação e aperfeiçoamento
16
Nas palavras do Director da Academia parece antever-se o fim trágico do Jardim Botânico e Experimental, que iria
ocorrer alguns anos mais tarde, aparentemente com o consentimento dos órgãos directivos da própria Academia. PIRES DE
LIMA (1937, 1942, 1949) descreveu em pormenor o desmembramento do Jardim da Academia. O processo inicia-se em
1892 com uma ordem da Direcção Geral de Instrução Pública para que a Academia cedesse, à Guarda Municipal, parte do
terreno onde se encontrava o Jardim Botânico. A Carta de Lei de 1 de Agosto de 1899 autorizava a alienação do Jardim, «se
o Governo assim o julgasse conveniente aos interesses do Estado» (PIRES DE LIMA, 1942:17). Finalmente, na sessão
ordinária do Conselho Académico da Academia de Novembro de 1903 foi votada a verba de 100$000 réis para a mudança
das plantas e preparação do terreno das Virtudes. Foi criado um simulacro de Jardim Botânico na Cordoaria, mas acabou
por ser desactivado por desentendimentos entre os jardineiros da Câmara e os da Academia. Houve um projecto de se reestabelecer o Jardim Botânico nos jardins do Palácio de Cristal, adquirido pela Câmara Municipal do Porto em 1933, que
não se efectivou. O Jardim Botânico só viria a concretizar-se na Quinta Grande de Salabert da família Andresen, à Rua do
Campo Alegre, adquirida pela Faculdade de Ciências do Porto em 1949 por iniciativa de A. Pires de Lima e com o apoio do
Reitor da Universidade, Amandio Tavares (PIRES DE LIMA, 1942, 1949; FCP, 1969:188-193). Ver Capítulo III.6.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
17
do jardim botanico, bibliotheca, gabinete de physica, historia natural e laboratorio chimico» (AAPP,
1881-1882).
5. O Regulamento da Academia em 1864
O Regulamento da Academia Politécnica do Porto era ligeiramente alterado em 1864.
Mantinham-se os mesmos cursos, à excepção dos Cursos preparatórios para os oficiais do Exército. A
10.ª Cadeira, Botânica, era regida pelos lentes da Secção de Filosofia. Por jubilação do Barão de
Castelo de Paiva em 1859, o lente proprietário da cadeira de Botânica era agora Francisco de Salles
Gomes Cardoso17. Ocupará o cargo até 1890, sendo substituído por M. Amandio Gonçalves.
Os livros de texto para esta cadeira eram os «Éléments de Botanique» de Richard e a «Flore des
jardins et des champs» de Maout e Decaisne. O Conselho da Academia era agora designado de
Conselho Académico. Os alunos perdiam o ano se dessem um número de faltas igual à quarta parte do
número legal das lições da respectiva aula. Os actos incidiam sobre as matérias dadas nas cadeiras. Os
pontos «devem ser feitos pelos Lentes das respectivas Cadeiras sobre todas as materias que serviram de
objecto ao ensino». «Um destes pontos tirados á sorte 24 horas antes do exame, fará o objecto especial
em que os examinadores interrogarão os estudantes, mas poderão aquelles fazer perguntas vagas sobre
a generalidade da Cadeira». Os exames orais duravam ¼ de hora para cada Cadeira e aluno. Um dos
estabelecimentos da Academia era o Museu de História Natural. O seu director era o Lente da 7.ª
Cadeira. Outro estabelecimento da Academia era o Jardim Botânico e Experimental, situado, como já
foi referido, na Praça do Duque de Beja. O seu director continuava a ser o Lente da 10.ª Cadeira.
Alguns artigos do Regulamento da Academia eram dedicados à gestão financeira do Jardim,
complementando assim o Regulamento próprio do Jardim de 1860. O artigo 85.º estabelecia que «As
rendas do Jardim botanico ficam exclusivamente applicadas para costeamento e aperfeiçoamento do
mesmo Jardim. Estas rendas são: os fundos que para tal fim forem votados no orçamento de Estado; a
venda de plantas, sementes, flôres ou outros quaesquer productos, que não fizerem falta para o estudo e
demonstrações da aula de Botânica», sendo «Este rendimento [...] administrado pelo Lente de
Botanica, director do Jardim [...]» (artigo 86.º) (AAPP, 1877-1878, 1882-1883).
17
Francisco de Salles Gomes Cardoso nasceu no Porto em 28 de Fevereiro de 1816. Era Doutor em Filosofia e Bacharel em
Matemática pela Universidade de Coimbra. Foi nomeado lente substituto da secção de Filosofia por Decreto de 23 de Junho
de 1851 e Carta Régia de 30 de Agosto de 1851, tendo tomado posse do cargo a 20 de Setembro de 1851. Por jubilação do
Barão de Castelo de Paiva, foi promovido a lente proprietário da 10.ª Cadeira, por Decreto de 2 de Março de 1859, tendo
tomado posse deste cargo a 30 de Abril de 1859. Será substituído por M. Amandio Gonçalves em 1890. Era Capitão de
Fragata, Cavaleiro da Torre e Espada e Aviz, tendo sido condecorado com a medalha n.° 2 dos Senhores D. Pedro e D.
Maria (AAPP, 1877-1878; PIRES DE LIMA, 1942:30-31).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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6. O Decreto de 1865 estabelece normas para o recrutamento dos professores
Em 1865 é publicado um Decreto que estabelece as normas para o recrutamento dos professores
nos estabelecimentos de ensino superior do Reino. Esta legislação uniformizava portanto as regras para
a contratação dos lentes na Escola Politécnica de Lisboa, na Universidade de Coimbra e na Academia
Politécnica do Porto, as três escolas de ensino superior do país. As regras eram muito exigentes e
requeriam uma sólida preparação generalista na respectiva área de conhecimento. Na Academia
Politécnica, a cadeira de Botânica pertencia à secção de Filosofia. O candidato à secção tinha de prestar
provas sobre Botânica e Zoologia, que constituiam uma parte significativa da História (Filosofia)
Natural. Logo no artigo 1.º se estabelecia que «o primeiro provimento de todos os logares do
magistério [...] é feito por concurso público, e a nomeação deve recair em pessoas de reconhecida
probidade, talento e aptidão». Os candidatos deveriam ter um «diploma de um curso completo de
instrucção superior em que se comprehenda a frequencia e exame das disciplinas que constituem as
cadeiras ou secção a que os candidatos se propõem» As provas do concurso consistiam: A. «Em duas
lições, de uma hora cada uma, sobre pontos tirados à sorte, quarenta e oito horas antes». Para a
admissão à Academia Politécnica do Porto, na secção de Filosofia, as lições do concurso eram, «uma
lição de physica ou chimica, outra em mineralogia e geologia; ou em anatomia e physiologia
comparadas, e zoologia e botanica». «Os pontos para cada lição não podem ser menos de trinta [...]»
(artigo 13.º). «Em acto continuo á exposição oral de cada ponto, os candidatos são interrogados por
espaço de uma hora por dois membros do jury [...]» (artigo 15.º) B. «Uma dissertação impressa sobre
materia escolhida livremente pelos candidatos de entre questões importantes das sciencias, que fazem
parte das faculdades, secções ou cadeiras que elles se propõem professar». Esta dissertação também era
sujeita a prova oral. «No dia destinado para a sustentação da dissertação os candidatos são interrogados
sobre a doutrina d’ella [...] estas interrogações duram hora e meia» (artigo 16.º). C. E ainda «em
trabalhos práticos». «As provas práticas [...] versam sobre [...] Os candidatos são tambem obrigados a
dar por escripto conta d’estes processos práticos. [...] Este relatório é feito na sala onde as provas forem
dadas [...] são concedidas tres horas aos candidatos para satisfazer á prova escripta [...] O objecto das
provas práticas é tirado á sorte no acto mesmo de começarem estas [...] Os pontos não podem ser
menos de dez [...]» (artigo 14.º) (AAPP, 1880-1881).
7. A Academia nas décadas de 1870-1880
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
19
Nas décadas de 1870-1880 encontramos novos cursos na Academia Politécnica. Mantinha-se a
10.ª Cadeira – Botânica, constituída por: (a) Agricultura, e (b) Veterenária. A 10.ª Cadeira era
ministrada nos seguintes cursos: Engenheiro Civil de minas; Engenheiro Civil de pontes e estradas;
Engenheiro Civil geógrafo; Agricultor; Curso preparatório para as Escolas Médico-Cirúrgicas; Curso
preparatório para a Escola de Farmácia; Curso preparatório para a Escola Naval, Curso de engenharia
naval (AAPP, 1878-1879). No ano lectivo de 1881-1882, os livros que serviam de texto nas aulas da
cadeira de Botânica eram: «Éléments de botanique» de Richard, «Flore des jardins et des champs» de
Maout et Decaisne, e «Flora lusitanica» de Brotero (AAPP, 1881-1882). O ensino prático e
experimental continuava a ser entendido como parte importante e integrante da cadeira de Botânica,
como se deduz das palavras que o Director Interino proferiu na abertura do ano lectivo de 1880-1881:
«É bem reconhecida a instante necessidade de nos afastarmos um pouco mais do ensino da parte
especulativa da sciencia e curarmos com todo o aproveitamento, que nos facultam os nossos meios
d’estudo, das suas applicações. Creio, ponto incontroverso, que a sciencia pura sem a arte, sem a
pratica, tem a faculdade de desenvolver o nosso espírito, e enriquecêl-o de conhecimentos, que só a sua
applicação póde traduzir em melhoramentos industriaes, agricolas, commerciaes e economicos, e
mostrar a sua utilidade. O ensino theorico é muito importante, e sem elle, por sem duvida, que o ensino
pratico se converteria em verdadeira rotina, e nunca poderia attingir ao maximo grao de perfeição, a
que fatalmemnte chega, quando parallelamente seja acompanhado do estudo theorico. Nos nossos
estabelecimentos de instrucção superior tem sido, até ha pouco tempo, o ensino eivado d’esta grande
falta – muita theoria e quasi só theoria. Os laboratorios e gabinetes não tinham os meios precisos para
as demonstrações e trabalhos que são indispensaveis aos exercicios praticos. [...] Os estabelecimentos
praticos d’esta Academia tem sido infelizmente engeitados de toda a protecção, comparando com a
dispensada aos dos outros institutos scientificos do nosso paiz.». Refere de seguida as medidas tomadas
para atenuar a situação, tendo aumentado «as dotações dos gabinetes e o pessoal auxiliar nos
laboratorios de chimica e physica, museu de historia natural, e jardim botanico com conservadores,
preparadores e ajudantes» (AAPP, 1880-1881).
8. O Regulamento da Academia de 1888
Em 1885 é reformado o ensino na Academia Politécnica do Porto por Decreto de 10 de
Setembro (DG 1885 09 21). A Academia passava a ser especialmente destinada a formar engenheiros
civis de obras públicas, minas e indústria, e habilitar para comerciantes. Ministrava também os cursos
preparatórios para a admissão na Escola do exército, Escola naval, Escolas medico-cirurgicas e de
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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farmácia (artigo 2.º). Pela primeira vez, a tradicional Cadeira de Botânica, a 10.a, era sub-dividida em
duas partes: 1.ª Botânica e 2.ª Botânica industrial e matérias-primas de origem vegetal (artigo 1.º). A
Botânica fazia parte do currículo dos cursos de: Engenheiros civis de obras públicas e de minas;
Engenheiros industriais; Cursos preparatórios para a Escola do exército; Cursos preparatórios para a
escola naval; Curso preparatório para as escolas médico-cirúrgicas; Curso preparatório para a escola de
farmácia (artigo 3.º). Eram ministradas três aulas semanais (artigo 1.º). A Botânica industrial e matérias
primas de origem vegetal era ministrada unicamente no curso de Comércio (artigo 3.º). O horário
consistia em uma aula semanal (artigo 1.º). Como lente proprietário da 10.ª Cadeira - Botânica,
mantinha-se Francisco de Salles Gomes Cardoso. Cada Cadeira tinha um lente proprietário, e um ou
vários lentes substitutos. Os lentes substitutos eram «demonstradores natos». O Conselho académico
continuava a ser constituído por todos os lentes proprietários e substitutos. O Jardim Botânico e
Experimental mantinha-se como um dos estabelecimentos auxiliares de ensino. Em 1890, por Decreto
de 6 de Fevereiro, M. Amandio Gonçalves18 assume a regência da 10.ª Cadeira (DG 1890 02 08), que
manterá até 1911, quando é substituído por G. Sampaio (AAPP, 1889-1890).
Tinha passado quase meio século sobre o primeiro regulamento da Academia. Os métodos de
ensino e a avaliação de conhecimentos mantinham-se, no entanto, na essência, inalterados. O ensino
continuava a ser laborioso e exigente (se bem que um pouco repetitivo). Como decorriam as aulas?
Mantinha-se a existência do ensino teórico e prático. A instrução teórica constava de lições, repetições,
memórias, e dissertações. Cada aula durava duas horas. Na primeira hora, o lente explicava a matéria
para o dia seguinte. Na segunda hora, interrogava os alunos ou ouvia-os «de lição». Em determinados
dias, previamente marcados, realizavam-se repetições orais ou escritas, com a duração de duas horas
(revisão da matéria dada). Os alunos podiam ser encarregados de escrever memórias ou dissertações
sobre determinados assuntos. A instrução prática abrangia trabalhos laboratoriais e de campo, visitas,
excursões e missões de estudo. A avaliação de conhecimentos seguia um esquema semelhante ao do
regulamento de 1839, quiçá ainda mais laborioso e exigente. Existiam exames de frequência
trimestrais, orais ou escritos, consoante a cadeira. No exame de frequência existiam pontos préelaborados. No exame oral era tirado um ponto à sorte. Estas provas eram classificadas. Os alunos que
atingiam uma média igual ou superior a 10 valores (em 20) eram admitidos a exame final, o acto. O
18
Manoel Amandio Gonçalves nasceu no Porto em 1861. Bacharel em Filosofia pela Universidade de Coimbra, foi
nomeado lente substituto da secção de Filosofia da Academia Politécnica do Porto por Decreto de 19 de Junho de 1884 (DG
1884 06 23), e lente proprietário da 11.ª Cadeira – Zoologia desta Academia, por Decreto de 14 de Agosto de 1885 (DG
1885 08 20). Em 1890 transitava para a Cadeira de Botânica. Em 1912, por motivo de doença, foi substituído na regência da
Botânica por G. Sampaio. Aposentou-se em 1915 (PIRES DE LIMA, 1942:31-32; FCP, 1969:245).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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exame final era oral, e constava de uma parte geral e de um ponto tirado à sorte três horas antes do
exame. Existiam finalmente os exames gerais ou de habilitação. Os alunos que tivessem sido aprovados
em todas as disciplinas obrigatórias, tinham ainda que realizar um exame geral, para obter o respectivo
diploma de curso. Constava de duas partes: a primeira era a redacção completa de um «projecto
complexo», e a segunda de uma prova oral. (AAPP, 1889-1890).
9. O ensino da Botânica na Academia Politécnica no dealbar do século XX
Que matérias se ensinavam na 10.ª Cadeira – Botânica? O primeiro programa apresentado no
Anuário da Academia refere-se ao ano lectivo de 1898-1899. Todavia, pelos livros de texto
recomendados e mencionados no Anuário, podemos conceber o programa da cadeira de Botânica na
década de 1890. Nos anos lectivos de 1891-1892 e 1892-1893, era o «Manuel d’Histoire Naturelle» de
Lanessan, o livro de texto recomendado (também para a 11.ª Cadeira – Zoologia). Nos quatro anos
lectivos seguintes, eram indicados: «Botanique médicale» de Trabut; «Flore élémentaire des jardins et
des champs» de Emmanuel Le Macut e J. Decaisne; «Elementos de botanica» de A. X. Pereira
Coutinho. Para os anos lectivos de 1898-1899 e 1899-1900, mantem-se o texto de A. X. Pereira
Coutinho e adiciona-se o «Traité de botanique», em dois volumes, de Couchet. Nos anos lectivos de
1900-1901, 1901-1902, 1902-1903, 1903-1904 e 1904-1905, são a «Anatomie et physiologie
végétales» de Gérardin e Henri Guede e o «Précis de Botanique médicale» de Trabut. Nos anos lectivos
de 1905-1906 e 1906-1907, o livro de texto básico para a Cadeira de Botânica era «Leçons
elementaires de botanique» de Daguillon (AAPP, 1891-1892, 1892-1893, 1893-1894, 1894-1895,
1895-1896, 1896-1897, 1898-1899, 1899-1900, 1900-1901, 1901-1902, 1902-1903, 1903-1904, 19041905, 1905-1906, 1906-1907).
Qual o programa da 10.ª Cadeira – Botânica - leccionada por M. Amandio Gonçalves? No ano
lectivo de 1898-1899 focava os seguintes aspectos fundamentais: A. Métodos e aparelhos para a
observação morfológica. B. Célula. Tecidos e aparelhos. Raíz. Caule. Folha. Flor. Reprodução. C.
Desenvolvimento das talófitas. Desenvolvimento das muscíneas. Desenvolvimento das criptogâmicas
vasculares. Desenvolvimento das fanerogâmicas. D. Fruto e semente. Germinação da semente. Plantas
saprofíticas. Parasitismo e simbiose. Plantas carnívoras. E. Alimentos dos vegetais. Respiração.
Circulação. Substâncias de reserva. Sensibilidade das plantas. Crescimento dos vegetais. F.
Fermentações. Cultura dos microrganismos. G. Caracteres gerais das talófitas. Fungos. Myxomicetos,
oomycetos, ustilagíneas, uredíneas, basidiomycetes e ascomycetes. Caracteres das famílias
pertencentes a estas ordens. Estudo das espécies mais importantes sob o ponto de vista médico. Algas.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
22
Cyanophyceas, chlorophyceas, pheophyceas e florídeas. Caracteres das famílias pertencentes a estas
ordens. Líquenes. Bactérias. Morfologia e fisiologia. Culturas. Estudo das bactérias patogénicas mais
notáveis. H. Caracteres gerais das muscíneas. Caracteres gerais das criptogâmicas vasculares.
Caracteres gerais das fanerogâmicas. Gimnospérmicas e angiospérmicas (AAPP, 1898-1899). A
Botânica, nos finais do século XIX, era assim uma disciplina abrangente – estudavam-se os organismos
considerados como plantas na época - das bactérias às angiospérmicas. A Microbiologia já existia
como disciplina independente desde meados do século XIX, mas era habitual o seu ensino estar
incluído na Botânica. A morfologia dominava. Morfologia externa, mas também citologia e histologia.
A fisiologia era incipiente.
O Regulamento da Academia Politécnica seria modificado por decreto de 27 de Fevereiro de
1890 e de 30 de Julho e 23 de Agosto de 1894. Todavia, mantinha-se na essência. Entretanto, os
exames gerais ou de habilitação eram abolidos por Decreto de 15 de Julho de 1892 (AAPP, 18891890).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
23
III. Gonçalo Sampaio, aluno e naturalista da Academia Politécnica do Porto
1. G. Sampaio aluno da Academia Politécnica
Gonçalo Antonio da Silva Ferreira Sampaio19 frequenta a Academia Politécnica do Porto
durante três anos lectivos. No ano lectivo de 1890-1891 inscreve-se na 7.ª Cadeira (Chimica
inorganica, 1.ª Parte: Chimica inorganica geral) e na 10.ª Cadeira (Botanica, 1.ª Parte: Botanica)
(AAPP, 1890-1891). No ano lectivo seguinte, 1891-1892 encontra-se inscrito novamente na 7.ª Cadeira
(Chimica inorganica, 1.ª Parte: Chimica inorganica geral), na 8.ª Cadeira (Chimica organica e
analytica. 1.ª Parte: Chimica organica geral e biologica. 2.ª Parte: Chimica analytica), e na 11.ª Cadeira
(Zoologia. 1.ª Parte: Zoologia) (AAPP, 1891-1892). Não se inscreve no ano lectivo seguinte (AAPP,
1892-1893). Finalmente, no ano lectivo de 1894-1895, encontra-se inscrito nas seguintes disciplinas:
2.ª Cadeira (Calculo differencial e integral), 4.ª Cadeira (Geometria descriptiva. 1.ª Parte), 6.ª Cadeira
(Physica, 1.ª Parte), 8.ª Cadeira (Chimica organica e analytica. 2.ª Parte: Chimica analytica), e 18.ª
Cadeira (Desenho, 1.ª Parte e 2.ª Parte) (AAPP, 1894-1895). Portanto, G. Sampaio não termina o curso
da Politécnica20. O lente da 10.ª Cadeira, Botânica, era, como já referimos M. Amandio Gonçalves.
2. Contactos iniciais com Júlio Henriques e a Sociedade Broteriana
G. Sampaio, ainda aluno dos primeiros anos da Academia, contacta com o Herbário da
Universidade de Coimbra. A primeira carta que existe no seu espólio é mesmo de Júlio Henriques21 e
data de 10 de Junho de 1892. Nesta carta, J. Henriques dá conselhos de como preparar
19
G. Sampaio nasceu na freguesia de S. Gens de Calvos, concelho de Póvoa de Lanhoso a 29 de Março de 1865. Em 1885,
matriculou-se na Escola Normal do Porto, com o intuito de ser professor primário. No entanto, abandona a Escola Normal,
voltando ao liceu de Braga onde finalmente concluiu o curso.
20
Antes de ingressar na Academia Politécnica do Porto, G. Sampaio terá frequentado o curso de Matemática da
Universidade de Coimbra, onde obteve aprovação em Algebra superior e Geometria analítica. Do curso da Academia
Politécnica teria tido aprovação nas 7.ª, 10.ª e 11.ª Cadeiras (SAMPAIO, 1912b).
21
Júlio Augusto Henriques (1838-1928) nasceu em Cabeceiras de Basto a 15 de Janeiro de 1838 e morre aos 90 anos de
idade. Era formado em Direito e depois em Filosofia pela Universidade de Coimbra, onde se doutorou em 1865. É nomeado
lente substituto aos 28 anos e sete anos mais tarde, em 1874, lente proprietário, sendo-lhe então confiada a direcção do
Jardim Botânico da Universidade de Coimbra. Em 1880 cria a Sociedade Broteriana e funda o Boletim da Sociedade
Broteriana (ver Capítulo V). Deve-se também a J. Henriques a compra do valiosíssimo herbário de Willkomm. Em 1906,
inicia a publicação, em fascículos, do seu «Esboço da Flora da Bacia do Mondego», que aparecerá como volume
independente em 1913 (HENRIQUES, 1913). São enumeradas 1.515 espécies (ver Capítulo IX). Estudou ainda a flora das
Serras da Estrela, Caramulo, Buçaco, Lousã, Gerês, Marão, e a flora de São Tomé e Príncipe. Descreveu diversas espécies
novas para a ciência, tanto do continente como das colónias, e foram-lhe dedicadas espécies novas e o género Henriquesia.
Publicou diversos trabalhos de botânica geral (HENRIQUES, 1885, 1889b, 1916b). Traduziu para português algumas obras de
Agricultura e Botânica geral muito em uso na sua época, como a de J. D. Baker, J. D. Hooker e H. Tanner. Escreveu dois
trabalhos biográficos sobre J. F. Correa da Serra (HENRIQUES, 1918, 1923). Publicou ainda os programas de disciplinas que
leccionava na Universidade de Coimbra (HENRIQUES, 1889a, 1892) (GEPB; FERNANDES, 1963; QUINTANILHA, 1975;
CABRAL & FOLHADELA, 2006).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
24
convenientemente exemplares de Lactuca viminea para serem enviados para a Alemanha: «Devo dizerlhe que o que se deseja é a folha. Peço por isso que escolha exemplares com folhas bem conservadas.
Embrulhando-a em qualquer cousa impermeavel [...] ou ainda em folha d’alface, é de esperar que as
plantas cheguem a Göttingen em bom estado».
G. Sampaio envia plantas para o Herbário da Universidade de Coimbra para serem identificadas
ou confirmadas as identificações que tinha feito. Numa carta de 28 de Agosto de 1893, J. Henriques
escrevia: «Antes de sair de Coimbra quero dar-lhe a nota das especies que me enviou. É a seguinte:
[...] Vai pouca em duvida». Num bilhete-postal de 19 de Agosto de 1896, podemos ler: «O Echium
deve ser o E. lusitanicum frequente nas regiões montanhosas.». Nesta altura, J. Mariz22 era naturalistaadjunto no Herbário da Universidade de Coimbra e uma das pessoas mais experientes e conhecedoras
da flora portuguesa. Competia-lhe, juntamente com J. Henriques, rever as identificações das plantas
distribuídas aos sócios da Sociedade e da «exsiccata lusitanica» (BSB, I-III). J. Mariz terá revisto
determinações de G. Sampaio, como se deduz pelo que J. Henriques escreve a G. Sampaio numa carta
datada de 4 de Agosto de 1896: «Mariz examinou o Carex e é de opinião que deve ser [...]». G.
Sampaio reconhecerá o auxílio do naturalista coimbrão dedicando-lhe, num dos seus primeiros
trabalhos (sobre o género Mentha, publicado em 1901), uma variedade nova23 – Mentha aquatica var.
Marizi. G. Sampaio terá informado J. Mariz da sua intenção em lhe dedicar esta variedade, ou mesmo
ter-lhe-á enviado um rascunho do trabalho, dado que numa carta datada de 29 de Dezembro de 1901, J.
Mariz escreve a G. Sampaio: «Principio por agradecer a amabilidade de V. Exa. em me dedicar a
Mentha hybrida de [...] como planta nova para a flora portugueza. [...] Pode V. Exa. mandar quando
quizer o artigo em que me falla sobre as Menthas dos arredores do Porto porque ainda vem muito a
22
Joaquim de Mariz Júnior nasceu em Coimbra a 28 de Janeiro de 1847. Terminou o curso de Medicina da Universidade de
Coimbra em 1878. Exerceu clínica durante algum tempo. Entra como naturalista adjunto à cadeira de Botânica da
Faculdade de Filosofia da Universidade de Coimbra em 1879. Realiza muitas herborizações no país, enriquecendo
assinalavelmente o Herbário da Universidade e contribuindo para as distribuições de plantas da Sociedade Broteriana em
mais de 200 espécies. Adquire um profundo conhecimento da flora portuguesa, tornando-se o responsável pela revisão das
determinações da «Flora lusitanica exsiccata» distribuída pela Sociedade Broteriana. Publica, em partes, os «Subsídios para
o estudo da flora portuguesa», que ocuparam inúmeros volumes deste Boletim. É autor de algumas espécies novas para a
ciência: Celsia brassicifolia Mariz, Succisa Carvalheana Mariz, Daveaua anthemoides Mariz. O seu grande prestígio entre
os botânicos da época levou a que alguns lhe dediquassem espécies novas, como: Conopodium Marizianum Samp., em
«homenagem aos grandes conhecimentos botanicos e notaveis qualidades de trabalho do meu amigo e illustre naturalista da
Universidade de Coimbra dr. Joaquim de Mariz, a quem devem numerosas e importantes monographias sobre a flora
phanerogamica do nosso paiz» (SAMPAIO, 1905e). Era também desenhador exímio, tendo desenhos seus sido publicados em
obras artísticas. Morre a 1 de Abril de 1916 em consequência de uma pneumonia, com pouco mais de 69 anos. J. Henriques,
director do Herbário escreveu a seu respeito: «Nos 37 anos durante os quais ocupou êste lugar, foi sempre empregado
zeloso, trabalhador conscencioso, podendo servir de exemplo», concluindo que «Foi um grande e eficaz trabalhador»
(HENRIQUES, 1917a) (GEPB; HENRIQUES, 1916a, 1917a).
23
Muitos nomes de táxones novos que G. Sampaio irá propor ao longo da sua carreira são associados a pessoas - quem
colheu a planta, quem deu opinião, quem fez sugestões, ou às características da planta.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
25
tempo para se publicar no Boletim da Sociedade Broteriana d’este anno». De facto o trabalho seria
publicado no volume XVIII do Boletim (1901).
Ao contactar com a Botânica da Universidade de Coimbra, G. Sampaio ter-se-á apercebido da
importância da Sociedade Broteriana24, e, logo em 1894, inscreve-se como sócio (BSB, XIII). O seu
endereço é de Póvoa de Lanhoso. Era um dos nove sócios envolvidos nas colheitas de plantas para as
distribuições da Sociedade Broteriana. A sua actividade é logo destacada. Será um dos poucos
colectores de plantas para a «Flora lusitanica exsiccata»25. Participa nas distribuições de plantas entre
sócios26. Encontramos elogios a este trabalho de colector em cartas dos botânicos de Coimbra para G.
Sampaio. Numa carta datada de 23 de Junho de 1896, J. Henriques agradecia: «Recebi hoje a sua carta
e muito estimo saber que está bem disposto para continuar com os trabalhos de herborizações» e
contagiava o jovem G. Sampaio com o gosto pela botânica: «Se for á serra da Cabreira peço-lhe que
tome notas da viagem para um pequeno artigo descriptivo. Pena é que não tenho um barometro [...]».
J. Mariz escrevia a 9 de Abril de 1904 para G. Sampaio: «Para calcular o numero de especies que
precisamos colher n’esta temporada para completar as nossas collecções de distribuição, tenho
empenho em V. Exa. me diga se effectivamente podemos contar com algumas plantas das suas
proficuas explorações do verão passado em Traz-os-Montes e outras localidades do norte, das quaes
V. Exa. nos prometteu partilha para a Sociedade Broteriana e Centurias».
3. G. Sampaio naturalista adjunto da Academia Politécnica
O excepcional mérito e aptidão para a Botânica do jovem G. Sampaio não teriam passado
desapercebidos a M. Amandio Gonçalves, professor da 10.ª Cadeira Botânica, e terá sido quiçá por sua
iniciativa que G. Sampaio entra como naturalista adjunto da Academia Politécnica do Porto em 190127.
Já tinha publicado diversos trabalhos sobre a flora portuguesa. O futuro científico do jovem G.
Sampaio terá parecido promissor às instâncias da Academia.
24
A Sociedade Broteriana foi fundada em 1880 por J. Henriques. Tinha como finalidade o estudo da flora portuguesa e o
intercâmbio de plantas (exemplares de herbário) entre os seus sócios. A Sociedade elaborou uma exsicata, «Flora lusitanica
exsiccata», que era permutada por outras exsicatas de Sociedades e Instituições nacionais e estrangeiras. O «Boletim da
Sociedade Broteriana» era o porta-voz da Sociedade, tendo iniciado a sua publicação em 1883. Em 1930 iniciou-se a
publicação das «Memórias» da Sociedade, e em 1935, do «Anuário» (COUTINHO, 1938; CARVALHO, 1939). A importância
da Sociedade Broteriana e das suas publicações será desenvolvida no Capítulo V.
25
«Flora lusitanica exsiccata»: centúrias XIV (BSB, XII), XV (BSB, XIV), XVI (BSB, XVI), e XIX (BSB, XXVI).
26
Nos anos de 1899 a 1902 (BSB, XIX) e 1903 a 1906 (BSB, XXI).
27
É nomeado naturalista adjunto da secção de Botânica, por decreto de 5 de Dezembro de 1901 (DG 1901 12 12). Residia
na Rua de Costa Cabral, 1399 (AAPP, 1901-1902). No mesmo decreto é nomeado António Augusto da Rocha Peixoto, para
a secção de Mineralogia, e Augusto Pereira Nobre, para a secção de Zoologia.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
26
4. Contactos com A. X. Pereira Coutinho
G. Sampaio também estabelece contactos com a Botânica da Escola Politécnica de Lisboa e
com o seu director e professor A. X. Pereira Coutinho28. A primeira carta do professor da Escola
Politécnica para G. Sampaio data de 23 de Junho de 190229. Em jeito de apresentação, G. Sampaio terá
enviado a A. X. Pereira Coutinho dois dos seus últimos trabalhos publicados, um sobre o género
Echium e outro sobre Mentha. O professor de Lisboa, nesta carta de 23 de Junho de 1902 aprecia-os da
seguinte forma elogiosa: «Recebi a sua Nota sobre as especies do genero Mentha dos arredores do
Porto, que muitissimo agradeço, e que li com o maior prazer. Permitta-me acrescentar, e veja n’isto a
verdadeira expressão do meu sentir, que a julgo superiormente bem feita; pois não só mostra um
grande trabalho de observação, mas um grande criterio, para a avaliação dos caracteres de um tão
intrincado grupo de plantas». Seguidamente, A. X. Pereira Coutinho discute o conteúdo do trabalho
28
D. António Xavier Pereira Coutinho (1851-1939) era formado em Agronomia, em 1874, pelo Instituto Geral de
Agricultura (Lisboa). Começa a trabalhar como agrónomo, em Bragança, em 1875. Estuda a flora espontânea da região.
Estas herborizações foram certamente decisivas na sua orientação como naturalista. Envia exemplares das suas colecções
para J. Henriques. Iniciou a sua vida de professor no Instituto Geral de Agricultura em 1880. É nomeado lente proprietário
em 1882 e em 1883 rege a cadeira de Silvicultura e Economia Florestal, transitando em 1886 para a cadeira de Química
Agrícola. Na década de 1880 publica um «Curso de Silvicultura» (Coutinho, 1886, 1887), cuja segunda parte («Esboço de
uma flora lenhosa») terá uma segunda edição em 1936 (COUTINHO, 1936). É escolhido pelo Conde de Ficalho para seu
sucessor no cargo de naturalista adjunto da Secção de Botânica do Museu Nacional de Lisboa, anexo à Escola Politécnica
de Lisboa, cargo que ocupa de 1890 até 1921, quando atingiu o limite de idade. Em 1891, concorre à vaga de lente
substituto da 9.ª Cadeira da Escola Politécnica, apresentando como dissertação «As juncáceas de Portugal» (COUTINHO,
1890). Após a morte do Conde de Ficalho, ascendeu, em 1903, ao lugar de lente proprietário da 9.ª Cadeira. A este
incumbia também a direcção do Jardim Botânico anexo à Politécnica. Continuava no entanto no Instituto de Agronomia e
Veterenária, onde da cadeira de Química passa para a de Botânica (que regeu até ao limite de idade). Ao ser promulgada a
reforma do ensino universitário que transformou a Politécnica em Faculdade de Ciências de Lisboa, passou à categoria de
professor ordinário. Publicou em 1913, a 1.ª edição da sua «Flora de Portugal» (COUTINHO, 1913). A flora desactualizou-se
rapidamente. A 2.ª edição desta «Flora de Portugal», revista pelo seu autor (que contava então 86 anos de idade) saiu a
público pouco tempo depois da sua morte (1935). R. T. Palhinha dirigiu a nova edição, impressa sob os auspícios do
Instituto de Alta Cultura. Esta 2.ª edição da Flora de Portugal (COUTINHO, 1939b) enumera 799 géneros e 2.845 espécies,
mais 12 e 110, respectivamente, que a 1.ª edição. A. X. Pereira Coutinho publicou, de 1914 a 1930, as «Notas da Flora de
Portugal», I a VII. Mais tarde, em 1935, reuniu essas Notas no «Suplemento da Flora de Portugal» (COUTINHO, 1935). A. X.
Pereira Coutinho também se dedicou ao estudo dos líquenes. Publica em 1916 «Lichenum Lusitanorum Herbarii
Universitatis Olisiponensis Catalogus» (COUTINHO, 1916) e em 1917 o respectivo suplemento (COUTINHO, 1917a).
Publicou também outros inventários das colecções do Herbário da Escola Politécnica (COUTINHO, 1917b, 1917c, 1919,
1921). É também importante a atenção que A. X. Pereira Coutinho dedicou ao ensino da Botânica a nível pré-universitário.
Publicou numerosíssimas obras destinadas ao ensino da Botânica e da Agricultura nos liceus e escolas primárias
(COUTINHO, 1893a, 1896b, 1898b, 1900a, 1906b, 1906c, 1907b, 1907c, 1920, 1923, 1928). Era sócio efectivo da Academia
de Ciências de Lisboa. Em 1935 foi-lhe conferido o grau honoris causa pela Universidade de Coimbra. Teve Aurélio
Quintanilha como um dos seus mais distintos discípulos. Atingido o limite de idade, a última fase da sua vida decorreu na
Quinta da Ribeira de Caparide (Estoril), dedicando-se então ao estudo dos fungos basidiomicetos, sobre os quais publicou
dois trabalhos (COUTINHO, 1931, 1934) (GEPB; PALHINHA, 1940; FERNANDES, 1963; TAVARES, 1969; MELO, 1987;
CABRAL & FOLHADELA, 2006; http://www.isa.utl.pt/home/node/268). Foi publicada uma lista completa das suas obras no
Boletim da Sociedade Broteriana (BSB, II série, volume XIV:XI-XX) e em TAVARES (1969). Parte da bibliografia de A. X.
Pereira Coutinho está disponível em http://bibdigital.rjb.csic.es/
29
É assim provável que G. Sampaio só tenha contactado a Botânica de Lisboa já como naturalista da Academia, portanto
depois de muitos contactos com o Herbário da Universidade de Coimbra e a Sociedade Broteriana.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
27
sobre as mentas, e depois pede uma opinião sobre o género Echium: «Tem no seu herbario um
exemplar das Berlengas, colhido pelo Daveau e destribuido pela Sociedade Broteriana, com o nome de
Echium Davaei, Bouy? Se tem, peço-lhe que o examine, e que me diga se lhe não parece um forma do
E. rosulatum, que eu creio que é bastante polymorpho no nosso paiz. Desejava esclarecer esta duvida,
que tenho há muito tempo». G. Sampaio terá respondido rapidamente a este pedido de informação,
dado que A. X. Pereira Coutinho escreve a 30 deste mesmo mês: «Muito agradeço as informações
acerca do E. Davaei». A. X. Pereira Coutinho volta a discutir o género Echium em carta datada de 13
de Fevereiro de 1905: «Ando agora com o genero Echium, que tenho quasi em ordem. Disponho de
mais de 200 exemplares portuguezes. Só tenho ainda duvidosos alguns do grupo [...] Pelos seus
apontamentos vejo que chamou E. Broteri ao E. lusitanicum, Wk. Encontrámo-nos na mesma idéa; eu
desconhecia o seu artigo, e tinha-lhe já dado esse nome nos meus apontamentos. Tem pois o meu
amigo a prioridade; peço-lhe que me dê o titulo completo do jornal, no., data e paginas, para eu poder
fazer a citação». De facto, no trabalho sobre o género Echium, G. Sampaio tinha proposto Echium
Broteri Samp. como espécie nova para a ciência, sendo E. lusitanicum Willk. sinónimo da espécie
nova.
5. Panorama dos estudos da flora portuguesa, 1880-1910
Entre os anos de 1888 e 1910, quando G. Sampaio inicia os seus estudos botânicos, qual o
panorama da Botânica em Portugal? Encontramos no Boletim da Sociedade Broteriana, um bom
espelho da botânica portuguesa. J. Henriques publicava, no primeiro volume do Boletim, um pequeno
texto em que caracterizava o estado dos estudos botânicos portugueses (BSB, I). Quais os principais
intervenientes? Da Escola Politécnica de Lisboa, A. Ricardo da Cunha30 como colector, e J. Daveau31
30
António Ricardo da Cunha nasceu em Lisboa em 1830. Foi praticante de jardineiro no Jardim Botânico da Ajuda em
1852, jardineiro do Jardim Botânico da Escola Politécnica em 1873, e posteriormente conservador do Herbário da Escola
Politécnica em Lisboa, à altura do Conde de Ficalho. Morreu em Lisboa em 1893 (COUTINHO, 1938; GEPB).
31
Jules Daveau nasceu em 1852, perto de Paris. Aos 14 anos ingressa como jardineiro do Museu de História Natural de
Paris. Nas horas livres aprendia botânica no Museu, na Sorbona, e no Colégio de França. Em 1872 é promovido a Chefe do
Laboratório de Sementes e do Jardim de Experiências de Paris, adquirindo «a par dum conhecimento profundo das sementes
dos diversos grupos, a habilidade que o caracterizava como jardineiro, para colocar as plantas no ambiente que mais lhe
convinha» (PALHINHA, 1930). Encontrando-se vago o lugar de primeiro jardineiro do Jardim da Escola Politécnica, a
direcção do Jardim consulta o Museu de Paris, que indica J. Daveau para o cargo. Inicia funções em 1876, tendo sido «um
dos mais dedicados, prestantes e zelosos do horto botânico» (MELO, 1987). Elabora o primeiro «Index Seminum» do Jardim
da Politécnica em 1878. Entre 1876 e 1892, dedica-se afincadamente ao estudo da flora portuguesa, publicando diversos
trabalhos. Abandona Lisboa em 1892. O Conde de Ficalho presta-lhe sentida homenagem. Em 1893 entra como jardineirochefe do Jardim Botânico da Universidade de Montpellier. Passa a conservador do Museu. Organiza modelarmente os
Herbários desta Universidade francesa, enriquecendo-os com numerosos exemplares. Morre em Montpellier em 1929. É
autor de várias espécies novas para a ciência, como por exemplo Scirpus pseudosetaceus (BSB, IX:85). J. Mariz dedica-lhe
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
28
como sistemata e geógrafo botânico. A. X. Pereira Coutinho, do Instituto Geral de Agricultura, como
sistemata. Em Coimbra, J. Henriques, J. Mariz e A. Möller32. No Porto, E. Johnston33, Eugenio
Schmitz, Isaac Newton34 e J. Casimiro Barbosa35 realizam inestimáveis herborizações. No entanto,
poucos se abalançavam a escrever textos de síntese como revisões de géneros ou famílias, floras
regionais ou sínteses fitogeográficas.
O Boletim da Sociedade Broteriana era um porta-voz para a renovação da botânica
portuguesa36. Que trabalhos sobre a flora portuguesa são publicados no Boletim entre 1880 e 1910?
J. Daveau publica estudos das famílias Plumbagináceas (BSB, VI), Ciperáceas (BSB, IX), sobre
a flora do litoral (BSB, XIV), e um estudo geral sobre a geografia botânica do nosso país (BSB, XIX).
A. X. Pereira Coutinho publica estudos sobre os Quercus de Portugal (COUTINHO, 1888), sobre as
famílias das Juncáceas (COUTINHO, 1890), Berberidáceas, Caparidáceas, Droseráceas, Franqueniáceas,
Fumariáceas, Ninfeáceas, Papaveráceas, Poligaláceas, Resedáceas e Violáceas (COUTINHO, 1892),
Malváceas (COUTINHO, 1893b), Aceráceas, Elatináceas, Empetráceas, Fraxináceas, Hipericáceas,
Rutáceas, Tamaricáceas, Zigofiláceas (COUTINHO, 1895), Liliáceas (COUTINHO, 1896a), Rosáceas
(FICALHO & COUTINHO, 1899) e Salicáceas (COUTINHO, 1899), Rubiáceas (COUTINHO, 1900b),
um género novo de plantas, Daveaua (BSB, IX:220) (PALHINHA, 1930; COUTINHO, 1938; GEPB; MELO, 1987). A
actividade de J. Daveau na Universidade de Montpellier é referida no Capítulo VIII.2.
32
Adolfo Frederico Möller nasceu a 31 de Outubro de 1842. Faz os primeiros estudos em Lisboa. Desloca-se para a
Alemanha em 1857, onde faz o curso de Silvicultura. Regressa a Lisboa em 1860, entrando ao serviço da Administração
Geral das Matas do Reino neste mesmo ano. Em 1865 é nomeado chefe da secção florestal do Mondego. Em 1874, foi
nomeado inspector do Jardim Botânico da Universidade de Coimbra, onde se conservou em actividade até 1914, quando
adoeceu gravemente. Em 1885 realiza uma importante exploração científica em S. Tomé. Retira-se para Lisboa, onde morre
em 1920 no Hospital de S. José. «Foi um empregado zeloso», «percorreu grande parte do país», trabalhando activamente
para o Herbário da Universidade de Coimbra (B, XXI:88-90). Foram-lhe dedicados os nomes de vários táxones de vegetais
e animais, como: Polypodium Molleri Bk., Polytrichum Molleri Müll., Molleriella mirabilis Winter e Lecidea Molleri Henr.
(B, XXI:88-90; GEPB).
33
Edwin Johnston, de ascendência inglesa, nasceu no Porto em 1841. Era empregado auxiliar de casas comerciais do Porto.
De temperamento sério e reservado, ocupava todo o tempo livre no estudo da flora. Nas herborizações procurava observar
com cuidado as fases das plantas, registando as épocas de floração das espécies que encontrava. Faleceu a 7 de Abril de
1917 no Porto. Foi um «dedicado amigo das plantas» (GEPB; HENRIQUES, 1917b). Foi um incansável e dedicado
companheiro de G. Sampaio nos seus primeiros anos de herborizações (ver Capítulo XIII.2).
34
Isaac Newton, de ascendência inglesa, nasceu no Porto em 1840. Foi um dos mais notáveis colectores de criptogâmicas
portuguesas. Herborizou sobretudo nos arredores do Porto. Os exemplares de algas foram posteriormente estudados por
Richter, os musgos e hepáticas por Lindberg, e os líquenes por Nylander. Participou na importante exsicata de algas «Phycotheca Universalis» de Hanck e Richter. Os seus exemplares encontram-se hoje no Herbário do Departamento de
Botânica (FCUP). Seu filho, Frederico Newton, foi naturalista e explorador africano (GEPB). J. SAMPAIO (1946, 1947)
descreveu pormenorizadamente a importância de I. Newton no estudo das criptogâmicas portuguesas.
35
Joaquim Casimiro Barbosa (1841-1921) era natural do Porto. Concluiu o curso de farmacêutico na Escola Médico
Cirúrgica do Porto em 1861. Em 1875 é nomeado 1.° oficial do Jardim Botânico e Experimental da Academia Politécnica
do Porto. Em 1913 é chefe dos jardins e arvoredos da Câmara Municipal do Porto. Publicou trabalhos sobre horticultura e
jardinagem. Foi redactor do «Jornal de Horticultura Pratica» e colaborou em diversos jornais da especialidade como o
«Jornal Horticulo-Agricola» (PIRES DE LIMA, 1942:14).
36
A Broteria, fundada em 1902, irá também ser um importante porta-voz dos botânicos portugueses (ver Capítulo VI).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
29
Campanuláceas (COUTINHO, 1901), Borragináceas (COUTINHO, 1905), Escrofulariáceas (COUTINHO,
1906a), Lamiáceas (COUTINHO, 1907a), sobre as monocotiledóneas (COUTINHO, 1898a). J. Henriques
publica estudos sobre as Gimnospérmicas (BSB, XIII), sobre as famílias das Amarilidáceas (BSB, VI),
Plantagináceas (BSB, XIV), Poáceas (HENRIQUES, 1905). J. Mariz publica estudos sobre as famílias
Crassuláceas (BSB, VI e XX), Papilionáceas (BSB, II), Crucíferas (BSB, III), Ranunculáceas (BSB,
IV), Cariofiláceas (BSB, V), Geraniáceas (BSB, VIII), Asteráceas (BSB, IX, X e XI), Apiáceas (BSB,
XII), Poligonáceas (BSB, XIII), Amarantáceas, Quenopodiáceas (BSB, XIV), Ambrosiáceas,
Dipsacáceas e Valerianáceas (BSB, XV), Gencianáceas e Primuláceas (BSB, XVI), Convolvuláceas,
Cuscutáceas e Solanáceas (BSB, XVII), Caprifoliáceas, Ericáceas, Monotropáceas (BSB, XVIII),
Escrofulariáceas (BSB, XXIII e XXIV), uma flora preliminar de Trás-os-Montes (MARIZ, 1889).
Portanto, quando G. Sampaio inicia os seus primeiros estudos, existia em Lisboa e Coimbra uma
plêiade de botânicos que almejavam a renovação da botânica portuguesa. G. Sampaio, no Porto, apesar
de ser o mais novo deste grupo de botânicos irá pertencer ao grupo dos fundadores da botânica
moderna em Portugal.
6. A crise de 1906
Apesar do cargo de naturalista que ocupava e da notável produção científica já publicada,
irrompe em 1906 em G. Sampaio uma crise de descontentamento que atinge o clímax no Verão. A
situação era tão grave que G. Sampaio escreve para J. Henriques e A. X. Pereira Coutinho indagando
da possibilidade de ser contratado como naturalista na Escola Politécnica ou na Universidade de
Coimbra. Pelas respostas dos professores de Lisboa e Coimbra podemos conjecturar algumas razões
para tal descontentamento.
A. X. Pereira Coutinho responde laconicamente e sem perspectivas de solução numa carta
datada de 16 de Junho de 1906: «Não temos aqui regulamento para o Naturalista. Felizmente temos
aqui n’esta secção vivido sempre todos em boa harmonia. Imagino quanto o deve desgostar tudo isso,
e acho-lhe toda a razão. Pena tenho de não lhe poder offerecer aqui um logar, que se tivesse meios
para isso com a melhor vontade lh’o offerecia». A segunda e terceira frases deste excerto sugerem que
G. Sampaio estaria numa grave situação de conflito interno com a direcção da Academia Politécnica.
J. Henriques responde ao pedido do colega portuense numa longa carta, datada de 2 de Junho de
1906, onde também não se antevêem perspectivas muito favoráveis: «Aqui ha dous naturalistas, um em
Botanica e outro em Zoologia com ordenados de 400$000 réis. Já se vê que estão em condições
inferiores aos de Lisboa e Porto. Há dous demonstradores, um para a secção de sciencias physico-
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
30
chimicas, outro para a de sciencias historico-naturais. Estes é que são encarregados do ensino
pratico. Na maior parte das cadeiras são os professores que fazem este ensino recebendo uma
gratificação mensal de 25$000 réis [...] Bom seria que a organização dos museus fosse a mesma não
sei se será possível conseguir isso, já não direi com relação ao pessoal, mas mesmo com relação a
vencimentos. Note que o vencimento que propomos para os naturalistas de 1ª. Classe é inferior ao
vencimento dos professores da Universidade, que têm 800$000 réis. Poderá ser o que deseja? Para
despesas de explorações temos [...] de 150$000 réis. Em Lisboa há mais. Seria bom para uns e outros
puderem dispor do mesmo. Faça-me o projecto e depois de approvado trata-se de conseguir o auxilio
de um politico de valor para proteger o projecto. Sem isso nada feito». A menção explícita aos
vencimentos que J. Henriques faz, indica que esta seria uma das principais razões de descontentamento
de G. Sampaio. No entanto, sob este ponto de vista, Coimbra não seria solução, dado que o vencimento
de naturalista era muito inferior ao do Porto e a diferença para o vencimento dos lentes ainda maior do
que no Porto.
Perante estas cartas de Lisboa e Coimbra, G. Sampaio terá elaborado, ou já tinha elaborado, um
projecto de regulamento para os naturalistas das Politécnicas (Lisboa e Porto) e da Universidade de
Coimbra a ser apresentado ao governo. Não encontrámos documento de G. Sampaio sobre este
projecto, mas no seu espólio, encontrámos uma carta de J. Mariz dirigida a G. Sampaio, datada de 3 de
Julho de 1906, em que dá o seu parecer sobre o projecto que teria sido elaborado por G. Sampaio. J.
Mariz era o mais antigo naturalista das escolas superiores portuguesas. Trata-se de um documento
valioso para podermos compreender esta crise de G. Sampaio de 1906. Eis a transcrição integral do
parecer do naturalista coimbrão: «Parecer do Naturalista adjuncto de Botanica da Universidade de
Coimbra. 1.º- A representação ao Governo por parte dos Naturalistas adjunctos aos Gabinetes de
Historia Natural das Polytechnicas e da Universidade, tal como vem esboçada no projecto do Exmo.
Snr. Gonçalo Sampaio, não se limita só a pedir a approvação d’um regulamento uniforme para o
pessoal dos referidos Gabinetes d’esses estabelecimentos scientificos; faz mais, propõe a criação de
attribuições novas aos mesmos Naturalistas, como são: 1.º A superintendencia dos trabalhos praticos
sob a direcção do professor respectivo, que para a Universidade já está sendo exercida pelos
Demonstradores, logares criados pela ultima reforma universitaria, tendo um regulamento de
trabalhos praticos adaptado pela faculdade de Philosophia, e approvado pela Portaria do Ministerio
do Reino de 24 de Novembro de 1905; 2.º A assistencia aos exames finaes fazendo elles assim parte do
jury com interferencia na votação da parte pratica que na Universidade só é permittida aos lentes
(mesmo pelo referido regulamento). Por estas difficuldades discordo d’esta parte do projecto, que
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
31
affectava o organismo universitario e talvez das Polytechnicas. 2.º- O mesmo projecto cria um lugar
de 2º. Naturalista, que pode ser exercido por um professor substituto. Na Universidade não se pode
estabelecer esta substituição porque ficava o 1.º Naturalista, que de ordinario não é lente, a
superintender sobre os serviços do 2.º Naturalista, que é lente. Tambem discordo d’este ponto do
projecto, propondo antes que, em lugar do 2.º Naturalista, seja criado o logar d’um Preparador do
herbario e muzeu, que pode ser acumulado pelo Naturalista mediante uma gratificação, visto as
relações intimas que há entre a classificação e estudo da flora, e a disposição conveniente das plantas
em herbario; exemplo: M. Willkomm foi o preparador do seu herbario do Mediterraneo. Além d’isso
concordo que é indispensavel um conservador do herbario e museu, e um guarda e servente. 3.ºConcordo com a equiparação dos ordenados dos Naturalistas de Lisboa, Porto e Coimbra. 4.ºConcordo com a proposta das herborizações e respectivos subsidios, menos na fixação das despezas
de explorações referidas á dotação dos Gabinetes. Fazem-se as explorações conforme houver
necessidade. 5.º- Finalmente concordo com o direito á aposentação dos Naturalistas». Pelo parecer de
J. Mariz podemos conjecturar sobre a proposta de regulamento elaborada por G. Sampaio, para os
naturalistas dos estabelecimentos de ensino superior (Lisboa, Coimbra e Porto), que seria na essência a
seguinte: A. Criação dos lugares de 1.° naturalista e o de 2.° naturalista. B. O 1.° naturalista
supervisionava os trabalhos práticos (sob a direcção do lente proprietário) e fazia parte do júri dos
exames, participando na votação do exame prático. C. O lugar de 2.° naturalista podia ser ocupado por
um lente (depreende-se, lente substituto). Para J. Mariz esta proposta não era aceitável dado que
entrava em conflito com a orgânica da Universidade de Coimbra, e podia originar a situação que lhe
parecia inaceitável de um 1.° naturalista (que não era lente) ocupar um cargo hierarquicamente superior
a um lente substituto (que ocupasse o cargo de 2.° naturalista).
Porque razão fazia G. Sampaio esta proposta? Nesta altura, o quadro de pessoal da Academia
Politécnica do Porto incluía as seguintes categorias (por ordem hierárquica decrescente): lente
proprietário, lente substituto, repetidor, demonstrador, naturalista e naturalista adjunto (AAPP, 19061907). Na 10.ª Cadeira – Botânica, o cargo de lente proprietário era ocupado por M. Amandio
Gonçalves, e o de naturalista adjunto pelo próprio G. Sampaio (AAPP, 1906-1907). G. Sampaio era
naturalista adjunto desde 1901. Podemos depreender desta proposta que G. Sampaio estaria de facto a
assegurar a supervisão dos trabalhos práticos da cadeira de Botânica? Esta seria uma competência de
um demonstrador, quando muito de um 1.° naturalista, mas G. Sampaio era só naturalista adjunto. J.
Mariz tinha razão em não admitir que o lugar de 2.° naturalista pudesse ser ocupado por um lente.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
32
Nesta altura os lentes tinham um curso superior, mas os naturalistas não o tinham necessariamente. J.
Mariz tinha, mas G. Sampaio não tinha – só frequentara algumas cadeiras da Academia Politécnica.
Portanto estes três documentos que analisámos apontariam para três razões principais para o
descontentamento de G. Sampaio: económicas, profissionais e outras de carácter interno da Academia
Politécnica.
Em termos económicos, e para o ano de 1901 (o mais próximo de que possuímos informação no
Anuário da Academia Politécnica), o vencimento do naturalista adjunto era muito razoável - 600$000
réis anuais, pouco inferior ao do lente proprietário que era de 700$000 réis (AAPP, 1901-1902). Em
1906, G. Sampaio vivia na Rua da Constituição, 974 (AAPP, 1906-1907). Não sabemos quanto pagaria
de renda de casa. No espólio de G. Sampaio encontrámos recibos da renda de casa, não de 1906, mas
de 1912, da Rua da Constituição, 986, em que o valor mensal é de 11$170 réis. Admitindo que em
1906 não pagaria mais de renda de casa do que em 1912, e que o seu vencimento seria próximo do de
1901 (50$000 réis mensais), poderíamos concluir que a renda de casa não seria talvez um encargo
excessivo para o seu vencimento. Poderemos depreender que não seriam económicos os principais
motivos de descontentamento? O documento que analisaremos de seguida aponta de facto para
problemas profissionais e internos da Academia como causa do descontentamento de G. Sampaio.
Existe no espólio de G. Sampaio um rascunho de uma carta dirigida ao então Director da
Academia, Francisco de Salles Gomes Cardoso, datada de 3 de Junho de 1906, que nos ajuda a
compreender esta fase grave da vida de G. Sampaio. O tom geral da carta é de extremo
descontentamento, sentimento de injustiça e, em alguns pontos, de acutilante revolta37. Parece ter sido
escrita de um jacto num momento de irrompente descontrolo. Quais as queixas do jovem naturalista?
A. Dificuldades económicas do gabinete de Botânica: «ao gabinete de botanica» foi retirada «desde ha
annos toda a verba da dotação geral da Academia», tendo sido negado «adquirir pela dotação da
bibliotheca qualquer livro que me seja necesario para o exercicio das minhas funcções de
naturalista». B. O desmantelamento do Jardim Botânico e Experimental: foi informada
«favoravelmente a immediata cedencia do jardim á Guarda Municipal sem se importar das
necessidades do ensino nem das observações e estudos que ahi se podessem fazer». C. O não
reconhecimento do mérito do trabalho que já tinha desenvolvido como naturalista e botânico: «tendo os
gabinetes de sciencia naturaes obtido na exposição do Palacio uma medalha d’ouro não» houve «a
mais pequena palavra de louvor para os respectivos naturalistas nem ao menos lhes» foi comunicada
37
Sobretudo se atendermos a que se tratava de um jovem naturalista não graduado a dirigir-se ao lente mais antigo da
Academia que era também seu director.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
33
«a distincção obtida»; para o gabinete de Botânica, G. Sampaio teria sacrificado «todo o meu tempo,
indo jantar de noute, sujeitando-me ás explorações mais arduas por esse paiz fora»; teria contribuido
«com todos os esforços para o estudo da nossa flora, que já me deve alguns favores». D. A situação
económica injusta em face das funções efectivas que desempenhava: foi mandado «abonar aos
repetidores e demonstradores gratificação de exercicio pela direcção dos trabalhos praticos» e foi
negado fazer o mesmo «para os naturalistas, que nem sequer tinham obrigação de dirigir taes
trabalhos». Termina este rascunho em tom terrivelmente amargo e pessimista: «Continuarei sempre no
meu caminho, nem pior nem melhor, como até aqui, até ao momento que queiram cortar-me os meios
de trabalho como naturalista da Academia Polytechnica. Esse momento talvez não esteja longe, quero
crél’o [...] a falta de consideração que tenho merecido aqui; não obstante nenhum acto da minha parte
a explica e a minha dedicação pelo desenvolvimento do gabinete é bem patente para quem a quiser
ver». G. Sampaio tinha razão quanto ao lamentável desmantelamento do Jardim Botânico38. A
morfologia e a sistemática eram dois aspectos basilares da Botânica da época. O ensino da Botânica
tinha uma forte componente prática. G. Sampaio dirigia os trabalhos práticos. Como ensinar botânica
sem um jardim botânico de apoio? Deixava de ser possível mostrar aos alunos as plantas vivas em
crescimento, fazer experiências de fisiologia vegetal, mostrar a diversidade morfológica das famílias39.
As aulas passavam a ser dadas com plantas previamente recolhidas, secas. Teria de haver um grande
esforço de trabalho de colector. Deixava de ser possível cultivar plantas para enriquecer o Herbário da
Academia40. Os jardineiros deixavam de recolher plantas para o Herbário da Academia. Acresce que G.
Sampaio tinha de facto realizado, desde 1901, quando foi contratado como naturalista, um trabalho de
grande nível académico. Não se sentia recompensado.
Este rascunho de carta terá sido escrito no mesmo dia ou em dias próximos das cartas que
enviou para A. X. Pereira Coutinho e J. Henriques. Escrito também nesta altura (datado de 6 de Junho
de 1906) existe um rascunho de uma carta para o governador de Vila Real. A carta trata de convicções
políticas e revela que G. Sampaio era adepto de João Franco, situando-se pois numa corrente autoritária
e conservadora41. Escrevia o seguinte: «Venho dar-lhe os meus sinceros parabens por ter sido
38
Ver Capítulo II.4.
O Jardim Botânico e Experimental, como era típico da época, estava organizado por grupos taxonómicos (ver Capítulo
II).
40
Ver Capítulo XIII.2.
41
O percurso político de G. Sampaio é interessante. Em 1888, o jovem G. Sampaio, com 33 anos de idade, é redactor do
«semanario politico», «Folha Democratica», de periodicidade semanal, editado na Póvoa de Lanhoso. O jornal assume-se
como virulentamente anti-monárquico. O primeiro número do jornal é publicado a 2 de Fevereiro de 1888. Era apresentado
da seguinte forma: «Militando, pois, nas fileiras do partido republicano combaterá intemeratamente por um idial, a
Liberdade; por um bem, a Justiça; por um soberano, o Povo» (FD 1888 02 02). No segundo número, no texto «Artigos para
39
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
34
nomeado governador civil de Villa Real [...] Não sei se se recorda de lhe ter dito [...] que se um dia o
conselheiro João Franco fosse ao poder e ahi persistisse nas suas affirmações liberaes e desse provas
de realisar o seu programma, eu seria franquista, por entender util para o paiz a existencia, dentro da
monarchia, de um partido com orientação democratica. Ora os ultimos acontecimentos convenceramme de que o Sr. Conselheiro João Franco é hoje, realmente, um convicto liberal, com uma tendencia
acentuadamente progressiva e uma honestidade de processos administrativos que todo o homem serio
deve aplaudir e apoiar. A sua conducta, desde que se encontra no poder, tem sido admiravel sob todos
os pontos de vista, conseguindo impressionar profundamente a opinião e merecendo as simpatias dos
que não põem acima dos interesses do paiz um cego espirito de partidarismo. Felicito a V. Exa. por ter
sido um dos companheiros do sr. Conselheiro João Franco na fundação de um partido que tão
correctamente está procedendo e que, espero-o, continuará a dar bons exemplos aos outros partidos,
inclusivamente aos republicanos, cuja linha de procedimento perante os actos e declarações do actual
governo não tem sido de modo a merecer a aprovação de nenhum democrata sincero e honesto».
Repare-se que para G. Sampaio era muito importante a «honestidade de processos administrativos»
(que via em João Franco), o que de certa forma indicia que o seu descontentamento era nessa ocasião
em parte resultante de uma ausência desta qualidade humana.
o povo. I. Para que serve um rei», são enumerados alguns defeitos do regime monárquico (FD 1888 02 09). Na edição da
semana seguinte (FD 1888 02 16), G. Sampaio continuava a série de «Artigos para o povo. II. Os braganças», focalizando
agora na personalidade e obra dos monarcas «que a casa de Bragança nos tem fornecido». A apreciação é muito negativa e
acusadora. O quarto artigo da série era publicado na edição seguinte do jornal (FD 1888 02 23). Neste, G. Sampaio
elogiava, sem reservas, o regime republicano, que considerava: «uma boa forma de governo»; «a fórma mais racional, mais
economica e vantajosa de governo»; «a soberania popular sem a mordaça do veto real»; queria «a liberdade de consciencia,
garantindo a cada um o direito de professar e manifestar a sua fé religiosa». Concluía que era «necessario estabelecer um
governo economico, […] implantar a republica em Portugal», porque a republica era «esta trindade sympathica e luminosa:
liberdade, egualdade e fraternidade» (FD 1888 02 23). Todavia, o regime republicano que se implantou no país em 1910
não iria corresponder às expectativas de G. Sampaio. Em cartas que escreveu a A. Ricardo Jorge, G. Sampaio manifestar-seà simpatizante dos regimes autoritários instaurados pela revolução de 5 de Dezembro de 1917 e pela revolução de 28 de
Maio de 1926. Numa carta escrita a 13 de Dezembro de 1917, escrevia: «A revolução, que foi uma coisa excelente, deve ter
beneficiado a sua questão hospitalar, com o que muito folgo» (BN A/2021). Com o governo saído da revolução de Gomes
da Costa, A. Ricardo Jorge assume a pasta do Ministério da Instrução. G. Sampaio, numa carta datada de 3 de Julho de
1926, endereçada ao «Exmo Snr. Dr. Artur Ricardo Jorge, Ilustre Ministro da Instrução», escreve em tom contundente:
«Muito estimo vê-lo a colaborar na obra de um governo que se propõe corrigir os desmandos praticados pelos politicos;
mas, meu amigo, isto chegou a tal podridão que mal posso acreditar no milagre que se anuncia. Deus os ajude e lhes dê
coragem no meio dos desgostos e das dificuldades que hão de ter. A quadrilha é enorme, temerosa, e a desmoralização da
maioria é completa» (BN A/1987). Destes elementos pode-se concluir que, para G. Sampaio, a moral, a ética, o patriotismo
e a economia da poupança, seriam valores primeiros de um sistema político e de uma governação. Não cabe obviamente
neste trabalho uma discussão da História portuguesa dos séculos XIX-XX. No entanto referimos a actividade política de G.
Sampaio porque ajuda a compreender o homem, de quem estamos a escrever uma biografia. Haverá desenvolvimentos
posteriores de actos políticos de G. Sampaio (ver Capítulo VII.8).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
35
Esta crise de 1906 foi ultrapassada. G. Sampaio manter-se-á como naturalista adjunto até 1911,
quando passa directamente para o topo da carreira docente da recentemente criada Faculdade de
Ciências do Porto.
7. G. Sampaio e o Congresso de Botânica de Bruxelas
Em 1910 G. Sampaio assistiu ao Congresso Internacional de Botânica que se realizou em
Bruxelas (SAMPAIO, 1912b). Após o Congresso visitou alguns laboratórios e contactou com botânicos
europeus. Estes contactos terão influenciado G. Sampaio, tanto do ponto de vista da docência, como da
investigação. Os contactos que estabeleceu nesta viagem terão sido importantes para a sua futura
actividade de professor da Faculdade. Estas conclusões podem ser retiradas de um texto escrito em
Genebra a 1 de Junho de 1910. Parece tratar-se de um diário de viagem incompleto. G. Sampaio
descreve o que tinha feito nos últimos dias da sua viagem: «Deixando Bruxellas, no dia 26 de maio,
dirigi-me a Liége, que é uma cidade belga importante pela sua poderosa industria e pelas suas
riquissimas minas de carvão, mas sem condições de belleza que a recomendem especialmente aos
estrangeiros. O rio Meuse, que lhe passa a flanco, é um rio turvo, sombrio, de corrente apagada,
embora atravesse uma linda região de collinas, que nos arredores da cidade quebram a monotonia
verdejante das infinitas planicies do paiz. Cheguei á noite, e no dia seguinte, depois de um rapido
passeio pela cidade, visitei o Instituto de Botanica, onde encontrei o Dr. Grevis, que o dirige. O
illustre reitor da Universidade recebeu-me [acrescentado por cima, muito] carinhosamente, prestandose com a mais penhorante delicadeza a fornecer-me todos os esclarecimentos sobre a organização das
instalações, [...] e condições de ensino ali professado. Foi no auditorio, que é um amplo amphiteatro
envidraçado e cheio de luz, que primeiro entramos. O mobiliario é simples mas solido, composto de
fiadas de mezas em semicirculo, cujo centro é ocupado [...] ha [...] esquematicos a cores, sobre
[acrescentado por cima, as plantas] da lição do dia e nas mezas dos alumnos viam-se exemplares de
jarro e de uma orchidea indigena, [...] Segundo me explicou o Dr. Grevis uma parte do anno é
destinado ao estudo da macrographia e outro ao da micrographia vegetal, fazendo-se um e outro no
auditorio. No estudo macrografico, ou morphologico, é distribuido a cada alumno um exemplar typico
de cada familia botanica que fez parte da lição, para que todos possam verificar sobre a propria
planta os caracteres respectivos, que o professor faz notar e tem devidamente desenhado na lousa. O
estudo micrographico ou histologico é bastante reduzido para o curso geral de botanica e, sobre este
ponto de vista, é inegavel que na Polytechnica do Porto há uma organisação muito mais perfeita e
completa, pois que ahi os alumnos não só tomam conhecimento de todos os aparelhos empregados em
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
36
micrographia vegetal, mas praticam os processos geraes da histologia, enquanto que em Liege apenas
praticam alguns cortes á mão que lhes permittam examinar as cellulas dos tecidos, com a sua forma
fundamental. O uso do microtomo automatico, dos aparelhos micrometricos, do [...] dos reagentes
colorantes, dos methodos de inclusão e da microphotografia pertence apenas aos alumnos que seguem
o curso especial para o doutorado em botanica [rasurado, e, ainda assim, por uma formação
rudimentar,] não se procurando, todavia, que mesmo para estes haja uma pratica superior á dos
nossos estudantes do Porto. [...] N’ese mesmo dia, á tarde, tomei o comboio que me devia transportar
á Alemanha, por Colonia, onde admirei a notabilissima cathedral gothica e d’onde segui para Bona. É
n’esta cidade encantadora, das margens do Rheno, que vive um dos mais insignes mestres da
histologia vegetal, o venerando Dr. Strasburger, director do Instituto botanico da Universidade.
Recebeu-me no seu [acrescentado por cima, modesto] gabinete de trabalho, o grande homem de
sciencia que todo o mundo culto conhece e admira, fallando-me com [acrescentado por cima, vivo]
interesse da visita que há annos fizera a Lisboa, onde a opulenta vegetação do Jardim botanico o
maravilhou deveras. Em seguida mostrou-me todo o instituto, cuja organisação é semelhante á do de
Liege, mas muito mais completo pelo que diz respeito no estudo da micrographia. No laboratorio do
doutorado, onde fui apresentado ao professor russo que ali viera estudar com o grande mestre, pude
examinar magnificos trabalhos sobre a cariogamia, executados pelo assistente [...] Devo dizer que não
foi sem uma certa emoção que me despedi do Dr. Strasburger, cuja affabilidade e aspecto [...] me
captivaram em extremo». G. Sampaio poderá ter dado conhecimento a J. Henriques das impressões
desta viagem (ou seria o texto que reproduzimos um rascunho de uma carta que terá sido enviado para
o seu colega de Coimbra?) porque numa carta datada de 24 de Agosto de 1910, J. Henriques respondia
a um comentário de G. Sampaio aparentemente sobre o ensino da Microbiologia na cadeira de
Botânica: «Vejo o que me diz relativamente a trabalhos praticos da aula de Botanica. Aqui não posso
entrar em trabalhos d’essa ordem. Já não é pouco o trabalho de anatomia. Não tenho pessoal, nem
tempo. Como os meus discipulos vam quasi todos para Medicina, lá estudam os micróbios que
cultivam no laboratório de microbiologia, que tem bom material e pessoal muito competente. De cá
levam o conhecimento do microscopio e certa pratica de histologia, que lhes será util. Creio que no
próximo anno terei um curso grande e não sei como me arranjarei com elle».
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
37
IV. Gonçalo Sampaio e o estudo dos Rubus portugueses
1. A obra-chave de G. Sampaio
Dedicamos este capítulo à análise da obra fulcral de G. Sampaio - «Rubus portuguezes.
Contribuições para o seu estudo»42. Não sendo o trabalho mais extenso, nem mais abrangente sobre a
flora portuguesa, consideramos ser o obra-chave do investigador portuense. Porquê? Pelas seguintes
razões principais: A. É uma obra de início de carreira. G. Sampaio só tinha entrado como naturalista da
Academia há três anos. Quando é publicada tinha 39 anos. B. Iria contestar abertamente mestres da
Botânica da época, o Conde de Ficalho e A. X. Pereira Coutinho. C. Trata-se de um género dificílimo
do ponto de vista taxonómico43. D. Uma análise atenta da obra em si, da sua preparação e das suas
consequências, fornece-nos uma compreensão quase total da personalidade, do método de trabalho e da
importância histórica de G. Sampaio, no estudo da flora portuguesa.
2. Data efectiva de publicação
G. Sampaio teria consciência da importância da obra que ia publicar e, quiçá por sua iniciativa,
antes da publicação em 1905 na revista da Academia, os «Annaes de Sciencias Naturaes», publica-a
sob a forma de separata44 (SAMPAIO, 1904c). Temos elementos para datar com segurança a sua
publicação efectiva da separata, que terá ocorrido em Dezembro de 1904. Numa carta datada de 20 de
Dezembro de 1904, J. Henriques agradecia o envio do trabalho: «Accuso a recepção da sua publicação
sobre os Rubus portuguezes e muito a agradeço». Considerando que a correspondência anterior de J.
Henriques é um bilhete-postal datado de 1 de Agosto que não menciona este trabalho e a elevada
frequência da correspondência entre estes dois botânicos, poderíamos afirmar, por estes elementos, que
a monografia teria saído a público entre 1 de Agosto e 20 de Dezembro de 1904. Esta conjectura é
42
As restantes obras de G. Sampaio são analisadas no Capítulo XIII. Pelas razões que serão apontadas no decurso do
presente capítulo, a análise desta obra merece um capítulo à parte. Seria intenção de G. Sampaio ilustrar este trabalho, o que
não se concretizou. Numa carta dirigida a A. Ricardo Jorge datada de 17 de Dezembro de 1902, escrevia: «Esse trabalho
será illustrado com boas estampas, segundo photographias que serão tiradas pelo Dr. Amandio» (BN A/2096). Já perto da
publicação da obra, numa carta datada de 29 de Junho de 1904, dirigida também a A. Ricardo Jorge, G. Sampaio escrevia:
«Devem dar-me um volume de cerca de 200 paginas e vai illustrado com as figuras de todas as nossas especies» (BN
A/2095). Esta carta sugere que as ilustrações estariam prontas. Porque não foram incluídas no trabalho final publicado?
43
Ver nota final deste capítulo.
44
A publicação do trabalho sob a forma de separata também poderá estar relacionada com um atraso na edição dos Anais.
Todavia, numa carta que escreve a A. Ricardo Jorge, datada de 29 de Junho de 1904, G. Sampaio previa a edição da revista
da Academia para antes do final do ano, o que não se terá concretizado: «Por estes dias vou a Coimbra consultar o
Herbario de Willkomm, e demoro-me 4 ou 5 dias, pois que aproveito a occasião para concluir a revisão das Epilobiaceas
portuguezas, que publicarei ainda este anno. […] Acabado este trabalho recomeçarei com os Rubus, cujo estudo conto
concluir até ao fim do verão, para ver publicado nos “Annaes da Academia Polytechnica” que começam a sahir em
novembro» (BN A/2095).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
38
confirmada por uma carta de W. O. Focke para G. Sampaio, datada de 31 de Dezembro de 1904, em
que o botânico alemão agradecia o envio do trabalho sobre os Rubus: «Je viens de recevoir votre traité
sur les Rubi Portugais, et je vous prie de vouloir bien accepter mes remerciments sincères».
Finalmente num exemplar que se encontra autografado e comentado pelo autor encontrámos na página
seguinte à da capa, com a caligrafia de G. Sampaio, «Porto, 25, XII, 1904», sugerindo que a obra lhe
terá chegado às mãos muito perto do dia de Natal de 1904.
3. Análise geral da monografia
A publicação da monografia tinha sido precedida, nos anos anteriores, de diversas publicações
sobre o género Rubus. Este era o trabalho monográfico45. Assim como na generalidade das suas obras,
G. Sampaio incorpora no texto muitos comentários, observações, discussões e análises. O que nos
revela uma exegese atenta da monografia?
G. Sampaio inicia a introdução referindo a desadequação dos trabalhos existentes sobre os
rubus portugueses. Avalia o trabalho de Brotero (que só considerava duas espécies no género) como
muito incompleto, o trabalho publicado pelo Conde de Ficalho e A. X. Pereira Coutinho alguns anos
antes (que consideraram 16 espécies no género; FICALHO & COUTINHO, 1899) como desadequado46 e a
abordagem de B. Merino na Galiza quase inaproveitável pela falta de material de herbário adequado.
Quais as deficiências do trabalho do Conde de Ficalho de A. X. Pereira Coutinho? Para G.
Sampaio, nos exemplares estudados por estes dois botânicos faltavam os caules estéreis (turiões) e não
existia «a menor indicação sobre a cor, forma e comprimento relativos dos orgãos florais».
Deficiências semelhantes encontrava nos exemplares galegos de B. Merino. G. Sampaio termina o
45
Apesar de G. Sampaio ter iniciado o estudo dos rubus na década de 1890, só nos primeiros anos de 1900 inicia a
publicação dos resultados destes estudos. Estes culminarão com diversas publicações datadas de 1902, 1903 e 1904. Este
ímpeto final no estudo dos rubus transparece de uma carta que escreve a A. Ricardo Jorge datada de 23 de Novembro de
1902: «No proximo anno conto em estudar bem os Rubus do norte para publicar uma monografia especial sobre este
genero em Portugal. Estou actualmente em correspondencia com os primeiros especialistas d’este genero e obtive este
anno numerosas exsiccatas de Rubus estrangeiros. No meu Herbario possuo já cerca de 200 typos de Rubus europeus,
todos enviados por especialistas de Inglaterra, da França, da Suecia e Allemanha […]. Como vê apezar de ser trabalho
muito incompleto já tem razão de ser publicado porque amplia bastante o conhecimento de genero Rubus em Portugal»
(BN A/2007). Poucos dias depois, numa carta datada de 17 de Dezembro, escrevia novamente a A. Ricardo Jorge: «No fim
do proximo anno que vem publicarei um trabalho extenso sobre os Rubus de Portugal, para o que farei numerosas
herborizações» (BN A/2096).
46
G. Sampaio é cortante quando escreve que «apezar de muito valiosa sobre diferentes pontos de vista, a monografia dos
distintos professores é, no que respeita a este genero, bastante incorrecta e deficiente». No entanto Ficalho e A. X. Pereira
Coutinho tinham reconhecido, no próprio trabalho, as suas limitações (ver mais à frente neste capítulo).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
39
raciocínio, dizendo que «perante estas circumstancias, claro está que as imperfeições do trabalho
seriam inevitaveis»47.
Seguidamente, G. Sampaio refere a elevada ocorrência de hibridismo e variabilidade fenotípica
nos rubus: «constituem um genero muito complexo […] critico de um estudo extremamente dificil e
composto de algumas centenas de fórmas, tanto puras como hibridas, ainda hoje não totalmente
conhecidas». Refere que o critério lineano antigo, seguido por Brotero, de só considerar duas espécies
no género, estava «posto definitivamente de lado», dado que era possível reconhecer «um elevado
numero de especies boas, nitidamente definidas e dominando areas geograficas extensas». Neste
trabalho, G. Sampaio descreve 32 espécies, mas ressalva que o trabalho se deve considerar
«egualmente cheio de imperfeições e lacunas, não tendo de modo algum pretensão de o inculcar como
obra definitiva sobre os Rubus portuguezes».
G. Sampaio assume uma total confiança na qualidade do seu trabalho quando escreve: «com
certeza ficam citadas todas as silvas dominantes no paiz, isto é, aquelas que se encontram com maior
frequencia e que ocupam superficies mais extensas do nosso solo. Das especies acantonadas,
certamente que muitas ficarão ainda por conhecer, visto que elas se limitam por vezes a areas
extremamente restritas nas provincias do norte, necessitando-se para sua descoberta de explorações
minociosas e demoradas». Muitas vezes é peremptório. Ao discutir o Rubus Coutinhi Samp. e
discordando da opinião de H. Sudre, escreverá «o ilustre rubulogista francez prof. Sudre affirma não
poder admitir que plantas um pouco esteries produzam por cruzamento fórmas mais ferteis do que elas.
Comtudo eu tenho absoluta certaza de que os hibridos d’esta silva são geralmente ferteis [...]».
De seguida, G. Sampaio descreve a organização das plantas, descrevendo cada uma das partes.
Finalmente, discute a difícil problemática da definição e delimitação das espécies neste género. Refere
o elevado polimorfismo destas plantas, «bastando pequenas diferenças mesologicas para lhes imprimir
modificações por vezes tão consideraveis que chegam a mascarar o facies normal da variedade, raça ou
especie a que pertencem», ou seja afirmando que a diversidade fenotípica pode ser superior à genética.
De entre os factores ambientais, destaca a luz. Para G. Sampaio a existência de hibridismo é outro dos
factores responsáveis pela variabilidade morfológica. Salienta que apesar de muitos híbridos serem
naturalmente estéreis, outros são férteis, gerando-se assim uma panóplia de formas morfológicas de
transição «perante as quaes resulta impotente toda e qualquer tentativa de sistematisação». Como
47
G. Sampaio era peremptório porque conhecia bem como os especialistas estrangeiros tinham abordado a sistemática do
género (principalmente W. O. Focke e H. Sudre), e como os melhores herbários e exsicatas distribuíam os exemplares de
Rubus que apresentavam sempre os turiões e as peças florais.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
40
distinguir as formas hibridas das puras? G. Sampaio enumera vários aspectos a ter em conta, como a
morfologia dos grãos de pólen e a área que ocupam. Salienta o elevado número de espécies endémicas
peninsulares. Termina a introdução da monografia referindo a distribuição das espécies e dando
conselhos práticos quanto à sua colheita e secagem. Segue-se o trabalho de taxonomia do género
Rubus. Apresenta chaves dicotómicas para chegar à identificação específica. A maior parte da
monografia consiste na descrição de cada uma das espécies e híbridos considerados. Descreve
formalmente a espécie, acrescentando uma valiosa secção de «observações». Trata-se de facto de uma
discussão da espécie. G. Sampaio justifica e discute a sua posição. Refere opiniões de colegas.
Algumas contesta, com outras concorda. As observações são frequentemente mais extensas do que as
próprias descrições das espécies. G. Sampaio tem o cuidado de salientar quais as características de cada
uma das espécies e em que medida estas diferem umas das outras.
4. Como organiza G. Sampaio o estudo dos Rubus?
Como organiza G. Sampaio o estudo dos Rubus? Para responder a esta questão utilizámos as
seguintes fontes de informação: A. O conteúdo da própria publicação. B. As colecções de exemplares
de Rubus existentes no Herbário da Academia. C. A documentação epistolar existente. D. Anotações
que escreveu em obras impressas.
A integração de toda esta informação permitiu-nos elaborar a seguinte arquitectura
metodológica para o trabalho publicado em 1904:
α. Recolha de material do campo. Herborizações intensas em diversos locais do país.
. Estudo da bibliografia existente. Contacto com as abordagens existentes.
. Estabelecimento das características determinantes na taxonomia dos Rubus portugueses:
turiões e orgãos florais.
. Aquisição de exemplares de toda a Europa: França, Grã-Bretanha, Europa de leste e
Escandinávia.
. Comparação dos seus exemplares com as espécies descritas.
. Troca de opiniões. Discussão com todos os especialistas em Rubus da época: H. Sudre, W. O.
Focke, W. R. Linton, W. M. Rogers.
. Estabelecimento e publicação de espécies e variedades novas para a ciência.
Analisemos em pormenor de que forma cada uma daquelas fontes de informação contribuiu
para o esquema conceptual que propusemos.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
41
4A. O método de trabalho descrito na própria monografia
G. Sampaio escreve na monografia que o trabalho era fruto de «oito anos de estudo e
investigações». Teria portanto começado por volta de 189648. O método correcto de trabalho de G.
Sampaio encontra-se sintetizado ao discutir várias das espécies por si criadas. Por exemplo, em relação
ao R. peratticus Samp., escreve que «sendo de parecer que esta planta pertence ao grupo do R.
uncinatus Mul., o dr. Focke observa que os foliolos são, todavia, muito diversos dos do tipo e nota a
sua semelhança com o R. reniformis, Boul. & Pierrat, silva de que possuo exemplares autenticos e que
o proprio rubulogista N. Boulay considera como um produto de cruzamento dos R. vesticus e R.
serpens. É certamente notavel a analogia de aspeto entre alguns exemplares de R. peratticus e os de R.
reniformis, comtudo estas duas plantas estão longe de ser identicas e a silva portugueza não é de modo
algum um hibrido. Do R. uncinatus, a que se liga, realmente difere por um conjunto de caracteres
valiosos, como são [...] A principio inclui esta planta e a precedentemente descrita [R. Henriquesii]
n’um unico tipo especifico a que [...] em 1902 dei o nome de R. trifoliatus, nome que não póde
sustentar se [...] por se referir não a uma verdadeira especie mas sim ao conjunto de duas, bem distintas
e autonomas. [...] Convém notar que o R. peratticus se distingue muito bem do R. Henriquesii [...]»49.
Em outra parte do texto faz questão de explicitar que para a elaboração da sua monografia, tinha
construído um herbário «com algumas centenas de fórmas autenticas, distribuidas em coleçoes
classicas ou determinadas por especialistas dos mais autorisados»50. Na introdução da monografia, G.
Sampaio agradece aos colegas especialistas - H. Sudre, M. Bouly de Lesdain, W. M. Rogers, W. R.
Linton, W. O. Focke, Erichsen, F. Du Pré, A. Hayek, L. M. Neuman, a troca de exemplares de
herbário51 . Também na introdução, G. Sampaio agradece a W. M. Rogers, H. Sudre, M. Bouly de
48
Significando que G. Sampaio já trabalhava afincadamente na flora portuguesa mesmo antes de ter sido admitido como
naturalista (ver Capítulo II).
49
Exemplo de observação atenta e minuciosa, ponderação de caracteres, comparação com espécimes de espécies já
descritas, seguida de balanço e conclusão: identificação de uma espécie já descrita ou espécie nova?
50
Estas «fórmas autenticas» eram exemplares recolhidos pelos próprios autores das espécies - o que hoje se chama
«material-tipo». O conceito de material-tipo só será incorporado no Código de Nomenclatura de 1935 (CAMP ET AL., 1947).
No entanto, como será demonstrado neste trabalho, a importância crucial da observação de «exemplares autenticos», já
estava bem presente no trabalho do taxonomista no início do século XX.
51
De todos estes investigadores existem, na colecção de Rubus coligida por G. Sampaio, exemplares com data de 1904, ou
data anterior a 1904. No entanto, não é possível, por várias razões, determinar com segurança qual a parte da colecção de
Rubus coligida por G. Sampaio que já estaria disponível quando elaborou a sua monografia. Exemplares com data de
colheita anterior a 1904 podem ter sido adquiridos depois desta data. Na correspondência não se encontram listas detalhadas
do material recebido. No entanto comparando as colecções coligidas por G. Sampaio e a correspondência (as primeiras
muito mais extensas do que as segundas), parece poder afirmar-se que algumas colecções não foram adquiridas
directamente aos seus organizadores, mas por intermédio do núcleo de colaboradores mais próximos de G. Sampaio. A
única certeza que temos é que os exemplares com data de colheita posterior a 1904, como uma parte da «Batotheca
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
42
Lesdain e W. O. Focke, os seus «valiosos e autorisados esclarecimentos na determinação de varias
fórmas»52. Ao longo da discussão das diferentes espécies incluídas no trabalho, este auxílio é
perfeitamente reconhecido e identificado53.
4B. As colecções de exemplares de Rubus existentes no Herbário da Academia
Colecções de exemplares de Rubus existentes no Herbário da Academia. G. Sampaio deixou
uma vastíssima colecção de exemplares de Rubus54. Que características apresenta esta colecção? Se nos
Europaea», uma parte do Herbário de A. Hayek, a colecção de «Rubi exs. Stiriae orientalis» de Sabransky e a exsicata de
Fr. Sennen, não puderam ter sido observados por G. Sampaio para a elaboração da obra publicada em Dezembro de 1904.
52
Estes eram de facto os mais conceituados rubologistas da época e G. Sampaio tinha tido o cuidado de os contactar a
todos. No entanto, apesar da sintonia ter sido geral, em alguns casos a discordância manteve-se e G. Sampaio não abdicará
da sua opinião discordante.
53
Ao discutir o R. subincertus Samp., G. Sampaio admite que a tinha inicialmente considerado como uma raça do R.
affinis, mas que enviou exemplares para W. O. Focke que discordou, considerando-a uma espécie nova, se bem que muito
próxima desta. Ao examinar o R. Sampaianus Sud., G. Sampaio refere que inicialmente tinha identificado o exemplar como
sendo R. leucandrus Focke, mas após ter enviado material para colegas, estes consideraram-no como uma espécie nova, o
que H. Sudre viria a concretizar em 1903 com a criação de R. Sampaianus Sud. Em relação ao R. peculiaris Samp., G.
Sampaio diz que lhe parecia uma espécie nova dado que diferia das conhecidas, mas que H. Sudre era da opinião que se
tratava de uma subespécie de R. pubescens. No entanto, W. O. Focke concordava que se tratava de uma espécie nova. Ao
discutir o R. portuensis Samp., G. Sampaio refere que «o prof. Sudre diz que o R. portuensis é identico ao seu R.
ellipticifolius. Ora, não obstante o respeito que tenho pelas opiniões do eminente batologista francez, não posso concordar
de modo algum com este modo de vêr». Em relação ao R. brigantinus Samp., refere que W. M. Rogers lhe tinha escrito
dizendo que «nada ha na Inglaterra que se lhe identifique» e que H. Sudre «inclina-se atualmente a consideral’a uma especie
muito interessante». Quando refere o R. Henriquesii Samp., G. Sampaio escreve «parecendo-me que o R. Henriquesii
oferecia uma certa analogia com algumas silvas da Inglaterra, submeti alguns exemplares ao exame do reputado especialista
d’aquele paiz, o snr. Moyle Rogers, que a considerou uma especie inteiramente nova para ele [...] Dos batologistas de outros
paizes a quem remeti egualmente a nossa fórma nenhum d’eles foi de parecer que a planta constituisse uma especie já
conhecida ou descrita». Ao discutir o R. inflexus Samp., escreverá: «Parecendo-me que esta curiosa silva era bastante
proxima de duas especies endemicas da Inglaterra, o R. Lintoni Foche e o R. botryeros Rogers, e tendo duvidas sobre se
devia filial-a em qualquer d’elas ou consideral-a como especie autonoma, resolvi consultar o distinto especialista inglez
snr. Moyle Rogers, o qual foi de parecer que o R. inflexus constitue uma especie independente, proxima realmente d’aquelas
plantas, mas diferindo de qualquer d’elas tanto, pelo menos, como elas diferem entre si».
54
Principais colecções estudadas por G. Sampaio (organizador: nome da colecção, colectores principais)
α. Colecções cuja maioria dos exemplares é anterior a 1904:
«Association Rubologique».
Baenitz, C.: «Herbarium Europaeum», colector: H. Hofmann.
Bagnall, J. E.: «Set of British Rubi (1892-1895)», colector: J. E. Bagnall.
Beckmann, C.: «Flora planitiei Germaniae boreali-occidentalis», colector: C. Beckmann.
Boulay, N. & M. Bouly de Lesdain: «Rubi Praesertim Gallici Exsiccati», colectores: M. Bouly de Lesdain, J. Harmand, H.
Sudre.
M. Bouly de Lesdain: Herbário, colector: Pierrat.
Chateau, E.: Herbário, colector: E. Chateau.
Demandt: Herbário, colector: Demandt.
Du Pré, F.: Herbário, colector: F. Du Pré.
Erichsen, F.: Herbário, Hamburgo; «Flora Hannover», colector: F. Erichsen; «Flora v. Baden», colector: A. Gotz; «Flora v.
Schleswig-Holstein», colector: F. Erichsen.
«Flora Hungarica», ex. Herbário L. Richter, colector: Harmanti.
Focke, W. O.: «Flora Germanicae bor.», colector: W. O. Focke.
Genevier, G.: Herbário.
Gravet, F.: «Flora Bélgica», colector: F. Gravet.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
43
focalizarmos só em exemplares datados antes de 1904, a colecção apresenta as seguintes
características: α. O número de espécies representadas é elevado. Estão representadas muitas espécies
dos autores mais importantes de Rubus: N. Boulay, W. O. Focke, G. Genevier, Lindley, P. J. Mueller,
W. M. Rogers, H. Sudre, Vest, Weihe & Nees. . As espécies representadas abrangem grande parte da
Europa, estando representados espécimes de Espanha, França, Bélgica, Grã-Bretanha, Alemanha,
Escandinávia e Hungria. . Estão representadas as exsicatas de Rubus mais importantes da época. .
Muitos espécimes foram colhidos pelos próprios autores das espécies representadas. Destacam-se W.
O. Focke e H. Sudre, mas também Bagnall, G. Genevier, W. R. Linton, Waisbecker55.
Hayek, A.: Herbário, Rubus austríacos, colector: A. Hayek.
Holzfuss, E.: «Flora von Pommern», colector: E. Holzfuss.
Lidforss, B.: «Rubi Scandanavici», colector: B. Lidforss.
Linton, W. R.: Herbário, colectores: C. Bailey, W. R. Linton, W. M. Rogers.
Neuman, L. M.: «Plantae Scandinavicae», colector: L. M. Neuman.
Rogers, W. M.: Herbário, colector: W. M. Rogers.
Scheppig, C.: Herbário, «Flora Berol.», colector: C. Scheppig.
Slater, H. H.: Herbário, Inglaterra, colector: H. H. Slater.
Sudre, H.: «Flora Gallica», «Herbarium Ruborum rariorum», colector: N. Boulay.
White, J. W.: Herbário, colector: J. W. White.
. Colecções com exemplares anteriores e posteriores a 1904:
Missbach, E. R.: «Flora Saxónica», colector: E. R. Missbach.
Sudre, H.: «Batotheca Europaea», colectores: W. O. Focke, G. Genevier, P. J. Müller, H. Sudre.
. Colecções cuja maioria dos exemplares é posterior a 1904:
Fitschen: «Flora Hannoverana», «Flora holsatica», colector: Fitschen.
Hayek, A.: «Herbarium Dr. August v. Hayek», colector: Sabransky.
Kupčok, S.: «Herbarium S. Kupčok, Bakabánya, Flora Hungariae», colector: S. Kupčok.
Lewin, J. P.: «Plantae Suecicae», colector: L. M. Neuman.
Sabransky: Herbário, «Rubi exs. Stiriae orientalis», colector: Sabransky.
Sennen, Fr.: Barcelona, «Plantes d’Espagne».
Zinsmeister, J. B.: «Flora Bavarica», colector: J. B. Zinsmeister.
55
Exemplos de espécies existentes na colecção de G. Sampaio com exemplares recolhidos (ou confirmados) pelos próprios
autores das espécies:
R. callicomus Kpk na «Flora Hungariae» de Kupčok.
R. chlorothyros Focke na «Flora Germanica bor.» de W. O. Focke.
R. criniger Linton no herbário de W. R. Linton.
R. crinitus Sudre na «Flora Gallica» de H. Sudre.
R. durescens Linton no herbário de W. R. Linton.
R. echinocalyx Erichsen na «Flora holsatica» de Fischen.
R. elegantissimus Hayek no «Herbarium Dr. August v. Hayek».
R. elongatispinus Sudre na «Batotheca Europaea».
R. eximius Erichsen na «Flora holsatica» de Fischen.
R. falciger Kpk na «Flora Hungariae» de Kupčok.
R. glucoxylon Sudre na «Batotheca Europaea».
R. lanceolatus Wiasbecker no «Dr. C. Baenitz Herbarium Europaeum».
R. maassii Focke na «Batotheca Europaea».
R. macrocardicus Sabransky no «Herbarium Dr. Sabransky».
R. majusculus Sudre no «Dr. C. Baenitz Herbarium Europaeum».
R. mercius Bagnall no «Set of British Rubi».
R. pedatifolius Genevier na «Batotheca Europaea».
R. pyrenaicus Sudre na «Batotheca Europaea».
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44
4C. A documentação epistolar
A documentação epistolar de que dispomos permite afirmar, com grande segurança, que esta
colecção de exemplares de Rubus datados antes de 1904 terá sido adquirida por G. Sampaio
essencialmente nos primeiros anos da década de 1900. Podemos portanto afirmar que G. Sampaio
soube construir uma excepcional colecção de Rubus europeus e que terá sido esta a colecção em que se
baseou para elaborar a maior parte do seu estudo dos Rubus portugueses.
G. Sampaio trocou opiniões sobre a identificação de alguns dos espécimes por si recolhidos.
Contactou com os mais prestigiados rubologistas da época, N. Boulay, M. Bouly de Lesdain, W. O.
Focke, A. Hayek, W. R. Linton, Neumann, W. M. Rogers e H. Sudre. Concordou com algumas
opiniões, discordou doutras. Mas rapidamente ganhou prestígio no meio destes especialistas56. A
reputação era também nacional. Alguns Rubus, incluindo espécies novas descritas por G. Sampaio,
serão incorporados nas distribuições de plantas e na exsicata da Sociedade Broteriana de Coimbra.
G. Sampaio começou o estudo dos Rubus por volta de 1896. O documento mais antigo sobre
Rubus do seu espólio é a «Liste méthodique des Rubus distribués par l’Association Rubologique en
1890». Esta Associação era dirigida na altura por N. Boulay, professor na Faculdade de Ciências de
Lille. Trata-se do catálogo das espécies disponíveis para permuta pela Associação, datado de 20 de
Junho de 1891. Para cada espécie é feita uma descrição. Em algumas espécies observa-se uma cruz a
lápis do lado esquerdo. Será uma marcação de G. Sampaio para pedir estes exemplares? Provavelmente
sim, dado que na colecção de Rubus coligida por G. Sampaio existem diversos exemplares desta
Associação. O catálogo termina com as seguintes indicações subscritas pela direcção da Associação:
«Mon intention était d’attendre les résultats de mes expériences de culture avant de continuer l’essai
de Révision entrepris il y a quelques années ; toutefois réflexion faite et sur l’avis de plusieurs associés
j’ai résolu de terminer ce dernier travail aussi rapidement que possible. Nous avons lieu d’espérer le
concours d’un spécialiste de l’Est de la France, pour la campagne prochaine. Il nous procurera les
types des espèces et des variétés décrites par Godron dans la Flore de France et dans la Flore de
Lorraine. Des envois considérables de diverses partes de l’Europe sont également annoncés […] Les
paquets doivent être adressés à M. Boulay, Professeur à la Faculté des Sciences, Lille. Le nombre des
R. separinus Genevier na «Batotheca Europaea».
R. tarnensis Sudre na «Flora Gallica» de H. Sudre.
R. timendus Sudre no «Dr. C. Baenitz Herbarium Europaeum».
56
A atestar este facto temos por exemplo a criação da espécie Rubus Sampaianus por H. Sudre, em 1903, em homenagem
ao rubologista portuense e baseada em material enviado por G. Sampaio.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
45
parts à recueillir est toujours fixé à 15 ou 16». Este texto mostra que a Associação Rubológica, à
semelhança da Sociedade Broteriana de Coimbra, recebia dos sócios lotes de exemplares que distribuia
pelos mesmos sócios. Era uma forma de, por esforço colectivo, se enriquecerem as colecções de todos
os sócios.
No início da década de 1900 aumenta exponencialmente a correspondência entre G. Sampaio e
os mais prestigiados estudiosos dos Rubus europeus. Entre 1902 e 1904, o estudo dos Rubus parece
tornar-se obsessivo para G. Sampaio, dado que quase toda a correspondência versará este tema57. No
início de 1902, G. Sampaio terá iniciado os contactos com diversos rubologistas europeus solicitando
permuta de exemplares de Rubus, dado que existem muitas cartas datadas de meados deste ano com
resposta a esta solicitação58.
M. Bouly de Lesdain, em bilhete-postal endereçado de Dunquerque e datado de 5 de Janeiro de
1902, escrevia «Dans un an ou deux, je compte recontinuer l’Association Rubulogique qui a cessée il y
a 3 ou 4 ans ; elle avait distribuée 1200 numéros de Rubus»59. M. Bouly de Lesdain terá
posteriormente enviado para G. Sampaio exemplares de Rubus, mas aparentemente G. Sampaio terá
enviado em troca plantas que não eram Rubus, o que não terá agradado ao especialista francês que
escrevia a 30 de Novembro deste ano: «J’ai reçu hier l’envoi de plantes que vous m’adressez, et vous
en remercie. Quand je vous ai fait un envoi de Rubus, il avait été convenu que vous ne m’enverriez que
des Rubus en échange ; je compte donc bien sur un second envoi. Vous m’excuserez si je tarde encore
quelques jours […] Je n’ai plus de Rubus en double pour le moment». G. Sampaio satisfaz o pedido de
M. Bouly de Lesdain enviando Rubus. O rubologista francês responderá a 20 de Fevereiro de 1904,
surpreendido com as novidades portuguesas: «Dans vos rubus que j’examine à la hâte, je trouve
quelques espèces bien intéressantes. Merci de votre brochure; vous avez bien raison de publier vos
découvertes»60.
G. Sampaio contacta com os Rubus belgas através de F. Du Pré, que vivia em Bruxelas e
possuía plantas para permuta. O botânico belga responde a 11 de Março de 1904: «que je pourrai, […]
57
De facto os trabalhos que publica entre 1902 e 1904 subentendem árduo labor. Poderá significar que nos primeiros anos
(entre 1896 e 1900) G. Sampaio terá essencialmente feito herborizações e só depois, quiçá pelas dificuldades surgidas pela
identificação dos espécimes que tinha em mãos, contactou com os colegas rubologistas?
58
Todavia a correspondência sobre os Rubus ultrapassará o ano de 1904 e prolongar-se-á intensivamente por mais alguns
anos (até 1906) e, esporadicamente, até ao fim da carreira de G. Sampaio. Também a maioria dos exemplares de Rubus
coligidos por G. Sampaio têm uma datação anterior a 1904, mas alguns ultrapassam esta data.
59
A «Association Rubologique» dirigida por N. Boulay tinha entrado em inactividade no fim da década de 1890.
60
N. Boulay e M. Bouly de Lesdain promovem, no início da década de 1900, uma «Rubi Praesertim Gallici Exsiccati»,
com material recolhido por prestigiados colectores como J. Harmand e H. Sudre, além dos próprios promotores. Na
colecção de G. Sampaio existem diversos exemplares desta exsicata. Serão estes os exemplares a que se refere a carta de 30
de Novembro de 1902?
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
46
envoyer pour le genre Rubus une collection des formes les plus saillantes croissant en Belgique. Si en
échange des plantes que je vous adresse, vous croyez devoir me faire parvenir des plantes de votre
contrée, je vous serais très reconnaissant de ne joindre à votre envoi que des exemplaires du genre
susdit». A resposta de G. Sampaio terá sido rápida e positiva dado que F. Du Pré escreve novamente a
4 de Abril, um bilhete-postal com o carimbo de Bruxelas: «Je vous adresse aujourd’hui par la voie de
navigation, via Anvers, un paquet de Rubus. J’espère que cet envoi vous parviendra en bon état et que
vous en serez satisfait».
Outro contacto terá sido com William Moyle Rogers61. W. M. Rogers concorda com a permuta
(apesar de reconhecer a sua idade avançada), escrevendo numa carta datada de 20 de Agosto de 1902:
«I have received your letter […] I hope to be able to send you some sheets of characteristic British
Rubi for the herbarium of your Academia. I am too old now to collect Rubi duplicates in any
quantities; but it will give much pleasure if I can thus far be of service to you, and I shall be glad to
receive such specimens of Portuguese Rubi as you may be able to send me in exchange to my home
address». Existe um rascunho de uma carta de G. Sampaio endereçada a W. M. Rogers com a data de 8
de Setembro deste ano. A resposta do colega britânico datada de 29 de Dezembro que iremos
mencionar à frente, sugere que esta carta terá de facto sido enviada. G. Sampaio responde, em francês,
ao seu colega britânico: «J’ai reçu votre aimable lettre et je vous remercie bien la forme gentile come
vous avez admis ma demande. J’espère avec le plus vif intérêt vos Rubus anglais, et en échange je vais
vous envoyer les plantes du Portugal. […] je vous adresse aujourd’hui un petit paquet de ces plantes,
dont je ferai prochainement un nouveau envoi. Entre les espèces maintenant envoyées vous trouverez
une plante que j’appelle Rubus duriminius, et donc la diagnose, en français, se trouve incluse. […] Je
vous prie, alors, de examiner la plante et de me dire si je la dois maintenir comme une espèce ou si, au
contraire, elle est seulement une forme déjà connue»62. W. M. Rogers responderá a 29 de Dezembro de
1902, agradecendo os Rubus que G. Sampaio lhe tinha enviado e tecendo considerações sobre os
exemplares: «I thank you for your letter of the 17th […] also thanking you for the packet of Rubus
specimens which reached me a few days ago […] The specimens which you have the goodness to send
me now are very interesting. I now remark on them […]». Terá ocorrido novo envio de Rubus para W.
M. Rogers e um pedido de opinião sobre as identificações apostadas, dado que o rubologista britânico
responderá a 25 de Janeiro de 1904: «I thank you for kindly sending me your Rubus specimens. There
61
Conjuntamente com W. R. Linton eram os dois mais importantes especialistas de Rubus da Grã-Bretanha.
R. duriminius foi proposto como uma variedade nova de R. bifrons em SAMPAIO (1903a). Esta é a primeira
correspondência de G. Sampaio em que pede uma opinião sobre a identificação de um exemplar de Rubus.
62
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
47
can, I think, be no doubt that the “R. Questierii” is rightly so named, and I am glad to find that it
extends into Portugal […] But I regret to say I find myself quite unable to give definitive names to all
the other specimens. So far as I can judge from the pieces you have sent, we have nothing in the British
Isles quite like any of them». Ainda terá ocorrido mais um envio de Rubus por G. Sampaio. W. M.
Rogers escreverá a 7 de Outubro deste ano de 1904: «I am much obliged to you for the beautiful
specimens of Rubus inflexus which I am very glad to place in my herbarium. I have examined them very
carefully and I believe that while they present many features which strongly recall our 3 species, […]
your plant really differs from these at least as much as they do from each other. It seems quite distinct
(as compared with these) in its […]».
G. Sampaio também contacta com o rubologista inglês W. R. Linton solicitando permuta, o que
é aceite. Em carta datada de 11 de Setembro de 1904, W. R. Linton escrevia: «J’aurai plaisir de vous
envoyer une selection de British rubi, aussitôt que je pourrai les preparer. Si vous avez des formes de
genus […] je voudrai bien les recevoir en échange».
Outro contacto ainda foi com M. Gandoger63. Mas este colega aparentemente não teria na altura
Rubus disponíveis, dado que responde em carta endereçada de Arnas, Villefranche – Rhône e datada de
24 de Agosto de 1902, «Je viens de recevoir votre aimable lettre, et je m’empresse de vous dire que je
recevrai avec beaucoup de plaisir vos plantes de Portugal. En retour, je vais vous envoyer un bon
paquet de plantes rares de France […] Je possède 7 à 800 espèces pour échanger ; il me sera donc
facile de vous dédommager. En 1903 je récolterai des Rubus, genre que je connais très bien, ayant
publié des ouvrages sur lui. Si vous avez des espèces de ce genre à déterminer, envoyez-les moi, avec
des numéros, je vous en donnerai les noms exacts». G. Sampaio envia plantas para M. Gandoger. No
entanto, o botânico francês não tinha Rubus para permutar, dado que escreve a 2 de Dezembro deste
63
Michel Gandoger realizou intensíssimas herborizações na Península Ibérica. Publica em 1910 na editora Hermann de
Paris o «Novus conspectus Florae Europae sive enumeratio systematica», uma listagem de 27.000 espécies descritas até à
data em floras europeias. Num manuscrito intitulado «Catalogue des plantes récoltées en Espagne et en Portugal pendant
mes voyages de 1894 à 1912» destinado à publicação na editora Hermann, M. Gandoger listava 7.403 táxones de vasculares
ibéricos, que havia recolhido nas suas herborizações ou permutado com outros botânicos. Em cada taxon era indicada a
localidade da observação. Escrevia no prefácio datado de Março de 1917: «Ce Catalogue est le résultat des récoltes faites
dans la Péninsule ibérique pendant mes vingt et un voyages botaniques. [...] Ils avaient pour but l’exploration méthodique
et aussi complète que possible de l’Espagne et du Portugal, en visitant les localités ou aucun botaniste n’avait été [...] Les
résultats de ces longues, pénibles et coûteuses recherches ont été satisfaisantes, puisque indépendamment des localités, un
grand nombre d’espèces nouvelles – voire même des genres – sont venus enrichi cette Flore merveilleuse, unique en
Europe. [...] Afin de rendre plus complet ce Catalogue j’y ai ajouté d’autres plantes reçues de mes correspondants [...] cet
ouvrage [...] peut donc être considéré, semble-t-il, comme le plus complet qui existe pour la Flore hispano-portugaise». O
importante trabalho de estudo da flora ibérica feito por M. Gandoger era reconhecido num artigo escrito por PAU (1897),
onde se pode ler: «Pocas excursiones han sido hechas en estos tiempos por botánicos extranjeros que puedan compararse á
las practicadas por nuestro amigo: exceptuando las de Porta, no conozco otro alguno que haya recogido tanta variedad de
plantas y tan notables […]» A bibliografia de M. Gandoger está disponível em http://bibdigital.rjb.csic.es/, onde se encontra
este manuscrito, assim como o trabalho de C. Pau.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
48
ano de 1902: «J’ai reçu votre paquet de plantes en bon état, ainsi que vos savantes brochures
botaniques. Je vous en remercie bien. Aujourd’hui je vous envoi, en retour, un paquet de plantes. Je
regrette de ne pouvoir vous donner des Rubus, car, en ce moment je n’en ai pas de doubles, et quand
vous m’avez écrit, il était trop tard pour en récolter, car les plantes étaient défleuries. Mais en 1903, je
récolterai des Rubus pour vous et beaucoup d’autres plantes que je vous enverrai avec plaisir». No
catálogo de plantas ibéricas de M. Gandoger, datado de 1917, são referenciados muitos exemplares de
rubus recolhidos em Portugal, incluindo espécies de G. Sampaio64. É muito provável que estes
exemplares tenham sido os enviados por G. Sampaio entre Agosto e Dezembro de 1902. A
correspondência entre G. Sampaio e M. Gandoger acaba aqui e na colecção de Rubus coligida por G.
Sampaio não existem exemplares deste botânico francês, pelo que concluímos que M. Gandoger não
terá concretizado o envio dos exemplares que referia na carta datada de 2 de Dezembro.
Também em 1902, G. Sampaio irá escrever a W. O. Focke, um dos mais eminentes rubologistas
da época. G. Sampaio seguramente consultou o trabalho monográfico clássico de FOCKE (1877)65. Terá
sido J. Henriques quem terá dado o endereço do botânico alemão a G. Sampaio, dado que podemos ler
numa carta datada de 4 de Novembro de 1902: «A direcção do Focke é a seguinte: […]». Entre Agosto
de 1904 e Maio de 1905 existem seis cartas ou bilhetes-postais que são importantes para avaliar a
contribuição deste rubologista alemão no estudo dos Rubus por G. Sampaio. A primeira
correspondência de W. O. Focke para G. Sampaio é datada de 12 de Agosto de 1904, e mostra que o
botânico portuense lhe tinha enviado exemplares de Rubus pedindo uma opinião ao especialista
alemão. Num bilhete-postal com o carimbo de Bremen, W. O. Focke escreve sucintamente: «C’est
avec beaucoup de plaisir que j’ai reçu vos échantillons. Je n’ai pu jusqu’à présent que très peu de
rameux de Rubi recoltés dans votre patrie. Je pense que votre no. 1 (beirensis) soit le […]». Segue-se
uma série de identificações, mas W. O. Focke remete para mais tarde uma resposta detalhada: «Après
une comparaison exacte je vous écrirai plus-en-détail. Je vous serai très obligé pour la collection de
Rubi portugais, que vous avez la bienveillance de vouloir m’envoyer». W. O. Focke escreve de facto
uma resposta mais detalhada logo três dias depois. Numa carta endereçada de Bremen e datada de 15
de Agosto, W. O. Focke começa por reconhecer que, pelas identificações enviadas, G. Sampaio já
conhecia bem os Rubus: «les déterminations des Rubi, que vous avez eu l’obligeance de m’envoyer,
64
No manuscrito citado na nota anterior, nas páginas 113-114, são citadas as seguintes espécies de Rubus da autoria da G.
Sampaio, com exemplares recolhidos em Portugal: «R. Henriquezii», «R. minianus». São ainda citados exemplares
portugueses de outras espécies deste género.
65
Existe no espólio documental de G. Sampaio um exemplar desta monografia com um carimbo da Academia Polytechnica
e anotações de G. Sampaio em diversas páginas. Apesar do texto principal ser escrito em alemão, todas as espécies são
descritas em latim.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
49
rendent témoignage d’une étude approfondie. Pour cette raison j’attendrai avec beaucoup d’intérêt
votre travail sur les Rubi de votre pays». Segue-se uma lista com a identificação de sete exemplares
(teriam portanto sido os enviados anteriormente por G. Sampaio). Algumas identificações encontramse rasuradas a lápis por G. Sampaio. Para o exemplar no 1, identificado por W. O. Focke como R.
obtusangulus Gremli, o nome está emendado para R. caldasianus66. Quanto ao exemplar n.o 2,
identificado por W. O. Focke como R. incurvatus Bab., o nome está emendado para «duriminius?»67.
Reconhecendo a qualidade do trabalho de G. Sampaio e a dificuldade deste grupo de plantas, W. O.
Focke pede então, na carta, que o colega portuense lhe envie exemplares, mas só se forem de táxones
novos para a ciência: «La détermination de ces plantes extrêmement voisines est toujours assez
précaire, quand on ne peut examiner que des rameaux secs. […] Séparée de mon herbier général je
possède une collection riche d´échantillons authentiques des Rubus de l’Europe. Je vous serais trèsobligé pour des contributions à cette collection, si vous publierez des formes de Rubus sous noms
nouveaux. Pour une collection des Rubus du Portugal je vous serais très-reconnaissant»68. G. Sampaio
terá rapidamente enviado um segundo lote de Rubus, porque logo a 8 de Setembro, recebe nova carta
de W. O. Focke, endereçada de Bremen. Lamenta não poder enviar em troca material equivalente: «cijoint vous trouverez mes remarques au sujet de vos Rubi. […] Je vous serai très-obligé pour toutes les
plantes que vous voulez avoir l’obligeance de m’envoyer. Je regrette seulement que je ne sois pas
préparé de vous faire un envoi équivalent en échange. Toutefois j’espère que l’Herbier public de cette
ville m’aidera de réunir une collection utile. Veuillez bien me faire savoir vos souhaits ; peut-être il me
sera possible de vous procurer l’un ou l’autre de vos desiderata». Numa folha à parte dentro do
envelope encontramos uma lista intitulada: «Rubi de M. Sampaio, 2. envoi». Segue-se uma lista de seis
exemplares identificados por W. O. Focke. Mais uma vez, G. Sampaio rasurou a lápis algumas das
identificações de W. O. Focke, de que discordava. No exemplar n.o 1, identificado por W. O. Focke
como R. pericallusi (esta espécie não era reconhecida por G. Sampaio como existente em Portugal), o
nome está emendado para R. peratticus69. Quanto ao exemplar n.o 2, não identificado por W. O. Focke,
mas com a seguinte anotação: «elle paraît être plus proche du R. incurvatus, mais je ne connais aucune
forme exactement correspondante», o nome está emendado para R. peculiaris70. Relativamente ao
exemplar n.o 5, identificado como R. affinis, W. O. Focke escreve que este exemplar era semelhante ao
66
Espécie nova proposta em SAMPAIO (1903a).
Variedade nova de R. bifrons proposta em SAMPAIO (1903a).
68
Saliente-se a utilização por W. O. Focke da designação de amostras «autênticas».
69
Espécie nova proposta em SAMPAIO (1904c).
70
Espécie nova proposta em SAMPAIO (1904c).
67
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
50
n.o 2 do primeiro envio (que tinha sido identificado como R. incurvatus). G. Sampaio discorda, e
considera o n.o 2 do primeiro envio como R. duriminius e este como R. subincertus71. A
correspondência entre G. Sampaio e W. O. Focke continuará após a publicação da monografia em
Dezembro de 1904. No entanto podemos afirmar que aparentemente, nesta altura, W. O. Focke
desconhecia as publicações de Sampaio de 1902 e 1904 sobre os Rubus portugueses, dado que não
identificou nenhuma das plantas enviadas por G. Sampaio como sendo uma das suas espécies novas.
Se atendermos ao que G. Sampaio escreverá na sua monografia, os contactos com H. Sudre
terão sido contemporâneos com os de W. O. Focke, mas a primeira correspondência que temos deste
rubologista francês data já de 2 de Dezembro de 1904. Este documento é importante porque mostra que
G. Sampaio enviou exemplares de Rubus para H. Sudre, que este lhe deu a sua opinião sobre as
determinações que tinha feito e que G. Sampaio terá participado na exsicata «Batotheca Europaea»72.
No bilhete-postal de 2 de Dezembro de 1904 com o carimbo de Toulouse, podemos ler: «Votre colis
m’est parvenu ces jours-ci seulement ; vos matériaux seront utilisés l’an prochain, car le 2e. fascicule
est déjà distribuée. J’étudierai vos spécimens, mais dés maintenant je peu vous dire que R. […]».
G. Sampaio também contacta com o botânico austríaco August Hayek solicitando permuta de
Rubus. Em bilhete-postal datado de 13 de Fevereiro de 1904, A. Hayek respondia positivamente: «Je
suis bien prêt d’échanger des plantes et de vous envoyer une collection de Rubus de l’Austriche. Mais
à présent je n’en ai que deux ou trois échantillons, mais l’été prochain j’en veux recueillir assez et les
vous envoyer. S’il vous plait, je vous pourrait aussi vous prêter toute ma collection pour quelques
semaines, pour étudier les formes, mais ça ne sera possible que l’automne prochain». Na carta
seguinte já datada de 1906, A. Hayek refere-se à colecção de Rubus colhidos por Sabransky. O facto da
colecção de Rubus de G. Sampaio conter diversos exemplares de Rubus colhidos por A. Hayek com
data de 1904, e o facto de G. Sampaio no seu trabalho monográfico publicado em Dezembro de 1904
agradecer a permuta de Rubus com este rubologista austríaco, sugere que, apesar de serem em número
reduzido, A. Hayek terá de facto enviado a G. Sampaio exemplares de Rubus, após esta carta de 13 de
Fevereiro de 1904. G. Sampaio terá retribuído com um lote de Rubus, cuja recepção é agradecida pelo
botânico austríaco numa carta com o carimbo de Viena e datada de 10 de Abril de 1906: «il me faut
71
Espécie nova proposta em SAMPAIO (1904b).
A «Batotheca Europaea» foi talvez a mais importante exsicata de Rubus e a sua distribuição coincide com a elaboração do
trabalho de G. Sampaio. Os fascículos I e II desta exsicata foram distribuídos em 1903 e 1904 e o fascículo III em 1905
(como adiante será referido) e, cada um, constava de dezenas de exemplares. Os colectores eram os melhores rubologistas
da época: W. O. Focke, G. Genevier, G. Müller e H. Sudre e diversas espécies distribuídas eram ilustradas por exemplares
recolhidos pelos autores das espécies.
72
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
51
vous remercier beaucoup pour les plantes portugaises que vous m’avez envoyé et aussi pour les rubus
très interessants, enfin aussi pour vos travaux botaniques qui m’interessaient beaucoup».
Os contactos estender-se-ão aos rubologistas escandinavos. Entra em contacto com L. M.
Neuman. Procurando permuta de Rubus o botânico sueco responderá a 20 de Fevereiro de 1904: «Avec
beaucoup de plaisir je vous enverrai ronces de notre pays [Suécia]; si vous voulez signer les espèces
desirées dans « Herbarium Sueciçum » que je vous remets croisé. Si vous désiriez autres plantes de
Rubi, vous pouvez signer aussi ces espèces ! Les genres que je desire sont […] Peut-être avez-vous une
liste des plantes que vous voulez échanger». Perante esta resposta positiva, G. Sampaio terá enviado
exemplares de Rubus para L. M. Neuman que responde a 26 de Março de 1904, discordando de uma
das identificações: «Aujourd’hui j’ai reçu vos plantes. Votre lettre arriva déjà 11/3. Rubus
pulcherrimus que vous avez déterminé, n’est pas le mien ! Bientôt je vous enverrai des plantes que
vous avez demandées»73.
Naturalmente, G. Sampaio contactou com os colegas espanhóis, Baltasar Merino74 e com
Carlos Pau75. O contacto inicial terá sido com B. Merino. G. Sampaio tinha especial interesse em
contactar com B. Merino, dado que este botânico jesuíta se encontrava a publicar uma flora da Galiza76,
e a flora desta região de Espanha tem muitas afinidades com a flora do Minho português77. No Verão
73
Existe na colecção de Rubus de G. Sampaio diversos exemplares recolhidos por este botânico sueco. Serão
provavelmente estes a que esta carta se refere.
74
Bibliografia de B. Merino está disponível em http://bibdigital.rjb.csic.es/
75
Bibliografia de C. Pau está disponível em http://bibdigital.rjb.csic.es/
76
P.e Merino estudava a flora galega desde finais do século XIX. Os resultados iam sendo apresentados nas publicações da
Real Sociedade Espanhola de Ciências Naturais (MERINO, 1901, 1902, 1911). Escrevia em 1901: «iremos, desde luego, por
medio de algunas notas, adelantando la noticia de las especies raras, nuevas ó criticas que hemos tenido la buena fortuna de
encontrar». PAU (1899) apreciava da seguinte forma o trabalho do jesuíta no conhecimento da flora galega: «Si España
contara con unos cuantos colectores como el Rd. P. Merino, sería tan conocida su flora como la de la Europa Central [...]
Escrupuloso y atento, ha recogido dicho naturalista los ejemplares una y mil veces hasta presentar las formas pertenecientes
á especies dudosas ó criticas en las condiciones de satisfacer los más exigentes deseos. Llevado del amor á la verdad ha
repartido sus recolecciones con una libertad á que no estamos acostumbrados. Sin recelos ni temores, sin falsa vanidad ó
amor propio, sin prevención alguna ni miedo á ser juzgado, comunica sus creaciones, conocedor del inconveniente que trae
el aislamiento. No ignora que el campo de la ciencia es tan vasto que cabemos en él holgadamente todos; y en su
consecuencia, ha procurado aumentar sus relaciones, dando á repartir, por medio de algunos amigos, sus plantas; y en
verdad que á veces no se le ha hecho justicia, omitiendo su nombre en algunas etiquetas [...] Otro de los méritos del P.
Merino consiste en que con sus trabajos ha contribuido al conocimiento de la flora gallega, que era por extremo imperfecto;
ha vulgarizado lo que ayer apenas se conocía; ha hecho con la flora de Galicia lo que Costa con la catalana, Loscos y Pardo
con la aragonesa y Boissier con la granadina. Deben estar muy agradecidos los gallegos al P. Merino, y la Sociedad
Española de Historia Natural muy orgullosa en contar entre sus miembros un socio cuya laboriosidad puede competir con la
de los más activos que conocemos».
77
A originalidade da flora galega e o seu deficiente conhecimento eram salientados por MERINO (1901): «no es [...] la Flora
española, entre las europeas, la mejor conocida (por falta, sin duda, de suficiente número de cultivadores de la botánica
sistemática), y que entre las varias regiones de nuestra península quizás la gallega sea de las menos exploradas [...] La
región donde hemos logrado penetrar el verano pasado, estoy casi seguro que no se ha sido pisada por ningún botánico; la
multitud de especies raras, en su gran mayoría nuevas para la Flora gallega, lo da bastante á entender». Também PAU (1899)
salientava a originalidade da flora galega: «Es preciso conocer á fondo la flora gallega para darse cuenta de la extrañeza que
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
52
de 1902, G. Sampaio ter-se-á mesmo deslocado ao «Colegio del Apóstol Santiago» em La Guardia
com o objectivo de conhecer B. Merino e o seu herbário, mas o encontro não se realizou. G. Sampaio
terá levado e deixado para B. Merino alguns dos trabalhos que tinha publicado. B. Merino escreverá
para G. Sampaio a 20 de Novembro de 1902 informando-o que tinha de facto muitos Rubus galegos,
mas que era C. Pau quem estava no momento a elaborar um estudo monográfico deste género,
disponibilizando-se para o apresentar a C. Pau: «En todo el tiempo que he empleado en recorrer
Galicia, he reunido arriba de 1700 especies, tantas ó mas como las que contiene la Flore de l’Ouest de
France de M. Lloyd. Pero si no fue posible verle y tratar á V. en la ocasión predicha, cábeme la
esperanza y satisfaccion de que por la próxima Pascua, como V. me asegura, tendré el placer de verle
por aquí. […] He leido con sumo gusto los opúsculos acerca de la flora de los contornos de O Porto
que V. ha tenido á bien dedicarme, asi como tambien la lista de exsiccata que publica el Boletim da
Sociedade Broteriana donde con frecuencia aparece el nombre de V. Por lo que antecede fácilmente
comprenderá V. que mis estudios se dirigen á la Flora general de Galicia, la cual, puede decirse, que
todavía no existe; pues pasan de 400 especies las que he encontrado y que eran desconocidas en este
pais. Por esta razon, y porque mi amigo el Sr. Pau, eminente botanico de Segorbe, me rogó le enviase
cuantas muestras encontrase yo del genero Rubus en Galicia, porque pretendia componer una
monografía de las especies españolas de dicho genero, monografía que llenaria el vacio en la flora
nacional, al mencionado botanico he remitido ejemplares de todo. Ya tiene clasificados bastantes
especies y formas gallegas, faltandole solo unas pocas. Asi que termine su trabajo á las especies de
Galicia procuraré yo reunirlas, pues conservo ejemplares de todas ó de casi todas, para que V. las vea
y examine, si en ello tiene V. interes. Tambien puedo poner á V. en relacion con dicho Señor, quien
experimentara en ello verdadera satisfacción. Espero que para la Pascua habrá completado el estudio
de los Rubus, y entonces podré tener el gusto de ponerlos á disposición de V. por todo el tiempo que á
V. le acomode, ó llevarse ejemplares de los duplicados […]». Após ter recebido esta carta, G. Sampaio
terá rapidamente enviado um pacote de plantas para B. Merino, que incluía algumas das espécies novas
de que era autor, dado que o botânico jesuíta responde a 22 de Dezembro do Colégio do Apóstolo
Santiago: «[…] le doy miles de gracias por los bellos ejemplares de plantas que ha tenido V. la bondad
siente el botánico al revisarla: se está en presencia de una flora de transición en la cual el meridional se encuentra
embarazado al determinar los ejemplares. Mi sorpresa, en vista de los envíos á que antes hice referencia, iba siempre en
aumento: cada nuevo envío aumentaba las dificultades, por cuanto la mayoría de las plantas pertenecían á formas más ó
menos diferenciadas de la especie clásica. Es un mundo aparte el Cantón gallego, del cual pueden publicarse á millares las
formas nuevas, inundando de especies la flora de la Península. Por lo tanto, hay que admirar el prudente criterio y buen
juicio del Rdo. P. Merino, cuando, pudiendo publicar gran número de tipos nuevos, se redujo á hacerlo únicamente de los
más importantes». Estes comentários de C. Pau são melhor compreendidos se atendermos ao facto de viver na Catalunha e
ser sobretudo conhecedor da flora mediterrânea do sul de Espanha.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
53
de emitirme y muy especialmente las especies que V. ha descubierto. […] El Sr. Pau me ha escrito
repetidas veces deseando que le pongo yo en relacion con alguno ó algunos botanicos portugueses.
Teniendo pues seguridad de estos sus deseos sin la menor dificultad puede V. desde luego escribirle
manifestandole con entera franqueza de pensamiento […] Por mi parte tiene V. á su disposición mi
Herbario de plantas de Galicia […]». A contribuição de G. Sampaio para a flora galega de B. Merino
aparecerá explícita na obra do jesuíta galego publicada em 1905 (volume I), de que falaremos à frente.
C. Pau iria descrever formalmente, em 1904, uma nova espécie de Rubus, R. merinoi, em
homenagem precisamente ao seu colega galego. Esta espécie encontrava-se restringida ao noroeste de
Espanha e portanto interessava sobremaneira ser conhecida por G. Sampaio. O botânico portuense terá
escrito a C. Pau pedindo exemplares de Rubus, em particular deste R. merinoi. C. Pau responde a 25 de
Agosto de 1902, prometendo enviar a espécie pedida (em troca de Rubus portuenses), mas
reconhecendo que alguns dos exemplares que tinha não estavam completos porque não apresentavam
amostras do turiões: «Del Rubus Merinoi no poseo más que un solo ejemplar, que proporcionaré á V.
apenas pasen unos días, pues […] tengo bastante que hacer en las plantas de mis amigos españoles.
Ya me lo devolverá V. cuando le convenga pero no tengo prisa por hoy. No creo que V. haga […] esta
especie. En las muestras del P. Merino hay un inconveniente, porque la inmensa mayoría, salvo todo,
los ejemplares de años atrás, no trae fragmentos de ramos estériles (turiones). No me cabe duda
alguna de que muchas especies propuestas por V. existen en Galicia y existen en mi colección; algunas
coincidirán con las especies á V. indicadas, pero no han sido publicadas esperando que el P. Merino
me las completará. Si de ellas poseyera más de un ejemplar yo se lo proporcionaré á V. Ahí en las
cercanías de Oporto existen, según los autores, bastantes formas propias de Portugal y que no poseo;
quedaría muy agradecido a V. […] pudiera proporcionarmelas para mi colección. No tengo prisa en
recibir las plantas que V. me ofrece; poco á poco […] V. lo que buenamente pueda […]». Poucos dias
depois, C. Pau irá de facto enviar o exemplar do R. merinoi que tinha, aproveitando para tecer algumas
considerações sobre este género de rosáceas. Escrevia a 11 de Setembro de 1902: «Remito la muestra
del Rubus Merinoi para que V. la conozca. No tengo otro ejemplar; á tener otro, no tendría
inconveniente en ofrecerlo á V., pero V. muy bien comprenderá, que tratando de ejemplar único no me
es conveniente desprenderme de él. De los Rubus de V. únicamente el R. Henriquesii Samp.[…] ha
sido recogido por el P. Merino a Cabañas (Ancarez) […] El R. lusitanicus no ha sido recogido por el
P. Merino. Todavía, en Galicia, á mi no me lo ha remitido».
G. Sampaio também trocou opiniões sobre os Rubus com os seus colegas portugueses, mas
tanto J. Henriques como A. X. Pereira Coutinho aparentemente não se mostravam «muito à vontade»
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
54
neste género de rosáceas. No entanto, os seus colegas auxiliarão G. Sampaio com informações
importantes. Em homenagem aos seus colegas, G. Sampaio irá dar o nome de cada um deles a uma
espécie nova de Rubus. Em carta datada de 4 de Novembro de 1902, J. Henriques envia a transcrição
da diagnose de uma dada espécie de Rubus. Provavelmente, G. Sampaio não teria acesso à obra em
causa. Também neste ano, G. Sampaio terá pedido ao seu colega de Coimbra o empréstimo dos
exemplares que o Herbário tivesse deste género. Na mesma carta terá informado o seu colega da nova
espécie de Rubus que lhe dedicava, Rubus Henriquesii Samp.78. J. Henriques responde, em carta datada
de 24 de Novembro de 1902, reconhecendo que os exemplares de herbário que tinham não estariam
completos: «Pelo correio de hoje vam as plantas europeias que aqui escolheu e vam também os Rubus
de que há exemplares [duas espécies de Rubus] e que devem ser devolvidos. Muito agradeço a sua
amabilidade de me dedicar um Rubus. Bom será que seja espécie firme. É um dos géneros mais
intricados e infelizmente os exemplares do herbário de Coimbra são bem incompletos. Em futuras
explorações, haverá o cuidado necessário para colher exemplares em boa ordem».
G. Sampaio dedicará também um Rubus ao seu colega de Lisboa – R. Coutinhi Samp.79. A. X.
Pereira Coutinho escreve para G. Sampaio a 1 de Fevereiro de 1904: «Recebi hoje a carta de V. Exa.
de 30 de Janeiro, que muito agradeço, bem como a amavel lembrança de V. Exa., dedicando-me o
novo Rubus que estudou. Como digo na Introdução do trabalho ás Rosaceas, todo aquelle estudo dos
Rubus é apenas apresentado como um prévio desbravamento do caminho, sem base solida, para a qual
78
Seria publicado em SAMPAIO (1904a).
Rubus Coutinhi foi publicado em SAMPAIO (1903b). No entanto, em trabalhos posteriores (SAMPAIO, 1914b),
provavelmente por sugestão de W. O. Focke, G. Sampaio considerará esta espécie como uma já descrita, R. Lespinassei
Clav. Como referimos atrás, G. Sampaio tinha sido muito crítico em relação ao trabalho publicado pelo Conde de Ficalho e
A. X. Pereira Coutinho sobre os Rubus portugueses (o trabalho estava incluído numa monografia sobre as Rosáceas de
Portugal). O trabalho tinha sido publicado no volume XVI do Boletim da Sociedade Broteriana. Estes dois botânicos de
Lisboa tinham utilizado material de herbário muito diversificado (do Herbário da Escola Politécnica, exemplares recolhidos
por Welwitsch, J. Daveau, A. Ricardo da Cunha, do Herbário da Universidade de Coimbra, exemplares recolhidos por J.
Henriques, A. Möller, M. Ferreira e os herbários europeu e de Willkomm), mas os exemplares não estavam completos. De
acordo com a abordagem da época do género Rubus, das características mais importantes para separar as diferentes espécies
salientavam-se as dos turiões e dos órgãos florais (principalmente das sépalas). Os exemplares dos bons Herbários
apresentavam sempre um fragmento do turião e as sépalas à parte e/ou uma descrição destes componentes da planta. As
limitações eram no entanto perfeitamente enunciadas e correctamente identificadas pelo seus autores, na introdução do
trabalho. Depois de afirmar que o género Rubus (assim como o género Rosa) era de «estudo intrincadíssimo, que absorve
hoje na Europa a attenção unica de distintos especialistas; e cuja determinação especifica, além de exemplares muito
perfeitos, pede uma longa preparação inicial. A determinação dos nossos Rubus apenas a podemos apresentar como previo
desbravamento de caminho, que só de futuro poderá conduzir à verdade, depois de novas herborizações e de exames mais
profundos e mais fundamentais. É, decerto, auspicioso o numero elevado das especies que apontâmos [Brotero só tinha
considerado duas espécies; neste trabalho eram reconhecidas 12], e que nos parecem bem distintas; mas a determinação de
várias é forçosamente sujeita a bastantes duvidas. Nem sômos especialistas no assumpto; nem os exemplares trazidos pelos
nossos collectores são sempre completos; nem podemos consultar as numerosas obras que seria preciso; e, por ultimo, nem
sempre tinham authenticidade bem garantida os exemplares do herbario europeu com que comparámos os nossos das varias
especies não representadas no herbário de Willkomm». Esta última frase é importante porque demonstra que os autores não
tinham material de herbário de qualidade suficiente para comparação.
79
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
55
nos faltavam a mim e ao Conde de Ficalho, estudos especialisados, livros e exemplares completos.
Toda essa parte do nosso trabalho repousa sobre aproximações apenas, mais ou menos plausiveis.
Acredito que, principalmente no genero Rubus, o exame das plantas vivaz é de primeira importancia
para a classificação; e acho que V. Exa. presta um assignalado serviço á nossa Flora proseguindo no
estudo de um genero composto de especies tão criticas e tão confusas. Muito me obsequeia V. Exa.
remettendo os exemplares que tiver disponiveis das fórmas da nova especie, e peço desde já que se não
esqueça de me enviar um exemplar do seu artigo, que vou lêr com o maior interese, e desejo
colleccionar ao lado dos outros elementos da Flora Portugueza, que tenho reunidos. Como V. Exa. se
tem dedicado bastante ao estudo d’este genero Rubus, tambem muito me obsequeia, quando tiver
tempo e occasião para isso, enviando-me uma lista das especies e variedades que encontrou até hoje
em Portugal e não vêem mencionadas no meu trabalho e do C. de Ficalho, e bem assim incluindo as
especies marcadas n’este trabalho, e que, segundo a sua opinião, devem mudar de denominação
específica. É claro que se tiver disponivel alguns exemplares das especies alli não mencionadas, muito
os agradeço egualmente, para os incluir no herbario da Polytechnica». O tom é positivo, a atitude
construtiva. A resposta de G. Sampaio terá sido rapidíssima, dado que logo a 5 deste mês de Fevereiro,
há uma nova insistência de A. X. Pereira Coutinho: «na lista dos Rubus que me enviou desejo uma
poucas de especies novas, e algumas outras cujas diagnoses não tenho nos livros que aqui possuo, e
como sei que se tem dedicado muito ao estudo d’este intricadissimo genero, peço-lhe que, quando para
isso tenha occasião opportuna, me dê uma chave resumida das especies enumeradas, que, supponho,
não lhe dará trabalho de mais. Tenho feito, para meu uso, as chaves dichotomicas de todas as especies
nas differentes familias, chaves que vou sucessivamente corrigindo com as observações proprias e com
todas as notas alheias sobre a flora portugueza, á medida que as vou encontrando. É possivel que
n’um futuro mais ou menos remoto, se as chegar a vêr no grau de perfeição que lhe quero dar, me
resolva a publical-a como livro elementar de facil consulta. É exactamente n’este sentido, e no
elemento importante para a parte que tenho sobre os Rubus, que lhe faço este pedido, caso, torno a
repetir, isso não lhe dê trabalho de maior»80.
Sintetizando, a correspondência entre G. Sampaio e os colegas europeus, com datações
anteriores à publicação da monografia sobre os Rubus portugueses (Dezembro de 1904), permite
concluir que, em termos de opinião sobre identificações de espécimes e sobre a taxonomia do género,
terão sido M. Bouly de Lesdain, W. O. Focke, L. M. Neuman e W. M. Rogers, os rubologistas que
mais contribuiram para este trabalho de G. Sampaio. Em termos de material de herbário, as
80
Sobre a colaboração mútua entre A. X. Pereira Coutinho, J. Henriques e G. Sampaio ver Capítulo IX.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
56
contribuições terão sido mais vastas. G. Sampaio terá permutado Rubus com M. Bouly de Lesdain, A.
Hayek, W. R. Linton, L. M. Neuman, C. Pau, F. Du Pré, W. M. Rogers e H. Sudre. Estas conclusões
retiradas da análise da documentação epistolar concordam com a informação contida na monografia de
1904, indicando que a documentação epistolar que chegou até hoje é muito completa81.
5. Reacções ao trabalho
Quais as reacções ao trabalho «Rubus portuguezes» publicado em Dezembro de 1904? A
primeira reacção é de W. O. Focke que escreve uma carta endereçada de Bremen e datada de 31 de
Dezembro de 1904. W. O. Focke agradece o trabalho e indaga sobre a colecção que G. Sampaio teria
prometido enviar: «Je viens de recevoir votre traité sur les Rubi Portugais, et je vous prie de vouloir
bien accepter mes remerciments sincères. Dans un groupe d’espèces extrêmement affines il est,
pourtant, très difficile de connaître les plantes décrites sans une comparaison d’échantillons
desséchés, si l’on ne peut pas étudier les buissons vivants. Vous avez eu l’obligeance de m’annoncer
une collection de Rubi Portugais et je vous serais très reconnaissant pour un tel envoi». No fim da
carta em forma de post-scriptum, W. O. Focke escreve uma observação interessante: «Est-ce que vous
possédez des graines de vos Rubi qui pourront servir à des essais de culture ?». W. O. Focke terá
ficado surpreendido com o trabalho de G. Sampaio, tanto mais que desconheceria os trabalhos
anteriores publicados pelo seu colega portuense. W. O. Focke é prudente, não quer emitir opinião sobre
o trabalho de G. Sampaio porque não tinha observado material suficiente. Por isso insiste para que G.
Sampaio envie a colecção que tinha prometido. A pequena frase que escreve no fim da página parece
uma re-insistência como quem ficou pensativo e quer resolver uma dúvida. W. O. Focke terá ficado
intrigado ou duvidoso da proposta de taxonomia que G. Sampaio propunha para os Rubus portugueses
e terá querido verificar o trabalho, observando as espécies novas em fresco e depois de secas? 82
Também M. Bouly de Lesdain reage rapidamente ao envio da monografia de G. Sampaio. Em
carta endereçada de Dunquerque e datada de 9 de Janeiro de 1905, escrevia: «J’ai reçu aujourd’hui
votre très intéressante brochure sur les Rubus du Portugal et avec tous mes remerciements, je suis
heureux de pouvoir vous adresser toutes mes félicitations. Au lieu d’un simple catalogue, vous avez fait
un travail que tous ceux que s’occupent de Rubus aurait toujours le plus grand intérêt à consulter».
81
A principal discrepância diz respeito a H. Sudre, onde só temos correspondência muito tardia (a partir de Dezembro de
1904).
82
A troca de sementes entre Herbários era nesta época vulgar e corrente e tinha como um dos objectivos, cultivar espécies
exóticas ou desconhecidas para obter as plantas completas, poder observá-las frescas, e secá-las para preparar exemplares
para o herbário. Ver Capítulo XIII.2.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
57
Em Fevereiro de 1905, num bilhete-postal datado do dia 19, B. Merino reconhecia as suas
dificuldades com os Rubus, e terá visto em G. Sampaio um colega que o poderia ajudar: «A pesar de lo
mucho que me sirve la monografía de V. sobre los Rubus portugueses, seria para mi de gran
satisfacción someterlos al criterio de V. se es que V. se anima á revisarlos. En esta ciudad estoy
imprimiendo la Flora de Galicia (cerca de 1,700 especies) y dentro de un mes próximamente vendrá la
impresión del genero Rubus, de modo que con el parecer de V. confirmando ó reformando el mio, las
especies que yo describe llevarian el sello de la certidumbre que es lo que pretendo». A resposta de G.
Sampaio terá sido rápida e afirmativa, dado que logo a 27 deste mês de Fevereiro, B. Merino escrevia
para G. Sampaio: «Hoy remito la colección de Rubus que he recogido en Galicia. Como mi proposito
fue que los examinara y estudiara el Sr. Pau, preferi enviarselos completos á él aúnque los mios
quedaran deficientes. Asi es que van algunos ejemplares sin turiones. Leyendo la monografía de V.
acerca de los Rubus portugueses noto que los gallegos son casi los mismos, y aunque el Sr. Pau me dio
algunas determinaciones, pero como nuestros Rubus se apartan tanto de los generalmente conocidos,
en algunas determinaciones ha debido cuidar cerca, pero no con la especie verdadera. V. tiene no solo
ejemplares en abundancia, sino que conserva fresca la reminiscencia de los caracteres, podrá con
relativa facilidad y con seguridad determinar aquellos que lo pueden ser los que no tengan suficientes
elementos, dejelos hasta que busque mejores ejemplares». Segue-se uma lista de 46 exemplares, a
maioria identificados, mas alguns sem identificação, e outros identificados mas interrogados. «En los
nombres puestos me refiro á la obra de V. Confieso que con la clase de ejemplares que van, tan
deficientes bajo muchos conceptos, pues se necesitaria haber tenido aficion al tiempo de la recoleccion
para hacerlo con más cuidado, solo V. por la razon antes dicha puede descifrar algunos si quiera.
Algunas de las especies que indico me parecen indubitables; pero en esto como en todo lo demás estoy
á su criterio». B. Merino confiava assim plenamente no conhecimento que G. Sampaio tinha dos
Rubus, reforçado pela ideia correcta que a flora galega era muito próxima da minhota e que C. Pau, não
tão bom conhecedor da flora do noroeste peninsular, estaria menos habilitado para a determinação dos
Rubus galegos. Mais uma vez a resposta de G. Sampaio terá sido rápida, porque B. Merino escreve
rejubilado a 7 de Março de 1905: «Recibí con gran satisfacción su postal del 3 del corriente y lo
agradezco infinito el trabajo que V. se toma en revisar las imperfectas muestras que he conservado.
[…] Con la monografía de V. y el libro de Focke havemos en el futuro, […] Pues por lo que yo he
podido observar, Galicia es rica y variada en especies de este genero […] Un millón de gracias […]
para […] estimada oferta de especies portuguesas que, a lo que yo presumo, han de ser iguales ó
parecidas á las gallegas». As contribuições de C. Pau e G. Sampaio para o estudo dos Rubus galegos
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
58
aparecerão explícitas na Flora da Galiza de B. Merino publicada em 1905 (MERINO, 1905). No texto
introdutório ao género Rubus, B. Merino reconhece que, para a sua elaboração, foram decisivas duas
contribuições. «Gracias á las indicaciones de nuestro estimado y reputado botánico Sr. Pau83, y á la
magnifica monografía que recientemente ha dado á luz el señor Sampaio sobre los «Rubus
portuguezes», podemos presentar un esbozo del variadísimo conjunto, no exento de novedades, que
presenta los Rubus de nuestra region». Reconhece que a flora galega era muito semelhante à
portuguesa (minhota) e dado que existia um especialista português em Rubus (portugeses) «para mayor
garantía de acierto, no fiándonos de nuestro propio estudio en género ten complejo, resolvimos someter
nuestra colección imperfecta […]» ao exame por G. Sampaio. «Como conclusion calcula el referido
batólogo [G. Sampaio] que deben existir en Galicia unas 50 especies, [B. Merino estaria a incluir aqui
as raças e variedades, quiçá também os híbridos] de ellas varias nuevas para la ciencia botánica ó
cuando menos para la Península Ibérica, como sucede con el R. dumnoniensis Rabington». No entanto,
B. Merino adverte que, em relação ao Rubus galegos, o trabalho era provisório: «las especies de este
género que enseguida exponemos, no son con mucho todas las de pueblan el país galáico». Termina o
texto introdutório referindo que 14 das espécies referidas na flora tinham sido determinadas por G.
Sampaio e que «las descripciones que siguen, excepto tres, son la obra del Sr. Sampaio traducidas ó
compendiadas, no sin previo examen de los ejemplares». Após a publicação deste volume da flora
galega, B. Merino ofereceu um exemplar a G. Sampaio, que terá respondido, elogiando o trabalho do
seu colega galego. B. Merino escreve para G. Sampaio em 8 de Outubro de 1905, em papel timbrado
do «Colegio del Apóstol Santiago, La Guardia», voltando a prometer recolher Rubus para o seu colega
portuense: «La opinión que V. ha formado de mi libro me lisonjea no poco y me anima á proseguir la
tarea. […] En mis viajes de herborizacion he tenido en cuenta sus encargos del genero Rubus. Le
remitiré una abundante y, á lo que yo creo, bastante curiosa colección, lo malo es que los ejemplares
más interesantes cogidos en los elevados picos de Ancarés a 1,400-1,600 metros tardaron más de un
mes en reunir al colegio […]». Em relação aos Rubus, podemos portanto concluir que G. Sampaio deu
uma contribuição significativa para o estudo das espécies galegas. A colaboração entre os dois
botânicos continuará até 1914.
Na sequência da publicação da monografia, G. Sampaio terá contactado os colégios ligados à
Broteria, onde em todos existia um herbário. Contactou o Colégio de S. Fiel, dado que a 15 de Junho
de 1905, J. S. Tavares lhe responde: «Muito prazer nos dará vindo aqui estudar os Rubus. Espero que
83
MERINO (1901) reconhecia o auxílio de C. Pau no estudo da flora galega da seguinte forma: «Sr. Pau, á cuyo ilustrado
criterio he sometido gustoso todas las especies galegas, que de algún modo se apartan y diferencian de las ya conocidas en
otras regiones».
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
59
não serão só as espécies desse género que lhe hão de interessar aqui. A estação de Castello Novo fica
a 4 kilometros do Collegio». Mas o botânico jesuíta decide, de qualquer forma, enviar plantas para G.
Sampaio, dado que no dia seguinte, escreverá: «envio inclusa a guia de um caixote que leva as
Labiadas do nosso herbário e que V. Exa. ahi conservará o tempo que lhe forem precisas. Como está
com a mão na massa, peço-lhe o obsequio de as rever, e de escrever num papel à parte os nomes que
houver de rectificar.[...] Com as Labiadas vão também dois Rubus do Tirol, que peço o obsequio de os
determinar».
G. Sampaio tinha recebido os fascículos I e II da importante exsicata «Batotheca Europaea» e
obterá também o fascículo III, como se constata pelo bilhete-postal de H. Sudre, com o carimbo de
Toulouse e datado de 25 de Novembro de 190584: «J’expédié aujourd’hui le 3e. fascicule du Batotheca.
Veuillez bien m’en accuser réception. Je n’ai pas eu de nouvelles du 2e. J’espère qu’il vous est
parvenu. N’avez-vous rien récolté cette année?». H. Sudre estava naturalmente interessado na
participação de G. Sampaio como colector desta exsicata, como se pode ler num bilhete-postal, com o
carimbo de Toulouse e datado de 13 de Fevereiro de 1906: «J’espère que le 3e. fascicule du Batotheca
vous est parvenue, et que pour le prochain il vous sera possible de me préparer quelques centuries de
Rubus». H. Sudre iria publicar uma monografia dos Rubus europeus em 1908-1913 e volta a contactar
G. Sampaio em 1910. Num bilhete-postal com o carimbo de Toulouse e datado de 23 de Abril, H.
Sudre escrevia: «Vous me feriez plaisir en me communiquant un exemplaire (par la poste) de la plante
que M. Focke appelle Rubus epidasys (R. tomentosus Samp. Rubus Portuguezes 53). Je vous la
retournerai sans retard. Je dessine en ce moment les espèces de la section tomentosi pour une Rubi
Europae, dont le texte [...] et je voudrais bien connaître votre plante pour en parler utilement. Je
regrette que vous ne vous occupiez plus de Rubus, surtout à cause de mon Batotheca, qui en est
aujourd’hui à son 7e. fascicule et qui en comportera au moins une douzaine». Esta será a última carta
conhecida de H. Sudre para G. Sampaio. Não terá havido mais permutas de Rubus com este rubologista
francês.
A. Hayek, botânico austríaco, já tinha permutado exemplares de Rubus com G. Sampaio, mas
tendo-lhe chegado às mãos uma colecção de Rubus colhidos pelo conceituado rubologista Sabransky e
sabendo dos interesses do seu colega portuense, escreve a G. Sampaio a perguntar se estaria interessado
nesta invulgar colecção. Numa carta datada de 10 de Abril de 1906, escreverá: «Par hasard j’ai reçu
juste maintenant une collection riche de Rubus de la Stirie, dont je vous peux envoyer des doublettes.
Les echantillons sont presque tous receuillis par Mr. Sabransky qui demeure à present à Sochau dans
84
Assim como pela análise da colecção de Rubus coligida por G. Sampaio.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
60
la Stirie. Les éspèces et formes nouvelles sont décrites dans […] Je serais bien heureux si vous
pourriez m’envoyer en echange de nouveau quelques plantes du Portugal». Trocar Rubus de Sabransky
por espécimes da flora portuguesa era uma excelente oportunidade e G. Sampaio terá aproveitado.
Apesar de não termos mais nenhuma carta deste botânico austríaco, a extensa colecção de Rubus
colhidos por Sabransky em 1905, uns com a etiqueta do Herbário Hayek e outros com a etiqueta
original do seu colector, que permanece na colecção de Rubus de G. Sampaio atesta que a permuta
seguramente se efectivou.
As permutas com W. R. Linton continuaram também. Em carta datada de 22 de Setembro de
1907, W. R. Linton escreverá para G. Sampaio: «A prêsent je vous envoi toutes les plantes que je
pouvais obtenir de vos desiderata. J’espère de vous envoyer un autre paquet après la saison prochain
si je pouvais les obtenir […] Les Rubi de Portugal que vous m’avez donné sont semblablement bonnes
espèces, et ils bien ressemblent les plantes Anglaises. Est-ce que vous avez le « Handbook of British
Rubi » par Rev. W. M. Rogers ? […] C’est une exposition des Rubi anglais très excellent».
6. Mais estudos dos Rubus portugueses
Como organiza G. Sampaio a continuação do seu estudo sobre os Rubus, após a publicação da
monografia?85 G. Sampaio continuará a estudar os Rubus e a enriquecer a sua colecção, se bem que a
um ritmo muito mais moderado86. W. O. Focke publica em 1914 a sua obra monográfica fundamental
85
A obra de G. Sampaio sobre os Rubus, as suas colecções de herbário de Rubus e a taxonomia do género Rubus na
península ibérica tem sido objecto de estudos modernos por MONASTERIO-HUELIN (1992, 1993, 1998). O conceito de
espécie neste género é hoje muito diferente do que era na geração de G. Sampaio. Nas primeiras décadas do século XX
tinham já sido propostas muitas centenas de espécies neste género, tornando-se a taxonomia do género muito complexa e
impraticável. Muitas das «espécies» criadas nesta época restringiam-se a áreas pequenas. Muitas destas «espécies» não
foram localizadas hoje nos locais onde foram observadas há um século atrás, provavelmente devido às suas características
instáveis. Para MONASTERIO-HUELIN, seguindo a formulação do investigador Weber, só devem ter a categoria de espécie, as
comunidades de Rubus que tenham uma área de distribuição superior a 50 km2. As comunidades de menor área são
consideradas como formas locais e poderão modificar-se com alguma rapidez no tempo. O seu número elevadíssimo e a sua
instabilidade tornam-nas de muito difícil enquadramento taxonómico, sendo nos recentes tratamentos taxonómicos do
género Rubus listadas (mas não classificadas) junto das espécies afins. Está no entanto fora do contexto deste trabalho a
análise do trabalho de G. Sampaio à luz destes conceitos modernos de espécie no género Rubus.
86
Nos trabalhos publicados até à monografia de 1904, inclusive, G. Sampaio tinha proposto os seguintes táxones novos
(espécies, raças e variedades) e novas combinações no género Rubus, todos acompanhados de diagnose em português: R.
bifrons var. duriminius Samp., R. caldasianus Samp., R. nitidus var. lusitanicus Samp., R. portuensis Samp., R.
rhamnifolius var. australis Samp., R. trifoliatus Samp. (em SAMPAIO, 1903a); R. brigantinus Samp., R. Coutinhi Samp., R.
koehleri var. gerezianus Samp., R. villicaulis raç. beirensis Samp. (em SAMPAIO, 1903b); R. Henriquesii Samp. (em
SAMPAIO, 1904a); R. minianus Samp., R. subincertus Samp., R. vagabundus Samp. (em SAMPAIO, 1904b); R. peculiaris
Samp., R. peratticus Samp. (em SAMPAIO, 1904c); R. discerptus var. maranensis Samp., R. incurvatus var. minianus
(Samp.) Samp., R. lusitanicus var. signifer Samp., R. mercicus var. castranus (Samp.) Samp., R. obtusangulus raç. beirensis
(Samp.) Samp. (em SAMPAIO, 1904e). Alguns destes nomes seriam posteriormente alterados ou emendados por G. Sampaio.
Em trabalhos posteriores proporá ainda mais a seguinte espécie nova que acompanhará de uma diagnose em latim: R.
herminicus Samp. (em SAMPAIO, 1912a).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
61
«Rubi Europaei». A. X. Pereira Coutinho publica, em 1913, a primeira edição da sua «Flora de
Portugal» (COUTINHO, 1913), onde naturalmente aborda o género Rubus.
Retomemos o intercâmbio entre G. Sampaio e W. O. Focke. Como referimos, o rubologista
alemão em carta de 31 de Dezembro de 1904 insistia para que o seu colega portuense lhe enviasse
exemplares de Rubus. G. Sampaio acedeu positivamente ao pedido, dado que o rubologista alemão
responde numa mensagem curta em bilhete-postal com o carimbo de Bremen, datado de 30 de Março
de 1905: «j’ai le plaisir de vous accuser la réception de votre envoi. Je vous remercie sincèrement
pour la collection intéressante. Je n’ai pas encore examiné un seul échantillon, mais j’ai vu au premier
coup d’œil que votre R. Coutinhi est le R. Lespinassei Clavand. Un paquet pour vous suivra bientôt».
Dois meses depois, a 30 de Maio, W. O. Focke envia a G. Sampaio uma carta onde detalhadamente se
pronuncia sobre os 18 exemplares que este lhe tinha enviado com as respectivas identificações. A
resposta de W. O. Focke é significativa porque muitos dos exemplares que tinham sido identificados
por G. Sampaio como suas espécies novas e diversas das identificações, não são contestadas por W. O.
Focke. Este facto significa que Focke terá lido o trabalho de G. Sampaio recebido em Dezembro do ano
anterior e que terá reconhecido a validade das espécies novas nele propostas? A parte inicial da carta é
breve e Focke parece estar naquela altura com pressa porque «À présent je suis engagé dans l’étude des
Rubi exotiques». Na segunda folha da carta temos então os comentários de W. O. Focke às
identificações de G. Sampaio. Qual o balanço? Os exemplares com os números 1, 5 e 14, identificados
por G. Sampaio como R. subincertus, R. portuensis e R. Henriquesii, não são contestados. Nos
exemplares números 7, 12, 15 e 16, W. O. Focke discorda da identificação. A resposta de W. O. Focke
em relação ao exemplar que tinha sido identificado como sendo R. Coutinhi, que Focke considera ser
uma espécie já descrita - R. Lespinassei, parece ter influenciado G. Sampaio, dado que na sua revisão
do Rubus integrado no «Manual» e nas «Listas das espécies», irá retirar o R. Coutinhi e citar o R.
Lespinassei.
O tema dos Rubus será recorrente com os seus colegas de Lisboa e Coimbra. Em 1909, A. X.
Pereira Coutinho irá encontrar em Sintra um Rubus que lhe parece então ser uma espécie ou variedade
nova. Não sabemos se já teria o exemplar de Rubus quando inicia com G. Sampaio uma série de trocas
de impressões sobre este género. Em carta datada de 25 de Maio de 1909, A. X. Pereira Coutinho
parecia querer reorganizar a colecção de Rubus da Escola Politécnica e retomar o estudo deste género:
«O herbario da Escola Polytechnica tem hoje os exemplares de Rubus provenientes do seu herbario,
cuja lista remetto inlcusa, e que V. Exa. em tempos fez o favor de me dar, mas faltam-lhe muitos
outros, cuja lista extrahi dos seus Rubus Portuguezes, e envio conjuntamente. Muito desejo completar,
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
62
tanto quanto possivel esta collecção, e V. Exa. muito me obsequeia cedendo-me alguns exemplares de
que tenha duplicados, ou guardando nas suas futuras herborizações exemplares das especies que
faltam e n’esta ocasião não tenha duplicado». Segue-se uma enumeração dos exemplares então
existentes no herbário da Escola Politécnica. «Desejo tambem saber se V. Exa. posteriormente a este
trabalho dos Rubus portuguezes modificou a sua opinião ácerca de alguma das plantas alli descriptas,
ou se lhes acrescentou já algumas especies ou fórmas descobertas depois. Por ultimo, vendo n’este seu
citado trabalho que considera como pertencendo ao R. ulmifolius a maior parte dos exemplares que eu
e o C. de Ficalho tinhamos referido ao R. [...] muito desejo conhecer a sua opinião acerca da
determinação d’aquelles que inscrevemos sob o nome de R. discolor (alguns são da Sociedade
Broteriana) e muitos dos quaes é muito provavel, segundo julgo, que tambem sejam fórmas da mesma
especie». G. Sampaio terá atendido o pedido do seu colega lisboeta, dado que a 14 de Junho de 1909,
A. X. Pereira Coutinho agradecia os exemplares de Rubus: «Por ultimo a sua collecção de Rubus é
optima, e muitissimo lh’a agradeço». Entretanto, A. X. Pereira Coutinho teria escrito a G. Sampaio
sobre o novo Rubus que tinha encontrado em Sintra e este terá pedido informações adicionais ao seu
colega de Lisboa. A 3 de Julho de 1909, A. X. Pereira Coutinho escrevia: «Appareceram em Cintra
mais uns exemplares, embora pouco abundantes do mesmo Rubus; estes teem bons turiões, mas o que
são é bastante menos glandulosos». Os exemplares são enviados alguns dias depois. Em carta datada
de 15 de Julho de 1909, A. X. Pereira Coutinho escrevia a G. Sampaio: «Recebi hontem a sua carta,
que muito lhe agradeço, e no correio de hoje remetto exemplares dos dois Rubus em que lhe falei,
colhidos ambos em Cintra. O mais interessante dos dois, que designo R. cintranus, é muito proximo do
seu R. Coutinhoi; julgo mesmo que se lhe deve ligar como uma subespecie, mas a este respeito é que
muito desejo a sua opinião. Tem o facies do R. Coutinhoi, mas diverge por caracteres importantes,
como são os ovarios glabros […] É claro que a questão de considerar uma certa planta como
subespecie d’outra ou especie distincta é uma questão apenas de bitola adoptada. Mas, pergunto –
quem, por exemplo, considerar o R. Genevieri como subespecie do Radula, não tem […]». Este R.
cintranus irá de facto ser considerado por G. Sampaio no seu «Manual» e nas «Listas das espécies»,
como uma variedade nova, não do R. Coutinhi, mas do R. cunctator Focke.
Por diversas vezes, J. Henriques envia exemplares de Rubus para o seu colega portuense
identificar. O tom é de assumida dificuldade com este género. Em carta datada de 12 de Julho de 1911,
J. Henriques escrevia: «Remeto-lhe tres exemplares de Rubus. Acertaria com os nomes específicos?».
Alguns anos mais tarde, a 5 de Fevereiro de 1915, desabafava desta forma: «Mando hoje um Rubus e
peço que veja se os determina, podendo ficar com duplicados, se os houver. Custa-me a entender com
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
63
estas creaturas. Vai um com o nome de R. radula, que me parece que já viu. Desde já agradeço». E a 9
de Agosto de 1917 escrevia para G. Sampaio no mesmo tom: «Hoje mando um Rubus, que recebi das
proximidades de Paredes de Coura. Que espécie será? Não me entendo com taes plantas».
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
64
V. A importância da Sociedade Broteriana e do seu Boletim
1. Fundação da Sociedade e seus objectivos
A Sociedade Broteriana foi criada em 1880 por iniciativa de J. Henriques. Como porta-voz da
Sociedade Broteriana, aparece o «Boletim da Sociedade Broteriana». O primeiro volume, referente aos
anos de 1880-1882, é publicado em 1883 pela Imprensa da Universidade em Coimbra.
Neste volume inaugural, J. Henriques apresenta a Sociedade e o seu Boletim, num texto datado
de Dezembro de 1882 (BSB, I). A necessidade da criação da Sociedade é apresentada como decorrente
do atraso em que se encontrava o país em estudos botânicos. Em Portugal, depois de Brotero (portanto
tinha passado quase um século), a investigação na área da Botânica encontrava-se estagnada: «Em
todas as as nações cultas o estudo da flora occupa a attenção de muitos naturalistas, e póde dizer-se que
em todas ha numero consideravel de obras descriptivas de incontestavel valor. Portugal tem feito
excepção a esta regra. Além dos trabalhos do dr. Brotero pouco mais ha. O nosso paiz tem sido
explorado botanicamente mais por extrangeiros do que por nacionaes. As explorações botanicas do dr.
Welwitsch, feitas sob a protecção da Academia Real das Sciencias, marcam um novo período na
Botanica portugueza, porque depois d’elle alguns individuos têm procurado seguir-lhe o exemplo»87.
Seguidamente, J. Henriques justifica a necessidade da criação de uma sociedade científica que
promovesse a superação da crise da Botânica nacional - «Parte d’essas difficuldades podem ser
vencidas vantajosamente por meio da associação, e por isso tentei em 1879 a formação d’uma
sociedade, cujos membros se auxiliassem mutuamente trocando entre si os productos das suas
herborizações e dando para o herbario da Universidade um certo numero de plantas em paga do
trabalho que ahi poderia ser feito para a exacta determinação das especies e distribuição dos
exemplares colhidos pelos socios. D’esta fórma reduzido o campo de exploração a uma pequena área
para cada socio, o trabalho collectivo daria resultados importantes, que de outro modo não seriam
facilmente realisados, e o estudo das especies colhidas, feito no herbario da Universidade, facilitaria de
certo a boa determinação especifica, havendo alli elementos para isso essenciais, taes como livros, e
principalmente um herbario importante, composto na sua maior parte de plantas da região mediterranea
87
Aqui parece injusta a omissão da «Flore Portuguaise», realizada por Link e Hoffmansegg, se bem que pode estar incluído
na referência que J. Henriques faz às explorações por estrangeiros. Em texto publicado alguns anos depois, J. Henriques irá
homenagear devidamente estes dois botânicos alemães. Ao fazer o balanço da actividade da Sociedade Broteriana na década
de 1880, J. Henriques escrevia no volume VIII do Boletim publicado em 1890 que «o desejo do grande naturalista» Lineu
«só muito tarde começou a ser satisfeito. Trabalharam para isso o dr. Brotero, o professor Link e o conde de Hoffmansegg»
(BSB, VIII).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
65
e muito especialmente de Hespanha, coordenado pelo professor Willkomm, um dos auctores do
Prodromus Florae Hispaniae».
Estava traçado o objectivo primordial da Sociedade Broteriana88 - a inventariação do
património florístico nacional -, e o método de trabalho: divisão do país em regiões; herborização de
cada região por um sócio; confirmação das identificações dos espécimes pelo herbário da Universidade
de Coimbra; distribuição de exemplares já identificados pelos sócios.
J. Henriques explica como conseguiu reunir o núcleo inicial fundador da Sociedade - «me dirigi
ás pessoas que pela posição official ou por seus trabalhos especiaes poderiam constituir a associação.
No primeiro caso estavam os agronomos e intendentes de pecuaria dos districtos, para os quaes é de
incontestavel vantagem o conhecimento da vegetação espontanea da região sobre que elles têm
inspecção». De seguida diz que teve êxito na iniciativa, e que já tinham sido distribuídas plantas aos
sócios e a instituições. Termina enunciando o objectivo primeiro da sua Sociedade: «refazer a Flora
lusitana», ou seja reformular e modernizar a flora de Brotero.
Neste mesmo volume inaugural do Boletim podemos ler o regulamento da recém criada
Sociedade Broteriana, onde se encontram naturalmente cristalizadas as ideias-força enunciadas por J.
Henriques. No artigo 1.° determinava-se que o objectivo da Sociedade Broteriana era «o estudo da
flora portugueza, promovendo a formação de herbarios locaes e dando elementos para o herbario» da
Universidade de Coimbra. Na Sociedade existiam duas classes de sócios. Os sócios da designada classe
A podiam oferecer plantas para o Herbário da Universidade de Coimbra e «promovem e auxiliam o
estudo da flora portugueza». Os sócios que serão designados da classe B e cujo número não podia
ultrapassar 30, tinham a responsabilidade de recolher «um numero de especies de plantas não inferior a
6 e em tantos exemplares, quantos forem os socios mais quatro». A que se destinavam estas plantas?
Destinavam-se a ser distribuídas pelos mesmos sócios (as quatro suplementares ficavam no Herbário da
Universidade de Coimbra), desta forma constituindo-se os «herbarios locaes» e enriquecendo-se o
Herbário da Universidade, como era objectivo fundamental da Sociedade89.
O artigo 3.° estabelecia que «os socios não devem offerecer para troca plantas que já tenham
sido distribuidas», garantindo desta forma que as distribuições eram sempre de espécies originais,
88
Encontramos objectivos semelhantes em outras sociedades botânicas da época como por exemplo a «Sociedad Botánica
Barcelonesa» (HERMIDA, 1996).
89
Esta ideia era seguida na Europa por muitas sociedades, jardins botânicos ou universidades, que por intermédio deste
sistema distribuíam ricas colecções de plantas. Em Espanha houve várias destas distribuições em que participou G. Sampaio
(ver Capítulo VIII). A ideia das distribuições era notável e foi determinante na formação dos principais herbários europeus.
O esforço individual não era muito (quem colhe um exemplar, colhe facilmente duas ou três dezenas) e a recompensa era
grande (recebiam-se em troca espécimes de espécies às vezes raras ou desconhecidas na região onde se vivia).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
66
formando-se assim uma colecção que se tornaria cada vez mais rica. No artigo 5.° indicavam-se os
requisitos indispensáveis para os exemplares a serem enviados pelos sócios: «bem seccados» e
«acompanhados d’uma etiqueta, que indique: a) o nome da especie; b) o nome do socio que a colheu;
c) a epocha do anno em que foi colhida; d) a localidade; e) qualquer indicação util, tam como a altitude,
natureza do terreno, usos locaes da planta etc.». Estas indicações eram indispensáveis para um segundo
propósito da Sociedade (enunciado no artigo 4.°) que era «o estudo geographico das plantas
portuguezas». O Herbário da Universidade de Coimbra constituía o núcleo agregador e dinamizador e
era responsável pela identificação das plantas enviadas pelos sócios, ou confirmação das identificações
prévias apostas pelos sócios nas plantas, como consta do artigo 6.°: «examinadas as plantas e
convenientemente determinadas no Jardim de Coimbra, serão distribuídas por todos os sócios, de modo
que cada um receberá uma collecção completa das plantas que foram colligidas por todos, ficando no
mesmo Jardim os exemplares que cada um mandar a mais»90.
Quais os sócios fundadores da Sociedade Broteriana? De acordo com o regulamento, o número
máximo de sócios da classe B era 30, como já referimos. De acordo com a lista apresentada no
primeiro volume do Boletim, existiam 22 sócios (B) na fundação da Sociedade. Salientam-se os nomes
de A. X. Pereira Coutinho, A. Ricardo da Cunha e J. Daveau em Lisboa e E. Johnston, Eugenio
Schmitz, Isaac Newton e J. Casimiro Barbosa na região do Porto. Quais os sócios da classe A?
Curiosamente eram em menor número dos que da classe B, 18. Encontramos os nomes de Conde de
Ficalho, Jayme Batalha Reis, professor do Instituto Agrícola de Lisboa, A. Möller, A. Luso da Silva91,
e Francisco de Salles Gomes Cardoso, lente da Academia Politécnica do Porto. Estacio da Veiga,
arqueólogo, era também sócio da classe A. O arranque da Sociedade não podia ser mais auspicioso.
Nas décadas seguintes nunca o número de sócios envolvidos nas distribuições irá ser tão elevado. No
volume II do Boletim são mencionados 17 sócios B, no volume III, 19, no volume IV e V, 18, em 1888
já só 16 e em 1889, só 10. No volume VIII referente a 1890 são mencionados 12 sócios B, mas nos
anos seguintes só 9.
90
O Herbário da Universidade de Coimbra, com J. Henriques como director e J. Mariz como naturalista, era, na época,
quiçá a instituição mais credenciada e apta para a identificação de plantas vasculares do nosso país. Neste herbário estava
integrado o notável Herbário de Willkomm, adquirido por iniciativa de J. Henriques, uma decisão histórica de grande
alcance. Era constituído por 100.000 exemplares representando 10.000 espécies, principalmente da região mediterrânea.
Tinha servido de base ao «Prodromus Florae Hispanicae», trabalho basilar de Willkomm e Lange sobre a flora portuguesa
(BSB, X:6-7; FERNANDES, 1977) J. Henriques com 42 anos de idade em 1880 (A. X. Pereira Coutinho só tinha 29 anos; G.
Sampaio tinha 15 anos, só irá inscrever-se como aluno da Academia Politécnica em 1890) assumia assim a liderança da
renovação da Botânica sistemática em Portugal.
91
Augusto Luso da Silva nasceu no Porto em 1827. Foi professor do Liceu do Porto. Publicou um compêndio de Geografia.
Era também naturalista tendo estudado moluscos terrestres e fluviais de Portugal. Estreou-se como poeta em 1853. Morreu
no Porto em 1902 (GEPB).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
67
2. As distribuições de plantas aos sócios
Nas duas décadas de 1880 e 1890, a actividade da Sociedade Broteriana, no seu principal
propósito de distribuir plantas e promover a constituição de herbários locais, irá ser impressionante e
avassaladora, como se constata pela leitura do seu Boletim. Em 1880 iniciam-se as distribuições de
plantas pelos sócios (recolhidas pelos próprios sócios). São distribuídas 126 espécimes
(correspondentes a igual número de espécies) de algas, musgos e angiospérmicas. Nos anos
subsequentes continuarão as distribuições, sempre mais de uma centena de espécimes por ano, que
abrangerão todos os grupos considerados como plantas na época: algas, fungos, líquenes, fetos,
hepáticas, musgos, gimnospérmicas e angiospérmicas. Apesar deste último grupo ser o mais numeroso
(como seria de esperar dado que era na altura o mais bem conhecido), é notável a diversidade de
plantas distribuídas pela Sociedade. De 1880 a 1889 foram distribuídas 1265 exemplares de herbário
pelos sócios, com a seguinte distribuição por grupo: algas (50); fungos (6); líquenes (18); hepáticas (5);
musgos (25); pteridófitas (26); gimnospérmicas (1); monocotiledóneas (218); dicotiledóneas (916). As
distribuições continuarão até 1906, se bem que a um ritmo menos acelerado. Nos anos de 1890, 1891,
1892, 1893, 1895, 1896, 1902 e 1903-1906, os totais das distribuições atingiram 1347, 1410, 1461,
1516, 1566, 1689, 1748, 1806, respectivamente. Ao fim de mais de duas décadas de distribuições, a
Sociedade Broteriana tinha portanto distribuído aos seus sócios (B) o número impressionante de 1806
espécimes (correspondendo a aproximadamente igual número de espécies) de todos os grupos de
«plantas». Não era obviamente toda a flora portuguesa, mas em termos de angiospérmicas era um bom
retrato!
3. A «Flora lusitanica exsiccata»
Podemos escrever, ironicamente, que aparentemente ainda «sobrava» tempo à equipa do
Herbário da Coimbra, dado que no volume IV do Boletim da Sociedade publicado em 1886, J.
Henriques anuncia o início da «Flora lusitanica exsiccata»: «Les plantes portugaises étant en general
assez rares dans les herbiers, le Jardin botanique de l’Université de Coimbra commencerá cette année
la publication regulière de plantes du Portugal et peut-être des colonies. On ne vendra pas ces plantes,
mais elles seront données en echange d’autres plantes»92. A «Flora exsiccata lusitanica» organizou-se
92
A «Flora lusitanica exsiccata» era portanto vocacionada para a permuta com instituições congéneres estrangeiras - por
essa razão J. Henriques escrevia em francês. O intercâmbio entre botânicos e sociedades científicas era, na época, intenso e
J. Henriques partilhava desta ideia bem moderna da verdadeira comunicação e troca franca de ideias e plantas entre
investigadores e instituições. Ao fazer um balanço dos primeiros anos de vida da Sociedade Broteriana, J. Henriques
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
68
em centúrias (100 exemplares). Nos anos de 1886, 1887, 1888, 1889 e 1890, foram produzidas duas
centúrias em cada ano. Portanto no fim de 1890 tinha sido distribuída uma exsicata lusitanica
constituída por 1.000 espécimes. A exsicata continua nos anos subsequentes, mas com a distribuição de
uma centena de plantas por ano até 1893 e a partir deste ano, uma centena de dois em dois anos até
1899. Termina em 1911 com a centúria XIX. A «Flora lusitanica exsiccata» seria portanto constituída
por 1900 espécimes de plantas (correspondendo a um número aproximadamente igual de espécies).
Quais os grupos representados? Assim como nas distribuições aos sócios, foram incluídos na exsicata
exemplares de algas, fungos, líquenes, hepáticas, musgos, fetos, gimnospérmicas e angiospérmicas,
sendo naturalmente este último grupo, o mais representado. Nas primeiras centúrias, a maioria dos
exemplares da exsicata foram recolhidos por A. Möller. Uma parte dos exemplares da exsicata foi
recolhida pelos sócios da Sociedade.
A produção desta exsicata era um esforço adicional para a equipa do Herbário da Universidade
de Coimbra. Olhando hoje para o volume de trabalho conjunto das distribuições e da exsicata lusitanica
podemos imaginar o que significou de esforço monumental para a reduzidíssima equipa do Herbário da
Universidade. Este facto era salientado por J. Henriques no volume XV do Boletim (1898): «No
herbario os trabalhos continuaram com toda a regularidade, apesar do limitadissimo pessoal. Fez-se a
distribuição relativa ao 16.° anno da Sociedade Broteriana e a da 15.a centuria da Flora lusitanica
exsiccata. O numero de exemplares distribuidos quer de especies portuguezas, quer de plantas
africanas, foi de 2:700. O numero de especies recebidas, quasi todas por troca, foi de 4:126
representado por 4:826 exemplares. Todo o serviço de separação das collecções, expedição e
distribuição das plantas recebidas pelos respectivos logares no herbario é executado por um unico
empregado, auxiliado por um pequeno rapaz. Não sei se haverá repartição dos estabelecimentos
officiaes onde o pessoal seja tão diminuto e o trabalho tão regular e, póde-se dizer, não bem pago»93. J.
Henriques, ao fazer o balanço da actividade da Sociedade Broteriana na década de 1880 no volume
VIII do Boletim, elogiava e agradecia o trabalho dos seus colaboradores, J. Mariz e A. Möller: «A estes
nomes» dos sócios B, «não posso deixar de juntar mais dois, o do Sr. Joaquim de Mariz Junior, e o do
sr. Adolpho F. Möller, jardineiro-chefe do jardim botanico. Ambos tem tido uma parte importantissima
escrevia no volume III do Boletim referente ao ano de 1884: «A Sociedade póde e deve entrar em relações com sociedades
analogas estrangeiras, algumas das quaes têm já pedido essas relações. Seria facil estabelecer a troca de plantas [...] Muitos
botanicos desejam com egual interesse receber plantas de Portugal». A exsicata lusitanica iniciada em 1886 estava portanto
na mente de J. Henriques já há alguns anos.
93
A rotina seria imensa: receber as plantas enviadas pelos sócios; fazer colheitas próprias; identificar e confirmar
identificações; elaborar etiquetas, mandar imprimir, verificar; expedir (na época era por caminho de ferro); receber outras
exsicatas em troca.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
69
no progresso dos estudos botanicos em Portugal, um estimado zelo e constancia as plantas portuguezas,
outro explorando cuidadosa e intelligentemente grande numero de regiões de Portugal».
G. Sampaio irá participar na exsicata da Sociedade Broteriana já no fim da sua distribuição. Irá
enviar plantas para as distribuições e receber plantas distribuídas pela Sociedade. A mais antiga
referência que encontrámos é um bilhete-postal de J. Mariz, datado de 18 de Julho de 1895 em que
escrevia que ficava «certo de lhe remetter para o Porto as plantas da Sociedade. Serão enviadas até ao
dia 15 d’Agosto, porque conto que a impressão das etiquetas esteja feita esta semana». Anos mais
tarde, J. Mariz dirigia-se a G. Sampaio em bilhete-postal datado de 9 de Abril de 1904, «Para calcular
o numero de especies que precisamos colher n’esta temporada para completar as nossas collecções de
distribuição, tenho empenho em V. Exa. me diga se effectivamente podemos contar com algumas
plantas das suas proficuas explorações do verão passado em Traz-os-Montes e outras localidades do
norte, das quaes V. Exa. nos prometteu partilha para a Sociedade Broteriana e Centurias». G.
Sampaio terá respondido rapidamente a esta carta, porque numa outra de J. Mariz, datada de 14 do
mesmo mês, pode lêr-se: «Com resposta ao obsequio da carta de V. Exa. de 11 do corrente agradeço e
acceito o offerecimento das plantas com que deseja contemplar o nosso herbario, bem como as
especies para as nossas distribuições (phanerogamicas); com relação aos lichens, só poderemos
acceitar para a proxima distribuição as especies que forem novas para Portugal, porque já estão
apartados para a colecção presente grande numero de fungos que nos mandou o Prof. de S. Fiel, J. da
S. Tavares, e não podemos deixar de representar nas collecções um numero maior de phanerogamicas.
É muito natural que as nossas distribuições se façam depois do meado de junho e então esta falta será
preenchida pelas plantas que V. Exa. offerece, por colheitas novas e sobejos»94.
4. O Boletim da Sociedade Broteriana
A edição do Boletim, que tanto esforço consumia a J. Henriques, tinha no entanto uma grande
recompensa que consistia nas publicações estrangeiras que recebia em troca95. Logo no volume II do
Boletim se agradecia o intercâmbio da publicação da Sociedade Broteriana com duas publicações. O
número de permutas cresceu exponencialmente à medida que o Boletim era conhecido e ganhava
94
Por esta carta vemos que o Colégio de S. Fiel também participava na exsicata da Sociedade Broteriana. Assim como G.
Sampaio enviava líquenes para o Colégio de S. Fiel, também participava com o envio de líquenes para a exsicata da
Sociedade. O interesse de G. Sampaio por líquenes é pois muito precoce, apesar das suas publicações mais importantes
sobre este grupo só surgirem bastantes anos mais tarde.
95
Esta permuta de publicações entre instituições e sociedades científicas de ciências naturais manteve-se até aos dias de
hoje (se bem que no presente muito diminuída), estando na origem da formação da maioria do acervo das nossas bibliotecas
universitárias de ciências naturais.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
70
prestígio no país e no estrangeiro. No volume XV do Boletim (1898), J. Henriques assinalava que o
Boletim tinha sido permutado por 60 revistas. No volume XVI (1899), já se assinalavam 78
publicações periódicas permutadas. No volume XVIII (1901), referem-se 72 publicações permutadas
com o Boletim.
A edição do Boletim da Sociedade Broteriana foi sempre para J. Henriques uma das suas tarefas
prioritárias. As dificuldades económicas foram sempre grandes. Ao escrever sobre a Sociedade
Broteriana no volume III do Boletim, J. Henriques reconhecia e agradecia o subsídio governamental:
«O governo, a requerimento meu, concedeu a composição e impressão do Boletim na Imprensa da
Universidade, auctorisando a despeza até 90$000 réis annuaes. É um grande auxilio, sem o qual o
Boletim mal poderia sustentar-se. Comtudo não é auxilio suficiente, por que a despeza de impressão
excede aquella verba, e a essa despeza vai juntar-se ás despezas com o papel, estampas, etc. Procurei
remediar as difficuldades convidando varias pessoas, ás quaes não seria indifferente o progresso dos
estudos botanicos em Portugal, para fazerem parte da Sociedade, pagando anualmente a quantia de
1$000 réis, que se poderia considerar como importancia da assignatura do jornal. O numero das
adhesões a este convite foi consideravel e espero que pouco a pouco se tornará maior». Uma das causas
para o elevado custo da produção do Boletim era o número reduzido de exemplares.
Nas largas dezenas de cartas e bilhetes-postais que J. Henriques escreveu para G. Sampaio são
raras as que não mencionam o Boletim e em particular as dificuldades económicas da sua edição.
Numa carta dirigida para G. Sampaio, datada de 9 de Agosto de 1917, J. Henriques queixa-se do custo
do papel para a impressão do Boletim: «Há primeiro que ver a questão do papel. É caro atendendo ao
preço. Pelo empregado no vol. XXVII [...] Não haverá no Porto papel que sirva e por preço
accessivel?». Nos últimos anos de vida, J. Henriques torna-se pessimista em relação à viabilidade da
edição do Boletim, quiçá pela sua avançada idade. Numa carta datada de 6 de Dezembro de 1920, J.
Henriques queixava-se a G. Sampaio: «Bom era continuar a publicação do Boletim mas não há
dinheiro. Não sei ainda como será [...] É de crêr que seja necessario parar com a assinatura de jornais
[...]». No ano seguinte, sente-se nas palavras de J. Henriques a idade avançadíssima e a dificuldade em
assegurar a direcção do Boletim. Escrevia para G. Sampaio em carta datada de 9 de Agosto de 1921:
«As estampas devem ficar muito caras na prezente ocasião. Bom seria que tivesse dinheiro para
continuar a publicação. Se estivesse tão pobre como nós nada poderia fazer. Brevemente mandarei o
volume XXVIII do Boletim. Será o último? O Carrisso [J. Henriques referia-se a L. W. Carrisso] e o
Quintanilha [J. Henriques referia-se a A. Quintanilha] entendem que deve continuar, mas para isso é
necessario ter colaboradores. Eu pouco posso fazer. É necessaria gente nova. O meu amigo é que
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
71
poderá dar bom auxilio, seu filho [J. Henriques referia-se a Joaquim Sampaio] e o Pires de Lima [J.
Henriques referia-se a A. Pires de Lima] também, e de Lisboa, o Ricardo Jorge [J. Henriques referia-se
a A. Ricardo Jorge]. Aqui o Carrisso e o Quintanilha podem tambem ajudar. Que diz? Eu tinha posto
no principio do volume uma resenha do que tinha feito o Boletim, e fazia as minhas despedidas e
agradecimentos. Ainda hoje o Quintanilha me perguntou se eu sempre estava disposto a rasgar essa
primeira folha. Não sei o que farei. Se houvesse quem queira colaborar, rasgarei a folha. Pode
continuar a publicação com o mesmo titulo ou outro. Em todo o caso deve continuar a ser o orgão dos
que em Portugal estudam a flora do país ou outros estudos botanicos. Dê-me a sua opinião». No início
de 1922 J. Henriques escreve a G. Sampaio novamente por causa do custo elevado do papel. Num
bilhete-postal datado de 6 de Fevereiro, podemos ler: «Escrevo este postal para pedir um favor. Não
descobrirá no Porto papel que sirva para Boletim do Instituto Botanico? Tenho escrito a varias
fabricas, mas ou não respondem, ou mandam amostras que não servem. No estabelecimento do Sr.
Domingos não haverá cousa que sirva? Eu desejo papel branco, fino, bem calandrado, para servir
para gravuras. As medidas do formato do Boletim são as seguintes – 0,26 x 0,18, em volume já
aparado. Deve por isso o papel dar um pouco mais. Desejo começar a impressão e não posso. Veja se
descobre [...] mande uma folha e indicação do preço de 1000 quilos». O assunto parece ter sido
resolvido, dado que a 23 deste mesmo mês, J. Henriques escrevia para G. Sampaio: «Recebi tambem
uma amostra de papel mandada pelo Sr. J. Gonçalves que serve muito bem e já foi feita a
encomenda». As dificuldades com a edição do Boletim continuavam, mas também o desejo em
prosseguir. A 24 de Outubro de 1922 escrevia para G. Sampaio: «Estou vendo que a vida do Boletim
não poderá ser longa por falta de dinheiro pois se agora há amigos que conseguem ter dotação para a
publicação não espero que os haja sempre. [...] P. S. – O seu amigo espanhol que se ocupa com os
fungos não quererá publicar o que se referir a Portugal no nosso Boletim?»96.
Pouco tempo depois, a 22 de Dezembro de 1922, novamente J. Henriques falava das
dificuldades da edição do Boletim, escrevendo com lucidez: «Se me faltar o subsidio oficial não
poderemos continuar a publicação [...] Se fora um jornal politico alguns teria, mas jornal botanico é
objecto de luxo, a que poucos ligam importancia». Finalmente, num bilhete-postal datado de 1 de Abril
de 1924, escrevia para G. Sampaio: «Não tenho esperança de poder continuar com a publicação do
Boletim. A Imprensa leva muito dinheiro pela impressão do jornal, as separatas ficam muito caras.
Deste volume, há 50 para o Fragoso, 50 para si, 50 para o seu filho [...]». O volume XXVIII será de
96
J. Henriques referia-se a R. G. Fragoso. Este investigador irá de facto publicar um trabalho no volume do Boletim de
1923 (ver Capítulo XI).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
72
facto o último volume do Boletim com a direcção exclusiva de J. Henriques. Tinha passado 40 anos à
frente da publicação. O trabalho realizado era notável, mas a idade não permitia continuar. Inicia-se
uma nova série do Boletim em 1922, em que L. W. Carrisso97 e A. Quintanilha98 assumem a liderança
da publicação.
O zelo e até carinho com que J. Henriques trata a edição do Boletim da Sociedade Broteriana
transparecem em muitas das cartas e bilhetes-postais que escreveu para G. Sampaio. O número de
botânicos portugueses era reduzidíssimo. Existia a «concorrência» de outras publicações de ciências
naturais, como as publicações da Sociedade Portuguesa de Ciências Naturais, da Academia Politécnica
do Porto e, a partir do início da década de 1900, a «Broteria». G. Sampaio irá publicar 14 dos seus
trabalhos no «Boletim da Sociedade Broteriana», ao longo de toda a sua carreira científica. Existia a
apetência natural para G. Sampaio publicar nas edições da sua Academia Politécnica e também da
Broteria, com quem tinha relações de colaboração científica e de amizade. Em carta datada de 24 de
Novembro de 1902, J. Henriques terminava com o seguinte desabafo: «Pelo que me diz, parece-me que
se inclina a publicar os seus trabalhos no Anuário da Academia Polytechnica. Espero em todo o caso
que alguma coisa dará para o Boletim, que deve ser continuado e que deve offerecer interesse aos
especialistas. O número de collaboradores é tão diminuto, que pena é em fugir d’elles os que muito
poderiam fazer». Em carta datada de 16 de Janeiro de 1905, J. Henriques queixava-se a G. Sampaio:
«O número de collaboradores é tão diminuto que se torna dificil completar qualquer volume. O meu
amigo prefere outras publicações e fico por isso privado do seu concurso. Posso, é verdade,
reproduzir os seus escriptos com a devida autorização, mas como sabe, os originais têm mais valor».
J. Henriques tenta, permanentemente, captar para o Boletim os trabalhos de G. Sampaio. Mas umas
vezes tinha «material a mais» - as colaborações excediam o espaço disponível, outras vezes a menos –
as colaborações não chegavam para completar o volume, como é compreensível para uma revista que
era publicada regularmente (em geral anualmente) e a produção científica dos colaboradores
97
Luís Wittnich Carrisso (1886-1937) nasceu na Figueira da Foz. Terminou o seu curso na Faculdade de Filosofia de
Coimbra e doutorou-se na Faculdade de Ciências de Coimbra em 1911. Em 1918 é professor catedrático e assume a
direcção do Jardim e do Instituto de Botânica da Universidade de Coimbra, por jubilação de J. Henriques. Foi Reitor da
Universidade de Coimbra. Reorganiza a Sociedade Broteriana e assume a direcção do seu Boletim. Dedicou-se
principalmente à botânica ultramarina, estudando a flora de Angola. Morre prematuramente em 1937 (GEPB; CARVALHO,
1939; CORREIA, 1939; COUTINHO, 1939a; FERNANDES, 1939; QUINTANILHA, 1975).
98
Aurélio Quintanilha nasceu em Angra do Heroísmo em 1892. Licenciou-se em Ciências Naturais pela Faculdade de
Ciências de Lisboa em 1919. Entra então para assistente da Universidade de Coimbra, onde se doutora em 1926, com um
estudo sobre um grupo de fungos aquáticos («Contribuição ao estudo dos Synchytrium»). Em 1928 é professor catedrático
da Universidade. De 1928 a 1931 especializa-se em genética de fungos com Kniep na Alemanha. Regressa a Coimbra.
Publica em 1933 «Le problème de la sexualité chez les champignons». Afastado do serviço e aposentado em 1935, parte em
1943 para África, onde organiza os serviços de investigação científica e experimentação agrícola do algodoeiro (GEPB;
FERNANDES, 1962, 1975; QUINTANILHA, 1975).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
73
naturalmente que oscilava. Em carta datada de 3 de Maio de 1904 respondia negativamente a um
pedido do seu colega portuense: «Respondendo ao seu postal tenho a dizer que não é possivel a
publicação no Boletim. Começou agora a composição do vol. XX com o catálogo descriptivo das
gramíneas e como está não se pode intercalar outro trabalho. Sinto ter de dar-lhe esta resposta. Se o
catálogo ainda não estivesse começado, ainda poderia entrar o seu trabalho; agora não pode ser».
Em carta datada de 23 de Junho de 1908, escrevia J. Henriques para G. Sampaio: «Não tem
escripto que possa servir para o Boletim da Sociedade Broteriana?». A resposta terá sido positiva,
dado que J. Henriques escrevia a 3 de Setembro: «Agradeço a sua carta e fico esperando o manuscrito
para ir para a imprensa na 2ª. Feira». Numa carta datada de 25 de Março de 1911, J. Henriques
terminava uma carta para G. Sampaio: «Vou começar a impressão do volume XXVI do Boletim. Não
terá nada para elle?». Em outras ocasiões, acontecia a situação inversa. Numa carta datada de 6 de
Dezembro de 1920, J. Henriques escrevia a G. Sampaio: «Sinto muito não poder publicar o estudo dos
Ulex. O vol. XXVIII ultimo está quase no fim».
Também A. X. Pereira Coutinho publicou diversos trabalhos no Boletim. Às vezes a demora na
publicação impacientava o professor de Lisboa. Desabafava para G. Sampaio a 20 de Maio de 1907:
«Tenho todos os meus trabalhos da especialidade no Boletim da Sociedade Broteriana e gostava de
alli os reunir todos, porque se não fosse isso não tinha dado para lá o manuscripto, mas está-me a
parecer que vou imprimir as Labiadas por outra parte; talvez pela Academia».
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
74
VI. A importância da Broteria e dos jesuítas botânicos na Botânica sistemática
1. A fundação da Broteria em 1902
A Broteria inicia a sua publicação em 1902 com o subtítulo de «Revista de Sciencias Naturaes
do Collegio de S. Fiel»99. Encontramos nas primeiras páginas uma fotografia da estátua de Avelar
Brotero que se encontra no Jardim Botânico da Universidade de Coimbra. Ao escolher uma designação
associada à figura do ilustre botânico português do século XVIII, a revista Broteria assumia-se assim
como de botânica e de ciências naturais em geral100.
A introdução ao volume 1.°, publicado em 1902 (B, I), inicia-se com a frase «A esperança de
podermos concorrer de algum modo para o progresso das sciencias naturaes em Portugal é que nos
anima á publicação da presente Revista». O naturalista tem de seguir métodos de investigação
rigorosos, mas deve contemplar, respeitar e amar o seu objecto de estudo – a natureza101: «A idéa de
concorrermos, por pouco que seja, para propagar o gosto das sciencias naturaes em nossa patria enchenos de alegria. A natureza é um livro immenso, que tem ainda muitas folhas por abrir»102.
Seguidamente assumem a sua atitute cristã - o amor a Deus passa por amar a Natureza, sua obra: «Ora
em todas ellas [as folhas do livro] se encontra escripto o nome augusto do Creator. E será acaso
pequena satisfação ao abril-as mostrar nellas a grandeza de Deus, que tanto se estampa na immensidade
dos mundos, como na extrema pequenez de myriades de animaes e plantas, cuja existencia só o
microscopio nos revela? [...] Desenvolver as sciencias naturaes é pois, como que dar a mão á
intelligencia para a elevar á suprema verdade que é Deus». Os redactores explicitam então qual será o
conteúdo da revista: «estudo systematico da fauna e flora [...] anatomia e a histologia tanto animaes
como vegetaes». Constatam e muito bem que são pioneiros nesta revista, dado que «nenhum
estabelecimento de ensino secundario em Portugal [...] tenha até agora publicado revista alguma
scientifica». Assinalam que a sua área prioritária de estudo será a zona envolvente do Colégio de S.
Fiel, «que vae dos arredores de Castello Branco até Manteigas e Ceia». Terminam a introdução,
homenageando o seu patrono e prometendo seguir-lhe as passadas: «o titulo adoptado para a nossa
Revista representa por um lado a justa homenagem do nosso reconhecimento ao celebre naturalista
portuguez, Felix d’Avelar Brotero; por outro lado ser-nos-ha de incitamento a bem merecer da partia
99
No centenário da revista Broteria foi editada uma monografia evocativa com contribuições diversificadas sobre a história
da revista (RICO & FRANCO, 2003). Agradecemos à Dra. Maria José Carvalho, bibliotecária do Colégio Nuno Álvares
(Caldas da Saúde, Santo Tirso), importantes indicações bibliográficas sobre a matéria deste capítulo.
100
A esta atitude não estava seguramente alheia a formação e interesses dos fundadores da Broteria – eram padres jesuítas,
mas também investigadores de grande nível e reputação em diversas áreas da botânica e da zoologia.
101
Sobre a pedagogia das ciências naturais vista pela Companhia de Jesus ver GORGUES (1996) e FRANCO (2003a).
102
Seguramente que no início do século XX muito trabalho estava por fazer na flora e fauna do nosso país.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
75
que elle tanto honrou, e tornar-nos-ha mais benevolo o acolhimento dos nossos trabalhos entre os
portuguezes que se prezam de o ser»103.
Neste 1.° volume da Broteria, C. Zimmermann inicia a publicação de um extenso texto sobre
«Microscopia vegetal» (ZIMMERMANN, 1902, 1903, 1905, 1906). Antes de abordar propriamente a
matéria científica, C. Zimmermann escreve sobre a pedagogia das ciências naturais (que seria também
a prática no Colégio de S. Fiel). Os pontos de vista que expressa revelam uma correcta percepção de
como se deve ensinar uma ciência experimental como a Biologia104. Aborda a importância da
microscopia no ensino das ciências naturais. Salienta a importância de serem os próprios alunos a
confeccionarem as preparações microscópicas que irão observar, porque desta forma «se despertava
entre os alumnos [...] aquelle enthusiasmo de [...] observar, estudar e descrever». Para o autor, o
fundamento da pedagogia das ciências naturais residia em conseguir «infundir nos animos juvenis [...]
amor e enthusiasmo [...] á materia que lhes é ensinada». Salienta, correctamente, a importância capital
da observação – a prática, primeiro: «verias então os noveis anatomistas com ideias claras e precisas
das coisas, em logar das ideias vagas, ligeiras e muitas vezes incorrectas e falsas que adquiriram no
estudo dos livros, embora adornados de estampas, estudo que ordinariamente se faz aborrecer por
fatigar a memoria», não só por uma questão de princípio metodológico, mas também por efeitos na
aprendizagem, dado que o «que se vê grava-se mais profundamente que o que se leu ou ouviu».
Partindo sempre da observação para a elaboração de interpretações explicativas, e regressando
novamente à observação para confirmação das hipóteses colocadas. Deve o professor fazer notar ao
aluno «o engano em que cahiu, e persuade-o de que na observação foi precipitado e se deixou guiar por
preconceitos, parecendo-lhe ver o que imaginava, e não o que realmente havia de ver». «O professor,
em logar de lhes corrigir immediatamente o erro, obriga-os a novas investigações e novo exame [...]
assim pouco a pouco se acostuma o discipulo a uma observação minuciosa [...] os repetidos enganos, as
continuas correcções que tem de fazer aos proprios juizos, fazem-lhe conceber uma salutar
desconficança de si mesmo. [...] Acautelar-se-ha n’aquillo que diz: não proporá nem aceitará como
verdadeira uma affirmação, cuja evidencia está longe de possuir». Acusa mesmo que o «ensino das
sciencias [...] na quasi totalidade dos estabelecimentos litterarios em Portugal é demasiada, para não
103
Cândido Mendes de Azevedo, ao fazer um balanço da actividade inicial da Broteria escrevia, num suplemento ao
fascículo de Março-Abril de 1913 «um grupo de professores se propôs estudar a fauna e a flora de Portugal. Reuniram
materiais de estudo, adquiriram livros, travaram relações com especialistas nacionaes e estrangeiros, começaram collecções,
cada um na sua especialidade; mas, para que os estudos feitos fossem de proveito mais amplo e duradouro, sentiam a
necessidade de os publicar» (AZEVEDO, 1913).
104
Sobre uma pedagogia moderna das ciências naturais no ensino secundário ver os aprofundados trabalhos de PAN (1949a,
1949b).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
76
dizer exclusivamente, theorico». A observação é primordial em Biologia, não só para a microscopia
(em foco neste trabalho), como para qualquer área das ciências naturais: «sem elle [espirito de
observação] o naturalista assemelhar-se-hia a um viajante melancholico e apathico que, atravessando
verdejantes prados e campos cheios de fructos, não reparasse nas variegadas bobinas e flores de que
estão matizados, cerrasse os ouvidos ao alegre chilrear das avezinhas e não se deixasse impressionar
dos encantos da paizagem que o rodeia». C. Zimmermann faz imbuir a admiração (o amor) pela
Natureza, na sua própria observação. Não duvida que seja possível contemplar e observar
(cientificamente).
Das palavras de C. Zimmermann, à semelhança do que podemos ler na introdução geral a este
volume da Broteria, transparece a forma como entendia a Natureza – admiração, gosto, amor e respeito
por todas as criaturas vivas. A microscopia era importante no avanço da Biologia da época, dado que
tinha revelado «um novo mundo ou multidão de seres notaveis pela fórma, propriedade e sobretudo
pelo numero incalculavel, os quaes pela sua pequenez se furtavam aos olhos». Estes pequenes seres
«pela microscopia ficam sob o dominio e ao alcance dos nossos sentidos; estudam-se, analysam-se,
admira-se-lhes a natureza e importancia capital». O microscópio, sendo um veículo para observar os
seres e as estruturas muito pequenas, podia ser utilizado para descobrir o mundo maravilhoso do
microscópico, mas também para inculcar este amor, «admiração e enthusiasmo» pelas criaturas vivas.
Naturalmente sendo C. Zimmermann padre jesuíta, entendia a observação da natureza pela microscopia
também como «um grande incentivo e poderoso estimulo de piedade e amor de Deus, que tudo fez e
ordenou com medida, peso e sabedoria summa». O amor à Natureza era louvor a Deus: «Quantas
vezes, extasiado e como que arroubado ante as maravilhas que nas minhas preparações o microscópio
me patenteava, eu louvei a Deus, tão minucioso, delicado e perfeito em suas obras!».
O texto de C. Zimmermann também revela o investimento que o Colégio de S. Fiel fazia no
adequado apetrechamento das salas de aula para o ensino das ciências naturais. Afirma
peremptoriamente que a microscopia devia fazer parte do ensino secundário, não devendo estar
restringida aos cursos superiores. C. Zimmermann acusa mesmo que «infelizmente muito se tem
descurado em Portugal o uso do microscopio no ensino secundario. Se exceptuarmos alguns collegios
de ensino particular, rarissimos são os lyceus do Estado em que os alumnos aprendam a trabalhar com
o microscopio. Contentam-se com a mera descripção do instrumento, sem aproveitar as innumeras
vantagens e proveitos que do seu uso podem tirar-se». Mas C. Zimmermann nem quer atribuir todas as
culpas aos responsáveis do Estado e afirma que a culpa «vem, em grande parte pelo menos, de se
desconhecer a facilidade relativa que ha em obter» preparações para observação microscópica. Sendo
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
77
este o diagnóstico, C. Zimmermann pensava contribuir para remediar a situação precisamente
explicando como era fácil e simples a confecção de preparações para observação de material biológico,
sendo este, ao fim e ao cabo, o objectivo do trabalho que iniciava. «Se com isto conseguir que alguns
dos meus illustres collegas se animem a estudos micrographicos, e assim contribuir para que aos seus
alumnos seja ministrado um ensino practico, que no estudo da anatomia vegetal é o unico proficuo,
dar-me-hei por bem pago do trabalho que tomei». Outra contrariedade apontada por muitos professores
era o tempo necessário à confecção das preparações microscópicas: «Todos se lastimam de que este
lhes falta para taes estudos, mórmente no começo do magisterio». Mas para C. Zimmermann
«economizando-o e aproventando-o bem, não faltará talvez», podendo até estas tarefas ser encaradas
como «tempo de descanço», sendo «recreação e passatempo proveitoso». Naturalmente que poderia
haver estes requisitos mas faltarem os instrumentos e utensilios indispensaveis. Para C. Zimmermann
«vencer [...] esta difficuldade compete ao governo, e vergonha será que negue aos lyceus o que estes
precisam para a boa instrução dos alumnos». O autor endurece então a sua linguagem, terminando em
conclusão que «o governo não pode negar os subsidios, ao menos para apparelhos indispensaveis na
instrucção secundaria, e um d’estes é, sem duvida, o microscopio».
Quem eram os fundadores da Broteria105? A ideia parecer ter partido de J. S. Tavares106, então
professor no Colégio de S. Fiel, ao qual se juntaram C. Zimmermann107 e C. M. Azevedo108, também
professores neste Colégio (AZEVEDO, 1913; LEITE, 1931; FRANCO, 2003a, 2003b). Estes três
professores constituíam a direcção da revista, tendo como colaboradores destacados, A. Luisier109
105
Sobre a fundação e os primeiros anos da Broteria ver o pormenorizado trabalho de FRANCO (2003a), que também
apresenta biografias exaustivas dos fundadores e directores da revista (FRANCO, 2003b).
106
P.e Joaquim da Silva Tavares (1866-1931) nasceu em Cardigos. Estuda Humanidades e Filosofia no Colégio de Setúbal,
de 1882 a 1888, ingressando oficialmente na Companhia de Jesus em 1888. Ensina no Colégio de Campolide e no Colégio
de S. Fiel. Termina a sua formação religiosa em Viena (Áustria) em 1899, regressando a Portugal. Ensina durante um ano
no Colégio de Setúbal. Em 1901 estabelece-se no Colégio de S. Fiel. É director do Herbário e do Museu de História
Natural. Funda a Broteria. Em 1908 é nomeado Reitor do Colégio. Na sequência da implantação do regime republicano,
exila-se em Salamanca, e depois no Brasil. Fixa residência na Baía em colégio jesuíta, onde logo em 1912 continua a
publicação da Broteria, que agora se sub-intitula «Revista Luso-Brazileira». Em 1914 regressa à Galiza. Em 1928 regressa
definitivamente a Portugal. Entomologista desde cedo, especializa-se no estudo das cecídias, em especial nas deformações
das plantas induzidas por insectos, tornando-se num reputadíssimo especialista desta matéria. Publica dezenas de artigos
científicos. É um dos fundadores da Sociedade Portuguesa de Ciências Naturais. Em 1928 torna-se sócio efectivo da
Academia das Ciências de Lisboa. É membro de diversas academias e sociedades científicas estrangeiras. Faleceu em Paris.
São-lhe dedicados diversos táxones, de que se destacam três géneros novos para a ciência: Tavaresia Kief., Tavaresiella del
Guercio e Silvatares Nav. (GEPB; LEITE, 1931). Parte da colecção de cecídias de J. S. Tavares encontra-se hoje no Colégio
Nuno Álvares.
107
Biografia em FRANCO (2003b).
108
Biografia de Candido Mendes de Azevedo em FRANCO (2003b).
109
P.e Alphonse Luisier (1872-1957) nasceu em Frignoley (Suíça) e morreu no Colégio Nuno Álvares. Ingressa na
Companhia de Jesus aos 19 anos. Faz os seus estudos teológicos em Innsbruch (Áustria). A diversidade botânica do Tirol
terão despertado, no jovem padre jesuíta, o gosto pela botânica, em particular pelos musgos e hepáticas. Ensina no Colégio
de Campolide entre 1907 e 1910. Com a expulsão dos padres jesuítas após a implantação da República em 1910, exila-se
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
78
(então do Colégio de Torres Vedras), Antonio da Costa e Oliveira Pinto e Camillo Torrend (do Colégio
de Campolide), Longinos Navás (de Saragoça) e Manuel Rebimbas (a viver na Bélgica). A maioria dos
fundadores da Broteria estava associada à fundação da «Sociedade Portuguesa de Sciencias Naturaes»
(AZEVEDO, 1913). J. S. Tavares, C. M. Azevedo e L. Navás eram distintos especialistas em
entomologia, C. Zimmermann em microscopia, histologia vegetal e diatomáceas, A. Luisier em
briófitas, A. C. Oliveira Pinto em física e química, e C. Torrend em sistemática de fungos.
2. O Colégio de São Fiel
A sede da Broteria estava no Colégio de S. Fiel, em Louriçal do Campo, perto de Castelo
Branco110. Neste colégio «educavam uns 350 alunos, pensionistas e gratuitos, vindos de todas as
provincias de Portugal e colonias [...] Era allí que se publicava a Broteria, e por isso se tornara um
centro scientifico dos mais importantes [...] onde acudiam os naturalistas estrangeiros a pedir
informações e materiaes de estudo para as suas especialidades. Aqui tinha a Broteria uma bibliotheca
de sciencias naturaes, das melhores de Portugal, e uma completa installação de microscopia. Aqui tinha
um herbario, em que, a par de um estimavel numero de phanerogamicas, avultava uma grande
collecção de cryptogamicas inferiores, como de fungos, musgos, lichens e algas. O museu de Zoologia,
alem da colecção de mammiferos e aves da região, em que havia algumas especies raras, encerrava
uma collecção de insectos, rica pela variedade e novidade das especies que continha. Para o publico
estava exposta uma parte só dos orthopteros, nevropteros e lepidopteros da Europa, do Brazil e das
colonias portuguezas, assim como parte das collecções de zoocecidias das mesmas regiões (esta ultima
collecção era a unica da Peninsula Ibérica). As outras collecções, de hymnopteros, hemípteros, dipteros
e coleopteros, encerravam elementos de grande valor; mas, assim estas como aquellas, iam-se
preparando e estudando, segundo o tempo e as circunstancias o permittiam. Havia uma collecção de
preparações microscopicas, para o estudo da anatomia e histologia, tanto animaes como vegetaes,
em Salamanca, onde reside na rua Serranos, 2. Herboriza intensamente nesta região. Alguns anos mais tarde desloca-se para
o «Colegio del Pasaje» em La Guardia, onde ensina e dirige a Broteria. Regressa finalmente a Portugal em 1932. Dirige a
série de Ciências Naturais da Broteria e ensina no Colégio Nuno Álvares. Publica em 1924, «Musci Salmanticenses»,
descrevendo 184 táxones, incluindo vários novos para a ciência. Conhecedor profundo da flora briológica da Madeira,
publica «Les Mouses de Madère» (1917-1922), e uma segunda edição sob o título «Les Mousses de l’Archipel de Madère et
en general des Îles Atlantiques» (1927-1932, 1938, 1942, 1945). Publica ainda dezenas de trabalhos de briologia. É um dos
fundadores da briologia moderna. É Doutor Honoris Causa pela Universidade do Porto em 1942 e titular da insígnia da
Ordem Militar de Santiago do governo português. Em sua homenagem têm sido dedicados táxones novos para a ciência:
Luisieria fariae Tav., Luisieria lantanae Tav. e Luisierella pusilla Ther., além de outros mencionados no presente trabalho.
A sua colecção de briófitas encontra-se hoje no Colégio Nuno Álvares. O seu carácter é definido por CASTELLARNAU
(1958): «Era austero, pero tratable y de un corazón bondadoso y muy caritativo» (GEPB; CASTELLARNAU, 1958; MELO,
1987).
110
Sobre o Colégio de S. Fiel ver GOMES (2003) e SALVADO (2003).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
79
trabalho de alguns collaboradores da Broteria» (AZEVEDO, 1913). O Colégio de Campolide em Lisboa
era outro dos centros de cultura científica dos fundadores da Broteria: «Outro centro scientifico era o
collegio de Campolide, onde eram professores boa parte dos redactores da Broteria. Ahi tinham as suas
collecções, algumas dellas importantissimas, como a de plantas phanerogamicas, as de fungos, musgos,
diatomaceas e mineralogia. Ahi tinham os livros e instrumentos das suas especialidades, que eram
varios ramos da historia natural, a microscopia, a physica e radiologia» (AZEVEDO, 1913).
3. A Broteria em 1907
Ao fim de alguns volumes, em 1907, a revista Broteria divide-se em três séries, uma de
vulgarização científica, outra de botânica, e uma outra de zoologia. As três secções permanecerão até
ao volume IX referente a 1910 (AZEVEDO, 1913). Na introdução ao volume 6.° (B, VI) é feito um
balanço dos primeiros cinco anos de actividade. O balanço era positivo: «descrevemos mais de 100
especies novas para a sciencia [...] publicámos a monographia de uma familia botanica, as biographias
de 4 naturalistas portuguezes, uma duzia de artigos sobre entomologia [...] quasi outros tantos sobre
cryptogamicas inferiores e um tratado completo de technica microscopica vegetal [...] apresentámos
aos leitores bastantes artigos de vulgarização [...] encetámos já o estudo de uma das mais difficeis
ordens da entomologia – a dos Nevrópteros, e neste volume começamos a publicação de uma
monographia do grupo mais interessante dos fungos, qual é o dos Myxomycetas». E o desejo de
trabalhar (muito) também: «O programa da Broteria é vastissimo».
4. Os fundadores da Broteria e a Sociedade Broteriana
Os futuros fundadores da Broteria inscrevem-se como sócios da Sociedade Broteriana no fim da
década de 1890 e irão participar nas distribuições de plantas da Sociedade, na flora lusitanica exsiccata
e no Boletim. A. Luisier, C. Zimmermann e J. S. Tavares aparecem pela primeira vez como sócios e
participando nas distribuições para os anos de 1899-1902, no Boletim de 1902 (BSB, XIX). Participam
nas distribuições de 1903-1906 (BSB, XXI). Participam também na «Flora lusitanica exsiccata» nas
centúrias XIX (BSB, XXVI). A. Luisier publica um trabalho sobre a flora da região de Setúbal no
Boletim da Sociedade (BSB, XIX).
5. G. Sampaio e Alphonse Luisier
Apesar de G. Sampaio só publicar o seu primeiro trabalho na revista Broteria em 1916, os
contactos entre os fundadores da Broteria e G. Sampaio datam de muitos anos antes e remontam ao
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
80
início da década de 1900. G. Sampaio estabeleceu uma longa e rica troca epistolar e científica, tanto
com A. Luisier como com J. S. Tavares, que se prolongou por mais de duas décadas, desde o início da
década de 1900 até depois de 1920.
A. Luisier, em carta datada de 30 de Setembro de 1901, remetida do Colégio de Setúbal,
escrevia para G. Sampaio: «Devo tambem accusar a recepção das plantas que V. Exa. me mandou e
que muito me interessam». G. Sampaio terá enviado exemplares de musgos para o seu colega jesuíta.
Num bilhete-postal datado de 12 de Junho de 1907, endereçada do Colégio de Campolide, A. Luisier
agradecia os exemplares: «Recebi da Livraria Lopes um caixote com [...] pastas de musgos. Agradeço
cordealmente tão grande favor. [...] Espero encontrar na colleção bom material para os meus estudos
biologicos». Em nova carta datada de 20 de Setembro deste mesmo ano, A. Luisier escrevia regozijado:
«Estive estes dias a examinar os musgos da Academia Polytechnica que V. Exa. me mandou. No meio
de um Dicrarum seojanicum colhido por V. Exa. em Ponte de Lima, no logar chamado Formogoso,
encontrei um Campylopes que me parece ser o C. flexuosus. Infelizmente não tem esporoforos. Se há
essa especie, é novo para Portugal. Daqui a alguns dias irei para o Colégio do Barro, Torres Vedras,
onde tenciono demorar-me até ao mez de Agosto de 1908, mas em occupações que não darão muito
logar a estudos botanicos. Peço instantemente a V. Exa. que me guarde alguns exemplares dos musgos
que encontrar. Brevemente remeterei para o Porto os musgos que V. Exa. me mandou com mais
alguns». Existia naturalmente intercâmbio recíproco entre os dois botânicos. Um dos géneros que
mereceu atenção particular a G. Sampaio foi o Ulex. G. Sampaio pediu exemplares emprestados a
vários herbários, nomeadamente àqueles a que A. Luisier estava ou tinha estado ligado. A 7 de Julho de
1910, A. Luisier respondia: «mandei há já dias os exemplares que aqui tenho dos Ulex que o amigo
deseja. Infelizmente estão em muito mau estado. O herbario do Collegio de Setubal esteve muito
abandonado durante annos, depois de eu sair de Setubal. O Collegio fechou-se. No anno passado
tratei de trazer para Campolide esse meu herbario que tanto trabalho me tinha custado e assim ainda
pude salvá-lo em parte, mas os insectos tinham feito obra muito conscienciosa. [...] O estudo dos Ulex
portugueses creio que não é nenhuma brincadeira». Alguns dias depois, talvez porque de facto os
exemplares não estivessem em condições, A. Luisier escrevia numa carta datada de 19 de Julho de
1910: «O prazer que tive em ir domingo a Cintra para lhe procurar os Ulex que deseja [...] Desculpeme o meu amigo porque n’esta epocha de exames está todo o meu tempo tão preso que mal encontro
alguns instantes nos dias de semana. [...] Quando estudei a flora de Setubal, encontrei bastante
difficuldade na classificação dos Ulex porque não tinha senão uma obra ou outra [...]». E num bilhetepostal escrito pouco tempo depois, a 1 de Setembro, do Colégio de S. Fiel, «Desculpe-me a demora
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
81
involuntaria em lhe responder a agradecer a amabilidade que teve de me mandar uma prova da
classificação do genero Ulex. [...] Gostei muito das suas chaves dos Ulex, e se bem um trabalho d’este
genero só com o uso de pode devidamente apreciar, parece-me contudo que lhe posso desde já dar
com toda a justiça os mais calorosos parabens», mostrando que o intercâmbio era de espécimes mas
também de ideias. Outros assuntos eram objecto de troca epistolar entre A. Luisier e G. Sampaio. A.
Luisier escrevia do Colégio de Campolide para G. Sampaio a 27 de Setembro de 1907: «A pedido do
Dr. Fedde de Berlin traduzi para latim para serem publicadas no Reportorium speciarum novarum
regni vegetabilis, as diagnoses das especies e variedades novas descriptas por V. Exa. nas suas «Notas
criticas sobre a flora portugueza». Não julgo porém licito mandar essa tradução a Berlin, sem pedir a
autorização a V. Exa. e mandar-lhe o manuscripto para V. Exa. ver se esse vai exacto e interpretei
bem o pensar de V. Exa. Peço pois encarecidamente a V. Exa. me queira dar essa autorização quanto
antes [...] Há dias mandei para a Povoa de Lanhoso as segundas provas do seu artigo sobre os
ranunculus [...]». A 4 de Janeiro de 1910, A. Luisier pedia informações sobre as criptogâmicas do
Herbário da Academia, e desabafava sobre os seus musgos: «Um botanico italiano, o Dr. Travuso,
pede-me com instancia que lhe copiasse o catalogo dos fungos da sua lista de cryptogamicas da
Polytechnica do Porto. É um trabalho bastante grande. Lembrei-me pedir-lhe um exemplar d’esse
catalogo se ainda tem algum disponivel. [...] Estou actualmente rodeado de musgos. É preciso
aproveitar as férias para adiantar o trabalho de classificação».
Após o encerramento do Colégio de S. Fiel no pós-1910, A. Luisier exila-se em Salamanca e é
de lá que escreve a G. Sampaio numa carta datada de 28 de Fevereiro de 1914: «Muito me alegro com
a noticia da proxima vinda a Salamanca do meu excellente amigo e dos estudantes de botanica. Logo
que puder irei informar-me dos preços dos hotéis [...] Tenciono acompanha-los nas excursões
projectadas, mas eu ando sempre de batina. Espero que não será essa circunstancia desagradavel a
nenhuma das senhoras que vierem [...] Eu há muitos annos que deixei completamente de lado o estudo
das phanerogamicas para consagrar exclusivamente às muscineas os raros momentos livres que me
deixam as minhas outras occupações que actualmente são muitas. [...]». Em 1915, A. Luisier encontra,
nos arredores de Salamanca, uma Centaurea que não reconhece. A 4 de Junho envia a planta para G.
Sampaio estudar: «Por este correio mando parte de uma Centaurea que estimaria saber o nome. Como
tem muitos (vão só alguns) e grandes capitulos vae dentro de [...] Se não for demasiada maçada pedia
o favor de ma classificar. Porem não ha urgencia nenhuma». G. Sampaio terá ficado surpreendido.
Envia um exemplar para o seu colega de Coimbra. J. Henriques responde a 13 de Julho, confirmando a
novidade da descoberta: «Devolvo a Centaurea sem ter encontrado cousa comparavel. Á primeira vista
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
82
deu-me idea da C. vicentina Well., mas examinando-a vi que era diferente. [...] P.S. – Já depois deste
escrito percorri as Centaurea do herbário europeu e vi aproximações com a C. hellenica, mas só
aproximações». Era uma espécie nova. G. Sampaio dar-lhe-á o nome de Centaurea Luisieri em
homenagem ao seu descobridor, e publicará o trabalho na revista Broteria de 1916 (SAMPAIO, 1916c).
A. Luisier recebe o trabalho e escreve de Ciudad Rodrigo a 22 de Julho de 1916: «Recebi hoje e muito
penhorado agradeço as duas separatas bem como a nova prova de amizade que me deu dando o meu
nome á Centaurea de Salamanca». J. Daveau também recebe o trabalho e escreve a G. Sampaio a 24
de Julho de 1916 do Jardim Botânico de Montpellier com uma frase curiosa: «Hoje recebi os dois
folhetos, tratando um da Centaurea Luisieri sp. nov., outro de “Lichens” novos para flora portuguesa.
Agradeço sumamente reconhecido o favor d’esta offerta e felicito-o para ter encontrado n’um sitio tão
corrido como são arredores de Salamanca Centaurea nova para a sciencia. O Pe. Luisier teve a mão
feliz».
Ainda durante o exílio e após a passagem por Salamanca, A. Luisier ensina no «Colegio del
Pasaje» em La Guardia, na Galiza. Continua o seu estudo dos musgos. Em carta datada de 15 de Abril
de 1921 escrevia para G. Sampaio: «Devo os parabens a V. Exa. pelos seus trabalhos e em particular
pelo artigo sobre as Desmidicaceas. Eu continuo, conforme posso os meus trabalhinhos sobre os
musgos. Pouco tenho publicado: as ocupações do ensino não me dão vagar para mais além da
monographia dos musgos da Madeira que está em via de publicação e que terei o gosto de mandar a
V. Exa». Como director da Broteria, A. Luisier insistia amiúde na colaboração de G. Sampaio. Em
carta datada de 7 de Maio de 1921, A. Luisier elogiava o seu colega portuense e pedia colaboração para
a Broteria: «Sinto muito o mau estado da sua saude, o que atribuo em primeiro logar ao muito que teve
de soffrer fisica e moralmente nestes annos passados. E por isso não lhe occultarei a minha admiração
pelos valiosos e numerosos trabalhos scientificos que apesar de tudo continua a publicar. Se V. Exa.
puder collaborar no fasciculo de Dezembro que principia a se imprimir em Outubro, muito lhe
agradecerei». No ano seguinte, a 30 de Janeiro, A. Luisier escrevia para G. Sampaio: «O fasciculo de
Junho que será dedicado á botanica principia-se a imprimir na primeira [...] Conto com um artigo de
V. Exa.». Ao mesmo tempo que J. Henriques se queixava amargamente do custo da impressão do
Boletim da Sociedade Broteriana, também A. Luisier escrevia para G. Sampaio a 25 de Março de 1922:
«nesta ocasião em que a tipografia acaba de aumentar em 50% o preço da impressão!! Por este andar
não sei quanto tempo mais poderemos sobreviver».
6. Os Herbários dos Colégios de S. Fiel, Setúbal e Campolide
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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O Colégio de S. Fiel, o Colégio de Setúbal e o Colégio de Campolide «constroem» aos poucos
os seus herbários. As colecções do Colégio de Campolide são descritas por A. C. Oliveira Pinto em
dois artigos que publica na revista «O Nosso Colégio, 1908-1910» (ONC, 1908-1910; PINTO, 1910a,
1910b). As melhores colecções eram de fungos e musgos. «Uma das mais completas collecções de
fungos de Portugal [...] Dos myxomycetos é seguramente, depois da do British Museum, a mais
completa da Europa [...] das 283 especies conhecidas contem ella 199 especies; e entre estas algumas
muito raras e novas para a sciencia [só faltando] quasi exclusivamente especies criticas ou duvidosas
ou algumas rarissimas». O estudo dos mixomicetos era levado a cabo por C. Torrend, à época um dos
mais reputados especialistas deste grupo de fungos. Era autor de diversos artigos publicados na
Broteria e de uma «Flore Générale des Myxomecètes». As colecções de musgos continham exemplares
do continente e da Madeira. As colecções eram ampliadas pela compra de «exsiccata e outras
collecções já feitas ou assignará as que se estão distribuindo periodicamente», e «por meio de
excursões scientificas como as que já se fizeram [...]; trocas com outros naturalistas, donativos feitos ao
museu, etc.». Registam-se trocas de «fungos e musgos com naturalistas estrangeiros, principalmente
com a Sociedade de Berlim, Berliner Botanische Tauschverein». Colaborava-se com a Universidade de
Coimbra: «Fez-se [...] a clasificação de mais de 100 especies de fungos para o herbario de Coimbra, a
pedido do Ex.mo Sr. Dr. Julio Henriques ao nosso collega P. C. Torrend. Este trabalho apparecerá no
Boletim da Sociedade Broteriana num estudo de conjuncto da Mycologia portuguêsa, coordenado pelo
naturalista Sr. Traverso». A. C. Oliveira Pinto reconhece que «só a boa vontade e inquebrantável
energia de trabalho [dos] dois collaboradores, P. A. Luisier e P. C. Torrend» tinha permitido chegar tão
longe no ensino e na investigação em ciências naturais no Colégio de Campolide. De facto, pelas
descrições de A. C. Oliveira Pinto nestes dois artigos, a impressão é de actividade febril em ciências
naturais no Colégio de Campolide no fim da década de 1900.
O Herbário do Colégio de S. Fiel tornar-se-á num dos melhores do nosso país. As colecções
iniciam-se com C. Zimmermann em 1897 (TAVARES, 1924). Em 1903, J. S. Tavares assume a direcção
do herbário (TAVARES, 1924). Quem eram os principais colectores de exemplares para o Herbário de S.
Fiel? C. Torrend colhia fungos; A. Luisier, fanerogâmicas (da região da Arrábida enquanto esteve no
Colégio de Setúbal, e do Tirol, quando residiu na Áustria) e sobretudo musgos; Meniarth recolhia
plantas dos arredores do Colégio do Barro em Torres Vedras onde vivia; Valério Cordeiro, líquenes da
região de Setúbal; Manuel Pacheco, colhia algas; Sebastião Antunes, «empregado do Herbário»
também recolhia fanerogâmicas (TAVARES, 1924).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
84
Como seria de esperar, estabelece-se a troca de exemplares (e respectivas determinações e
também opiniões) com o Herbário da Academia Politécnica e com os de Lisboa e Coimbra. Já
referimos as trocas de material de herbário entre A. Luisier e G. Sampaio. Em outras ocasiões, as trocas
são dirigidas pelo seu director, J. S. Tavares. Em carta datada de 16 de Junho de 1905, endereçada da
«Revista de Sciencias Naturaes – Broteria - Collegio de S. Fiel» e dirigida a G. Sampaio. J. S. Tavares
escrevia: «envio inclusa a guia de um caixote que leva as Labiadas do nosso herbário e que V. Exa.
ahi conservará o tempo que lhe forem precisas. Como está com a mão na massa, peço-lhe o obsequio
de as rever, e de escrever num papel á parte os nomes que houver de rectificar. [...] No que diz
respeito á questão principal isto é a Nepeta multibracteata Brot., nós temos só duas Nepetas [...] No
dia 23 do corrente tenho que partir para Coimbra a acompanhar os alumnos que vão fazer exame de
7º. Ano. [...] Com as Labiadas vão também dois Rubus do Tirol, que peço o obsequio de os
determinar». E num bilhete-postal escrito poucos dias depois a 9 de Julho, J. S. Tavares escrevia: «e
assim mal poderei tratar de lhe arranjar plantas para o herbario da Academia. Mas creio que isso se
poderá fazer no próximo anno lectivo». G. Sampaio irá homenagear J. S. Tavares dedicando-lhe
algumas espécies novas, como por exemplo, Loeflingia Tavaresiana Samp.111.
7. A implantação da República
A implantação do regime republicano seria desastrosa para a actividade científica dos jesuítas
botânicos e para a Broteria. Logo no dia 8 de Outubro um decreto «expulsa, desnaturaliza e espolia de
tudo a todos os Jesuítas que residiam em Portugal» (AZEVEDO, 1913). Os padres jesuítas eram expulsos
de Portugal112 e a redacção da Broteria exilava-se no estrangeiro113 (AZEVEDO, 1913).
111
Loeflingia Tavaresiana Samp., dedicada «ao meu amigo P. Joaquim da Silva Tavares, professor do Collegio de S. Fiel e
distincto naturalista bem conhecido pelos seus estudos sobre as zoocecidias de Portugal» (SAMPAIO, 1905e).
112
Na Bélgica, os professores do Colégio de Campolide instalam-se no «Château de Dielighem» em Jette-Saint-Pierre-lezBruxelles e fundam o «Instituto Nun’Alvres» que abre as suas portas em 7 de Novembro de 1912. Todavia a guerra com a
Alemanha iria tornar a permanência em solo belga inviável. Em 1914, o Instituto desloca-se para o «Hotel de Los Placeres»
em Lourizán, perto de Pontevedra, na Galiza. As condições do Hotel para o ensino eram deficientes e, em Setembro de
1916, o Instituto muda-se para o «Colegio del Pasaje» em La Guardia, Galiza. O «Colegio del Apostol Santiago», instalado
neste edifício, onde vivia o P.e Merino, muda-se então para Vigo, para o edifício «La Molinera» (para uma história deste
Colégio ver http://www.colegioapostol.com/). O Instituto Nuno Álvares permanece em solo espanhol até 1932, quando
regressa definitivamente a Portugal, para as Caldas da Saúde, onde ainda hoje se encontra. O período entre 1916 e 1932, de
permanência em La Guardia, será dos mais profícuos para os jesuítas botânicos portugueses (ONC, 1914-1934).
113
A publicação da revista Broteria é interrompida em 1911, mas reaparece no ano seguinte com edição no Brasil. «Dois
annos e meio são passados, depois que os redactores da Broteria foram expulsos de Portugal pelo governo provisorio da
Republica e espoliados dos seus livros e collecções scientificas, pelo unico motivo de serem jesuitas» (AZEVEDO, 1913). «A
Broteria reappareceu após um anno de interrupção; e reappareceu, com excesso de ousadia, augmentada em volume,
confiada na benevolencia que alem-mar esperava encontrar no Brasil, para onde foi arrojada parte de seus redactores pela
onda revolucionária» (AZEVEDO, 1913). Em 1913, a Broteria tem a redacção em Salamanca. Com a instalação do Colégio
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
85
Logo a 18 de Novembro de 1910, é nomeada pelo governo uma comissão «encarregada de
examinar urgentemente as colecções scientificas e a bibliotheca existentes no Collegio de Campolide,
pertencente ao Estado, classificando o que encontrar digno de aproveitamento, e propondo ao Ministro
da Justiça o destino a dar a esses objectos e livros, como entenderem mais util ao progresso da sciencia
e ao enriquecimento das collecções, museus e bibliothecas de Lisboa» (AZEVEDO, 1913). A comissão
era constituída por Alberto Ferreira Vidal, reitor do Liceu de Passos Manuel, Anselmo Braamcamp
Freire, presidente da Câmara Municipal de Lisboa e director do Arquivo Histórico, Adolpho Penna,
professor do Liceu da Lapa, Almeida Lima, professor da Escola Politécnica, Anthero de Seabra,
conservador do Museu Bocage, anexo à Escola Politécnica, Antonio Aurelio da Costa Ferreira e A.
Machado114, professores do Liceu Camões, A. X. Pereira Coutinho e Balthasar Osorio, professores da
Escola Politécnica, Gabriel Pereira, inspector das Bibliotecas, e José Leite de Vasconcellos, director do
Museu Etnológico (AZEVEDO, 1913). A 21 de Novembro eram adicionados à comissão os seguintes
elementos: J. Verissimo de Almeida, do Instituto de Agronomia e Veterenária, e Francisco Julio
Henriques Cortes, do Colégio Militar (AZEVEDO, 1913). A presença de professores da Escola
Politécnica e de diversos liceus da capital era lógica tendo em conta o tipo de colecções existentes no
Colégio de Campolide e fazia adivinhar que o espólio do Colégio seria distribuído pela Politécnica e
liceus de Lisboa. Mas a comissão reúne-se e vota por unanimidade que se restituam as colecções aos
seus proprietários (AZEVEDO, 1913). No entanto, de grande parte dos livros, instrumentos e colecções
perde-se o paradeiro, e os proprietários acabam por receber só parte do que lhes pertencia, e após
muitos meses de espera (AZEVEDO, 1913)115.
Pela correspondência recebida por G. Sampaio é possível escrever um pouco da história das
colecções biológicas do Colégio de Campolide. Numa carta para G. Sampaio datada de 10 de Março de
1912, A. Machado indagava: «A Comissão encarregada de distribuir o material scientifico de
Campolide encontrou ali uma collecção de musgos de Isaac Newton, que presentemente se encontra
[...] no meu Lyceu de Camões. Peço o favor de me informar se a referida colecção pertence á Escola
Polytechnica do Porto, afim de a remetter para ahi». A resposta de G. Sampaio terá sido positiva, dado
que poucos dias depois, a 23 do mesmo mês, A. Machado escrevia: «Peço-lhe o favor de me dizer se
recebeu a guia e a remessa dos musgos e se chegou a colecção em bom estado».
Nuno Álvares em La Guardia, em 1916, a redação da revista passa também para o colégio galego, onde permanece até
1932, quando regressa definitivamente a Portugal (ONC, 1914-1934).
114
Sobre A. Machado ver Capítulo IX.7.
115
Uma parte do Herbário do Colégio de Campolide foi de facto devolvida aos seus proprietários, encontrando-se hoje no
Colégio Nuno Álvares. Agradecemos ao P.e José Carvalhais a amabilidade e disponibilidade que teve em nos aceder a
consulta do importante Herbário do Colégio.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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Também em Novembro de 1910 é nomeada uma comissão para «estudarem o destino a dar aos
livros e collecções de estudo do extincto Collegio de S. Fiel»116 (AZEVEDO, 1913). Esta comissão era
constituída por personalidades da região de Castelo Branco, onde se localizava o Colégio: José Ramos
Preto117, advogado, Gastão Randolpho Correia Mendes, professor do liceu (que por motivos pessoais,
se afastou da comissão), Alfredo Alves da Mota, médico municipal, Francisco Xavier Pereira,
professor da Escola de habilitação para o magistério primário e Arthur Marques de Carvalho,
veterinário (AZEVEDO, 1913; SALVADO, 2001). Esta comissão não tinha o mérito da nomeada para o
Colégio de Campolide e as colecções biológicas presentes em S. Fiel seriam até mais valiosas dos que
as de Campolide. A comissão elabora um relatório datado de 22 de Fevereiro de 1911, em que se
preconizava que o Herbário fosse para o então Liceu de Castelo Branco (SALVADO, 2001). Mas o
Governo decide em contrário e institui a Universidade de Coimbra como depositária fiel das colecções
de História Natural de S. Fiel (SALVADO, 2001). José Ramos Preto, advogado na região, reage a 16 de
Janeiro de 1912, naturalmente insistindo na condução das colecções biológicas de S. Fiel para o liceu
de Castelo Branco, dado ser esta escola «absolutamente desprovida de gabinete de [...] história natural»
(SALVADO, 2001). As autoridades acabarão por decidir dividir o espólio do Herbário de S. Fiel entre o
Liceu de Castelo Branco118 e o Herbário da Universidade de Coimbra (SALVADO, 2001).
Na correspondência recebida por G. Sampaio encontramos eco desta contenda. Em carta datada
de 27 de Dezembro de 1910, J. Henriques queixa-se a G. Sampaio do destino que pareciam tomar as
colecções do Colégio de S. Fiel: «Contava receber alguma cousa das collecções de S. Fiel, mas o
Ministro da Justiça dise ao Reitor, que para cá nada dava, porque tudo era pouco para Lisboa.
Tinham-me dito que essas collecções seriam repartidas por Coimbra e Porto. Agora é tudo para
Lisboa». Mas, como já referimos, as preocupações de J. Henriques eram infundadas. Será até no
Boletim da Sociedade Broteriana, nos volumes XXVIII (HENRIQUES, 1920) e I (II série) (HENRIQUES,
1922), que é apresentado um inventário do Herbário de S. Fiel (parcial, só referente à flora nacional; no
primeiro trabalho referente às plantas vasculares e, no segundo, referente às criptogâmicas). O pequeno
texto que antecede o inventário (de 1920) é importante e muito elogioso para as colecções e para os
116
Sobre o desmantelamento das colecções de ciências naturais do Colégio de S. Fiel ver SALVADO (2001) e SALVADO
(2003).
117
José Ramos Preto, à margem da comissão, mas aproveitando a onda anticlerical do pós-5-10-1910, elabora um relatório,
datado de 26 de Janeiro de 1911, sobre a actividade do Colégio de S. Fiel e da Companhia de Jesus (PRETO, 1911), o qual
mereceu uma resposta detalhada do P.e Cândido Mendes de Azevedo, publicada também em 1911 (AZEVEDO, 1911). O
texto de J. R. Preto, extremamente depreciativo e acusador, centra-se em aspectos económicos e financeiros, não referindo
nem o ensino nem a investigação biológica em S. Fiel pelo que não o discutiremos aqui; aliás a ausência de apreciação por
parte de J. R. Preto do ensino e investigação em ciências naturais em S. Fiel é uma das contestações de C. M. Azevedo.
118
Onde ainda hoje se encontra na Escola Secundária de Nuno Álvares (Castelo Branco).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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professores de S. Fiel119. Pode ler-se na introdução que «o govêrno autorisou a Faculdade de Sciencias
da Universidade de Coimbra a escolher nos seus gabinetes e laboratórios o que julgasse digno de ser
aproveitado. Uma comissão para essa escolha nomeada escolheu vários instrumentos de física, alguns
animais empalhados, uma bela colecção de insectos, com especialidade de borboletas, a colecção
preciosa de Zoocecidias, alguns livros e o herbário». Segue-se uma descrição do Herbário de S. Fiel:
«neste colaboraram os dintintos professores do Colegio, os Srs. P.e J. da Silva Tavares, C.
Zimmermann, C. Torrend, A. Luisier, Meniarth, L. Antunes. No herbário encontram-se também
exemplares colhidos por empregados do Jardim Botanico de Lisboa e alguns dos distribuidos pela
Sociedade Broteriana. No herbário, além de plantas portuguesas, encontram-se não poucas colhidas em
diversas localidades dos países por onde passaram aqueles professores». «Este herbário é um
documento valioso para o estudo da flora do país» sintetiza a qualidade e nível do Herbário de S. Fiel,
fruto de anos (não muitos) de trabalho árduo dos jesuítas fundadores da Broteria. Por fim, neste texto
introdutório é prestada homenagem e reconhecimento aos notáveis fundadores da Broteria: «Os
coleccionadores são homens de grande ilustração scientifica, provada pelas publicações de que são
autores [...] No Colégio, além dos serviços do ensino dos colegiais, trabalhava-se utilmente e muito se
fez e se poderia continuar com directores tão competentes». A inclusão do Herbário de S. Fiel no
Herbário da Universidade de Coimbra também se atesta por uma carta de J. Henriques, dirigida a G.
Sampaio, datada de 25 de Maio de 1921: «Pede-me fungos e musgos. É caso grave porque tenho eu de
escolher o que se poderá dar, e isso é grave. A colecção de fungos parasitas de diversas plantas é
grande e levará tempo a correr. Dos fungos grandes não há muitos. Talvez possa separar alguns da
colecção de S. Fiel. Dos musgos a separação é trabalhosa, por serem bastantes numerosos. Verei o
que poderei fazer». As colecções de diatomáceas do Herbário de S. Fiel foram, em parte, restituídas ao
seu principal colector, C. Zimmermann (TAVARES, 1924).
A riqueza do Herbário do Colégio de S. Fiel à data do seu desmembramento em 1910 é
evidenciada por J. S. Tavares, num trabalho que publica na Broteria (TAVARES, 1924): «compunha-se
de 93 espécies de Lichenes portugueses; 627 espécies de Musgos, portugueses e estrangeiros, incluindo
a «Bryotheca Europaea» e a «Flora exsiccata Bavarica»; 521 espécies de Fungos portugueses; cerca de
3.000 Diatomáceas, em que entravam as collecções compradas a Tempere e a Peragallo; 855 espécies e
106 subespécies de variedades de Phanerogâmicas portuguesas, a que se devem juntar 47
Phanerogâmicas estrangeiras. O número total das espécies de que se compunha o Herbário de S. Fiel
119
Este reconhecimento será agradecido por J. S. Tavares num artigo que publica em 1924 na revista Broteria sobre o
Herbário de S. Fiel (TAVARES, 1924).
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elevava-se por tanto a 5.121 espécies e o número de exemplares (não de espécies) de Phanerogamicas
portuguesas ascendia a 1.311, assim distribuídas: 27 Pteridófitas, 6 Gymnospérmicas, 231
Monocotyledóneas e 1.043 Dicotyledóneas». Naturalmente que o Herbário de S. Fiel era especialmente
rica nos grupos em que os jesuítas botânicos se destacavam: musgos e diatomáceas.
A espoliação das colecções biológicas do Colégio de Campolide e do Colégio de S. Fiel era
grave e tem eco na prestigiada revista americana «Science». No número publicado a 24 de Novembro
de 1911, T. D. A. Cockerell dava conta do que se passara e referia um documento de protesto subscrito
pelos padres jesuítas exilados. Cockerell concordava que os professores jesuítas tinham o direito de
receber de volta os seus bens, livros e colecções. Escrevia que «granting the accusations [...] that they
are jesuits, and opposed to a republican form of government, there is still no justification for the action
taken in depriving them of their scientific materials. No doubt the government claims that all these
things belong to the colleges, and not at all to the particular men; but while this may be true in a sense,
all scientific men will agree that they had rights in the matter which have been apparently ignored». De
seguida o autor do texto sugere a formação de uma comissão internacional para estudar o assunto e
elaborar um relatório. Conclui: «if the report supported the exiles, organized protests from the scientific
bodies of different countries might be appropriate» (COCKERELL, 1911).
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VII. A República e as Universidades. Gonçalo Sampaio, professor da Faculdade de
Ciências da Universidade do Porto
1. A República e as Universidades
A instauração da República em 5 de Outubro de 1910 desencadeou uma revolução no ensino
superior português. Nos anos seguintes é publicada uma catadupa de legislação estrutural e normativa
sobre o ensino superior, de que destaca a criação, em 1911, das Faculdades de Ciências nas três
Universidades portuguesas, Lisboa, Coimbra e Porto, com estatuto e organização semelhantes. Seria
uma medida modernizadora de grande alcance para o ensino superior no nosso país.
Enquanto não encontrámos qualquer comentário político ao 5 de Outubro em toda a
correspondência de A. X. Pereira Coutinho e J. Henriques para G. Sampaio, encontrámos diversas
apreciações ás alterações legislativas que iam sendo produzidas no ensino superior.
2. Os cursos livres
Uma das primeiras medidas do governo republicano, publicada a 7 de Novembro de 1910 foi a
transformação dos cursos das Academias e da Universidade de Coimbra em «cursos livres», sem
assistência obrigatória e regime de faltas. Pode ler-se no Diário do Governo n.° 28: «Direcção Geral da
Instrucção Secundaria, Superior e Especial. Considerando que já foi decretado o regime de cursos
livres na Universidade de Coimbra e Escola Polytechnica de Lisboa [...] Considerando que os alumnos
da Academia Polytechnica desejam os cursos livres; O Governo Provisorio [...] decretou: Todos os
cursos professados na Academia Polytechnica do Porto são livres. Os exames [...] deverão versar sobre
as materias professadas durante o anno nas respectivas cadeiras [...]» (AAPP, 1910-1911).
Poucos dias depois, a 14 de Novembro, J. Henriques escrevia a G. Sampaio sobre este assunto:
«O regime dos cursos livres é mau [...] Há estudantes com 8 e 9 cadeiras! Há um estudante
matriculado no 4º. ou 5º. de Direito e que está dando lições no lyceu de Ponta Delgada!! Haverá país
no qual isto se dê?». A 27 de Dezembro deste ano, J. Henriques voltava a desabafar sobre as alterações
da rotina académica: «Com relação aos trabalhos académicos [...] não sei o que será no fim do anno.
Na minha aula ainda veem bastantes alumnos e mesmo aos trabalhos práticos. De 77 faltam a esses
serviços uns 30. Esses nem veem às liçoes theoricas nem às praticas. Que farão no fim do anno? Cá
ainda se não falou nos tais exercicios e conferencias. Veremos se depois de fevereiro [...] se vem essa
novidade».
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
90
3. A criação das Universidades de Lisboa e Porto
Os dois Decretos fundamentais que instituíam as Universidades de Lisboa e Porto e as
Faculdades de Ciências nas três Universidades seriam publicados a 22 de Abril e a 15 de Maio de 1911.
Os cursos, a carreira docente e o ensino universitário seriam profundamente modificados com esta
legislação. Os projectos destes diplomas terão sido discutidos nas Academias e na Universidade de
Coimbra. J. Henriques enviava para G. Sampaio os seus comentários a 26 de Fevereiro de 1911:
«Recebi hontem a sua estimada carta. O objecto dela é complicado. O reitor da nossa Universidade
deve ter ido para Lisboa; era o que ele tencionava fazer. Nada sei do que ele projecta. A organização
das faculdades tem de ser discutida nos conselhos, pois que são esses os competentes. Com relação á
Botanica, eu não vou muito fora da ideia de fundir a Morfologia com a Botânica Geral [...] O ensino
da Botânica ficaria com a Botânica Geral e Botânica Especial. Esta parte é que não deve ser tocada.
Com relação ao curso de Botânica Médica não sei o que farão as Faculdades de Medicina. O curso
semestral é pouco, muito especialmente o que vai de Março a Julho, que é ou tem sido muito reduzido.
Aqui, como os cursos do 1º. anno médico têm sido enormes, tem sido divididos em duas turmas, tanto
em Botânica como em Zoologia, uma no 1°. semestre, outra no segundo, saindo as gratificações dos
rendimentos das Faculdades. Apesar disto ainda esses cursos são divididos em pequenas turmas (12 a
16 alumnos) para os trabalhos práticos. Fala-me em tres professores. Aqui temos dous e um assistente
em Zoologia e outro em Botânica e agora foi a proposta para o 2º. assistente. Não tenho presente o
que querem os de Lisboa. Ouvi lêr o projecto, há tempos, mas não lhe liguei grande atenção.
Esperemos pela discussão nos conselhos e pelo que os reitores nos dam. É conveniente não perdermos
o que temos, ou pelo menos não ficarmos ganhando menos do relativamente pouco que agora
recebemos». Alguns dias depois, J. Henriques voltava à questão dos cursos livres, que afinal não
estariam a correr tão mal quanto teria temido, escrevendo a G. Sampaio a 10 de Março: «Como tem
corrido por ahi os cursos livres? Na minha aula tem havido certa frequencia e na pratica por
enquanto não tenho razão de queixa. Veremos o que virá ainda».
O Decreto de 22 de Abril de 1911 criava as Universidades de Lisboa e Porto e reformava a
Universidade de Coimbra. O diploma começava por definir os objectivos das Universidades
portuguesas: «Fazer progredir a sciência, pelo trabalho dos seus mestres, iniciar um escol de estudantes
– nos métodos de descoberta e invenção scientífica»; «Ministrar o ensino geral das sciências e das suas
aplicações, dando preparação indispensável às carreiras que exigem uma habilitação scientífica e
técnica»; «Promover o estudo metódico dos problemas nacionais e difundir a lata cultura na massa da
Nação pelos métodos da extensão universitária». Em cada Universidade, era criada uma Faculdade de
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91
Ciências «destinada ao ensino superior e geral das ciências matemáticas, físico-químicas e históriconaturais». Era garantida a liberdade, independência e autonomia do ensino universitário: «Só as
Universidades são competentes para governar o respectivo ensino. O professor desenvolve livremente o
ensino que lhe foi confiado e responde perante a Faculdade respectiva. As Faculdades organizam
livremente o programa geral dos estudos, dentro do seu quadro, e são responsáveis perante a
Universidade. A Universidade delibera sôbre a organização do quadro de estudos e é responsável
perante o Govêrno» (artigo 13.º). O importante artigo 74.° reforçava lapidarmente a autonomia e a
liberdade do ensino universitário: «O ensino universitário assenta fundamentalmente no princípio da
liberdade de ensinar e aprender». O artigo 40.º definia a hierarquia do professorado: professores
ordinários; professores extraordinários; assistentes; professores livres e professores contratados. A
categoria de «lente», com dezenas de anos no ensino superior, dava assim lugar à de «professor». O
professor ordinário era pois o antigo «lente proprietario». «Os professores ordinários, extraordinários e
assistentes são nomeados pelo Govêrno, sôbre proposta das Faculdades e Escolas, mediante concurso
por provas públicas, por títulos scientíficos e serviços ao ensino, ou por promoção ou transferência,
consoante os regulamentos das Faculdades e Escolas» (artigo 41.º), com um parágrafo único: «As
Faculdades e Escolas poderão extraordinariamente propor ao Govêrno a nomeação sem concurso, de
individualidades eminentes, de notória reputação, nas Sciencias e nas Letras». Na sequência da criação
dos cursos livres a 7 de Novembro de 1910 era agora institucionalizado o «professor livre»: «Os
professores livres são os admitidos pelas Faculdades e Escolas e autorizados pelo Senado, para regerem
cursos facultativos gerais ou especiais» (artigo 48.º). No entanto, «Os professores livres não teem
ordenado do Estado; são remunerados pelos alunos, recebendo uma percentagem deduzida da propina
[...], e a frequência dos seus cursos tem valor igual ao dos cursos oficiais» (artigo 55.º). Eram também
definidas as características do ensino universitário: «A atividade docente dos professores e assistentes
exerce-se: expondo a sciência feita, em lições e em conferencias com os alunos; ensinando como se faz
a sciência, em exercícios de investigação scientífica; ensinando o que vale a sciência, em exercícios de
aplicação scientifica» (artigo 51.º). O ensino era organizado em dois semestres lectivos. Em
consonância com a criação dos cursos livres e a postura radical do republicanismo inicial, o artigo 75.º
estabelecia que: «A ordem dos estudos não é prescrita. Os estudantes podem inscrever-se livremente
nos cursos e cadeiras, salvo as dependências estabelecidas nos diplomas especiais» e o artigo 76.° que:
«Não haverá registo algum de assistência ou falta dos alunos a qualquer dos cursos, salvo as restrições
constantes dos diplomas especiais». Era criada a figura de licença sabática por um semestre ao fim de
seis anos de ensino (artigo 58.º). Finalmente o artigo 82.º estabelecia que as Universidades conferem os
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
92
graus de Bacharel, Licenciado e de Doutor (AFSP, 1911-1912 a 1913-1914; DG 1911 04 22; SANTOS,
1996).
4. A criação das Faculdades de Ciências de Lisboa, Coimbra e Porto
Pouco tempo depois do diploma que reformava a universidade portuguesa, era publicado o
importante Decreto de 15 de Maio de 1911 que organizava as Faculdades de Ciências de Lisboa,
Coimbra e Porto120. Este diploma era necessário e antecipado pelo decreto anterior, que no seu artigo
41.º remetia a admissão dos professores para regulamentação específica da cada escola. Este decreto de
15 de Maio, à semelhança do anterior, organizava as três instituições universitárias de Lisboa, Coimbra
e Porto, em moldes semelhantes. Era assim a machadada final no previlégio de séculos da Universidade
de Coimbra. O primeiro artigo definia os objectivos das Faculdades de Ciências. A Faculdade de
Ciências «tem por fim a cultura, progresso e ensino das sciências matemáticas, físico-químicas e
histórico-naturais». O artigo 5.º estabelecia que «O ensino é feito normalmente por professores
ordinários, professores extraordinários e assistentes». Existiam «primeiros assistentes e segundos
assistentes» (artigo 32.°). A admissão dos professores às Faculdades era regulamentada numa série de
artigos. O artigo 33.º definia as vias possíveis de admissão: «O provimento dêstes lugares é feito por
concurso, por distinção e por antiguidade». Para concorrer ao lugar de segundo assistente era
necessário apresentar «pública-forma da carta de doutor na secção respectiva»121. Os segundos
assistentes eram «nomeados por dois anos, findos os quais teem de deixar a Faculdade se não forem
reconduzidos. Os segundos assistentes reconduzidos podem concorrer ao lugar de primeiros
assistentes, se houver vaga no respectivo grupo, sendo o concurso documental e efectuado perante os
professores da secção respectiva» (artigo 39.º). A principal função dos segundos assistentes era
«auxiliar os trabalhos práticos do respectivo grupo» (artigo 38.º). Os primeiros assistentes eram
«nomeados por três anos, findos os quais teem de deixar a Faculdade, se não forem reconduzidos. Os
primeiros assistentes reconduzidos podem concorrer ao lugar de professores extraordinários, se houver
vaga, no respectivo grupo, sendo o concurso ainda documental e efectuado perante os professores da
respectiva secção» (artigo 41.º). «Os primeiros assistentes auxiliam os professores nas demonstrações e
experiências do curso, dirigem os trabalhos práticos dos alunos e regem os cursos de que forem
120
Sobre a criação da Faculdade de Ciências de Lisboa ver FERREIRA (1987).
Esta exigência do grau de doutor era uma medida avançada para a época, mas seria pouco exequível, dado que o grau de
doutor por estas Faculdades era criado pelo mesmo diploma. Esta situação seria corrigida por legislação posterior. O
Decreto de 18 de Novembro de 1911 criava um regime transitório para os segundos assistentes, autorizando quem tivesse
habilitações para concorrer a professor das extintas Academias pudesse concorrer a segundo assistente (AFSP, 1911-1912 a
1913-1914).
121
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
93
encarregados pela Faculdade, podendo ainda ser autorizados a abrir cursos livres remunerados pelos
alunos» (artigo 40.º). O artigo 42.º estabelecia que «A promoção a professor ordinário faz-se, em regra,
por antiguidade de serviço; mas pode a Faculdade propôr a nomeação para tal lugar de pessoa de
excepcional valor, que tenha prestado relevantes serviços à sciência». Assim, os assistentes e os
professores extraordinários eram providos por concurso, mas os professores ordinários, no topo da
carreira, normalmente por antiguidade. O ensino «Consta de uma parte livre (lições magistrais e lições
com demonstração) e de outra obrigatória (trabalhos práticos e estágio nos laboratórios)» (artigo 5.°).
Aqui o diploma diverge do anterior ao considerar obrigatória a assistência às aulas práticas. Era uma
medida sensata, dado que muitos dos cursos ministrados nestas Faculdades eram de ciências
experimentais122. No entanto mantinha-se a liberdade de cada aluno organizar o seu plano de estudos
dado que o artigo 13.º estabelecia que «Não há qualquer dependência legal e obrigatória entre as
disciplinas». As disciplinas eram organizadas em secções. Na 3.ª Secção - Ciências Histórico-Naturais,
no 2.º Grupo – Ciências Biológicas, as disciplinas na área de Botânica eram: Botânica (curso geral);
Morfologia e Fisiologia Vegetais; Botânica Especial e Geografia Botânica. Era ainda determinado que
as Faculdades conferiam os graus de bacharel e doutor. O bacharelato obtinha-se pela frequência de no
mínimo de oito semestres. Para a obtenção do grau de doutor, na secção de ciências histórico-naturais
era necessário «um ano de tirocínio prático, provado, num laboratório nacional ou estrangeiro, e à
apresentação de uma tese original, impressa, sôbre assunto da sua escolha. A tese será discutida perante
um júri». O diploma, no seu artigo 45.º, determinava que cada uma das Faculdades devia ter «Um
jardim, museu e laboratórios botânicos» como um dos estabelecimentos anexos123 (AFSP, 1911-1912 a
1913-1914; DG 1911 05 15; SANTOS, 1996).
122
O Decreto n.° 860 de 12 de Setembro de 1914 iria instituir (se bem que com algumas restrições) a obrigatoriedade geral
de frequência das aulas práticas, arrepiando portanto o caminho inicialmente traçado de frequência totalmente livre às aulas.
Lê-se neste diploma que: «Considerando que o regime dos cursos livres [...] está sendo praticado de forma que se anulam
em grande parte, senão completamente, os benéficos efeitos que devem resultar da reforma do nosso ensino universitário»,
estabelecia-se que, nas Faculdades que ainda não tinham tornada obrigatória a assistência às aulas práticas, «será marcada
falta [...] aos alunos que não compareçam, quando estes sejam em número superior a dois terços dos inscritos» (AFSP,
1911-1912 a 1913-1914).
123
A implantação do Jardim Botânico não se concretizou. Dez anos passados, a 17 de Fevereiro de 1921, era publicado um
Decreto dedicado à implementação do Observatório Astronómico e do Jardim Botânico da Faculdade de Ciências do Porto
(DG 1921 02 17). No preâmbulo deste Decreto (n.° 7.325), subscrito pelo Ministro da Instrução Pública, Augusto Nobre,
relembrava-se a importância do ensino prático e o desmantelamento do Jardim da Academia: «Sendo de absoluta
necessidade que ao ensino teórico se alie o ensino prático, e não existindo na Faculdade de Sciências da Universidade do
Porto [...] nem um jardim botânico, destinado ao ensino da botânica, pois o antigo Jardim Botânico e Experimental,
pertencente à Academia Politécnica, foi cedido pelo Governo à guarda municipal do Porto, logo em seguida ao movimento
revolucionário de 31 de Janeiro, e não voltou a ser restabelecido». No artigo 1.° determinava-se que a Faculdade de
Ciências podia estabelecer um Jardim Botânico para o ensino da Botânica na Faculdade.
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5. Os regulamentos das Faculdades de Ciências
A completar os dois diplomas anteriores, o Decreto de 22 de Agosto de 1911 estabelecia os
regulamentos das Faculdades de Ciências. A admissão ao professorado (a entrada para segundo
assistente) era definida no artigo 18.º em níveis de grande exigência. Os concursos constavam, em cada
grupo, das seguintes provas: uma dissertação impressa e expressamente composta para o concurso;
uma prova prática sobre qualquer das disciplinas do grupo, sorteada na ocasião; uma lição sorteada
com a antecedência de 24 horas com a duração de uma hora; a dissertação era discutida durante uma
hora e a lição durante meia hora, por um professor do grupo respectivo. Os pontos para a lição eram em
número de vinte e estavam expostos durante dez dias. As três provas eram julgadas conjuntamente
(AFSP, 1911-1912 a 1913-1914).
Qual a reacção a esta legislação? J. Henriques em carta datada de 11 de Dezembro de 1911
escrevia para G. Sampaio: «Vejo o que me diz relativamente ao seu curso de Botanica. Eu tenho dous
cursos – Botanica geral com 30 alumnos, Botanica medicinal com 40 e tantos. Por enquanto veem
quasi todos e estão em boa ordem. Tambem não tenho livro [...] a parte pratica da classificação e
descripção. Para isto usam a minha terminologia (?) Texto para as lições theoricas não há, nem
legalmente pode haver. [...] apurar os livros que podem ser consultados. Por causa dos cursos
praticos, tenho já 12 horas (pelo menos) de serviço por semana e depois de Natal devo ter 15 horas e
sem gratificação. Effeitos das leis novas».
6. A crise de G. Sampaio de 1912
Em 1912 a situação de G. Sampaio e a do próprio ensino da Botânica na recentemente criada
Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, tinham-se tornado críticas e insustentáveis. No ano
lectivo de 1910-1911, M. Amandio Gonçalves era o «lente proprietario» da 10.ª Cadeira - Botânica e
G. Sampaio, naturalista adjunto da cadeira de Botânica (AAPP, 1910-1911). No ano lectivo seguinte,
M. Amandio Gonçalves, adoece e «não se encontra em exercício por motivo de doença verificada pela
junta médica» (AFSP, 1911-1912 a 1913-1914). Mas os Decretos da criação da Universidade do Porto
e da sua Faculdade de Ciências tinham tirado a possibilidade legal de G. Sampaio leccionar, dado ser
naturalista e não ter terminado o curso da Academia Politécnica. O Conselho Académico da Faculdade
encarrega G. Sampaio de, excepcionalmente, substituir o lente doente (SAMPAIO, 1912b)124, mas a
124
G. Sampaio substituía M. Amandio Gonçalves e fazia imprimir os programas dos seus cursos: «Microscopia Vegetal»
(SAMPAIO, 1911b) e «Botânica geral» (SAMPAIO, 1911c). G. Sampaio fará imprimir, em 1920, uma segunda edição do
programa da Botânica geral (SAMPAIO, 1920c) e uma terceira em 1935 (SAMPAIO, 1935b). Os tópicos abordados serão
semelhantes aos da primeira edição.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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situação não poderia manter-se por muito tempo, sendo de prever que M. Amandio Gonçalves fosse
substituído por um professor, talvez de outra Universidade.
A situação torna-se explosiva quando na Faculdade de Ciências do Porto se abre concurso para
2.° assistente da 3.ª Secção – Ciências Histórico-Naturais. De acordo com o Decreto de 15 de Maio de
1911, para concorrer ao lugar de segundo assistente era necessário apresentar «pública-forma da carta
de doutor na secção respectiva». Ora G. Sampaio não tinha terminado o curso da Academia Politécnica
e portanto não poderia concorrer.
O estado de espírito do naturalista portuense era de revolta e de desânimo. No espólio epistolar
de G. Sampaio existe um rascunho de uma carta datada de 7 de Maio de 1912 dirigida ao Director
Geral das Colónias. O motivo (inicial) da carta era responder a um convite que lhe tinha sido feito para
estudar a flora das colónias portuguesas de então. G. Sampaio agradece, mas declina o convite.
Seguidamente a carta resvala para uma análise do seu passado, da sua situação presente e do seu futuro.
O documento é de grande importância pelo que o transcrevemos na íntegra, intercalando alguns
comentários: «Exmo. Snr. (Director Geral das Colónias) Em virtude de serviços oficiaes que me
tiveram ausente do Porto durante alguns dias, só hoje cumpro o dever de resposta ao oficio de V. Exa.
[...] que muito me honra como prova de confiança da parte de VV. Exas. O Ministro das Colónias e
Governador Geral da provincia de Moçambique nos meus reduzidos meritos scientificos. Seria para
mim grande prazer o facto de colaborar n’uma obra de exploração botanica bem conduzida e
completa n’aquela nossa provincia africana, pois conheço quanto se [...] a iniciativa do Governo da
Bélgica em que se notabilisaram os valiosissimos trabalhos de Wildeman e Tr. Durand sobre a flora
do Congo; circunstancias particulares e muito especiaes em que me encontro não permitem, porem,
que eu tome parte de tão consideravel empreendimento. Tenho actualmente em publicação um
trabalho de conjuncto da Flora portugueza, trabalho que de modo algum devo interromper, não só
porque representa o resultado de longos anos de estudo e sacrificios, mas tambem porque de qualquer
utilidade o julgo para o paiz em que nasci. Alem d’isso não posso esquecer que todas as minhas
investigações se têm concentrado no estudo da nossa vegetação continental, sobre a qual desejo
continuar e concluir diversos trabalhos iniciados, e que o estudo de uma flora africana vastissima e
inteiramente nova para mim, seria quasi impossivel com vantagem e reditos para a nação [rasurado, o
paiz], no periodo de enfraquecimento de energias em que infelizmente já entrei». A posição de G.
Sampaio é sensata - sente a pressão de acabar a sua flora de Portugal e não tem dúvidas que se
derivasse para a flora das colónias nunca acabaria a sua flora portuguesa. A partir deste ponto, a carta
deriva para uma assumida posição de protesto: «Não posso ocultar a V. Exa. que me sinto cançado um
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
96
pouco e sobretudo, desanimado, pois se é certo que muito me penhora o convite de S. Exa. o Ministro
das Colonias para cooperar em um serviço de grande responsabilidade scientifica, não é menos
verdadeiro que a reforma do ensino universitario decretada pelo Governo Provisorio da Republica
representou para mim o mais completo [rasurado, ingrato] esquecimento, senão o mais inesperado
castigo, por toda uma vida de estudo desinteressadissimo e constante. Tendo-se creado por lei, há
bastantes anos, os cursos praticos de sciencias naturaes na Academia Polytechnica do Porto, e tendo
sido encarregados de os dirigir os respectivos naturalistas, veio essa reforma expulsal’os agora
d’esses cursos, tirando-lhes os vencimentos correspondentes de 25.000 reis mensaes, que por lei
[acrescentado por cima, expressa] lhes pertenciam. N’estas condições vejo-me hoje fóra da regencia de
um curso que [acrescentado por cima, comigo] se abriu e fundou e que desenvolvi a ponto de fazer
d’ele o unico regularmente organisado de todo o paiz e de tornal’o merecedor [acrescentado por cima,
em publicações impressas] de elogiosas referencias de especialistas [rasurado, sabios] estrangeiros
que o visitaram. [acrescentado por cima, a elas] Acresce ainda que, tendo sido eu o encarregado pelo
conselho academico da regencia da [acrescentado por cima, propria] aula de Botanica, no
impedimento infelizmente longo do respectivo cathedratico, [G. Sampaio refere-se aqui a M. Amandio
Gonçalves] me coloca a referida reforma na impossibilidade de ser admitido como simples
concorrente, por provas publicas, ao logar [acrescentado por cima, até] de 2º. assistente de uma
cadeira que tenho regido desde há dois anos e sobre cuja materia tenho publicado mais de duas
dezenas de monografias de investigação scientifica original. Com semelhante paga aos 47 anos,
grande parte dos quaes têm sido gastos em estudo [acrescentado por cima, tão desinteressado como
persistente], vê [acrescentado por cima, muito], claramente V. Exa. como é justificada a descrença que
me domina e a falta de energias que devo sentir para novos [acrescentado por cima, e dificeis],
emprehendimentos scientificos, n’um paiz em que as recompensas [acrescentado por cima, a este
genero de trabalhos], são da natureza das que a V. Exa. acabo de expôr. Saude e Fraternidade.
Faculdade de Sciencas da Universidade do Porto. O Naturalista».
G. Sampaio decide então enviar um requerimento directamente ao Ministro do Interior datado
de 13 de Maio de 1912 (SAMPAIO, 1912b). Quais as pretensões de G. Sampaio? Ser admitido ao
concurso para 2.° assistente da 3.ª Secção que se encontrava aberto. Quais os argumentos que utiliza?
Admite que apesar de não ter um curso superior, teve aprovação nas cadeiras de ciências naturais (10.a
e 11.a cadeiras) da Academia, tinha experiência de docência, tanto de aulas práticas como de teóricas
(já que há dois anos que substituía M. Amandio Gonçalves na regência da Botânica Geral) e tinha
experiência de investigação: era naturalista desde 1901 e tinha um apreciável número de trabalhos de
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
97
investigação publicados (mencionando explicitamente a publicação em curso do seu «Manual da Flora
Portugueza»).
Mas o Ministro envia o requerimento para a Faculdade informar e o Conselho opina contra a
pretensão de G. Sampaio125. A situação torna-se, para G. Sampaio, de tal forma grave que edita uma
folha de duas páginas que faz imprimir na Tipografia do Carregal (SAMPAIO, 1912b). Neste
documento, que intitula «Sem comentarios», transcreve integralmente o requerimento que tinha
enviado ao Ministro do Interior, acrescentando algumas considerações suas. O documento não tem
data, mas seguramente que terá sido elaborado pouco dias depois do parecer negativo do Conselho da
Faculdade. As considerações que acrescenta ao requerimento são acutilantes e de indignação. G.
Sampaio começa por salientar o trabalho meritório que ele próprio, Rocha Peixoto e Augusto Nobre, os
três naturalistas da Academia tinham desenvolvido e que todos se encontravam impossibilitados de
concorrer ao concurso pela legislação em vigor. De seguida transcreve na íntegra o requerimento e
acrescenta algumas considerações. Refere a incongruência do Conselho da Faculdade que há dois anos
o tinha incumbido da regência da Botânica, considerando-o portanto «competente para as funções de
professor», e que «lhe nega, agora, capacidade para 2.° assistente». Acrescenta que a legislação em
vigor permitia a entrada na carreira de professor por mérito. Refere ilustres portugueses que não tinham
nenhum curso universitário, Bazilio Teles, Alexandre Herculano, João de Loureiro e Correia da Serra.
7. G. Sampaio, nomeado professor ordinário da Faculdade de Ciências do Porto
Quiçá em consequência do requerimento de G. Sampaio, é publicado, a 13 de Julho deste ano,
um decreto que permitia o concurso a 2.° assistente a «indivíduos que, nos últimos anos, tenham
publicado trabalhos scientíficos de reconhecido merecimento sôbre as disciplinas do grupo a que
pretendem concorrer» e a 17 de Agosto um outro diploma que permitia que os naturalistas fossem
promovidos a primeiros assistentes, desde que os «Conselhos Escolares julguem de merecimento os
trabalhos por êles executados», mas «sem direito a promoção» (AFSP, 1911-1912 a 1913-1914).
Estava assim aberta a possibilidade de G. Sampaio entrar como primeiro assistente da Faculdade.
Todavia, o desfecho seria outro. A legislação (Decreto de 15 de Maio de 1911) previa no artigo 33.°
que «O provimento [dos] lugares é feito por concurso, por distinção e por antiguidade» e no artigo 42.º
que «A promoção a professor ordinário faz-se, em regra, por antiguidade de serviço; mas pode a
125
Este episódio é referido num bilhete-postal que escreve a A. Ricardo Jorge datado de 2 de Junho de 1912: «O conselho
informou contra, mas houve votos com declaração em contrario e não compareceram muitos lentes. Um d’elles ao ver
aquilo até se retirou sem votar. Foi uma maroteira preparada, como explicarei em carta. Conto ir por estes dias a Lisboa.
Haverá trovoada por aqui contra a escandalosa protecção ao afilhado» (BN A/2072).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
98
Faculdade propôr a nomeação para tal lugar de pessoa de excepcional valor, que tenha prestado
relevantes serviços à sciência». G. Sampaio poderia portanto entrar para professor da Faculdade por
mérito, sem ter um curso universitário. Tal viria a acontecer. Por Decreto de 7 de Dezembro de 1912,
G. Sampaio era nomeado directamente para o topo da carreira de professor - Professor Ordinário da 3.ª
Secção – Ciências Histórico-Naturais, 2.º Grupo – Ciências Biológicas da Faculdade de Ciências da
Universidade do Porto126 (AFSP, 1911-1912 a 1913-1914).
Quais as reacções a esta nomeação? A. Ricardo Jorge127 escreve a 4 de Dezembro de 1912: «Ha
dias que ando para escrever-lhe desde que vi nos jornaes que o Conselho da Faculdade propusera a
sua nomeação para professor ordinario. Um grandissimo abraço pela victoria alcançada»128. J.
Henriques numa carta datada de 6 de Abril de 1913 escrevia: «tive tambem conhecimento da sua
nomeação para professor effectivo. Felicito-o por isso e com muita satisfação»129.
126
G. Sampaio nomeado Professor Ordinário por proposta do conselho escolar da Faculdade, nos termos do parágrafo
único do art. 41.º do decreto de 22 de Abril e art. 42.º do decreto de 15 de Maio de 1911 (AFSP, 1911-1912 a 1913-1914).
Quando em 1921 é criado o Instituto de Investigações Botânicas, com G. Sampaio como director, no seu currículo, a
nomeação para professor é descrita da seguinte forma: «Em 1911-1912 concorreu a uma cadeira de professor, sendo
admitido, e sendo depois, por proposta unânime do júri ao Governo da República, isento, por distinção, das respectivas
provas e despachado para o lugar que actualmente desempenha» (DG 1921 03 21). G. Sampaio regerá, nos anos lectivos de
1913-1914, as cadeiras de Botânica (curso geral), Morfologia e fisiologia vegetais, Botânica especial e Sciências naturais
(botânica) (AFSP, 1911-1912 a 1913-1914). No ano lectivo de 1917-1918, as seguintes: Botânica (curso geral), Morfologia
e fisiologia vegetais, Botânica especial e geografia botânica e Botânica F.Q.N. (preparatórios para Medicina) (AFSUP,
1914-1915 a 1917-1918).
127
Sobre A. Ricardo Jorge ver Capítulo X.2.
128
A esta carta, G. Sampaio responderá num bilhete-postal datado de 9 de Janeiro de 1913: «Muito obrigado pelos seus
parabens. Tudo está liquidado, felizmente» (BN A/2064).
129
No entanto, G. Sampaio manterá sempre um sentimento estranho de não-reconhecimento pelo seu valor científico.
Bastantes anos mais tarde num rascunho de uma carta que, apesar de não estar endereçada, pelo seu conteúdo seguramente
que se destinava a A. Ricardo Jorge, datado de 1 de Fevereiro de 1921, G. Sampaio fala de líquenes e da sua carreira
científica: «Mandei para a Broteria, onde virá publicado no próximo numero de botânica, um novo trabalho sobre liquenes
de Portugal. Lá descrevo entre outras novidades a interessantíssima Acarospora Zahlbruchneri Samp. que colhi em
Santarém e em Lisboa. Hei-de mandar-lhe um exemplar para vêr que se, conhecendo-a, a colhe ahi em quantidade para as
distribuições. Já a mandei ao Dr. Zahlbruckner, que a reputa uma boa espécie. Estou em activa correspondência com ele,
que se mostra interessadissimo com os liquenes portugueses que, diz ele, têm grande relação com os da Dalmacia. Mandeilhe já uma coleção, na qual iam quasi todas as espécies que eu tenho descrito como novas. Pedi-lhe que as examinasse e
me desse a sua opinião. Respondeu-me que as examinou e que não só as considerou espécies novas, mas também boas
especies. Enviou-me já um pacote de liquenes contendo espécies que eu lhe pedi e liquenes da Dalmacia. Mas ainda não
chegou cá o pacote. Tambem diz que vai enviar-me uma segunda remessa, que está a preparar. Enfim, estou satisfeito com
as suas relações e com a maneira como me trata. Tem já a imprimir o seu Systema, ou seja, Catalogo Universal dos
liquenes, em 6 volumes e nelle inclue as minhas espécies. Está a redigir a apreciação dos meus trabalhos - que todos lhe
enviei, a seu pedido, para ser publicado numa revista da especialidade, em alemão. Actualmente trabalha na redacção da
2ª. edição do volume dos liquenes da obra do Engler e diz-me que nela virá já incluido o meu género Carlosia, das [...]
Tendo sentido um grande prazer com isto, pois vejo que o meu esforço, desprezado em Portugal, é apreciado ao menos
pelas auctoridades scientificas lá de fora. A maneira como o Dr. Zahlbruckner me está tratando só foi egualada até certo
ponto pela forma carinhosa como me tratou o Dr. Focke a respeito dos meus trabalhos sôbre os Rubus de Portugal. [...]
Meu caro, não podemos ter outra recompensa superior ao prazer que se sente vendo o nosso trabalho apreciado e louvado
pelos grandes mestres. Por isso nestes últimos dias o Dr. Zahlbruckner tem-me feito feliz. Trabalho com amôr, que isso me
dará recompensas superiores a tudo e que fazem esquecer muito ponta-pé que se leva por esta vida fóra. Não se esqueça do
que lhe pedi na ultima carta. Eu desejo apurar certas particularidades para ultimar o catalogo dos liquenes de Portugal. E
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
99
8. G. Sampaio encarcerado durante a Monarquia do Norte
Na sequência do efémero episódio da Monarquia do Norte de 1919, G. Sampaio será
encarcerado130. A proclamação da restauração da monarquia e a constituição da «Junta Governativa do
Reino de Portugal» eram anunciadas na edição de 21 de Janeiro de 1919 de «O Commercio do Porto».
O Visconde do Banho era nomeado Ministro da Instrucção e da Justiça e instalava-se no edifício da
Universidade do Porto. Na edição do dia seguinte noticiam-se as primeiras prisões dos dissidentes
republicanos. A Monarquia do Norte, liderada por Paiva Couceiro tinha uma vida curta e a República
era restaurada a meados do mês de Fevereiro. A edição de 14 de Fevereiro de 1919 de «O Commercio
do Porto» anunciava a restauração da República: «n’um movimento rapido, de extraordinario e grande
presteza, foi hontem restaurada a republica no Porto». Na edição de 19 de Fevereiro são pela primeira
vez noticiadas as «prisões de implicados nos ultimos acontecimentos [...] que recolheram
incommunicaveis ao Aljube». Nas edições do «O Commercio do Porto» dos dias seguintes são
noticiadas mais prisões de (supostos) adeptos monárquicos. Na edição do dia 21 de Março de 1919
podemos lêr, na rubrica das prisões: «Em Ponte de Lima foi detido, vindo para esta cidade e recolhendo
ao Aljube, o snr. G. Sampaio, professor da Universidade do Porto».
Porque razão era preso G. Sampaio? Nas edições do «O Commercio do Porto» de 21 de Janeiro
a 19 de Fevereiro de 1919 não encontrámos qualquer referência a actos públicos de G. Sampaio de
adesão à Junta de Paiva Couceiro. Em Agosto decorrem muitos julgamentos dos presos implicados na
Monarquia do Norte. Os processos eram julgados em «conselho de guerra num tribunal militar especial
para julgamento de presos politicos». «O Primeiro de Janeiro» e «O Commercio do Porto» narravam
diariamente as sessões dos julgamentos. «O Primeiro de Janeiro» de 1 de Agosto de 1919 relatava que
«foram entregues ao tribunal militar os processos referentes aos presos politicos srs. Gonçalo Antonio
da Silva Ferreira Sampaio e Antonio Ferreira Sampaio, moradores na rua da Constituição». No entanto,
tanto nas edições do «O Primeiro de Janeiro» como no «O Commercio do Porto» de 1 a 21 de Agosto
não deixe de colher liquenes até no sul, que deve estar cheio de novidades sem fim». Torna-se difícil de compreender este
texto, escrito por quem tinha o percurso académico que referimos e que era considerado e respeitado no mundo científico
europeu.
130
Não cabe, obviamente, no presente trabalho, uma análise política da Monarquia do Norte, nem procedemos a qualquer
investigação sobre as condições em que terá decorrido a prisão de G. Sampaio. Referimos este episódio porque G. Sampaio,
durante a sua prisão de 1919, terá escrito uma das suas obras mais significativas, o «Epitome da Flora Portuguesa» (ver
Capítulo XIII.4.). Procurámos, pela consulta de dois jornais diários portuenses, «O Commercio do Porto» e «O Primeiro de
Janeiro», datar o dia da sua prisão e o da sua libertação. O manuscrito do «Epitome da Flora Portuguesa» apresenta um
prefácio que termina com, «Porto, Aljube, 27-5-1919». G. Sampaio é preso a 22 de Março e libertado a 21 de Agosto. Tinha
sido o prefácio escrito ao começar ou finalizar a obra? Se foi escrito ao começar, o trabalho terá sido elaborado em menos
de três meses. Se o prefácio foi escrito no final da redacção, esta terá demorado no máximo dois meses. A Monarquia do
Norte encontra-se relatada em detalhe por SILVA (2006).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
100
de 1919 não encontrámos qualquer notícia referente ao julgamento de G. Sampaio. Finalmente, na
edição de 21 de Agosto de 1919 podia ler-se: «Foi restituido á liberdade o snr. dr. G. Sampaio, que se
encontrava em tratamento no hospital da Misericordia». G. Sampaio tinha portanto estado cinco meses
encarcerado131.
131
Pela análise da sua correspondência com A. Ricardo Jorge, pode-se afirmar que após a libertação e até Maio de 1920 G.
Sampaio viveu na Póvoa de Varzim, Rua António Graça, 32. Num bilhete-postal datado de 28 de Maio de 1920, escrevia
para A. Ricardo Jorge: «Vou retirar da Povoa de Varzim para Braga» (BN A/2044).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
101
VIII. Gonçalo Sampaio e a Flora Ibérica. As exsicatas
1. As exsicatas no início do século XX
No início do século XX, a distribuição de colecções de folhas de herbário (exsicatas) era uma
actividade muito difundida. Várias instituições e particulares preparavam as suas exsicatas que
vendiam ou permutavam por outras preparadas por outras instituições ou particulares. Esta actividade
era importantíssima, porque permitia o enriquecimento das colecções e herbários. SENNEN (1932)
sintetiza a importância das exsicatas, referindo em particular à que organizava: «Le résultat le plus
positif des centaines de mille d’exemplaires de plantes d’Espagne distribués par nos exsiccata est de
caractère purement scientifique: l’approvisionnement des musées, la vulgarisation de la flore ; et aussi
la mise en évidence des caractères floristiques indéniables propres aux plus petits domaines, lorsqu’ils
sont isolés». Só com bons herbários era possível realizar boas Floras e deste facto cedo se terá
apercebido G. Sampaio que irá participar activamente em diversas exsicatas, tantos institucionais como
individuais. Desta actividade resultou um enriquecimento do Herbário da Academia e da Faculdade.
Algumas exsicatas eram constituídas por plantas vasculares, outras abrangiam todos os grupos
tradicionais da Botânica. As espécies endémicas eram particularmente regateadas e as exsicatas eram
tanto melhores e valiosas quanto maior número destas espécies tivessem. Fr. Sennen, ao fazer o
balanço de 25 anos da sua exsicata salientava quais as características de uma boa colecção: «Cet intérêt
se tire de la richesse des matériaux de certains groupes complexes, du nombre considérable d’espèces
rares et endémiques, de leur grande diversité géobotanique. Il résulte aussi du nombre considérable de
récolteurs [...] et, en général, de l’abondance, de l’esthétique préparation et de la belle présentation des
spécimens [...] l’intérêt géobotanique résulte de la diversité des domaines qui sont entrés à contribution.
[...] La plage et la dune, le littoral, l’étage des moyennes montagnes, l’étage alpin et de la zone glaciale,
ont fourni des contingents très variés». Nas exsicatas que tiveram a colaboração de G. Sampaio eram
frequentes os pedidos das espécies, endémicas portuguesas ou endémicas ibéricas. Se excluirmos a
«Flora lusitana exsiccata» da Sociedade Broteriana e as exsicatas específicas de Rubus132, encontrámos
evidência documental para a participação de G. Sampaio em diversas exsicatas europeias. Os contactos
iniciam-se por volta de 1901, quando G. Sampaio entra para naturalista da Academia Politécnica.
2. G. Sampaio e a Universidade de Montpellier
132
Sobre este assunto ver Capítulos IV e V.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
102
A referência mais antiga diz respeito à Universidade de Montpellier. O Instituto de Botânica
desta Universidade francesa distribuía uma exsicata organizada por Ch. Flahault e J. Daveau133. No
catálogo para a exsicata de 1902, Ch. Flahault descrevia o esforço de organização do Herbário da
Universidade: «nous poursuivons depuis 22 ans pour mettre l’herbier de Montpellier au niveau des
grandes collections nationales». Seguidamente elogiava enfaticamente o trabalho de J. Daveau na
organização do herbário: «l’infatigable et savante collaboration de notre ami M. J. Daveau», e também
«a fait, pour plusieurs botanistes, de nombreuses déterminations d’espèces exotiques, plus encore que
de plantes indigènes, et nous avons communiqué des éléments de travail à des savants de divers pays».
Seguidamente, Ch. Flahault agradecia aos botânicos que tinham contribuído para a exsicata daquele
ano. J. Daveau procedia à revisão do Herbário seguindo uma ordem por famílias. No catálogo de 1902,
Ch. Flahault agradecia a revisão das monocotiledóneas, no de 1904, a revisão das Apiáceas, Araliáceas,
Asteráceas (parte), Dipsáceas, Rubiáceas e Valerianáceas, no de 1905, as Asclepiadáceas, Asteráceas
(parte), Campanuláceas e Ericáceas, e no de 1906, as Borragináceas, Convolvuláceas, Escrofulariáceas,
Gencianáceas, Loganiáceas, Orobancáceas, Polemoniáceas e Solanáceas.
Como operava a exsicata da Universidade de Montpellier? Ch. Flahault escrevia os objectivos e
o modus operandi nos catálogos de 1904, 1905 e 1906: «nous rappelons que nous donnons, chaque
année, tout ce dont nous pouvons disposer et que, en retour, nous acceptons les dons qu’on veut bien
nous faire. Il ne saurait être question pour nous d’échanges ayant, de près ou de loin, un caractère
commercial. Nous avons mieux à faire qu’à compter ou peser la valeur, forcément arbitraire et relative,
de ce que nous offrons ; nous n’avons qu’un but, multiplier les moyens de travail». G. Sampaio irá
trocar muitos exemplares com a Universidade de Montpellier, alguns destinados a exsicatas da
133
Existem no espólio de G. Sampaio os catálogos desta exsicata referentes aos anos de 1902, 1904, 1905 e 1906
(«Catalogue des Plantes que l’Institut de Botanique de Montpellier peut distribuer»). Neste período encontra-se também
documentação epistolar sobre trocas entre a Universidade de Montpellier e G. Sampaio, pelo que se poderá deduzir que este
intercâmbio se restringiu a este período. Nos catálogos estão marcadas, a lápis ou a tinta, diversas espécies. Serão
presumivelmente as espécies que G. Sampaio terá pedido em troca das que enviava. Quais os botânicos que contribuíam
para esta exsicata? Dos botânicos que colaboraram com G. Sampaio, encontramos a referência à participação do próprio J.
Daveau, de Fr. Sennen (em todos os catálogos) e de A. X. Pereira Coutinho, só no ano de 1906. A colaboração de G.
Sampaio é reconhecida nos catálogos referentes aos anos de 1902, 1904 e 1906. Os exemplares que não eram recolhidos em
França tinham a indicação do país de origem. Dado que para as distribuições de 1902 e 1904, G. Sampaio era o único
português que contribuía para a exsicata de Montpellier, podemos identificar as contribuições que G. Sampaio terá feito
para a exsicata desta universidade. No catálogo referente a 1902, G. Sampaio contribuiu com exemplares referentes a 30
táxones, mas em 1904, só a nove. No catálogo referente a 1906, aparecem referidos também nove exemplares portugueses,
mas além de G. Sampaio, também A. X. Pereira Coutinho tinha contribuído. Estes incluíam diversos táxones da autoria de
G. Sampaio (Gratiola genuflora Samp., Myosotis globularis Samp., Romulea Clusiana var. serotina Samp., Spergularia
rupicola var. australis Samp. e Veronica demissa Samp.) e outros dos botânicos clássicos (Anagallis parviflora Link &
Hoffm., Campanula primulaefolia Brot., Erythraea major Link & Hoffm., Linaria amethystina Link & Hoffm., Linum
setaceum Brot., Ranunculus bupleuroides Brot., Silene littorea Brot., Silene scrabiflora Brot., Thymus glabratus Link &
Hoffm. e Viola lusitanica Brot.). Como se referiu no início deste capítulo este tipo de exemplares eram especialmente
valiosos nas exsicatas.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
103
Universidade francesa, outros ao seu Herbário. J. Daveau, num bilhete-postal datado de 21 de
Dezembro de 1901 escrevia para G. Sampaio que «As listas das plantas a distribuir ainda não estão
promptas, mas não podem tardar muito!». G. Sampaio terá enviado plantas para o Herbário da
Universidade de Montpellier em 1902. Ch. Flahault, num bilhete-postal datado de 30 de Janeiro de
1903 escrevia: «Nous avons reçu avec vive reconnaissance votre envoi de plantes. L’année finit, pour
l’administration de notre herbier, au 1er. Décembre. C’est à cette date que j’ai arrêté la liste de nos
doubles; c’est pourquoi votre envoi n’y figure pas. Mais vous pensez bien qu’il a été accueilli avec
reconnaissance. Vous recevrez bientôt notre envoi». As contribuições de G. Sampaio para o Herbário
de Montpellier continuaram. Num bilhete-postal datado de 8 de Novembro de 1905, J. Daveau
escrevia: «Recebi em seu tempo a sua carta avisando me da remessa de valiosos exemplares para
distribuição e para a collecção d’este nosso Instituto. Entretanto mando pelo correio dois dos
Dianthus que me pediu [...] Com respeito ao seu pedido de correspondente para trocar Dianthus, não
posso lhe dar satisfação. O melhor modo seria de dirigir seu pedido ao secretario da Sociedade
Botânica de França que o fará inserir no Boletim». J. Daveau recebe de facto as plantas de G. Sampaio
e escreve a 12 de Dezembro deste ano, «Recebemos o pacote de plantas e brochuras, tendo remetido
ao Sr. Flahault as plantas e brochuras que lhe eram destinadas e pela minha parte agradeço as que
me fez o favor de offerecer». Ch. Flahault, num bilhete-postal com a data de 11 de Dezembro deste
mesmo ano, reforçava as palavras de J. Daveau: «Nous avons reçu hier votre précieux paquet et nous
vous remercions vivement de vos brochures et de vos plantes pour nos herbiers et pour notre
distribution de doubles. Tout cela nous fait grand plaisir. Ce qui nous fait de plaisir encore, c’est votre
grande activité et le zèle avec lequel vous étudiez». Os exemplares históricos dos herbários portugueses
eram valiosos e naturalmente alvo de especial atenção. A carta de J. Daveau datada de 28 de Dezembro
de 1905 dirigida a G. Sampaio é esclarecedora a este respeito: «Na sua próxima remessa, estimava
muito receber os dois typos Linaria Ficalheana e L. Welwitchii. Emprestei (dei emprestado) a alguém
que não me lembro e que se esqueceu de m’o devolver o trabalho do Rouy sobre Linarias de modo que
estou um tanto nas escuras a respeito das espécies d’este meu amigo. É muito possível que tenha
confundido Ficalheana com Welwitchii. Tenho uma vaga ideia que uma espécie da península de Tróia
falsamente chamada L. reticulata pelo conde de Ficalho, deve ser a L. Ficalheana Rouy, e que a L.
filifolia [...] foi desdobrada formando a L. Welwitchii, mas não tenho textos para verificar. Agradeço
muito o que me poder certificar n’este respeito, assim como exemplares da espécie de Tróia se os
tiver»134.
134
O «Catalogue des Plantes que l’Institut de Botanique de Montpellier peut distribuer» para 1906, o último que existe no
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
104
3. G. Sampaio e Carlos Pau
Talvez as trocas mais intensas tenham sido com os colegas botânicos espanhóis, C. Pau, B.
Merino, Fr. Sennen e Font Quer. G. Sampaio conhece C. Pau por intermédio de B. Merino.
Inicialmente os interesses centram-se em Rubus135, mas rapidamente as trocas generalizam-se a outros
grupos. Numa carta datada de 25 de Agosto de 1902 e endereçada de Segorbe, C. Pau explicita quais as
plantas que lhe interessam mais - as endémicas primeiro: «Las plantas que á mi en primer lugar me
interesan son las de la Península, y de Portugal las formas propias de esta flora; de la isla Madeira,
no siendo alguna especie que exista en las floras mediterráneas, no me importan. […] Ahí en las
cercanías de Oporto existen, según los autores, bastantes formas propias de Portugal y que no poseo;
quedaría muy agradecido a V. […] pudiera proporcionarmelas para mi colección». Alguns dias
depois, a 11 de Setembro, C. Pau envia alguns Rubus para G. Sampaio e volta a reafirmar quais as
plantas que gostava de ter em troca, «Las plantas portuguesas que á mi más me convienen […] los
propias de la flora de Portugal». No início do ano seguinte, a 5 de Janeiro de 1903, C. Pau volta a
manifestar o seu interesse na troca de plantas com G. Sampaio, sobretudo porque os seus «deseos son
igualmente conocer la flora portuguesa que hoy desconozco por completo. Indicará V. condiciones y
órdenes, pues yo tendré mucho gusto en complacerle en todo cuanto me sea posible; el número podrá
V. indicarlo. Yo podría fácilmente proporcionarlo hasta 600 formas españolas y que tengo de años
anteriores. […] Mis formas nuevas, siempre que poco ejemplares para repartir, son las primeras
especies que comunico; muchas las tengo agotadas, pero de bastantes puedo disponer de ejemplares
que tendré cuidado de mandarlos á V.». No fim do ano, nova carta de C. Pau, datada de 4 de
Novembro em que o botânico espanhol insiste na troca de plantas «rendirle a V. el ofrecimiento de
plantas españolas que a V. hice el año pasado. Pues bien, a fines de año podré remitirle a V. sobre 500
especies de fanerogamicas; V. me las devolverá en plantas fanerogamicas portuguesas cuando queda y
lo venga bien». Finalmente, G. Sampaio envia um lote de plantas para C. Pau, que agradece rejubilado
em carta datada de 19 de Janeiro de 1905 - «En mi poder las plantas y el folleto que se ha servido V.
comunicarme por todo lo cual le manifiesto mi agradecimiento. Entre ellas veo la Centaurea
Fraylensis, que no poseía, y le doy un millón de gracias por habermela proporcionado: ella sola, vale
por ciento. Mis plantas no tardaran en ir y mañana mismo comenzaré á prepararlo». C. Pau revela-se
mesmo como um entusiasta sequioso de plantas e herbários, perguntando a G. Sampaio se não existiria
espólio de G. Sampaio, data de 24 de Dezembro de 1905, pelo que não é possível confirmar se estas duas linarias terão sido
enviadas.
135
Ver Capítulo IV.4C.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
105
algum herbário português à venda: «Lo mismo compraré un herbario portugues (unicamente) […] V.
de alguno que lo quisiera vender; pero hace de poseer de mil especies por arriba, y no ser exajerado el
precio». E novamente a mesma pergunta numa carta datada de 22 de Março de 1905: «¿Existe en
Portugal algún botánico que se dedique á la venta de las plantas?».
4. G. Sampaio e Fr. Sennen
Em 1912, G. Sampaio inicia uma troca de correspondência com Fr. Sennen de Barcelona136,
que se prolongará por muitos anos. Num bilhete-postal datado de 23 de Março de 1912, dirigida a G.
Sampaio, Fr. Sennen anunciava o seu interesse em trocar plantas de herbário: «Je désirerais la
procurer soit par achat soit en échange de plantes de mes exsicata. Cette année je distribue 800
numéros de plantes de Catalogue, Baléares, Valence, Aragon, Castille, Asturies. Certains numéros
sont épuisés mais la plupart sont encore représentés». Alguns meses mais tarde, a 12 de Agosto de
1913, Fr. Sennen escrevia novamente a G. Sampaio, procurando activamente espécies endémicas
portuguesas, «J’aurais bien désiré publier quelques bonnes espèces de Portugal, mais je ne sais si vous
pourrez me donner cette satisfaction. Jusqu’á présent j’ai un certain nombre de numéros intéressants».
G. Sampaio envia as suas «Lista das espécies» do Herbário Português, entretanto publicadas, pelo que
a 15 de Janeiro de 1914 Fr. Sennen novamente insiste na troca de plantas: «Merci pour votre Apendice
a l’Herbário Portugués. Dés qu’il me sera possible de signaler les espèces intéressantes et bien
nombreuses pour ma publication, je vous enverrai le Catalogue pour que vous puissiez faire votre
chois. En ce moment je fais étudier quelques formes critiques par des spécialistes». G. Sampaio
publica mais um apêndice à «Lista das espécies» representadas no Herbário Português e envia um
exemplar para Fr. Sennen. Fr. Sennen selecciona as espécies que lhe interessavam para a sua exsicata e,
num bilhete-postal datado de 22 de Fevereiro de 1914, envia a lista para G. Sampaio, insistindo mais
uma vez na troca de plantas seleccionadas: «Merci pour votre Segundo Apendice à l’Herbário
Portugués. J’ai déjà […] sur ce riche herbario, les plantes parmi lesquelles vous pourrez faire votre
choix pour les plantes à récolter pour mon exsicata. Si vous le trouvez bien je vous […] dans le
fascicule que j’espère vous adresser dans les premiers jours de Mars». G. Sampaio terá respondido
indicando quais as plantas que poderia fornecer para a exsicata de Fr. Sennen. Num bilhete-postal
ilustrado datado de 13 de Junho de 1914, Fr. Sennen pede então a G. Sampaio as plantas seleccionadas
que lhe interessavam: «Je recevrai avec plaisir pour l’exsicata, le Saxifraga […] et les autres plantes
136
Frère Sennen (1861-1937), Étienne Marcellin Granier-Blanc, era francês. O seu herbário, constituído por cerca de 85.000
espécimes, encontra-se actualmente no Instituto Botânico de Barcelona (http://www.institutbotanic.bcn.es/herbario.html).
Bibliografia de Fr. Sennen está disponível em http://bibdigital.rjb.csic.es/
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
106
que vous me signalez et pour lesquelles je vous […] Déjà de fort bonnes plantes me sont annoncées par
plusieurs collaborateurs». G. Sampaio terá enviado rapidamente as plantas para Fr. Sennen, muitas em
conjuntos de 20 repetidos, porque a 14 de Agosto deste mesmo ano, Fr. Sennen agradece a encomenda
recebida: «J’ai reçu ce matin vos deux postaux de belles plantes portugaises, très intéressantes pour
lesquelles je vous suis bien reconnaissant, tant pou celles envoyées en 20 [A caligrafia de Fr. Sennen
não é inequívoca, mas parece-nos tratar do número 20] que pour les autres en une part. Je reviens des
Pyrénées avec quelques bonnes espèces. J’ai aussi quelques bonnes plantes des Baléares». Em troca,
Fr. Sennen envia exemplares da sua exsicata para G. Sampaio e, em bilhete-postal ilustrado de 26 de
Março de 1915, pede a confirmação da recepção das suas plantas: «Vous aurez sans doute reçu mon
envoi de plantes d’Espagne, distribuées en trois fascicules et 2 colis […] J’espère que vous les aurez
bien reçues, bien que quelques numéros ne soient pas si intéressants que ceux qui proviennent de vos
plantes choisis de Portugal». Fr. Sennen fica maravilhado com as plantas enviadas por G. Sampaio.
Talvez porque muitas espécies lhe fossem desconhecidas. Fr. Sennen vivia em Barcelona e herborizava
sobretudo nesta região. Não estaria muito familiarizado com a flora portuguesa. Num bilhete-postal
ilustrado de 20 de Abril de 1915 escrevia para G. Sampaio que «Je suis émerveillé de la richesse de vos
récoltes et je me réjouis d’avance des envois que vous me promettez. Je vous en remercie en attendant
le plaisir des beaux moments passés à leur contemplation». Por um bilhete-postal de Fr. Sennen
dirigido a G. Sampaio, datado de 11 de Dezembro de 1915, sabemos que Fr. Sennen envia as etiquetas
impressas para G. Sampaio colocar nas folhas de herbário: «Je ne trouve pas l’étiquette du petit
Genista enfermé dans la boite avec le Cynomorium. Veuillez me l’adresser aussitôt que vous le
pourrez, car les étiquettes vous être données sans retard à l’imprimeur. J’espère que vous aurez reçu
mon petit envoi de plantes pour vos correspondants»137. Alguns dias depois, a 6 de Janeiro de 1916, Fr.
Sennen volta a insistir na etiqueta da Genista e pede confirmação da recepção dos exemplares enviados
da sua exsicata: «Je me permets de venir vous demander l’étiquette du Genista qui accompagnait le
Cynomorium dans la boite ; sans cette étiquette je ne pourrai pas distribuer cette intéressante espèce
portugaise. J’espère que vous aurez également reçu mon modeste envoi pour vos amis». Todavia Fr.
Sennen tinha-se enganado. Não era uma Genista mas um Ulex erinaceus, uma espécie de Welwitsch.
Num bilhete-postal ilustrado datado de 12 de Junho de 1916 escrevia para G. Sampaio, sempre
absorvido pela sua exsicata: «Je viens de recevoir l’étiquette de Ulex erinaceus, que par distraction et
sans faire attention aux calices, j’avais nommé Genista. Avez-vous déjà pensé à mes exsiccata ? Je vais
137
Algumas etiquetas ainda se encontram no espólio epistolar de G. Sampaio (ver Capítulo XV). As folhas de herbário da
exsicata de Fr. Sennen sairiam portanto prontas das mãos de G. Sampaio.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
107
bientôt partir pour les Pyrénées. On m’a promis des plantes d’Afrique». Em bilhete-postal datado de
21 de Novembro de 1918 Fr. Sennen pede a G. Sampaio uma determinada espécie para a sua exsicata:
«Vos belles plantes de Portugal seront toujours les bien-venues. Pourriez vous m’adresser quelques
pieds les uns fleuris les autres en graines mûres de Arenaria conimbricensis Brotero ? Je voudrais les
comparer avec quelques formes critiques de ce groupe».
A exsicata «Plantes d’Espagne» de Fr. Sennen138 era vastíssima, e progredia a um ritmo
vertiginoso, distribuindo centenas de exemplares por ano139. Para alimentar as distribuições, Fr. Sennen
precisava de receber muitas plantas dos seus colaboradores (mas estes recebiam em troca os
exemplares da exsicata). Por isso encontramos muitas cartas de Fr. Sennen dirigidas a G. Sampaio
indagando das próximas remessas de plantas. Em bilhete-postal datado de 28 de Março de 1921, Fr.
Sennen escrevia a G. Sampaio que «J’ai attendu longtemps à vous dire, combien m’était agréable la
lettre dans laquelle vous m’annoncez votre précieux envoi de plantes, que je n’ai pas encore reçu.
J’espère toutefois qu’il arrivera». Mas os envios de G. Sampaio tardavam em chegar e, por isso, Fr.
Sennen escreve novamente para G. Sampaio a 4 de Janeiro de 1922: «Je n’ai pas encore reçu l’envoi
que vous m’avez annoncé depuis longtemps. Le cahier des étiquettes de 1921 est prêt pour
l’imprimerie. Si vos plantes arrivent je les joindrai à ces séries».
Por intermédio de G. Sampaio, A. Ricardo Jorge também irá participar na exsicata de Fr.
Sennen, enviando plantas e recebendo exemplares das distribuições140. A participação de A. Ricardo
Jorge nesta exsicata terá sido iniciada em 1917 e sugerida por G. Sampaio. Numa carta datada de 17 de
Maio de 1917, G. Sampaio escrevia a A. Ricardo Jorge: «Vou escrever ao Sennen para o admitir como
colaborador das suas distribuições de plantas. É necessário que o meu amigo lhe mande as plantas
138
Em 1932, ao comemorar os 25 anos da exsicata «Plantes d’Espagne», Fr. Sennen fazia o balanço da sua obra
monumental (SENNEN, 1932). A exsicata terá começado em 1906. Inicialmente foi a região onde vivia, a Catalunha, a mais
intensivamente herborisada. Fr. Sennen sintetizava modestamente o quarto de século da sua exsicata escrevendo neste
trabalho: «Toutes les vacances de ces 25 laborieuses années ont été consacrées à leur exploration […] Nous ne nous
attribuons d’autre mérite que celui de la persévérance dans le labeur». A distribuição da exsicata terminou em 1937. No seu
conjunto foi constituída por 30 séries, totalizando 10.309 espécimes (http://www.institutbotanic.bcn.es/herbario.html)
139
Analisando as etiquetas dos exemplares organizados por G. Sampaio é possível concluir que a exsicata «Plantes
d’Espagne» de Fr. Sennen distribuía centenas de exemplares por ano. A série dos exemplares n.os 2925-2940 da exsicata
terá sido constituída por exemplares organizados por G. Sampaio entre Abril de 1915 e Setembro de 1916 e terão sido
distribuídos ainda em 1916 ou em 1917. A série de n.os 3294-3312 da exsicata terá sido constituída por exemplares
organizados por G. Sampaio entre Abril e Outubro de 1917 e terão sido distribuídos neste ano ou no seguinte. Os números
4308-4324 da exsicata terão sido constituídos por plantas organizadas por G. Sampaio entre Junho de 1915 e Julho de 1920
e terão sido distribuídos ainda em 1920 ou em 1921 ou até em 1922.
140
A colaboração dos botânicos portuguesas na exsicata de Fr. Sennen era agradecida pelo seu autor: «Le Portugal, que
géographiquement ne peut être séparé de l’Espagne, nous a apporté son concours. Messieurs les professeurs Dr. G.
Sampaio, Dr. R. Jorge, Dr. R. Palhinha, nous ont envoyé le plus intéressant de leur flore. A tous ces collaborateurs, dont la
continuation d’une coopération effective n’a pas toujours dépendu de leur bon vouloir, nous adressons nos plus vifs
remerciements, demandant à ceux que le peuvent de nous continuer leur aide bienveillante et dévouée» (SENNEN, 1932).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
108
(30 exemplares de cada espécie) até meio de outubro. Ele distribui em janeiro. Incluso mando-lhe uma
lista das espécies que pode enviar-lhe e que se encontram ahi no sul. Mandará pelo menos 10 espécies
por ano» (BN A/2025). Algum tempo depois, numa carta datada de 3 de Agosto deste ano, G. Sampaio
escrevia entusiasmado a A. Ricardo Jorge: «Irei nas férias a Castelo Branco. Ahi lhe remeto a resposta
do Sennen, que diz que lhe vai enviar uma colecção dos seus duplicados. Deve ser colecção excelente,
a julgar pelas que costuma mandar. Se quizer, escreva-lhe já, agradecendo e pondo-se em relação
directa com ele» (BN A/2094). Num bilhete-postal dirigido para G. Sampaio, datado de 10 de Maio de
1918, A. Ricardo Jorge escrevia: «Levo para o Sennen o Ulex argenteus Welw.». A. Ricardo Jorge
viaja muito no estrangeiro e no país. Nas suas excursões irá recolher muitos exemplares para a exsicata
de líquenes de G. Sampaio141, mas também para a exsicata de Fr. Sennen. Num bilhete-postal datado de
5 de Novembro de 1919, dirigido a G. Sampaio, Fr. Sennen escrevia: «Je n’ai pas encore fait la
distribution de 1918. Je la réunirai à celle de 1919 et vous adresserai votre contingent des premiers.
Avez-vous quelques bonnes espèces pour cette année ? Ainsi que M. le Dr. Ricardo Jorge ? […] P.S. –
Il y a plus d’un an que j’ai envoyé […] deux colis de plantes pour le Dr. Ricardo Jorge». Num bilhetepostal dirigido a G. Sampaio datado de 12 de Maio de 1920, A. Ricardo Jorge, entre menções a
líquenes, escrevia: «Já recebi uma infinidade (talvez 500 ou mais) de plantas do Sennen. Vou fazer
uma remessa de boas especies para a distribuição e para ele». G. Sampaio, numa carta endereçada da
Póvoa de Varzim, datada de 16 de Maio de 1920, indagava junto de A. Ricardo Jorge da sua satisfação
com a colaboração na exsicata de Fr. Sennen: «Então gostou da remessa do Sennen? Eu tambem a
recebi ha dias. Distribui sempre plantas muito boas e em grande número» (BN A/2088).
Mas os envios de A. Ricardo Jorge tardavam a chegar e, por isso, Fr. Sennen num bilhete-postal
dirigido a G. Sampaio datado de 4 de Janeiro de 1922 queixava-se que «Je suis également sans
nouvelles de M. le Dr. Ricardo Jorge qui m’a fourni pendant deux ans de bonnes plantes. Je ne sais
pas même s’il a reçu mes 3 ou 4 envois en plusieurs colis». No entanto, A. Ricardo Jorge continuava a
herborizar para a exsicata de Fr. Sennen. Numa carta dirigida a G. Sampaio, datada de 9 de Abril de
1925, A. Ricardo Jorge escrevia que «já tenho um bello programa de colheitas para o Sennen, para
quem já tenho preparadas algumas boas especies a que outras se juntarão do sul».
5. G. Sampaio e Font Quer
141
Ver Capítulo X.2.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
109
G. Sampaio também terá participado nas exsicatas organizadas por Font Quer142 do Museu de
Ciências Naturais de Barcelona: «Herbario Ibérico» e «Flora iberica selecta». Em carta datada de 5 de
Fevereiro de 1924, Font Quer escrevia que «Le quedo tambien muy reconocido por el envio que me
ofrece de un centenar de duplicados del Museo Botánico de Porto; los acepto, y puede remitirlos
cuando guste a cambio de otras tantas especies raras, de España, que puedo mandarle yo. Y, espero
que asi que vuelva de lleno a los trabajos botánicos podrá colaborar en la formación del que yo
quisiera que fuese «Herbario Ibérico», los trabajos del cual prosiguen felizmente. El año pasado
hemos herborizado en Valencia […] Seria una lástima que en Portugal no tuvieran ningún ejemplar de
este Herbario. Y como se venderá a unas mil pesetas oro la colección de las primeras mil especies,
claro es que será difícil adquirirlo. Piensen Vds. en una posible colaboración, y a cambio de plantas
bien preparadas, lo pueden obtener gratis». Algum tempo depois, já na década de 1930, Font Quer terá
indagado junto de G. Sampaio se queria participar numa nova exsicata em curso, a «Flora iberica
selecta». A resposta do professor portuense terá sido positiva, dado que o botânico de Barcelona
escrevia a 18 de Fevereiro de 1935 em tom de satisfação e concretização: «Recibo con suma
complacencia su carta de 9 de diciembre en la que me ofrece su colaboración para le empresa de la
Flora iberica selecta; y se lo agradezco profundamente. Ahora mismo he dispuesto que le sea remitida
la última colección que nos queda de la Centuria I, que espero recibirá dentro de unos dias. Viendo la
colección, asi como hojeando las Schedae que he tenido el gusto de remitirle, se dará cuanta del
carácter de la exsicata, hecha a base de especies herborizadas en sus localidades clásicas. […] Por el
momento bastará con que V. remita cinco especies, con 32 pliegos de cada una, que es lo que
corresponde a una Centuria de la Flora iberica selecta. Si V. ahora, sin las exigencias de su cátedra,
creia posible colectar plantas para Flora iberica en cantidad mayor que 10 especies por año, que
corresponden a las dos Centurias que pensamos dar anualmente, tal vez le interesaria recibir a
cambio de las que pudiese mandar y pasasen de aquel número una cantidad en metálico. Asi trabajan
algunos colaboradores nuestros, a quienes enviamos quince pesetas por cada especie bien preparada,
previamente aceptada por nosotros y en número de 32 ejemplares».
6. Outras exsicatas
Também encontrámos referência a exsicatas particulares. M. Gandoger143, num bilhete-postal
com o carimbo de Villefranche – Rhone, dirigido a G. Sampaio, datado de 29 de Janeiro de 1902,
142
143
Pius Font i Quer (1888-1964). Para uma biografia sumária deste botânico catalão ver: http://www.institutbotanic.bcn.es/
Sobre M. Gandoger ver Capítulo IV.4C.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
110
propunha-se iniciar uma troca de plantas de França por plantas de Portugal continental ou das suas
colónias: «Aurez-vous la bonté de me dire si vous voudriez faire avec moi un échange de plantes
sèches pour l’herbier ? Je vous enverrai des espèces rares de France avec plusieurs de mes ouvrages
botaniques. En retour vous m’enverrez des plantes de Portugal (ou des colonies portugaises, si vous en
avez). Il me reste encore 31 exemplaires de mon Flora Europae (27 vol. […] 1882-1893). Voulez vous
en accepter un exemplaire en échange de plantes sèches exotiques ? […] Combien avez-vous de
centaines de ces plantes exotiques à donner ?». G. Sampaio terá respondido afirmativamente a este
pedido, mencionando o seu especial interesse pelos Rubus. M. Gandoger envia nova carta de Arnas,
Villefranche – Rhône, datada de 24 de Agosto desse mesmo ano, em que afirmava que «Je viens de
recevoir votre aimable lettre, et je m’empresse de vous dire que je recevrai avec beaucoup de plaisir
vos plantes de Portugal. En retour, je vais vous envoyer un bon paquet de plantes rares de France […]
Je possède 7 à 800 espèces pour échanger ; il me sera donc facile de vous dédommager. En 1903 je
récolterai des Rubus, genre que je connais très bien, ayant publié des ouvrages sur lui. Si vous avez
des espèces de ce genre à déterminer, envoyez-les moi, avec des numéros, je vous en donnerai les noms
exacts». G. Sampaio envia então plantas para M. Gandoger, que responde a 2 de Dezembro deste
mesmo ano, prometendo retribuir a oferta de G. Sampaio, mas infelizmente sem Rubus - «J’ai reçu
votre paquet de plantes en bon état, ainsi que vos savantes brochures botaniques. Je vous en remercie
bien. Aujourd’hui je vous envoi, en retour, un paquet de plantes. Je regrette de ne pouvoir vous donner
des Rubus, car, en ce moment je n’en ai pas de doubles, et quand vous m’avez écrit, il était trop tard
pour en récolter, car les plantes étaient défleuries. Mais en 1903, je récolterai des Rubus pour vous et
beaucoup d’autres plantes que je vous enverrai avec plaisir». A correspondência com M. Gandoger
não terá sequência.
G. Sampaio irá também trocar plantas com o Herbário de Gustav Müller. Em carta datada de 22
de Outubro de 1908, G. Müller escrevia «Je vous en remercie cordialement […] au grand plaisir la
centurie de belles plantes que vous m’offrez. J’en ai déjà reçu quelques unes par […] de la Société
Merlinoise (Leonhardt et Mr. Giraudias). La plupart des espèces seront bien désirées et il va sans dire
que je vous préparé en contre valeur un envoi dont j’espère que vous aurez toute entière satisfaction
afin que nos relations d’échange continueront. M’occupant surtout des Crucifères je vous serais bien
obligé si vous pourriez me procurer un échantillon de […]».
Excepcionalmente, G. Sampaio adquiriu exemplares de exsicata por compra. Existem no
espólio de G. Sampaio dois catálogos da firma alemã Otto Leonhardt em Nossen, um referente a
1906/1907
e
outro
para
1912/1913
(«Doubletten
Verzeichnis
des
Berliner
Botanischen
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
111
Tauschvereins»). Os exemplares eram permutados ou vendidos (a 0,05 marcos cada). As listas eram
extensíssimas e abrangiam fungos, algas, líquenes, hepáticas, musgos, fetos e fanerogâmicas. O
catálogo de 1906/1907 encontra-se muito marcado e o de 1912/1913 também tem muitas espécies
sublinhadas. Existe uma importante factura desta firma Otto Leonhardt em Nossen que mostra que G.
Sampaio terá enviado 1.366 espécimes e que terá recebido 1.768 exemplares. O total a pagar era de
39,05 marcos. A factura não está datada, mas na parte inferior, com a letra de G. Sampaio está escrito
que o montante tinha sido pago por cheque em Maio de 1908. Este elevadíssimo número de exemplares
que G. Sampaio enviou para esta firma demonstra uma grande capacidade de organização e trabalho.
7. O projecto da Flora Ibérica
Na década de 1920 houve o projecto ambicioso da elaboração de uma Flora Ibérica, dirigida por
G. Sampaio, e patrocinada pelo governo espanhol. A primeira referência consta de uma carta de R. G.
Fragoso para G. Sampaio, datada de 30 de Maio de 1922. Em jeito de apresentação escreve: «El Jardin,
hoy reunido bajo su direccion con el Museo, forma parte del Instituto de Ciencias Naturales con el
Museo Antropológico, y como yo soy profesor de dicho Instituto, agregado al Museo y Gefe de este
Laboratorio botánico, al pasar al Botánico, sigo siendo profesor del Instituto pero agregado al Jardin
y Gefe en el de la Seccion de Criptogamia». Seguidamente apresenta a proposta da Flora Ibérica: «de
Barcelona Dr. Caballero, discipulo mio de Micologia, y amigo muy querido, tendremos a nuestra
disposición los Herbarios todos, y cualquier planta que Vd. desee consultar estará a su disposición en
cuanto la pida. Esto se lo digo en vista a su colaboración para la flora ibérica. Escoja Vd. una familia,
la que V. quiera, pida las plantas y tipos que desee, y cuanto tengamos aquí, incluso notas de libros,
copias, etc. Con eso, su profundo conocimiento de la flora lusitánica y el Herbario de Willkomm, nadie
estará como Vd. en disposición de hacer admirablemente las floras das familias de la peninsula
ibérica». Por esta carta deduzimos que o projecto seria promovido por R. G. Fragoso, de Madrid, e por
Caballero, de Barcelona. O projecto não se concretiza, mas dois anos depois, Font Quer, também de
Barcelona (do Museo de Ciências Naturais), propõe a elaboração de um catálogo da flora ibérica,
dirigido por G. Sampaio em colaboração com C. Pau. Escreve numa carta datada de 5 de Fevereiro de
1924: «Creo que es indispensable publicar el catálogo de la flora ibérica si se quieren establecer con
probabilidades de éxito las nuevas reglas de nomenclatura propuestas por V.; y creo tambien que si el
Sr. Pau se decidia a emprender esa obra junto con V. adelantaríamos mucho en la resolución de no
pocos problemas de sistemática, y de nomenclatura especialmente. Yo podria ofrecer a los dos la
hospitalidad de las publicaciones de esto Museo, para editar el catálogo con la máxima dignidad. Si
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
112
llegábamos asi a tener una obra parecida al «Genera» de Dalla Torre, concerniente a la flora
peninsular, es indudable que nuestros botánicos lo adoptarian de muy buena gana. Sus puntos de vista
me parecieron muy lógicos. Sólo falta desarrollar la idea, dándole la forma práctica de un catálogo».
Esta carta é importante porque mostra o alcance e o impacto que as propostas de nomenclatura botânica
apresentadas por G. Sampaio no Congresso do Porto tiveram na comunidade de taxonomistas
espanhóis. Todavia o projecto novamente não se concretizaria, mas não terá morrido. R. G. Fragoso
insiste em carta datada de 8 de Março de 1926: «Hemos de ocuparnos los botánicos y Bolivar, de ver
como se hace algo de la flora ibérica, contando sobre todo con su valiosisima cooperación».
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
113
IX. Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho, Gonçalo Sampaio e as Floras de Portugal
1. A necessidade de uma flora moderna de Portugal
As floras disponíveis, de Brotero e de Link e Hoffmansegg, com mais de um século de vida,
estavam naturalmente ultrapassadas e desactualizadas. Por outro lado, em alguns países, tinham sido
publicadas, ou estavam a ser publicadas, floras regionais e nacionais. Era o momento para a criação de
uma flora moderna de Portugal. Quem serão os protagonistas da elaboração desta flora? J. Henriques,
A. X. Pereira Coutinho e G. Sampaio lideraram um grupo de botânicos que levaram a cabo este
desiderato. Neste capítulo discutiremos a forma como esta tarefa foi planeada e executada, com base na
documentação do espólio de G. Sampaio144.
2. As personalidades de J. Henriques e A. X. Pereira Coutinho através do espólio epistolar
Porém, antes do método, os personagens. Que personalidade emerge da correspondência escrita
por J. Henriques? Existe um testemunho externo, directo, de A. Ricardo Jorge. Numa carta datada de 8
de Janeiro de 1902 dirigida a G. Sampaio, sabemos que o jovem médico lisboeta visitou a Botânica da
Universidade de Coimbra onde conheceu J. Henriques. Descreve o professor de Coimbra da seguinte
forma: «Contra toda a espectativa acabo de vêr o que há muito tempo desejava visitar e conhecer.
Chegei ontem de Coimbra onde tive a honra de conhecer o Dr. Julio Henriques que me mostrou
detidamente o museu, o herbario e a bibliotheca, diversos livros (entre elles o manuscripto de
Tournefort) e que me offereceu três volumes do Boletim de Coimbra e que finalmente me convidou
para socio da Broteriana. A descripção que me fez d’elle fica muito aquém da realidade – é
inimaginavel a bondade, simplicidade e franqueza do seu caracter. Gostei immenso do museu que
mostra o trabalho do seu director. Fallei-lhe em si, dizendo-lhe que tinha sido o Snr. Sampaio que me
tinha despertado o gosto pela botanica, gabando-o elle a si como justamente o merece».
Como caracterizaríamos a personalidade e carácter de J. Henriques, por uma análise do
conteúdo das cartas que escreve para G. Sampaio? A simplicidade e generosidade são constantes nas
suas missivas. A sua preocupação com o ensino ressalta de breves frases que intercala nas suas cartas.
Em carta datada de 4 de Novembro de 1902 dirigida a G. Sampaio, terminava com este desabafo:
«Desculpe-me de só agora dar conta de mim, pois só agora começo a entrar no meu estado normal
depois da trovoada das matrículas». A 13 de Abril de 1908 terminava um bilhete-postal para G.
144
Extravasa o objectivo deste trabalho discutir em pormenor a validade científica das propostas que foram sendo
apresentadas pelos intervenientes deste projecto. Fá-lo-emos só pontualmente quando se torna indispensável para a
clarificação de uma questão concreta. O nosso propósito é antes desenhar e discutir a forma e o método utilizados na
prossecução desta tarefa.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
114
Sampaio: «Não lhe dou já resposta às suas perguntas, porque falta o tempo. Bem sabe que estamos na
terrivel epoca de exames». A 27 de Julho de 1909, escrevia para G. Sampaio: «N’esta terrivel epoca de
exames, em que cada dia tenho de estar quatro horas pelo menos, sentado a ouvir o que os rapazes
dizem, em geral muito mal, não há grande vontade de tratar de cazos duvidosos». J. Henriques era
também muito cioso dos seus pertences. Em carta de 24 de Novembro de 1902 dirigida a G. Sampaio,
terminava com a seguinte frase: «Não se esqueça dos livros, que ahi tem». J. Henriques era generoso
mas exigente, o que se depreende de uma carta datada de 20 de Dezembro de 1904: «Tenho esperado a
sua anunciada visita, assim como a remessa dos livros. Vou perdendo a esperança d’uma e d’outra, o
que deveras sinto. Bem compreendo que os livros podem fazer falta. [...] mas é justo devolve-los a
tempo [...] Tudo quanto aqui houver está ás suas ordens, livros, plantas, mas é justo que não haja
longas demoras em devolver o que receber. Estabeleça-mos esta regra, que me parece boa». Os livros
emprestados a G. Sampaio eram uma preocupação. Às vezes irritava-se. Escrevia a 2 de Janeiro de
1923 para G. Sampaio: «A proposito d’esse livro tenho a fazer-lhe um pedido – não escreva n’ele mais
do que já escreveu. Desagrada-me muito ver um livro bem impresso com correcções a tinta de
escrever. É feitio meu. As correcções feitas nem todas são legiveis, de modo que não se sabe o que lá
estava, nem a correcção. Desculpe-me a impertinencia». Com o avançar da idade, J. Henriques irritase ainda mais com as demoras na entrega dos livros emprestados a G. Sampaio. Escrevia a 14 de
Novembro de 1923: «Revendo hoje o livro no qual há as notas dos livros emprestados encontro de 14
publicações sobre liquenes que levou [...] Eu sou o responsavel por tudo isto e era-me muito agradavel
que tudo voltasse. Os emprestimos sem prazo são muito inconvenientes. [...] Convem pois que o livro
emprestado não esteja fora do seu lugar por muito tempo. Isto significa que me era muito agradavel
que o meu amigo mandasse o que lá tem, para descanço meu».
O zelo era também relativo ao material de herbário que emprestava ao seu colega portuense. Às
vezes zanga-se com as demoras de G. Sampaio. Em carta datada de 23 de Janeiro de 1909, J. Henriques
escrevia: «Há mezes que [...] pedido com instância os Ranunculus, que ahi estão. Disse o motivo
porque as pedia, que era a necessidade de as vêr para o catalogo que comecei da flora da bacia do
Mondego. Lembrei-me de pedir ao Dr. Aarão que, no caso de vir no Natal a Coimbra, como
costumava, lh’as pedisse e as trousesse. Respondeu-me que não vinha, nem que tinha falado consigo
[...] Há-de concordar que se eu lhe preparasse uma [...] egual ou mesmo menor, se zangaria comigo.
Eu não me zango porque julgo isto devido aos seus trabalhos, mas peço encarecidamente que os
mande quanto antes pois fazem-me grande falta. Não esqueça também o seu manuscripto para não
atrasar muito a impressão do Boletim». Com este tom de carta, G. Sampaio ter-se-á apressado a
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
115
responder, dado que J. Henriques escreve a 8 de Fevereiro de 1909, em ambiente mais desanuviado:
«Muito estimei receber hontem a sua carta. A falta de resposta a varias cartas recentes e a demora na
remessa das plantas começava a inquietar-me fazendo-me desconfiar do seu modo de ver a meu
respeito. [...] Ainda bem que escreveu e cá espero as plantas». Grande parte da correspondência de J.
Henriques para G. Sampaio é constituída por bilhetes-postais com mensagens breves, como a que
escreveu para acusar finalmente a recepção destas plantas, datado de 19 de Fevereiro de 1909: «Recebi
finalmente as plantas». G. Sampaio dedicará especial atenção ao difícil género Ulex, pedindo
exemplares emprestados ao Herbário da Universidade de Coimbra. O zelo de J. Henriques é bem
expresso nesta frase escrita a 30 de Junho de 1910 numa carta dirigido a G. Sampaio: «Mando como
amostras exemplares de Ulex [são indicadas cinco espécies], exemplares unicos do herbario e por isso
teem de voltar». Bastantes anos mais tarde, a 25 de Maio de 1921, dirigia-se a G. Sampaio no mesmo
tom: «Fiquei satisfeito com a noticia de que brevemente mandava as plantas que para ai foram. Já é
tempo de as pôr no seu lugar, e já [...] fizeram falta. De futuro deverá combinar sempre para haver
pequena demora».
Em 1911 e face à legislação republicana publicada145, J. Henriques requere a sua aposentação.
Informa G. Sampaio a 25 de Março de 1911: «Requeri a aposentação, como não podia deixar de
requerer em face do decreto relativo a aposentações. Tenho as condições n’elle exigidas – mais de 70
anos e mais de 30 de serviço. Veremos o que o governo resolve. O Dr. Arriaga antes de ir para Lisboa
affirmou-me que eu seria confirmado ou conservado no meu posto, e ultimamente a faculdade aí
discutiu uma proposta votou que a direcção do jardim a anexos me fosse conservada. Creio pois que
ficarei e estimarei isso porque gosto de trabalhar e de viver com as hervas». Mas continuará a
trabalhar por muitos anos após a aposentação. Às vezes é de singela sinceridade. Terminava um
bilhete-postal dirigido a G. Sampaio datado de 19 de Setembro de 1911: «Agora trato da publicação
do catalogo da biblioteca e vou começar a catalogação do museu. É bom ir tratando do testamento».
Num bilhete-postal datado de 11 de Abril de 1913, já aposentado e muito mais velho que G. Sampaio
estimulava o seu colega portuense na tarefa a que estava acometido: «Queixa-se de velhice precoce.
Mau é que isso seja verdade. Poupe-se para poder trabalhar ainda muito. A viagem ao Algarve devia
ser interessante. É terra para dar ainda boa porção de plantas. O pior é haver pouco quem as possa
colher segundo as regras. Quase todos estão velhos e [...] os novos não [...] vontade de continuar a
nossa obra». Alguns anos mais tarde, a 9 de Fevereiro de 1920, escrevia para G. Sampaio: «Como esta
145
Será uma das medidas da catadupa legislativa do pós-5-10-1910. No Diário do Governo n.° 18, de 23 de Janeiro de 1911
era publicada uma determinação do Ministério do Interior que obrigava a aposentação de todos os professores de qualquer
grau ou estabelecimento de ensino no fim do ano lectivo em que tenham completado 70 anos de idade (AAPP, 1910-1911).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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de saude? Eu vou andando quasi regularmente, mas sem grandes passeios. Ao fim da tarde, terminado
o meu serviço, a vista está fraca apesar de eu pouco uso ter feito d’ela. É ferrugem nas molas
alimentada pelos meus 82».
Como caracterizaríamos a personalidade e carácter de A. X. Pereira Coutinho, por uma análise
do conteúdo das cartas que escreve para G. Sampaio? Bem diferente dos colegas de Coimbra e Porto. É
organizado e metódico e de uma grande tenacidade na prossecução de objectivos previamente
determinados146.
3. A Flora de Portugal de A. X. Pereira Coutinho
A. X. Pereira Coutinho irá publicar a 1.a edição da sua «Flora de Portugal» em 1913147. Através
da análise da correspondência que troca com G. Sampaio é possível reconstruir o método e o avanço da
construção da flora pelo botânico lisboeta.
O método de trabalho de A. X. Pereira Coutinho para elaborar a sua flora de Portugal emerge
em diversas das cartas que escreve para G. Sampaio. A 13 de Fevereiro de 1905 escrevia: «Acabo de
receber as suas plantas que muito agradeço. Chegaram em optimo estado. Peço desde já licença para
as demorar cá; ficam ao meu cuidado. Disponho de muitos exemplares, e a minha revisão é fatalmente
demorada n’estas condições; desejo ir estudando genero por genero, e só ao tratar de cada um d’elles
irei consultar as plantas respectivas do seu herbario». Em 1909, G. Sampaio inicia a publicação, em
fascículos, do «Manual da Flora Portugueza». Aparentemente este facto desencadeou um estímulo em
A. X. Pereira Coutinho, que em duas longas cartas escritas em Janeiro deste ano, fala do seu projecto
da Flora de Portugal (paralelo ao de G. Sampaio), sem no entanto deixar do felicitar o seu colega
portuense. O método de trabalho e programa de acção do botânico lisboeta é claro. Escrevia a 15 de
Janeiro de 1909 para G. Sampaio: «Tambem eu trabalho ha 2 annos em escrever uns elementos da
Flora portugueza. Baseio-me no herbario da Polytechnica, nas herborisações que tenho agora
mandado empreender, e nos trabalhos anteriormente publicados dos que teem estudado a nossa flora.
O meu manuscripto vae acompanhando a revisão, que eu faço, do herbario. Tenho actualmente
ordenados 2 armarios, com umas 900 especies, e o manuscripto respectivo. Se tiver força e saude para
continuar a trabalhar como tenho trabalhado até aqui, calculo que devo ultimar esta empreitada
dentro de uns 5 anos. Só tenciono entregar no fim de tudo, o manuscripto á imprensa, para poder
corrigir a parte já feita com o estudo das novas herborizações e poder aproveitar os trabalhos
146
Exemplificaremos todas estas características em parágrafos seguintes.
Esta Flora tinha sido precedida pela publicação, no Boletim da Sociedade Broteriana, de revisões de muitas famílias da
Flora portuguesa (ver Capítulo III.5).
147
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
117
realisados sobre a nossa flora até essa epocha. Tenho encontrado bastantes factos interesantes e
várias especies novas para a nossa flora. De algumas d’essas especies, a pedido do Dr. Julio
Henriques, dou noticia no proximo volume do Bolletim da Sociedade Broteriana». E logo alguns dias
depois, a 21 deste mês: «Quando o Mariz publicou a revisão das primeiras familias (Ranunculaceas,
Caryophyllaceas, Cruciferas, Leguminosas), ainda as plantas do herbario da Polytechnica não eram
enviadas para Coimbra, para serem revistas conjuntamente. D’aqui resulta que é muito possivel que
existem no herbario da Polytechnica especies ou variedades portuguezas ainda não conhecidas, como
existentes cá. Mas, sem um trabalho demorado e conscencioso é impossivel apural-o, com segurança.
Com effeito o herbario portuguez da Polytechnica enche hoje completamente 6 grandes armarios (tão
grandes, que é preciso uma escada para se chegar ás prateleiras superiores), e tem reunidas as
colheitas de Welwitsch, do Daveau, R. da Cunha, F. Mendez; mas todas estas plantas estão com a
classificação provizoria dos seus collectores, e só uma revisão total do conjunto póde merecer
confiança. É isso o que estou fazendo, há 2 annos, e já tenho muitas plantas em ordem e apuradas
muitos factos interessantes; mas, como ainda não puz as mãos nas familias a que V. Exa. agora se
reffere, comprehende decerto a impossibilidade que eu tenho de indicar especies não conhecidas, ou
mesmo determinar o habitat das que já são conhecidas no paiz. Felicitando a V. Exa, pelo seu
emprehendimento»148.
Ao contrário de G. Sampaio, o método de A. X. Pereira Coutinho é linear – estudar família por
família. Em cada família, estudar género por género. Pedir exemplares emprestados (ou permutar).
Estudar a bibliografia existente referente à flora nacional, nomeadamente a publicada pelos seus
colegas de Coimbra e Lisboa. Elaborar uma lista das espécies portuguesas e respectiva chave
dicotómica. Trocar opiniões e impressões com os seus colegas. Emendas e correcções.
Na documentação epistolar de A. X. Pereira Coutinho para G. Sampaio encontrámos prova que
no Jardim Botânico da Escola Politécnica se cultivavam plantas para se obter material de herbário ou
para se realizarem observações em condições fenológicas particulares149. Um dos géneros mais
discutidos entre A. X. Pereira Coutinho e G. Sampaio foi o Silene. Em carta datada de 24 de Outubro
de 1909, A. X. Pereira Coutinho escrevia: «Recebi do Museu de Paris, entre várias plantas e sementes,
as sementes de [...] e Silene italica; vou semear estas ultimas ao lado das sementes de Silene longicilia
dos arredores de Lisboa, para depois comparar vivas as duas plantas». Também neste ano de 1909, A.
X. Pereira Coutinho encontrará em Sintra um Rubus que lhe terá parecido como novo para a ciência.
148
A estimativa de A. X. Pereira Coutinho não era muito irrealista – a 1.a edição da sua flora seria publicada em 1913.
Geralmente pediam-se as sementes que eram cultivadas no Jardim Botânico. Nos Rubus terão sido utilizadas outras
formas de propagação.
149
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
118
Contacta com o seu colega portuense para discutir este novo Rubus e numa carta datada de 3 de Julho
de 1909 temos uma indicação que estas plantas estariam a ser cultivadas no Jardim da Escola
Politécnica para observação: «Examinou o exemplar que lhe remetti da planta de Caparide, cultivada
hoje na Polytechnica? É bem o hybrido R. caesius x ulmifolius, não lhe parece?»150.
A primeira referência sobre a elaboração da Flora de Portugal por A. X. Pereira Coutinho é feita
numa carta datada de 30 de Junho de 1902 para G. Sampaio: «Encetei uns estudos preliminares, com
idéa de mais tarde revêr as nossas Borragineas». Mas os estudos pormenorizados desta família só se
terão efectivado algum tempo mais tarde. A 13 de Fevereiro de 1905 escrevia para G. Sampaio: «Ando
agora com o genero Echium, que tenho quasi em ordem. Disponho de mais de 200 exemplares
portuguezes. Só tenho ainda duvidosos alguns do grupo [...]».
Em carta datada de 24 de Fevereiro de 1906, informa o seu colega portuense que tinha
terminado a revisão das Borragináceas151 e que tinha iniciado o estudo das Escrofulariáceas, pelo que
pedia ao seu colega o empréstimo de exemplares desta família. G. Sampaio acedeu ao pedido, tendo
enviado exemplares para o seu colega lisboeta. Alguns meses mais tarde, A. X. Pereira Coutinho ainda
estudava esta família, escrevendo a 8 de Maio: «tenho trabalhado persistentemente nas
Escrophulariaceas, mas não posso dar ainda por terminadas senão as de corolla personada ou
mascarina, grupo em já determinei 50 e tantas especies». Discute seguidamente alguns aspectos da
sistemática e taxonomia do género Linaria. Alguns dias depois, a 13 deste mês, informava G. Sampaio
que estava a estudar o género Veronica e pedia uma cópia da diagnose de Veronica demissa. Na carta
faz algumas considerações sobre a taxonomia deste género. A 9 de Junho deste ano de 1906, A. X.
Pereira Coutinho informava o seu colega portuense que estava a terminar o seu trabalho sobre as
Escrofulariáceas e que desejava devolver as plantas emprestadas. Refere que R. T. Palhinha e o
conservador do Herbário da Escola Politécnica tinham ido ao Cabo de S. Vicente à procura da Linaria
algarbiana e que a tinham encontrado. A. X. Pereira Coutinho envia para G. Sampaio, juntamente com
esta carta, exemplares desta espécie e também de «da nova Linaria de Beja». Na mesma carta, A. X.
Pereira Coutinho ainda refere outro género desta família, Digitalis152. Escreve: «achei muito curiosas
as suas Digitalis, que ambas me parecem boas especies. O numero das especies d’este genero
conhecidas em Portugal sobe a 6 no meu trabalho; pois que temos na Estrella a D. nevadensis e
determinei a D. minor, muito bem caracterizada n’uns exemplares colhidos em Bragança ou Vimioso
150
Os Rubus só têm valor para herbário quando as plantas estão completas, o que muitas vezes não ocorre quando são
observadas no campo (ver Capítulo IV).
151
A. X. Pereira Coutinho publica uma revisão desta família no Boletim da Sociedade Broteriana (COUTINHO, 1905).
152
G. Sampaio tinha acabado de publicar a descrição de novos táxones de Digitalis.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
119
pelo Dr. Mariz». Alguns dias depois, A. X. Pereira Coutinho terá terminado o seu estudo das
escrofulariáceas portuguesas153. A 16 de Junho de 1906, devolvia os exemplares emprestados,
escrevendo honestamente para G. Sampaio: «Vae inclusa a guia do caixote em que vão as suas plantas.
Muito agradeço. Intercalei exemplares das especies ou fórmas não ou pouco representadas, sempre
que pude dispôr d’elles. Infelizmente ainda não vão representadas todas as especies, mas já não faltam
muitas. Com a sua auctorização, tirei um dos exemplares de L. viscosa [...] Sem a sua auctorização,
tirei um pequeno exemplar dos duplicados da sua Digitalis Amandiana não collados; não pude resistir
a essa tentação e tem lá muitos; desculpe-me pois [...]».
Segue-se a família das Labiadas (Lamiáceas). Em carta datada de 31 de Dezembro de 1906,
escrevia para G. Sampaio: «Começo agora a revêr as Labiadas e já aqui tenho o herbario da
Universidade. Muito me obsequeia se quizer enviar-me as suas; terei de as demorar aqui uns mezes,
mas, tratarei d’ellas com cuidado e procurarei incluir os duplicados de que lhe faltar. Ficar-me-hia
assim o trabalho mais facil, mas se lhe causa transtorno em demorar aqui tanto as plantas, então é
melhor virem mais tarde, quando eu já tiver as minhas cousas mais adeantadas». O estudo da família
corria bem a A. X. Pereira Coutinho154 que escrevia pouco tempo depois a 19 de Fevereiro de 1907: «O
meu trabalho vae relativamente adeantado, pois que já terminei o grupo das Menthinae, Thyminae e
Melissinae e levo quasi no fim o estudo de genero Salvia ; tem corrido assim depressa, porque eu já
tinha de há tempo preparado bastantes elementos». A. X. Pereira Coutinho terá precisado de observar
exemplares de Labiadas do Herbário do Colégio de S. Fiel. Alguns dos exemplares estariam na altura
no Herbário da Academia Politécnica, pelo que A. X. Pereira Coutinho se dirige a G. Sampaio a 23 de
Abril de 1907: «Pedi o herbario de S. Fiel antes das férias da Paschôa e julgava que não m’o
remetteriam, em vista da demora». Termina esta carta fazendo um balanço positivo da tarefa a que se
tinha acometido: «Levo o meu trabalho muito adeantado, mas preciso de umas herborizações para
esclarecer alguns pontos duvidosos». Algum tempo depois, a 9 de Maio de 1907, protesta
energicamente junto do seu colega portuense: «Não recebi ainda o herbario de S. Fiel. Estou a
terminar o meu trabalho e por isso esse herbario faz-me falta n’esta occasião. Peço, pois, o favor de
m’o enviar com a possivel brevidade». Mas a situação ter-se-á rapidamente resolvido dado que logo a
15 deste mês, escrevia para G. Sampaio: «Acuso a recepção do seu bilhete, bem como do herbario de
S. Fiel. V. Exa. me dirá depois se, quando terminar o meu trabalho, o deve remetter para ahi ou para
S. Fiel». A 20 de Maio de 1907, A. X. Pereira Coutinho informava o seu colega portuense que tinha
153
154
A. X. Pereira Coutinho publica uma revisão desta família no Boletim da Sociedade Broteriana (COUTINHO, 1906a).
A. X. Pereira Coutinho publica uma revisão desta família no Boletim da Sociedade Broteriana (COUTINHO, 1907a).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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«as Labiadas a bem dizer completas. Apenas estou á espera de tempo proprio para mandar colhêr
umas plantas em que desejo tirar umas dúvidas. Não lhe mandei já o seu herbario, porque se a
colheita fôr fructuosa, devo puder intercalar mais algum exemplar». G. Sampaio tinha enviado para A.
X. Pereira Coutinho exemplares de Labiadas a pedido do colega lisboeta. Este devolve-as a 2 de Julho,
já perto da conclusão do estudo da família: «Remetto inclusa a guia do caixote em que vão as suas
Labiadas. [...] Inclui no seu herbario bastantes duplicados, alguns de plantas raras; só lá não ficam
representadas as especies ou variedades de que não me foi possivel arranjar duplicados». Mas A. X.
Pereira Coutinho terá tido dúvidas sobre um dos géneros da família e pediu emprestados a G. Sampaio
exemplares de Mentha155. As plantas são devolvidas a 6 de Agosto de 1907 acompanhadas da seguinte
mensagem escrita num bilhete-postal: «Remetto no correio de hoje o pacote com exemplares das
Menthas, que fez o favor de me enviar e que hontem recebi. Era apenas na separação e denominação
das fôrmas de M. aquatica que desejava fazer umas alterações».
No ano seguinte, em 1908, A. X. Pereira Coutinho terá estudado as famílias Alsináceas,
Silenáceas, e Aizoáceas, porque inicia, com G. Sampaio, uma longuíssima discussão sobre os géneros
Loeflingia, Silene e Mesembryanthemum. A. X. Pereira Coutinho inicia a discussão numa carta datada
de 2 de Junho de 1908: «Tenho um exemplar unico, portugues da Loeflingia hispanica – é de Vila
Velha de Rodam. A sua L. Tavaresiana parece-me realmente synonyma da L. pentandra, Cav.; tenho-a
tambem dos arredores de Aldea Gallega e das margens do Guadiana. Quanto ainda á Silene Boryi
muito folgo de que V. Exa. procure revê-la e estudá-la de novo com cuidado. É bem possível que se
trate de uma espécie peninsular, ainda não descripta, que envolve exemplares do Douro, exemplares
colhidos pelo Cutanda nos arredores de Madrid. Muito agradeço o favor de me comunicar
opportunamente os resultados a que chegar».
Alguns meses mais tarde, a 20 de Novembro, A. X. Pereira Coutinho insiste na Loeflingia
Tavaresiana e inicia a discussão dos Mesenbryathum spp.: «Por causa de um trabalho que trago
actualmente entre mãos, muito desejava vêr um exemplar da sua Loeflingia Tavaresiana [...] (tenho as
diagnoses). Se V. Exa. tem algum exemplar disponível, muito me obsequeia dando-o para o herbario
da Polytechnica; se não tem duplicado, muito me obsequeia egualmente deixando-m’os examinar por
uns dias. E agora uma ultima pergunta, que tambem faço. Vejo citado pelo Dr. J. Henriques, no
Boletim da Sociedade Broteriana, entre plantas novas encontradas por V. Exa. em Portugal, o
Mesembryanthemum glaucum, subespontaneo em Espinho. V. Exa. tem bem a certeza de que se trata
desta especie? Tenciono mandar um jardineiro d’aqui a Espinho procurá-lo pois parece-me que talvez
155
G. Sampaio tinha publicado em 1901 um trabalho sobre o género Mentha (SAMPAIO, 1901a).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
121
elle possa ser o M. brachyphyllum Welw. Esta especie, exclusivamente portugueza, é tão proxima do
M. glaucum, que Welwitsch ao principio tomou-a como uma fórma d’elle. O Mariz é que o confundio
no seu trabalho com o M. nodiflorum, do qual é absolutamente diverso. Acho muito interessante
liquidar definitivamente este ponto, e averiguar se a especie portugeza chega até Espinho». A
Loeflingia Tavaresiana era uma espécie nova proposta por G. Sampaio (SAMPAIO, 1905e). A. X.
Pereira Coutinho não possuía nenhum exemplar desta espécie, mas tão somente a sua descrição. Não
estaria convencido que se tratava de uma espécie válida e que os exemplares não fossem de Loeflingia
pentandra Cav. Em relação à Silene Boryi, G. Sampaio tinha-a encontrado nas margens do Douro, mas
sendo diferente da espécie típica de Boissier, tinha-a considerado como variedade nova desta espécie,
Silene Boryi var. duriensis Samp. (SAMPAIO, 1900c)156. A. X. Pereira Coutinho tinha dúvidas que se
tratava de facto da S. Boryi Boiss., dado que esta era uma espécie alpina, de grandes altitudes. Quanto
aos Mesembryanthemum, estava em causa a existência da espécie M. glaucum L. em Espinho descrita
por G. Sampaio num trabalho publicado em 1900. A. X. Pereira Coutinho tinha dúvidas se não seria o
M. brachyphyllum Welw. Mas não tinha razão. Esta espécie não existia em Portugal e o próprio A. X.
Pereira Coutinho não a incluirá na sua Flora de Portugal. G. Sampaio atende o pedido do seu colega
lisboeta e terá enviado exemplares da sua L. Tavaresiana, dado que A. X. Pereira Coutinho escreve a
27 de Dezembro de 1908: «Recebi-he as plantas que fez o favor de me enviar, e que muitissimo lhe
agradeço. Ainda as não estudei, mas, pelo aspecto, a Loeflingia assemelha-se muito a um exemplar
velho e mau, existente no herbario da Polytechnica, e colhido pelo Welwitsch, no Alemtejo. Vou
comparal-os, para vêr se lhe posso referir esse exemplar». Para esclarecer a dúvida em relação ao
Mesembryanthemum de Espinho, A. X. Pereira Coutinho escreve a 15 de Janeiro de 1909: «Mandei a
Espinho procurar o Mesembryanthemum em que lhe fallei, um dos jardineiros da Polytechnica;
encontrou optimos exemplares, que agora aqui vou cultivar. É o M. brachyphyllum, Welw.; pedi para
o estrangeiro, o M. glaucum, vivo, com o qual o desejo comparar. A nossa planta é considerada como
boa especie no Gürke – Plantae Europaeae - , no Engler.[...] Não conheço sufficientemente o M.
glaucum para o poder decidir. Que a planta de Espinho corresponde exactamente com os exemplares
de Welwitch que cá tenho, isso é certo».
A 25 de Maio de 1909, A. X. Pereira Coutinho retoma a discussão do género Silene. Não estava
convencido que a Silene das margens do Douro observada por G. Sampaio fosse uma variedade da S.
Boryi. Argumentava desta maneira: «Passando a um outro assumpto. Em tempos nos Annaes de
156
Mais tarde, após observação cuidada de «bons exemplares da S. Boryi, de Espanha», G. Sampaio irá propor para esta
variedade a categoria específica (SAMPAIO, 1921b).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
122
Sciencias Naturaes e agora novamente no Prodromo da Flora Portuguesa, que V. Exa. está
publicando, vejo citada uma planta em que tenho a duvida que passo a expôr, pedindo desde já a V.
Exa. que não veja n’estas minhas palavras mais do que ellas realmente querem significar, isto é, o
desejo de esclarecer uma questão que bastante me interessa. Refiro-me á Silene Boryi var. duriensis. A
minha duvida é que [esta espécie é de] plantas das grandes altitudes, plantas alpinas, sendo por isso
realmente para estranhar a sua existência nas margens do Douro. É verdade que Cutanda cita na
Castella a Nova, em altitude bastante baixa, a var. tejedensis (que, segundo as descripções, deve ser
muito proxima da sua duriensis), mas Willkomm põe em duvida que se trate da mesma especie, e
lembra até a possibilidade de ser a planta de Cutanda uma especie ainda não descripta. Teve V. Exa.
occasião de comparar a planta portugueza com exemplares authenticos da especie de Boissier? Se a
comparou e V. Exa. tem a certeza na determinação, conclue-se que a S. Boryi é planta de mais larga
área de distribuição do que se julgava, e não é meramente uma planta alpina, embora suba tão alto
nas montanhas. Se a não pode comparar com exemplares authenticos, valia bem a pena fazê-lo
(existem provavelmente no herbario de Willkomm, em Coimbra), afim de se liquidar de vez esta
questão». Continuando a discutir este género, A. X. Pereira Coutinho aproveita a ocasião para
concordar com o seu colega portuense que, no «Manual», considerava a S. conica e a S. conoidea,
ambas como espécies existentes em Portugal, a primeira dos arredores de Lisboa e a segundo perto do
Porto: «Ainda a proposito d’este genero Silene. Vi que V. Exa. cita, como pertencendo á S. conica, as
plantas dos arredores do Porto que primeiramente considerára como S. conoidea. Eu encontrei a S.
conoidea nos arredores de Lisboa, uma unica vez, em 1880, e conservo no meu herbario um dos
exemplares encontrado; é um bom exemplar, com optimas flôres e fructos. Quando vi agora a sua
emenda, fui verificá-lo de novo, e compará-lo com os exemplares da S. conica e S. conoidea que tenho
no Herbario Europeu; o meu exemplar é sem duvida da S. conoidea, e as duas especies – ambas ao
que parece bem raras – são então portuguezas».
Quatro dias mais tarde, a 29 de Maio de 1909, após a discussão de outras espécies, A. X.
Pereira Coutinho insiste novamente na S. Boryi: «E voltando ainda á Silene Boryi; um caracter
importante e bem caracteristico d’esta especie deve ser a grandeza extraordinaria do calice (que
Willk. marca no Prodr. 1½’’ = 39 mm, e que levou Bory a confundi-la com S. longiflora). Os seus
exemplares do Douro têm o calice tão grande?». Perante a insistência do colega lisboeta, G. Sampaio
terá perguntado a A. X. Pereira Coutinho se gostaria de receber as plantas do Douro para esclarecer o
assunto. Mas A. X. Pereira Coutinho, em carta datada de 7 de Junho de 1909, insiste que seja G.
Sampaio a resolver a questão, sugerindo que o seu colega portuense observasse os exemplares de S.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
123
Boryi recolhidos por Willkomm: «Com proposito á Silene Boryi, muito agradeço o seu offerecimento,
mas eu preferia muito que V. Exa. a estudasse. O caminho seguro para fazer este estudo, era pedir
para Coimbra o exemplar do herbario de Willkomm da verdadeira S. Boryi e compará-lo com o seu. O
Willkomm diz no Prodr. que o viu vivo, portanto deve ter exemplares no seu herbario; o Dr. J.
Henriques com certeza que lhe empresta esses exemplares, se o meu amigo lh’os pedir».
Na mesma carta de 7 de Junho, A. X. Pereira Coutinho retoma a questão da L. Taveresiana.
Ainda não estava convencido que esta espécie não fosse de facto um sinónimo da L. pentandra Cav.:
«Quanto á Loeflingia pentandra, Cav., a gravura de Cavanilles, que vi, não é boa, e as descripções
que conheço não são muito desenvolvidas; a fórma dos estigmas, [...] é que me fizeram suppor que
será identica á sua Taveresiana. Creio que sejam diversas, desde que V. Exa. me diz conhecer a L.
pentandra e ella ser bem distinta. Folgaria, no entanto, de vêr exemplares authenticos da L.
pentandra. Não para corroborar este ponto, uma vez que V. Exa. o affirma com conhecimento de
causa, mas porque desejava conhecer sufficientemente a especie hespanhola para a poder procurar
entre nós, com mais probabilidades de a encontrar. É muito provavel, com effeito, que ella esteja
tambem em Portugal, sobretudo no sul, onde demais este genero parece não escassear». G. Sampaio
acedeu rapidamente ao pedido do seu colega e este terá ficado convencido quanto à validade da S.
Taveresiana, escrevendo logo a 11 de Junho: «O exemplar hespanhol da Loeflingia pentandra, que vou
estudar amanhã, conto remettê-lo para a proxima semana, conjuntamente com as plantas que já aqui
tenho apartadas para V. Exa., [...] Não vale a pena remetter-me V. Exa. a Loeflingia da Zambujeira;
apenas lhe peço que depois de a estudar me diga em que especie a filia. Passei rapidamente pela vista
o seu pacote de plantas. Na verdade a L. pentandra tem aspecto bem diverso da sua Tavaresiana; é
muito mais semelhante á hispanica, de que possuo no herbario europeu bons exemplares». Poucos dias
depois, A. X. Pereira Coutinho a 14 de Junho, devolvia o exemplar da Loeflingia pentandra de G.
Sampaio e continuava a discussão deste género - ainda faltava esclarecer a identidade do exemplar que
tinha de Vila Velha de Rodão: «Devolvo o seu exemplar de Loeflingia pentandra, e muito lhe agradeço
ter-me dado ocasião de o estudar. Comparando-o com um exemplar da L. hispanica, proveniente dos
Pyreneus orientaes (exsiccata Maguier), acho nos dois proximadamente o mesmo porte, o mesmo
indumento, a mesma inflorescencia e as mesmas dimensões da flôres. O que fica para os distinguir? O
numero dos estames e a fórma do estylete? Parece-me que este caracter não é bastante para distinguir
duas especies, e a meu vêr a L. pentandra deve ser considerada uma simples variedade do typo
linneano. Quanto ao meu exemplar de Villa Velha de Rodam direi que está em fructificação. Consegui
contar-lhe 3 estames n’uma flor, e quanto ao estylete não o vi em condições favoraveis. Julgo que
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
124
pertencerá á L. hispanica typica, mas seria necessario examinar a planta viva e em estado mais
atrazado para o poder asseverar com certeza, uma vez que não encontro outros caracteres
differenciaes. É claro que a sua L. Tavaresiana é bem distincta; pela inflorescencia, com as flôres
dispostas em pseudo-espigas alongadas, entra no typo da L. hispanica; mas com as pseudo-espigas
muito mais delgadas, com as flores mais pequenas e o porte diverso, o que tudo as distingue
sufficientemente, a meu vêr, para ser considerada como especie distincta». De facto, A. X. Pereira
Coutinho, na sua flora de 1913, irá considerar este exemplar de V. V. de Rodão como sendo a L.
hispanica, e como duvidosa a existência em Portugal da raça pentandra da L. hispanica L. G. Sampaio,
no seu «Pródromo», não considerará a existência em Portugal desta raça pentandra.
Dois dias depois, A. X. Pereira Coutinho retorna à discussão do género Silene, interrompida
pelas Loeflingia. A 16 de Junho de 1909, reafirmava o seu interesse na permuta de plantas do género
Silene. Escrevia para o seu colega portuense: «A Silene longicilia (Brot.) é frequente nos arredores de
Caparide; posso preparar e enviar-lhe bons exemplares; tem o calice [...] Quanto á S. muscipula é por
aqui pouco frequente; só a encontrei uma vez. Muito lhe agradeço a sua proposta para a troca de
plantas, e procurarei reunir aqui algumas que o interessem. Quanto tiver occasião, lhe enviarei
tambem indicações sobre as planta do norte que principalmente deseja, bem como formularei algumas
duvidas que tenho sobre determinadas especies. Não tenho exemplares nem da Silene mellifera nem da
S. nemoralis, em que me falla». Mas ainda faltava esclarecer a Silene Boryi, e a 3 de Julho deste ano,
A. X. Pereira Coutinho, escreve: «Nunca pode averiguar nada acerca da Silene Boryi? A proposito
déste genero, dir-lhe-ei que tenho hoje a desconfiança que eu e o meu amigo interpretamos por fórma
diversa a S. longicilia (Brot.), pois que o meu amigo a considera muito proxima da S. nutans e eu a
considero muito mais proxima da S. italica. Hei de mandar-lhe exemplares para trocarmos
impressões. A planta que eu considero como S. longicilia tem por si a tradição no nosso herbario há
muitos annos (já ssim a considerou o Welwitsch tambem), e do mesmo modo a tradição de Coimbra (o
Mariz é tambem a esta mesma planta que se refere no seu trabalho), sendo por ultimo a mesma ainda
que se encontra nos lugares citados por Brotero. Será esta planta que eu julgo dever identificar com a
S. longicilia Brot. A sua raça nemoralis da S. italica? É questão essa que á vista dos exemplares bem
se desfaz». O género Silene é complexo, tem muitas espécies e a discussão continuava a 21 de Agosto
de 1909: «arredores de Lisboa, onde Brotero indicava a sua S. longicilia, não tem sido encontrada
nem a S. mutans nem coisa que se lhe aproxime; parece que esta especie tem no nosso pais limite mais
superior. A S. longicilia, na minha opinião, deve pois aproximar-se ou da S. italica ou da S. nemoralis.
Com vagar verificarei depois os exemplares do herbario da Polytechnica e do meu herbario. No
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
125
herbario europeu tenho um bom exemplar da S. nemoralis (parece-me que da flora exsiccata de
Maguier)». No dia seguinte, A. X. Pereira Coutinho já se encontrava na sua casa de férias na Ribeira de
Caparide, perto da Parede e escrevia a G. Sampaio uma carta inteiramente dedicada ao género Silene. O
documento está infelizmente muito danificado. É no entanto curiosa a seguinte frase de A. X. Pereira
Coutinho que resume um homem absorvido pela botânica: «Escrevi hontem, á pressa, de Lisboa, e
completo hoje d’aqui com mais vagar o meu pensamento ácerca do caso da S. italica e S. longicilia, e
que muito desejo vêr a limpo». Novamente a Silene Boryi numa carta datada de 20 de Novembro de
1909: «Tambem peço a V. Exa. que me empreste – mas esse mais tarde – o seu exemplar de Silene
Boryi, pois que muito desejo tirar a limpo essa questão. Para a poder estudar devidamente é porém
indispensavel ter prezente um exemplar autentico da S. Boryi; vou pedi-lo ao dr. J. Henriques, que
decerto m’o empresta, se o tiver como julgo, do herbario Willkomm». Infelizmente a correspondência
entre A. X. Pereira Coutinho e G. Sampaio interrompe-se em 1910157. Não nos é possível seguir o
desfecho das discussões sobre estes géneros.
A influência dos trabalhos e opiniões de G. Sampaio no trabalho de A. X. Pereira Coutinho
emergem em diversas cartas escritas pelo botânico lisboeta. Quando recebe o trabalho de G. Sampaio
sobre as Epilobiáceas, escreve a 22 de Junho de 1906 a agradecer e termina confessando: «Logo que
tenha tempo, vou revêr pelo seu trabalho uns que colhi o anno pasado».
Outras vezes, A. X. Pereira Coutinho parece querer distanciar-se do seu colega portuense. G.
Sampaio publica em 1909, no Boletim da Sociedade Broteriana, uma flora regional – de Odemira.
Envia um exemplar para o seu colega lisboeta, que agradece, numa carta datada de 24 de Outubro de
1909. Aproveita a ocasião para tecer considerações sobre o trabalho dele e do colega portuense:
«Recebi o exemplar da sua Flora Vascular de Odemira, que fez o favor de me enviar, e que muito
agradeço. [...] Lisoujeou-me bastante, póde crer, o facto de encontrar algumas das suas apreciações
tão conformes com os resultados a que eu tambem cheguei e que vem agora publicados n’este numero
do Boletim da Sociedade Broteriana, que parecem escriptos pela mesma mão! Não houve sugestão
nem da minha parte nem da de V. Exa., pois que são pontos sobre que nunca trocámos impressões, as
provas d’esse meu original estão já revistas há muitos mezes e eu só agora estou refferindo. Este
encontro nas mesmas apreciações, confesso-o, é-me muito agradável, e tomo-o como um bom signal
de termos chegado á verdade. Apenas sinto não poder generalizar estas minhas considerações a todo o
seu trabalho; mas, para ser verdadeiro, devo acrescentar que – infelizmente para mim – nem com
157
Ver Capítulo XIII.5.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
126
todas as aproximações e interpretações que V. Exa. ahi propõe eu posso estar em equal
concordancia».
4. A Flora do Mondego de J. Henriques
J. Henriques dedicou especial atenção ao estudo das gramíneas (família Poaceae) (HENRIQUES,
1905) e à flora da região de Coimbra (HENRIQUES, 1913). Encontramos na correspondência para G.
Sampaio muitas referências a estes estudos. Num bilhete-postal datado de 1 de Agosto de 1904
escrevia telegraficamente: «Não colheu gramíneas?». J. Henriques ia informando o seu colega
portuense da elaboração da sua flora do Mondego. Em carta datada de 24 de Agosto de 1910, escrevia:
«Eu continuo com o esboço da flora do Mondego, que vai lentamente. Faço diligências para no
volume XXV dar a maior [...]». Ás vezes escrevia a pedir uma opinião concreta. A 14 de Agosto de
1911 escrevia para G. Sampaio: «Que nome deu ao Lathyrus paluster [...]? Estou com os Lathyrus
para o meu esboço da flora do Mondego e por isso desejo saber o nome novo». G. Sampaio terá
respondido e J. Henriques escrevia a 19 de Setembro deste ano: «Com relação ao Lathyrus deixei-o ir
como está no Prodromo [J. Henriques referia-se ao «Pródromo da Flora Portugueza» de G. Sampaio],
fazendo em nota referencia à sua opinião». Num bilhete-postal datado de 22 de Março de 1915
escrevia para G. Sampaio: «Mando-lhe uma folha da pequena Flora do Mondego, que deve substituirse 1ª. folha do livro. Boa ou má sempre é muito completa para a primeira chave publicitada. Se por
ventura alguns dos seus discipulos tiverem a Flora, mandarei as folhas necessarias para a
substituição».
5. O estudo da flora portuguesa por G. Sampaio
Ao contrário de A. X. Pereira Coutinho que define à partida um esquema de estudo da flora
portuguesa, não encontrámos em G. Sampaio tal planeamento. Que método utiliza G. Sampaio para
estudar a flora portuguesa? Por uma análise da obra publicada por G. Sampaio, parece-nos ser possível
afirmar que G. Sampaio ao estudar a flora nacional foi guiado pelas seguintes motivações principais158:
A. Estudo de géneros ou espécies mal conhecidas ou confusas, dos quais já tinha bom material de
herbário. Estes táxones estavam dispersos por várias famílias, não havendo portanto uma sequência
orgânica de trabalho. B. Estudo de exemplares de espécies novas, com a proposta de criação dos
respectivos táxones. Através das suas herborizações e de material que lhe foi oferecido, G. Sampaio
158
Ver também Capítulo XIII, 2A e 2B.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
127
depara-se com exemplares de espécies ainda não descritas. C. Reavaliação, clarificação e promoção das
obras fundamentais da botânica portuguesa de Brotero, Link e Hoffmansegg159.
G. Sampaio irá basear os seus estudos numa significativa colecção de exemplares de Herbário.
Nas primeiras herborizações, G. Sampaio foi muitas vezes acompanhado por E. Johnston160. As cartas
de E. Johnston para G. Sampaio revelam um enorme gosto pela botânica e vontade de ajudar o jovem
naturalista portuense. Numa carta datada de 10 de Julho de 1905, escrevia: «Amigo e Snr. Sampaio:
Hontem, sempre consegui arranjar-lhe alguns exemplares da tal Pinguicula, e aguardo as suas ordens
a respeito das mesmas. Se quizer, levo-lhe as plantas à sua casa, com muito gosto, como tambem
specimens do Ranunculus Holianus, das margens do Tamega, e [...] Pena é que as Pinguiculas sejam
poucas, mas a estação já está bastante adiantada. Se eu soubera em Maio ou Junho que desejava ter
exemplares d’estes arredores, facilmente tinha arranjado um bom numero de plantas, pois varias vezes
tenho atravessado terrenos nos quaes a Pinguicula é abundante. Queira, pois, avisar-me com
antecedencia, sendo possivel, de qualquer planta que lhe possa arranjar, que eu com o maior prazer
farei o possivel para executar as suas ordens». As colheitas de E. Johnston e a ajuda a G. Sampaio
continuarão por muitas anos. Num bilhete-postal datado de 3 de Junho de 1913, escrevia para G.
Sampaio: «Estive ante-hontem em Leça do Balio e graças ás informações que me deu, encontrei o
Lychnis flos-cuculi, quasi em frente do mosteiro. Como, porém, as plantas eram poucas, só levei
comigo uns seis exemplares para seccar. Foi a primeira vez que vi esta planta, a crescer, n’este país».
G. Sampaio também estudou material permutado e emprestado. Através da análise da
documentação epistolar constatamos que estas trocas precederam de perto a publicação das obras. G.
Sampaio publica, em 1905, um estudo sobre as Epilobiáceas portuguesas e terá pedido emprestados os
exemplares do Herbário da Escola Politécnica. A. X. Pereira Coutinho responde positivamente em
carta datada de 29 de Fevereiro de 1904: «No dia 20 do corrente mandei despachar em grande
velocidade um pequeno caixote, contendo as Epilobiaceas portuguezas da Polytechnica». As plantas
foram recebidas por G. Sampaio que escreve ao seu colega de Lisboa, acusando a recepção das plantas
e enviando um exemplar do trabalho publicado. A 22 de Junho de 1906, A. X. Pereira Coutinho
159
Por uma análise dos carimbos apostos nas obras, parece-nos provável que as obras de Brotero já existiriam na Academia.
Pelo contrário, a «Flore Portuguaise» de Link e Hoffmansegg terá sido comprada por iniciativa de G. Sampaio, em data
posterior a 1906. Esta hipótese baseia-se numa carta de K. Hiersemann para G. Sampaio, datada de 22 de Fevereiro de
1906. Em papel timbrado «Karl W. Hiersemann, Buchhaendler und Antiquar, Leipzig»: «Monsieur Gomes de Macedo de
votre ville a bien voulu me charger de vous indiquer le prix de, Link, flore portugaise. Je suis encore à la recherche de cet
ouvrage et l’offrirai le plus tôt possible. Entretemps je me permets de vous adresser mes catalogues 313 et 315 et de vous
inviter de m’adresser une liste de tous vos desiderata que vous ne trouves pas y annoncez. Je pourrais également les fournir
à des conditions favorables».
160
Ver Capítulo XIII.2.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
128
agradece e elogia o trabalho do seu colega portuense: «Recebi o bilhete de V. Exa., accusando a
recepção das plantas, assim como o exemplar do seu novo trabalho sobre as Epilobiaceas. Muito o
agradeço. Foi um bom serviço, tanto mais que o genero Epilobium tem sérias difficuldades, mais
augmentadas ainda com as fórmas hybridas. Numa carta anterior datada de 27 de Abril de 1906, o
botânico lisboeta tinha pedido que G. Sampaio lhe oferecesse duplicados de exemplares desta família
quando devolvesse os da Escola Politécnica. Também neste ano, G. Sampaio publica um trabalho sobre
o género Romulea (SAMPAIO, 1905b). Pede exemplares emprestados ao Herbário de Lisboa e A. X.
Pereira Coutinho responde a 13 de Fevereiro de 1905: «Tenciono enviar-lhe amanhã a Romulea em
que me falla». No início de 1907, G. Sampaio pede a A. X. Pereira Coutinho exemplares de
Brassicáceas, pedido que é atendido a 23 de Abril de 1907: «Remetto inclusa a guia do caminho de
ferro correspondente a um caixote em que vão os generos da familia das Cruciferas que me pediu». O
género Ulex foi também objecto de especial atenção por G. Sampaio. Troca exemplares e opiniões com
J. Henriques. Em carta datada de 8 de Junho de 1910, o botânico coimbrão escrevia: «Recebi a sua
carta e vejo as duvidas que lhe offerecem os Ulex. É genero difficil». G. Sampaio terá enviado um
rascunho de um estudo sobre este género, dado que J. Henriques escreve a 24 de Agosto de 1910: «O
seu quadro dos Ulex não me parece mal, e creio que por elle se poderá chegar sem difficuldade à
determinação das espécies. As suas reducções talvez sejam justas. É um género bastante difficil, não
tanto como o Rubus, mas dá ainda que fazer». Algum tempo depois, G. Sampaio terá enviado um
estudo do género Lupinus. J. Henriques terminava uma carta datada de 7 de Outubro de 1912: «P. S. A
chave dos Lupinus parece-me bem».
G. Sampaio ia enviando os trabalhos que publicava aos seus colegas. Estes respondem
agradecendo e insistindo sempre na esperança de ver publicada a flora de Portugal de G. Sampaio.
C. Pau recebe o trabalho de G. Sampaio, «Notas criticas sobre a flora portugueza», e responde a
19 de Janeiro de 1905, «Hubiera visto con agrado algunas formas que V. trae en sus “Notas criticas”
como [...] Le felicito por sus descubrimientos y porque adivino en V. al futuro autor de la flora
portuguesa. Yo creo que seria á V. fácil publicarla un poquito más seria que la italiana de [...] más
detenida que la reciente de [...] menos apasionada y farragosa que la de Rouy [...] los autores
alemanes [...] quieren servir de buen ejemplo [...]».
B. Merino ao receber a Flora Vascular de Odemira escrevia para G. Sampaio a 27 de Outubro
de 1909: «he recibido con sumo gusto sus apuntos sobre la “Flora vascular de Odemira”. Con tantos
y tan valiosos trabajos como V. y varios otros botanicos portugueses han llevado a cabo, esperamos
que pronto reconstituiran la verdadera Flora de Portugal que todos tanto deseamos».
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
129
É sobretudo com a publicação do «Manual» que mais se sente a pressão para G. Sampaio
publicar uma flora de Portugal completa, tanto mais que não existia nenhuma disponível. A. Luisier
recebe um exemplar do Manual e escreve a G. Sampaio a 1 de Setembro de 1910: «Muito me regozija
com a publicação do seu Manual da Flora Portugueza. Faça o possivel para que o livro possa ser
publicado quanto antes. Desejaria muito que o preço seja o mais convidativo possivel para que se
possa adoptar como manual escolar nos Collegios e lyceus, para os trabalhos praticos de botanica na
6ª. e 7ª. Classes». J. Henriques numa carta sobre a reorganização do ensino da botânica no pós-5 de
Outubro de 1910, datada de 11 de Dezembro de 1911, escrevia singelamente: «Se a sua flora já
estivesse concluida aconselharia aos meus discipulos a acquisição d’ella. Assim continuarei com as
floras francesas». Um bilhete-postal de Fr. Sennen para G. Sampaio datado de 23 de Março de 1912
sugere que as notícias progrediam, mas deturpavam-se: «Un ami vient de m’annoncer votre Flore de
Portugal en préparation. Je désirerais la procurer soit par achat soit en échange de plantes de mes
exsiccata». J. Daveau escrevia a 7 de Agosto de 1913: «A sua flora, em preparação seguinte me
constaram, e esperada por todos os amigos da botânica, e eu faço votos para que sahe em breve á
luz». A. Luisier escrevia a 14 de Março de 1915, num bilhete-postal endereçado de Salamanca : «A
flora portugueza que estava em preparação já está publicada?». R. T. Palhinha161 escrevia a 26 de
Outubro de 1922: «A sua flora? Está demorada ainda? Grande desejo tenho eu a ter á mão. Servirá
para mim de muito, mas muito [...] terei de o incomodar por causa da sinonimia».
6. A construção das Floras de Portugal
Em síntese podemos portanto afirmar que J. Henriques, A. X. Pereira Coutinho e G. Sampaio
colaboraram entre si na elaboração dos seus estudos da flora de Portugal. A colaboração ocorreu a três
níveis: A. Permuta e empréstimo de material de herbário. O país, para os meios de transporte da época,
era extenso e portanto difícil de herborizar. As regiões de Trás-os-Montes, Alentejo e Algarve, as mais
afastadas destes três centros, eram mal conhecidas. A permuta e o empréstimo de exemplares destas
regiões e de outras localidades enriqueceram os herbários de Coimbra, Lisboa e Porto. B. Troca de
opiniões e comentários sobre a sistemática e taxonomia de táxones. Houve troca de opiniões sobre a
taxonomia de táxones diversos, principalmente ao nível do género e espécie. C. Conhecimento prévio
161
Ruy Telles Palhinha foi o sucessor de A. X. Pereira Coutinho na direcção do Jardim e Herbário da Faculdade de Ciências
de Lisboa. Foi Reitor do Liceu Central de Lisboa em 1907-1908 (ALCL, 1907-1908:3), e do Liceu Camões em 1908-1909
(ALC, 1908-1909). Organizou a 2.a edição da Flora de Portugal de A. X. Pereira Coutinho. Estudou sobretudo a flora dos
Açores. Também se dedicou a estudos da história das Ciências Naturais (MELO, 1987).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
130
da obra dos colegas. Cada um conhecia a obra publicada dos colegas. Naturalmente que a obra
publicada terá influenciado o trabalho dos colegas.
7. O contributo de António Machado
O contacto entre A. Machado162 e A. Luisier ocorreu por intermédio de G. Sampaio e terá sido
decisivo para a via de especialização que o professor dos liceus de Lisboa acabou por enveredar. Numa
carta datada de 16 de Novembro de 1912, A. Machado revelava as dificuldades que tinha em, sozinho,
abordar os musgos e pedia ajuda ao professor portuense: «Nos momentos de ócio continuo a entregarme á minha paixão biológica. Isto porém com varias dificuldades por falta de quem me oriente.
Poderia o meu amigo, que se dá com o Luisier, pôr-me em comunicação com ele, recomendando-me a
benevolência dum especialista?». G. Sampaio terá respondido positivamente a este pedido, dado que
A. Machado escreve a 21 de Abril de 1913, de Lisboa: «O professor Cambeses, meu colega dum dos
liceus do Porto, trouxe-me a noticia de que ainda não tinham aberto concurso aí para o logar de 2º.
Assistente da Secção de Sciencias Biologicas [...] Apesar de me custar deixar a vida de Lisboa, cêdo ás
reiteradas instancias de meu pai que muito deseja que eu vá mudar para Famalicão, onde tem
algumas propriedades [...]». A abertura de concurso para assistente da Botânica do Porto terá sido
confirmada por G. Sampaio, dado que poucos dias depois, a 30 deste mês, A. Machado escrevia:
«Estou-lhe extremamente grato pelas suas boas palavras e pelo interesse que lhe merece a minha
pessoa e a que pode estar certo, procurarei sempre corresponder o melhor que souber. Tenho já todos
os documentos preparados para o concurso [...] A dificuldade porem está em trabalhar agora [...]
meio agitado de Lisboa e com 20 horas de serviço semanal no Liceu. Vou por isso ver se obtenho
licença pelo menos de’um mes. Se a conseguir retirar-me-ei para Famalicão a redigir a minha tese.
Procurei hoje na Academia das Sciencias os livros que me indicou, mas nenhum deles consta do
162
António Luís Machado Guimarães (1883-1969) era filho de Benardino Machado. Licenciou-se em Filosofia Natural na
Universidade de Coimbra em 1906. Nos anos lectivos de 1907-1908 e 1908-1909 é professor extraordinário de Línguas no
Liceu Central de Lisboa-Liceu Camões (ALCL, 1907-1908:4, ALC, 1908-1909:4). No ano lectivo seguinte ensina Línguas,
Ciências Físicas e Naturais e Desenho. No ano lectivo 1910-1911 é professor efectivo do 5.° Grupo e director do Museu do
Liceu Camões (ALC, 1910-1911). Nos dois anos lectivos seguintes ensina Línguas, Ciências Físicas e Naturais. Sobre a
história do Liceu Camões ver SILVA & VASCONCELLOS (2003). Em 1914 ingressa como 2.° assistente no 2.° Grupo da 3.a
Secção na Faculdade de Ciências do Porto, passando a 1.° assistente em 1919. Inicialmente ligado às disciplinas de
Botânica, passa em 1921 para as disciplinas de Zoologia, onde permanece até à sua aposentação em 1953. Foi director do
Museu, Laboratório de Zoologia e da Estação de Zoologia Marítima, anexos à Faculdade de Ciências. Fez parte da
comissão encarregue do desmantelamento das colecções biológicas do Colégio de Campolide. Ironicamente terá sido o seu
contacto com A. Luisier o responsável pela sua especialização em briologia, como se demonstra neste capítulo. Em 1918,
enquanto assistente de Botânica, publica o «Catálogo descritivo de Briologia Portuguêsa». Publica no Boletim da Sociedade
Broteriana, de 1925 a 1931, a «Sinopse das Briófitas de Portugal» (PIRES DE LIMA, 1942:46-48; FCP, 1969:274-277; MELO,
1987). Agradecemos ao Dr. José Luís Falcão de Vasconcelos as valiosas informações sobre a vida e obra de A. Machado.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
131
catalogo que examinei [...]». A. Machado terá de facto entrado para assistente da Faculdade. J.
Henriques escrevia para G. Sampaio a 18 de Março de 1915: «Como o Antonio Machado por aí está
envio inclusa carta a agradecer os musgos». O contacto entre A. Machado e A. Luisier terá ocorrido
na sequência da carta que transcrevemos atrás, porque o botânico jesuíta num bilhete-postal dirigido a
G. Sampaio datado de 14 de Março de 1915 escrevia: «Há já muito tempo que não tenho noticias
nenhumas do Sr. Dr. Machado». Sob a orientação de A. Luisier, A. Machado irá realizar um
importante estudo das briófitas portuguesas.
8. A contribuição de Clemente Lourenço Pereira
Na década de 1920, G. Sampaio trava conhecimento com Clemente Lourenço Pereira e J. M.
Miranda Lopes163. Inicia-se então uma colaboração entre o professor portuense e os párocos amadores
de botânica que se prolongará por vários anos. C. L. Pereira vivia em Insalde (Paredes de Coura) e irá
estudar a flora do Minho. J. M. Miranda Lopes vivia em Argoselo (Vimioso) e ocupar-se-á da flora de
Trás-os-Montes. Ambos são introduzidos nos estudos botânicos por J. Henriques, mas talvez devido à
idade do professor de Coimbra que em 1920 já estava aposentado há vários anos, os contactos são
posteriormente dirigidos para G. Sampaio. Nas palavras de ambos se sente vibrar a paixão (tardia) do
naturalista, o amor pela natureza, pela vida, pelas plantas como organismos que como nós partilham a
biosfera. G. Sampaio era muito melhor conhecedor da flora, do que C. L. Pereira e J. M. Miranda
Lopes. Independentemente das idades de cada um, estabelece-se uma relação semelhante à de um aluno
com o seu professor. Colhem plantas, identificam. Enviam exemplares para G. Sampaio confirmar as
identificações. Esta colaboração será muito profícua, porque dará origem a duas floras regionais, uma
de Paredes de Coura e outra de Vimioso. O enriquecimento foi mútuo. C. L. Pereira e J. M. Miranda
Lopes apreenderam a botânica (sistemática) e G. Sampaio enriqueceu o seu conhecimento da flora
portuguesa e o Herbário da Faculdade de Ciências. Numa época em que as deslocações eram difíceis,
ter colectores permanentes no Minho e em Trás-os-Montes era uma grande ajuda para a exploração da
flora do continente português. A colaboração foi especialmente profícua em relação à flora
163
P.e José Manuel Miranda Lopes (1872-1942) nasceu em Argoselo (Vimioso, Bragança). Frequentou o Seminário de
Bragança, tendo sido ordenado presbítero a 3 de Novembro de 1895. Foi Reitor da Igreja de Carção de 1900 a 1909 e,
seguidamente, pároco de Argoselo, sua terra natal. Auxiliado por J. Henriques, A. X. Pereira Coutinho e G. Sampaio estuda
pormenorizadamente a flora de Vimioso. Deste estudo resulta a publicação, no Boletim da Sociedade Broteriana, de uma
flora do concelho (LOPES, 1926, 1928, 1930, 1933). O seu herbário, composto por representantes de 806 espécies, foi
legado à Sociedade Broteriana. Descobre duas espécies novas para a ciência (Gagea nova Samp. e Saxifraga Lopesiana
Samp.) que são descritas formalmente por G. Sampaio. Publicou ainda «Argosêlo – Notícia histórica e corográfica» e uma
monografia sobre Carção (LOPES, 1939) (FERNANDES & GARCIA, 1943). Agradecemos ao Dr. Carlos Prada de Oliveira
alguns elementos da biografia de J. M. Miranda Lopes.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
132
transmontana que era na altura mal conhecida. As herborizações de J. M. Miranda Lopes darão a
conhecer diversas variedades e espécies novas para a ciência. Os trabalhos botânicos de ambos são
publicados no Boletim da Sociedade Broteriana.
Foi através de J. Henriques que C. L. Pereira se iniciou nos estudos botânicos no fim da década
de 1910. Publica no Boletim da Sociedade Broteriana de 1920 (volume XXVIII) uma primeira flora
regional de Paredes de Coura (plantas vasculares) (PEREIRA, 1920). J. Henriques escreve uma pequena
nota explicativa: «O estudo [...] foi cuidadosamente realizado pelo Rev. P.e Clemente Lourenço
Pereira, o qual com o fim de conhecer a vegetação da região percorreu todo o concelho observando
com cuidado todas as plantas vasculares que por ali se encontravam. Dirigiu-se a mim para o auxiliar,
no que me deu muito prazer, e concorreu de modo especial para enriquecer o herbário da Universidade
com os exemplares que enviou. Bom exemplo deu, digno de ser seguido para se conseguir um
conhecimento exacto da flora do nosso país». Na introdução à sua flora, C. L. Pereira faz uma
caracterização geográfica do concelho, menciona culturas agrícolas e caracteriza sumariamente a
vegetação. Termina a introdução agradecendo a contribuição do professor coimbrão: «O estudo que se
segue é devido à iniciativa do Sr. Dr. J. Henriques. Um grande número de plantas, a maior parte, foram
estudadas por êle; as restantes foram estudadas por mim, mas verificadas por êle. Dedicava-me ao
estudo das plantas por distracção, movido por certas dificuldades consultei-o, e não só tive a resposta
que desejava, como tambêm o incitamento para continuar, com mais proveito, os meus estudos. Desde
então nunca mais faltou o seu conselho de amigo, nem a sua sábia orientação; e foi assim que se
estudou a flora do concelho de Paredes de Coura, o que não se teria feito sem a sua intervenção.
Agradeco-lhe muito sinceramente todos os favores que tão generosamente me dispensou». O estudo
das plantas vasculares de Paredes de Coura por C. L. Pereira é seguido por um estudo dos musgos do
mesmo concelho por A. Machado e dos líquenes por G. Sampaio. O trabalho de G. Sampaio é uma
listagem de espécies, sem comentários adicionais.
A primeira carta de C. L. Pereira para G. Sampaio data de 13 de Abril de 1921, e indica que G.
Sampaio lhe tinha enviado um exemplar do seu «Manual»: «Recebi, ha alguns dias, o Manual da Flora
Portugueza e agradeço muito a gentileza da offerta. Está muito bem feito, sendo para lamentar que
não esteja concluido. As alterações da nomenclatura podiam fazer-se no indice, ou n’um appendice, e
por esta forma abreviava-se a publicação, aproveitando-se tambem o trabalho já realisado. Ainda não
principiei o meu estudo por causa da chuva; se não fosse esse o obstaculo ja o teria começado. Terá o
seguinte titulo: Explorações Botanicas na Margem Portugueza do Minho». No Congresso do Porto
organizado por G. Sampaio no Verão de 1921, este fez menção do trabalho meritório que estava a ser
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
133
realizado pelo pároco minhoto. C. L. Pereira escreve a G. Sampaio a 21 de Julho de 1921: «Apresentolhe os meus agradecimentos por ter feito no Congresso do Porto a apreciação do meu trabalho, pois se
a apreciação não fosse feita por pessoa amiga só conseguiria uma critica desagradavel. [...] Envio-lhe
algumas plantas da flora de P. de Coura que V. Exa. deseja observar, esperando que me indicará as
devidas correcções. [...] Envio-lhe, tambem, todas as plantas que ainda conservo pertencentes á flora
marginal do Minho».
Inicia-se então uma longa (até 1933) e regular troca de correspondência, plantas e opiniões. A
23 de Agosto de 1921, C. L. Pereira enviava Rubus para G. Sampaio: «Pedia-lhe o favor de me
classificar o Rubus que lhe envio. Foi encontrado em Insalde, pertencendo portanto á flora de Paredes
de Coura, e não deve ser raro nos logares frescos e onde haja agoa. Contudo passou-me
inadevertido». G. Sampaio terá incentivado C. L. Pereira a prosseguir os seus estudos da flora de
Paredes de Coura com vista à elaboração de uma flora regional completa. A 25 de Janeiro de 1922, C.
L. Pereira respondia: «Concordo absolutamente com o conselho de V. Exa. para limitar o meu trabalho
a um pequeno resumo. Publicando-se tudo, dava-se grande extensão ao trabalho, e contudo ficava
ainda muito incompleto. Portanto, o melhor é conclui-lo e depois publica-lo o mais completo que seja
possivel. Isto porem deve levar bastante tempo, porque a região é extensa, e eu não sou velho, nem
novo rico para poder fazer as despesas provenientes de uma exploração continua. Envio-lhe o novo
manuscripto indicando nelle apenas algumas plantas interessantes». No ano seguinte, em 1923, J.
Henriques terá contactado C. L. Pereira para que publicasse no Boletim uma nova versão, melhorada,
da flora de Paredes de Coura. Tendo G. Sampaio publicado, em 1920, uma primeira listagem dos
líquenes deste concelho, J. Henriques também terá pedido a C. L. Pereira que enviasse para o
especialista portuense amostras de líquenes do concelho. C. L. Pereira informava G. Sampaio destes
contactos a 2 de Novembro de 1923: «O Snr. Dr. Julio Henriques escreveu-me, ha pouco, pedindo-me
um trabalho para o Boletim Broteriano, e lembrava-me que se podia continuar o trabalho anterior
ácerca da flora de Paredes de Coura. Pedia-me, por isso, que lhe enviasse d’aqui os lichens que
podesse colher para V. Exa. os estudar, e [...] O Snr. Dr. A. Machado, disse-me que V. Exa. prepara
um trabalho de conjunto ácerca dos lichens de Portugal, e por iso, segundo creio, mais interesse
devem ter estas remessas». C. L. Pereira envia os líquenes para G. Sampaio poucos dias depois. A 29
de Novembro escrevia para o professor portuense: «Envio hoje a primeira remessa de lichens; como ja
sabe pela minha carta anterior, é para satisfazer um pedido do Snr. Dr. Julio Henriques, que se
realiza esse trabalho». As herborizações de C. L. Pereira terão continuado e em 1927, a 3 de
Novembro, escrevia para G. Sampaio em tom de conclusão: «Envio-lhe, pelo mesmo correio, algumas
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
134
plantas, e pedia-lhe o favor de as rever. [...] PS – O estudo da flora da bacia do Minho pode-se
considerar concluido; por isso pedia-lhe o favor de a publicar quando houvesse occasião para isso».
C. L. Pereira reconhece, no entanto, que não teria as melhores condições para poder organizar
um herbário em Insalde, o que era uma limitação para os seus estudos florísticos. A 27 de Julho de
1922, escrevia a G. Sampaio em tom desalentado: «Eu não conservo as plantas que vou estudando por
não ter logar disponivel para as recolher; por isso é inteiramente razoavel que se conservem ahi.
Infelizmente em dias de calor, chego a casa com ellas murchas e deterioradas o que me impede de
enviar bons exemplares». O desânimo parece apoderar-se do pároco minhoto, agravado por problemas
familiares e dificuldades económicas. Sugere dedicar-se às criptogâmicas. A 22 de Maio de 1930
escrevia a G. Sampaio: «O Sr. e o Sr. Dr. Júlio Henriques foram as únicas pessoas em que encontrei
generosidade, e que me procuraram ajudar, e por isso tinha muito interesse em conhece-lo
pessoalmente. Feitas estas duas excepções, posso dizer, e sem exagerar as coisas, que só tenho
encontrado garotices, e o que mais irrita é que aquelles que tinham obrigação de me ajudar, são os
primeiros a dar o mau exemplo. Fui a Braga para ver se podia publicar um livro; mas infelizmente
parece que a publicação ainda há de demorar. Com o lucro da venda dos meus livros, deste e do outro
que já publiquei, tencionava adquirir um microscópio, para poder estudar um grupo de fungos ou
algas, que ainda não esteja muito estudado entre nós, nem encerre difficuldades muito graves. Não fui
feliz na minha tentativa, e bem contra a minha vontade, tenho de reconhecer que me aconteceu como
ao caçador do urso que já dispunha da pelle, sem primeiramente o ter caçado. Tenho bastante
adiantado outro volume dedicado ao estudo da crise nacional, e assim que estiver concluído, voltarei
aos primeiros amores. Ficarei, portanto de relações cortadas com a critica, para tratar somente das
flores. A doença e depois o falecimento do meu saudoso pai obrigaram-me a interromper o estudo da
botânica durante 2 annos, porque nem me permittiam sair de casa, nem me consentiam as disposições
para estudar»164.
C. L. Pereira parece recuperar do desalento porque termina a sua «Flora da Bacia do Minho»
que seria publicada nos Anais da Faculdade de Ciências do Porto, quiçá por iniciativa de G. Sampaio.
O trabalho é publicado em duas partes (PEREIRA, 1931a, 1931b), onde são listadas 773 espécies de
plantas vasculares, correspondendo a 417 géneros. Algumas das espécies descritas são novas para a
flora portuguesa. A maioria dos exemplares é recolhida por C. L. Pereira, uma minoria por G. Sampaio.
Para cada espécie é geralmente indicada a sua frequência, se rara se vulgar. Os locais de colheita são
164
Esta carta sugere que C. L. Pereira não tinha, à data, conhecido pessoalmente nem o professor de Coimbra nem G.
Sampaio.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
135
variados, do litoral ao interior, de norte a sul da bacia do rio Minho. Numa curta introdução, o autor
descreve sumariamente a região em estudo, incluindo até alguns dados artísticos. Chama a atenção para
o facto de na Flora de Paredes de Coura, publicada no Boletim da Sociedade Broteriana, terem
«algumas espécies» ficado «mal classificadas; por isso prevalece a classificação do presente trabalho».
Termina com «a expressão do meu sincero agradecimento ao sr. Dr. G. Sampaio pela coadjuvação que
me prestou para realizar êste trabalho, que não seria possível sem o seu auxílio». Não se tratando de um
trabalho propriamente de investigação, esta flora regional foi certamente um importante contributo para
a sistematização do conhecimento da nossa flora continental.
Depois de estudadas as plantas vasculares da sua região, C. L. Pereira retoma a vontade de se
lançar na botânica criptogâmica, mas novamente as dificuldades lhe parecem intransponíveis. As
últimas cartas que escreve para G. Sampaio revelam um apaixonado pela natureza, que no entanto tem
dificuldades para trabalhar. A 27 de Agosto de 1932 escrevia para G. Sampaio: «O meu trabalho
consagrado ao estudo da crise nacional está concluído; falta apenas retocar, e ler mais alguma coisa,
para melhor compreensão das questões tratadas. Concluindo isto voltarei aos primeiros amores, que
como sabe, é o estudo da botânica. Como a necessidade é engenhosa, tenho andado a organizar uma
colecção de selos, para com o dinheiro da sua venda poder adquirir um microscópio. Se conseguisse
adquirir este aparelho ficava bem preparado para o meu estudo». A última carta data de 27 de Abril
de 1933. Escrevia C. L. Pereira, talvez influenciado pelos trabalhos de G. Sampaio sobre as algas
desmídeas: «Nesta ocasião, posso dispor de dois contos de reis, se com esta quantia pudesse adquirir
um microscopio, empregava com muito gosto esta quantia para esse fim, embora isso me traga alguns
sacrificios. Se não for orientado neste caso, nada farei, porque não posso fazer muita coisa com geito.
Desejava portanto que V. Exa. me orientasse na escolha do aparelho, um grupo de plantas que devo
estudar, e que me indicasse os livros que devo adquirir. Não conheço o alemão. Traduzo alguma coisa
o inglês, com o auxilio do dicionário. De toda a nossa flora, creio que são algas as plantas que estão
mais mal estudadas, e por esse motivo talvez fosse preferível orientar nesse sentido o meu estudo».
Encontramos eco deste impasse pessoal no livro que publicará em 1947 - «A política do espírito»
(PEREIRA, 1947), na figura do investigador português - desafortunado e desapoiado pela sociedade.
Neste trabalho, C. L. Pereira aborda as questões que lhe parecem ser mais prementes na sociedade
portuguesa de então. Dedica o capítulo VI à «Reforma da instrução». Depois de referir o problema
propriamente da instrução pública, escreve sobre a investigação e os investigadores portugueses.
Formula a questão, de «não termos tido, uma plêiade brilhante de investigadores que tenham
enriquecido a ciência com as suas descobertas». Porquê? Para C. L. Pereira «era inteiramente justo que
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
136
a sociedade se interessasse pelos homens que tivessem a vocação científica, fornecendo-lhes os
elementos de trabalho, e colocando-os ao abrigo das incertezes da vida [...] apesar de trabalharem para
todos, a sociedade desconhece-os [...]». O autor considerava pois que a falta de apoio era a uma causa
importante para o reduzido número de investigadores em Portugal. C. L. Pereira achava que apoiar os
investigadores «era um dever da mais trivial justiça», porque «o bem-estar que possue a civilização
moderna é obra dos sábios». A investigação era, para C. L. Pereira, um trabalho especialmente árduo,
porque era «arrancar à natureza a descoberta de algum dos seus segredos, [sendo para tal] preciso
gastar muito tempo, passar longas vigílias, sofrer muitos sacrifícios, passar talvez uma vida inteira
entregue a este tormento». C. L. Pereira vê mesmo o trabalho do investigador como uma «obrigação
[imposta por Deus] que tem de empregar o poder da sua inteligência na conquista da verdade e do
progresso», encontrando, não nos Homens, mas em «Deus, o seu melhor apoio, e o estímulo mais
eficaz».
9. A contribuição de J. M. Miranda Lopes
J. M. Miranda Lopes publica, em 1926, no volume IV da nova série do Boletim da Sociedade
Broteriana uma primeira versão da Flora do concelho de Vimioso, datada de Novembro de 1926
(LOPES, 1926). Na introdução ao trabalho faz uma caracterização geográfica do concelho. Refere
hidrografia, clima, geologia e agricultura. O gosto pela botânica é explicado por J. M. Miranda Lopes
no fim desta introdução, elogiando a figura excepcional do seu primeiro mentor: «Em Abril de 1918 o
Exmo Sr. Dr. Oscar de Pratt, em nome da Academia das Sciencias de Portugal, convidou-me a
trabalhar na pesquisa e organização do vocabulário da linguagem popular desta região. Encontrando
nesta linguagem o nome de muitas plantas, comecei por aquele tempo a estudar a flora da minha terra,
confrontando o nome vulgar com o nome scientifico para, nessa monografia, conscienciosamente, dar
uma notícia das que fossem mais conhecidas. Notei desde logo que a maior parte das plantas dêstes
sitios não tem nome vulgar e que êste até varia muito de uma região para outra. Foi então que para
resolver certas dificuldades me dirigi ao Exmo. Senhor Doutor Júlio Augusto Henriques, pedindo-lhe o
favor de me orientar neste trabalho. Recebeu com a máxima gentileza o meu pedido e na carta que me
escreveu em 25 de Novembro de 1918, declarou-me que se punha inteiramente á minha disposição para
êste fim, animando-me a colher tôdas as plantas que pudesse encontrar nesta região e a enviar-lhas para
êle as estudar e fazer a sua classificação. Durante estes últimos oito anos êle, o meu nobre, bondoso e
respeitável amigo, o meu querido e venerando velhinho, teve a suma bondade e a grande paciência de
aturar tôdas as impertinências da minha ignorância neste ramo da sciência, atendendo todos os meus
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
137
pedidos e desfazendo tôdas as minhas dúvidas. Bem pode dizer-se que o estudo que se segue é obra
sua. Eu fico apenas com o grande prazer que tive em colher e conhecer as plantas da «Flora da minha
terra», e com a elevada honra que me deu publicando a respectiva lista no presente volume do seu
querido Boletim. Por tudo isto deixo a Sua Ex.cia a viva expressão dos meus sinceros agradecimentos e
indelével gratidão. E é para admirar que êle, em tão avançada idade, e movido apenas pelo entranhado
amor que sempre teve á sciência e pelo desejo de me ser agradável, tivesse coragem para consumir os
últimos dias da sua preciosa existência num estudo, que certamente lhe deu muitíssimo trabalho, êle
que já nem pode escrever, e que quási já não tem luz nos olhos, porque a deu toda ás plantas e flores
que tanto amou. Admirável prova da resistência das faculdades da sua grande inteligência!».
Os contactos com G. Sampaio terão sido posteriores a esta primeira publicação. Em carta
datada de 18 de Novembro de 1927 dirigia-se ao professor portuense: «Reservo-me porem para
reformar o meu modestissimo trabalho quando concluir a minha exploração botanica em todas as
freguesias do concelho, e então, seguindo as regras que V. Exa. me indicar, veremos como uniformizar
a nomenclatura botanica». Inicia-se então uma curta mas intensa troca de plantas e opiniões entre o
pároco transmontano e o botânico portuense. J. M. Miranda Lopes enviava plantas para o Porto com
identificações provisórias. Recebia de volta os comentários do professor portuense. Logo a 29 de
Novembro deste ano, J. M. Miranda Lopes acusa a recepção de plantas enviadas por G. Sampaio:
«Recebi tambem as plantas da ultima remessa, e chegaram muito bem felizmente». G. Sampaio teria
encontrado uma Centaurea nos exemplares enviados por J. M. Miranda Lopes que lhe terá parecido
(inicialmente) uma espécie nova, e terá informado o pároco transmontano da novidade. Nesta mesma
carta, J. M. Miranda Lopes regozijava: «Grande prazer me deu V. Exa. com a noticia de que a linda e
pequenina Centaurea que lhe enviei com o numero 582 é talvez uma especie nova. Se V. Exa. podesse
desde já formar com segurança o seu juizo, bem era menciona-la já na 2ª. Lista das plantas da Flora
do concelho de Vimioso, que tenciono publicar no proximo volume do Boletim da Sociedade
Broteriana. V. Exa. porem fará o que julgar mais seguro e prudente. Tratando-se realmente de uma
especie nova, muito agradeço a lembrança de a dedicar ao humilde parocho de Argozelo, se com isso
V. Exa. quer honrar o clero de Portugal. Não sendo com este intuito, eu antes queria que ela ficasse
com o nome de V. Exa. muita pena terei se ella não torna a mostrar-se aos meus olhos. [...] Foi a
Divina Providencia que me deu a felicidade de estabelecer relações espirituais com V. Exa. Se não
fosse V. Exa. que triste figura não faria eu com a apresentação desta planta!»165. No ano seguinte,
165
Esta novidade não viria a ser confirmada.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
138
escrevia a 21 de Maio para G. Sampaio: «Muitissimo obrigado pela determinação das plantas e pela
remessa da lista das que V. Exa. colheu por estes sitios em 1907».
J. M. Miranda Lopes publicará, em 1928, no volume V da nova série do Boletim da Sociedade
Broteriana, uma primeira adenda à sua Flora do concelho de Vimioso (LOPES, 1928). Antes da
publicação e com as provas tipográficas na mão, escreve, a 4 de Julho deste ano, uma carta a G.
Sampaio, pedindo uma resposta definitiva sobre algumas espécies que o professor portuense teria
indicado como novas: «recebi de Coimbra as provas tipograficas do meu trabalho sobre a Flora do
Concelho de Vimioso. É a 2ª. Lista, onde menciono as plantas que colhi durante o ano de 1927 e
outras que ainda não estavam bem estudadas. São de facto 190 especies. Peço-lhe o favor de me dizer
se acha conveniente que inclua já nesta lista algumas das plantas mais raras e notaveis que colhi
nestes ultimos meses, e que foram por V. Exa. estudadas e classificadas. Para assegurar a prioridade
da descoberta parecia-me que não seria mal dar já a noticia da nova variedade da Saxifraga
granulata e da Centaurea que V. Exa. me dedicou, se se trata efectivamente d’uma especie nova. Por
este correio lhe envio um ramo desta planta com flores mais desenvolvidas. [...] Talvez se trate d’uma
simples forma da Centaurea melitensis, L., mal descrita na Flora de Sr. Dr. Pereira Coutinho». A
resposta de G. Sampaio terá sido positiva em relação à primeira espécie166 e negativa em relação à
segunda. J. M. Miranda Lopes aceita a opinião e a adenda à flora do Vimioso é publicada. É muito
esclarecedora a introdução ao seu trabalho. No primeiro parágrafo, os estudos botânicos são
apresentados por J. M. Miranda Lopes como a sua «predilecta distracção nas poucas horas vagas da
lida constante do» seu «ministério paroquial», tanto mais que em «aldeias sertanejas, como as do
concelho de Vimioso», «a gente não pode ter outra distracção mais honesta, útil e agradável». Mas a
botânica tinha-se tornado mais do que uma «distracção», porque no segundo parágrafo, J. M. Miranda
Lopes assume-se como naturalista apaixonado e crente: «encanta-me a vida das plantas, a beleza das
suas flores e a variedade das suas formas; e quanto mais as conheço mais as amo e admiro, e muito
mais amo e admiro a arte e sabedoria eterna do divino artista, que tão bem pintou as suas pétalas,
revestiu as suas fôlhas, bordou as suas sementes e organizou a sua delicada estructura». Seguidamente
refere que, nos seus estudos botânicos, tinha utilizado a flora de A. X. Pereira Coutinho e que os
professores A. X. Pereira Coutinho e G. Sampaio lhe tinham esclarecido algumas dúvidas.
As herborizações de J. M. Miranda Lopes e a colaboração com G. Sampaio continuaram. A 14
de Maio de 1929 escrevia para G. Sampaio mais uma carta rejubilante de alegria contagiante: «debaixo
166
Que G. Sampaio, em homenagem a J. M. Miranda Lopes, designará de Saxifraga granulata var. Lopesiana (Samp.)
Samp., publicada em 1931 (SAMPAIO, 1931b), substituindo Saxifraga Lopesiana Samp., publicada no trabalho de J. M.
Miranda Lopes de 1928 (LOPES, 1928).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
139
d’um calor extraordinario, em direcção a Vimioso; e percorrendo montes e vales, ora a pé, ora a
cavalo, cheguei por fim, ás 2 da tarde, ao local onde pela 1ª. vez encontrei a Saxifraga Blanca, no dia
18 de Abril. Depois de verificar que á beira do caminho numa extensão de 200 metros
aproximadamente não havia nada, entrei num lameiro proximo, e, logo ao primeiro golpe de vista dei
com uma pequena colónia desta linda planta, colhendo os exemplares que por este correio lhe envio
em três papeis separados. [167] Antes porem de chegar ao local, tive a felicidade de encontrar outras
plantas notaveis, que lhe envio tambem por este correio. Lindissima e muito rara por estes sitios, pois
nunca a tinha visto, é a planta numero 1052 que á 1ª. vista me parece uma Linaria ou uma Polygala.
[...] Notavel e interessantissima e muito ornamental é a planta numero 1055!! Nunca tinha visto coisa
semelhante. Outra descoberta notavel é a Paeonia que vae com o numero 1054. Como verá esta é
lanuginosa não só na pagina inferior das folhas, mas até mesmo na capsula dos fructos. Trata-se
portanto d’uma planta ou nova para a nossa flora ou para a sciencia. A linda Veronica que lhe mandei
com o numero 1050 tambem me parece nova. Se o for, desejava dedica-la ao meu amigo, fazendo eu a
diagnose. Descobri em Vimioso um verdadeiro paraiso botanico!». Pela descrição da Paeonia, com as
folhas pubescentes, terá parecido a G. Sampaio que se tratava da P. officinalis, uma espécie
desconhecida em Portugal e terá pedido a J. M. Miranda Lopes mais pormenores. J. M. Miranda Lopes
responde rapidamente, a 20 de Maio de 1929, dando detalhes sobre a planta em questão: «Hontem, por
ser Domingo e ter muito serviço religioso, não me foi possivel ter o prazer de acusar a sua
correspondencia de 15, 16 e 17 do corrente. Faço-o hoje para lhe agradecer, muitissimo penhorado,
não só o favor da determinação das plantas que ultimamente lhe enviei, mas tambem as entusiasticas
felicitações que me dirigiu pelas minhas descobertas botanicas. Eu tambem estou encantado com as
lindas plantas que no dia 13 encontrei nos montes e lameiros de Vimioso! [...] Da Paeonia [...] só
encontrei um exemplar, á ultima hora, quando, estava já a sahir do monte, mas é provável que no
mesmo local apareçam mais. As flores deste exemplar que eu vi são cor de rosa muito viva, ou
purpureos, como a Paeonia lusitanica; e as da Paeonia humilis, uma são cor de rosa vivo, outras d’um
roseo mais esbatido e outras até com estrias quasi esbranquiçadas. Desta aparecem exemplares mais
pequenos com as flores amarelados – carmezim e com os segmentos mais estreitos. A esta forma
pequena é que Retzius daria com precisão o nome de P. humilis. Mas a 1ª. que lhe mandei e que colhi
em Vimioso, nos lameiros do Aveloso, é uma planta robusta, bastante alta e ainda mais alta que a P.
lusitanica». Com esta descrição, G. Sampaio terá confirmado que a Paeonia de folhas pubescentes
167
Trata-se da Saxifraga carpetana Boiss. & Leut. (sinónimo de S. blanca Willk.), desconhecida até então no nosso país
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
140
seria de facto a P. officinallis L., e que a segunda Paeonia de flores carmezim e folículos pequenos
seria a P. microcarpa Boiss. & Reut.168.
J. M. Miranda Lopes também recolhia musgos nas suas herborizações pelo concelho de
Vimioso, que eram enviados para A. Machado. Em carta datada de 10 de Junho de 1929, informava G.
Sampaio destas remessas de musgos: «No dia 6 tambem enviei ao Sr. A. Machado uma boa colecção
de musgos das colheitas que fiz ultimamente e onde iam especies notaveis. Oxalá encontrem grandes
novidades para a Flora de Portugal». A época era propícia e as descobertas de J. M. Miranda Lopes
continuavam. A 15 de Junho deste ano escrevia nova carta para G. Sampaio a relatar as últimas
descobertas: «A aroidacea que lhe mandei com o no. 1066 é espontanea. Não tinha duvida alguma.
Vive nas margens da Ribeira de Avelouro, nas encostas d’um grande vale entre serras e grandes
penedos e muito distante dos [...] Colhi-a em 30 de Junho do ano passado pela 1ª. vez mas só com
fructos e ainda verde. Este ano voltei lá para ver se a encontrava com flores e apesar de ser um pouco
antes daquela data, já só encontrei com flores o exemplar que lhe mandei que era lindissimo e estava
na pujança e no seu maximo desenvolvimento. Sem flores vi muitos no mesmo local. Esta planta tem as
folhas alabardinas, maculadas de branco, com grandes auriculas, espadice amarelo com uma clava ou
maça bastante grande e comprida, perfeitamente cilindrica (!) e as sementes são cor de canela,
bordadas com alveolos e (albumen?). Parece-me ser o Arum italicum Will. Este ano já não é possivel
obter um exemplar vivo, e o unico com que fiquei meti-o num papel, não foi seco com pressão, e
quando o colhi já tinha o espadice seco. A espatha é esbranquiçada. Oportunamente lhe enviarei este
exemplar assim mesmo como está. [A descrição de J. M. Miranda Lopes condiz com esta identificação]
A Calluna pubescens Koch é rarissima por estes sitios. Eu nunca a tinha visto. Quando a colhi
pareceu-me que tinha a pubescencia glandulosa; mas agora, que já está seca, fui ver e não a tem. Mas
a pubescencia é muito espessa e parece-me uma coisa nova. Vive [...] nas faldas da serra de Aveloso,
onde encontrei uma grande colonia de Paradisia lusitanica, gigantes – a sua variedade transmontana,
por mim descoberta em 1928 em Vimioso; mas agora com as folhas tão grandes, glabras e lusidias que
até me parecem diferente. Não a colhi porque as flores não tinham ainda desabrochado.[169]». G.
Sampaio terá tido dúvidas em relação a este Arum de que lhe falava J. M. Miranda Lopes e terá pedido
um exemplar ao pároco transmontano que lhe respondeu poucos dias depois, a 21 de Junho de 1929:
168
SAMPAIO (1913b) tinha proposto a designação de P. humilis raç. microcarpa para esta segunda Paeonia. Posteriormente,
SAMPAIO (1931b) irá considerar esta variedade como sinónimo de Paeonia microcarpa Boiss. & Reut.
169
Esta variedade nova será designada no trabalho de J. M. Miranda Lopes publicado em 1928 de Paradisia lusitanica var.
transmontana Samp. SAMPAIO (1931b) irá considerá-la como uma variedade de uma espécie já existente: Anthericum
Liliago var. transmontanum (Samp.) Samp.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
141
«O gigantesco “Arum italicum” que foi na mesma remessa levava o apendice da espadice, e ia até
embrulhado num papel fino para que não se estragasse com a pressão. Estou bem certo disto. Talvez
se desprendesse ahi ao abrir o volume e cahisse no chão. Era exemplar unico!». G. Sampaio terá tido
dúvidas em relação a este Arum, dado que o Arum maculatum L. então desconhecido em Portugal, tem
o espádice violáceo. Mas esta espécie acabaria por ser observada em Vimioso pouco tempo depois.
No volume VI da nova série do Boletim da Sociedade Broteriana (1929-1930), J. M. Miranda
Lopes publicará, uma segunda adenda à sua Flora do concelho de Vimioso (LOPES, 1930). Na
introdução à obra, faz uma breve resenha dos estudos botânicos do concelho. Seguidamente salienta as
espécies novas para Portugal e para a ciência que estavam contidas na listagem (algumas das quais
foram mencionadas atrás) e mais uma vez a contribuição de G. Sampaio: «ao meu nobre e presadíssimo
amigo [...] um dos mais notaveis nomenclaturistas da Europa, reitero os meus cordiais agradecimentos
pela classificação que fez de tôdas as plantas que lhe enviei». Salienta que na listagem tinha
incorporado as espécies referenciadas por J. Mariz em trabalho publicado no Boletim em 1888. Inclui
ainda o estudo dos musgos por A. Machado, que elogia: «insigne briologista, quem classificou a grande
maioria das lindas e delicadas muscíneas da minha terra». Escreve ainda na introdução: «As
herborizações da última primavera custaram-me grandes fadigas, pois tive de percorrer a pé grandes
distâncias, fora da localidade, em profundos, tortuosos e compridos vales e altos montes, o que para a
minha idade já é sacrifício. Mas o prazer que me causou a descoberta das novas plantas que dei á flora
do meu país indemnizou-me bem de tôdas as canseiras, e até da má impressão que nos deixa a
zombaria e o riso escarninho dos que nos chamam malucos por nos metermos nestes trabalhos». Em
jeito de balanço das três publicações: «No ano corrente ainda não me foi possível atingir o limite da
área geográfica que tencionava explorar, porque luto constantemente com falta de tempo». Termina
agradecendo ás pessoas do povo que o têm ajudado «guiando-me por caminhos e veredas
desconhecidas» e ainda ao seu «fiel cavalo» que «indo, subindo e trepando rápidamente como um gato
até onde eu quero, sem nunca se mostrar enfadado ou aborrecido».
No volume VIII do Boletim (1933) será publicada uma terceira (última) adenda à flora de
Vimioso (LOPES, 1933). Agradece novamente a colaboração de G. Sampaio e agora também de L. W.
Carrisso da Universidade de Coimbra. São incluídas novamente diversas espécies novas para Portugal,
mas nenhuma espécie nova para a ciência. Como balanço final temos uma grande contribuição para o
estudo da flora portuguesa dada por J. M. Miranda Lopes em colaboração com A. X. Pereira Coutinho,
J. Henriques e G. Sampaio.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
142
10. Carlos França e o estudo das plantas carnívoras
C. França170 publicará entre 1921 e 1925 uma série de trabalhos sobre plantas carnívoras da
flora portuguesa e sobre um parasita protozoário das eufórbias (FRANÇA, 1922a, 1922b, 1925a, 1925b).
A maioria dos trabalhos é publicada no Boletim da Sociedade Broteriana. Porquê o seu interesse nestes
temas da Botânica? Num dos últimos dos seus trabalhos - uma conferência que realiza a 1 de Maio de
1925 e que é publicada no Boletim da Sociedade Broteriana deste ano (FRANÇA, 1925a), C. França faz
o balanço das suas descobertas e explica a sua motivação para ter abordado esta área tão especializada
da Botânica e aparentemente distanciada da sua especialidade médica. Começa por abordar a
problemática da fitopatologia em geral, referindo como exemplo o cancro das plantas causado pelo
Agrobacterium. Seguidamente refere a doença causada nas eufórbias por um protozoário flagelado do
género Leptomonas. Ora o protozoário tem como hospedeiro primário um hemíptero, que infecta as
plantas. O protozoário realiza uma parte do ciclo de vida no próprio hemíptero. Qual o interesse de C.
França? É que esta doença das eufórbias tem analogias com diversas doenças humanas causadas por
outros protozoários. Havendo afinidades no ciclo de vida, um melhor conhecimento da doença das
eufórbias, em especial o ciclo do protozoário no hospedeiro primário, pode contribuir para um melhor
conhecimento e controlo das doenças causadas no homem. Seguidamente, C. França aborda o estudo
das plantas carnívoras. Qual o seu interesse no estudo deste grupo tão peculiar de plantas? O estudo
começou com a Drosophyllum e, nesta planta, C. França encontrou analogias com a nutrição humana.
C. França observou que as folhas de Drosophyllum que capturam uma presa «dias depois, a parte da
fôlha que fartamente se alimentou do insecto tem um aspecto patológico, apresenta-se anegrada,
emmurchecida. O exame microscópico mostra-nos a causa dêste deperecimento – os vasos condutores
da seiva elaborada e as células da fôlha nas regiões próximas estão inteiramente cheios de granulações
negras, que, por completo, obliteram os vasos. Estas granulações são os dejectos que, arrastados pela
corrente circulatória e não podendo ser expulsos, para ali ficam acumulados, paralizando a circulação
170
Carlos França (1877-1926) nasceu em Torres Vedras. Forma-se em medicina na Escola Médica-Cirúrgica de Lisboa. É
um dos jovens colaboradores de Câmara Pestana, especializando-se em doenças infecto-contagiosas e em parasitologia
humanas. Ao lado de Câmara Pestana participa no combate à epidemia de peste que ocorreu no Porto em 1899 (onde
morrerá o distinto bacteriologista lisboeta). Em 1910 também combaterá esta doença na Madeira. É nomeado médicoauxiliar do Instituto Bacteriológico «Câmara Pestana», sendo seu sub-director em 1905. Neste ano entra como naturalista
para o Museu de Zoologia da Escola Politécnica. Após a implantação da República, incompatibiliza-se com as autoridades
de saúde, abandona o Instituto Bacteriológico «Câmara Pestana» e retira-se para a sua Quinta de Colares, onde «seul et isolé
du monde, avec de très maigres ressources, il improvise un petit laboratoire où il vat continuer ses brillantes investigations»
(QUINTANILHA, 1926). A partir desta data dedica-se à botânica. Contacta com A. X. Pereira Coutinho, J. Henriques e G.
Sampaio. Estuda primeiro um parasita flagelado existente no látex das eufórbias. De seguida dedica-se ao estudo das plantas
carnívoras. Deste estudo resultam várias publicações no Boletim da Sociedade Broteriana. Finalmente, a Faculdade de
Medicina de Lisboa convida-o para professor de parasitologia. Faz investigação no Instituto Rocha Cabral. Inicia estudos
sobre a malária, mas adoece. Morre prematuramente antes dos 50 anos (GEPB; QUINTANILHA, 1926).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
143
da seiva e matando o orgão da planta». Ora «essas fôlhas, agora sêcas, contribuíram para o sustento da
[...] planta, fornecendo-lhe um precioso alimento azotado, mas são vitimas pelo trabalho digestivo [por
meio de enzimas produzidas por glândulas digestivas presentes à superfície das folhas] a que tiveram
de proceder». A importância da captura das presas na nutrição da Drosophyllum já era conhecida - por
esta razão as plantas tinham raízes atrofiadas. A novidade descoberta por C. França era que as folhas
que absorviam as presas morriam em resultado da absorção. Qual a relação com os animais? É que
nestes também existem patologias associadas a um excesso de proteínas, por ingestão de elevada
quantidades de carne. No entanto, nos animais, ao contrário da Drosophyllum, existem mecanismos de
desintoxicação do excesso de azoto – os rins eliminam-no sob a forma de ureia. E se os rins não
funcionarem? Então o animal «morrerá pelo mesmo mecanismo» que a Drosophyllum. Após o estudo
da Drosophyllum, C. França debruçar-se-á sobre outras carnívoras da flora portuguesa, a Utricularia
vulgaris e a Aldrovandia vesiculosa. Encontrará nas três carnívoras que estudou, diferentes
mecanismos de captura e digestão das presas, sendo este estudo comparativo a principal contribuição
de C. França para o melhor conhecimento das plantas carnívoras. Em Utricularia e Aldrovandia, ao
contrário de Drosophyllum, a digestão das presas era essencialmente microbiana. As plantas absorviam
já os produtos da decomposição das presas, não tomando parte activa na sua degradação. Por esta
razão, não sofriam os processos de intoxicação observados em Drosophyllum. No entanto o mecanismo
físico de captura era mais elaborado do que em Drosophyllum. Após comparação com outras plantas
carnívoras, C. França conclui que o aperfeiçoamento do mecanismo físico de captura é inversamente
proporcional ao desenvolvimento das glândulas excretoras. Esta relação tem sentido de um ponto de
vista biológico, dado que se a planta não é activamente produtora de enzimas degradadoras, tem de
manter a presa capturada durante o tempo necessário a que os microrganismos presentes no ambiente,
eles próprios degradem a presa. As descobertas de C. França baseavam-se em observações realizadas
nas próprias plantas e também em trabalho de histologia.
A formação de C. França não era de botânico. É assim natural que tenha contactado os
professores de botânica da época, para aconselhamento, troca de opiniões e discussão do seu objecto de
estudo – as plantas carnívoras portuguesas. Entra em contacto com A. X. Pereira Coutinho, J.
Henriques e G. Sampaio. Existem duas cartas de C. França para G. Sampaio que não são datadas, mas
pelo seu conteúdo são muito provavelmente de 1919 ou 1920. A que nos parece ser a primeira (não
datada 1), pelo seu carácter de apresentação, é uma longa carta enviada da «Quinta Mazziotti,
Collares», C. França explicava demoradamente ao professor portuense como pensava organizar o seu
estudo das plantas carnívoras portuguesas: «Em primeiro lugar, sendo eu principalmente um
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
144
parasitologista metto foice em seara alheira [...] Tenho estudado [...] parasitas do latex das [...] que
causam doença nestas plantas [...] Tem-me impressionado a falta de prosperidade das plantas
carnivoras [...] Publicar um trabalho, que está prompto sobre o Drosophyllum. Claro está que não
sendo botanico não quero invadir as zonas de competencia dos outros e fico-me nos limites [...] minha
competencia. Como se trata porem d‘uma planta portuguesa [...] eu gostava de tomar a minha
monographia tão completa quanto possivel e visto que é tão amavel eu gostaria: 1.º Saber em que
termos Link tratou o Drosophyllum e indicações bibliográficas tão completas quanto possivel [...] 2.º
Saber que termos Grisley em 1661 citou ou se referiu ao Drosoplyllum? Tournefort? [...] 4.. Não me
tinham até aqui falado em qualquer trabalho histologico sobre o Drosophyllum; no meu estudo
occupo-me especialmente da estrutura das glandulas digestivas que, por signal, é muito interessante e
complicada. O meu trabalho demonstra que não existe parallelismo entre o aperfeiçoamento nos
aparelhos de captura e a capacidade d’absorção - é das carnivoras mais perfeitas se bem que como
aparelho de captura, seja rudimentar, o creio ter demonstrado que a alimentação carnivora é uma
aberração nociva á planta, o que vem contra a maioria das ideias dominantes. Do herbario é que
queria o seguinte; uma lista com: Localidades dos exemplos, medições da parte aérea e radicular.
Tenho uma lista egual de Lisboa e Coimbra. Graças ao Dr. J. Henriques, que me enviou um exemplar
perfeito, colhido há dias, consegui ver que, ao contrario dos informes de Darwin, a raiz de
Drosophyllum é muito desenvolvida. Como vê quando me dirigi ao Sampaio eu queria muito mesmo o
que agora peço, mas a culpa é sua que abriu novos horizontes ao meu trabalho. Em resumo. No fim do
meu trabalho e para lhe tirar todo o ar de ter pertencido a botanico, mas para o tornar completo e
mais interessante, levará como appendice: a) Historia da planta (dadas a G. Sampaio) – 1.ª menção,
[...] b) Menção dos exemplares da Universidades de Coimbra, Porto e Lisboa. 3) Area da distribuição
geografica. 4) 3 cartas de Darwin, duas dellas ineditas, emprestadas pelo Dr. Tait. [...] Das
Utricularias tinha o maior empenho em as obter para continuar as minhas investigações que têm tanto
mais opportunidade que o physiologista Rafael Dubois disse ha mezes, e em ar [...] as maiores
heresias». Na segunda carta não-datada (não datada 2) podemos ler: «Tenho quasi concluido um
trabalho sobre o Drosophilum lusitanicum Link e precisava d’umas indicações que espero dever-lhe:
1.º Desejava saber quaes os exemplares que existem no Herbario da Faculdade de Sciencias, com
indicação sobre o sitio em que foram colhidos e data. 2.º Dos exemplares adultos gostava de saber
dimensões da parte aerea e da raiz. 3.º Lembro-me do Gonçalo Sampaio, há annos, quando ahi estive
de passagem [...] onde passei uns dias encatadores que nunca me esquecerão, me mostrar a obra de
Link. Podia obter-se uma photographia do desenho da Drosophyllum da referida obra?». Num
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
145
bilhete-postal datado de 3 de Dezembro de 1920 escrevia: «O D. Antonio Pereira Coutinho informoume do habitat do Drosophyllum como segue: [...] Se houver qualquer elemento a acrescentar quanto
ao habitat, é muito obsequio acrescentar neste mesmo postal». O trabalho de C. França terá progredido
rapidamente. O Congresso do Porto organizado por G. Sampaio em 1921 aproximava-se - era uma boa
oportunidade para C. França expôr as suas descobertas com a Drosophyllum. Mas irá pedir ao professor
portuense que seja ele a apresentá-lo no Congresso. Escreve a G. Sampaio a 29 de Março de 1921 (a
carta de facto não tem a indicação do ano, mas pelo seu conteúdo é seguramente deste ano): «Já há 3
dias tenho prompta a minha comunicação para o seu congresso mas como d’aqui, por doença do chefe
do correio não registam, não lhe mandei ainda. Dei-lhe uma redacção para Congresso, isto é, saltei
por cima da parte mais maçadora de histologia para me deter na parte citologica. [...] Consegui
realizar este trabalho graças á extrema amabilidade dos Professores Julio Henriques, D. Antonio
Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio, do [...] William Tait e de M.elle Sarah Manaças. Todos
contribuiram com material para as minhas pesquisas e a todos deixo aqui consignada a minha
gratidão. [...] lhe peço mais o favor de ser o meu amigo que no Congresso apresente o meu trabalho.
Perdoará este incomodo. [...] Finalmente estou ancioso pelas Utricularias [...]»
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
146
X. Gonçalo Sampaio e a Liquenologia Ibérica
1. G. Sampaio e M. Bouly de Lesdain
Apesar do primeiro trabalho de G. Sampaio sobre líquenes só ter sido publicado em 1916, o seu
interesse por este grupo remonta aos anos de naturalista da Politécnica. M. Bouly de Lesdain, num
bilhete-postal com o carimbo de Dunquerque, datado de 5 de Janeiro de 1902, escrevia que «Le 8
Décembre dernier, je vous ai envoyé un coli postal de mousses et de lichens; je serais bien heureux de
savoir s’il vous est parvenu en bon état». Em troca, G. Sampaio terá enviado, ao seu colega francês,
exemplares de líquenes, pedindo a sua identificação ou confirmação de determinações suas, mas, talvez
por inexperiência, os exemplares não estavam em condições. M. Bouly de Lesdain, escrevia em
bilhete-postal dirigido a G. Sampaio, datada de 20 de Fevereiro de 1904, «Dans quelques jours, je vous
enverrai la liste de détermination des lichens envoyés ; malheureusement, un certain nombre ne
portent pas l’indication de localité ; et sont par conséquence sans valeur pour moi. Comme je colle
mes lichens, je vous demanderai, si vous voulez bien me faire un autre envoi, de joindre à chaque
espèce une étiquette indiquant la localité correcte». Era um erro elementar, resultante da sua
inexperiência com este grupo.
As trocas de líquenes entre M. Bouly de Lesdain e G. Sampaio continuaram e o liquenólogo
francês será um dos mais próximos colaboradores de G. Sampaio no estudo dos líquenes portugueses.
Numa carta dirigida a A. Ricardo Jorge, datada de 16 de Maio de 1920, G. Sampaio escrevia: «O dr.
Bouly de Lesdain pediu-me a Lecania Lesdaini, que lhe enviei com outras plantas, algumas das quais
novas, como […] Ficou contentíssimo e promete-me uma colecção de coisas boas. […] Emende
tambem na planta que levou do litoral de Leça como Lecania […]. Tendo dúvidas e parecendo-me
diversa desta, consultei o dr. Bouly, perguntando-lhe se não seria espécie nova. Respondeu-me que o
é, e boa espécie, dedicando-me-a com o nome de Lecania Sampaiana, B. de Lesd. Corrija portanto a
determinação. […] Vou submeter ao exame do dr. Bouly outras espécies sôbre que tenho dúvidas. Ele
tem uma colecção de liquenes das melhores da Europa. Entre elas irá […]» (BN A/2088). Poucos dias
depois, a 2 de Junho, G. Sampaio escrevia novamente a A. Ricardo Jorge sobre a colaboração com o
liquenólogo francês: «O dr. Bouly, que ficou muito contente com os bons líquenes que lhe mandei, e
com as minhas espécies, anunciou-me a remessa de uma boa colecção mas até hoje não a recebi.
Oferece-se para me copiar as diagnoses dos líquenes que eu quizer e combinamos fazer juntos – por
proposta dele – o estudo e a denominação das especies novas sôbre que eu tenha qualquer duvida.
[…] eu tenho bastantes espécies que julgo novas, mas com duvidas. Por isso vou-lh’as enviar. Como
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
147
em Portugal ha muitas Lecanias novas, é muito provavel que a Lecania algarbiensis do Coutinho o
seja realmente. Porque o não convence a mandar exemplares a um especialista lá de fora, para ele se
pronunciar e fazer uma diagnose suficiente da planta? Seria coisa acertada» (BN A/2086). Num
bilhete-postal com o carimbo de Dunquerque, datada de 22 de Fevereiro de 1922, M. Bouly de Lesdain
escrevia «Je vous remercie […] de l’offre si aimable que vous me faites de m’envoyer des lichen».
2. Arthur Ricardo Jorge e a exsicata «Lichenes de Portugal» de G. Sampaio
Arthur Ricardo Jorge171 desempenhou um papel importante no trabalho de liquenologia de G.
Sampaio, recolhendo muitos exemplares para o Herbário da Academia e da Faculdade e participando
na exsicata «Lichenes de Portugal» de G. Sampaio172. Ter-se-ão conhecido em 1901. Numa carta
dirigida a G. Sampaio, datada de 8 de Janeiro de 1902, A. Ricardo Jorge, depois de referir as suas
impressões da visita que tinha feito a J. Henriques em Coimbra, escrevia que «Fallei-lhe em si,
dizendo-lhe que tinha sido o Snr. Sampaio que me tinha despertado o gosto pela botanica, gabando-o
elle a si como justamente o merece», terminando entusiasmado com a botânica, «Já estou com grande
vontade de herborizar pois este anno hei de ter muito mais tempo de estudar porque não faço exame».
Os primeiros interesses botânicos de A. Ricardo Jorge seriam as plantas vasculares. G. Sampaio terá
pedido a A. Ricardo Jorge para procurar uma ou várias Calendula em Monsanto. A. Ricardo Jorge
responde ao pedido em carta datada de 16 de Abril de 1906, escrevendo que «Não obstante parti hoje
de manhã para lá e ali esquadrinhei o mais que pude durante algumas horas. A unica Calendula que
encontrei é esta que hoje envio, apezar de não me parecer aquella que me pede. Mando-a no entanto e
desejo que o Snr. Sampaio se convença de que fiz todos os esforços por realizar o seu desejo».
Em 1918, os interesses científicos de A. Ricardo Jorge direccionam-se para os líquenes, por
razões de ordem académica e com o apoio de G. Sampaio. A. Ricardo Jorge era 2.º assistente da
Faculdade de Ciências de Lisboa. Em 30 de Dezembro de 1917 completava dois anos na categoria. De
acordo com a legislação em vigor, para poder continuar como 2.º assistente teria de ser reconduzido,
caso contrário teria de abandonar a Faculdade. Para a recondução terá sido exigido a A. Ricardo Jorge a
171
Arthur Ricardo Jorge, filho do professor e distinto médico Ricardo Jorge, nasceu em 1886. Formou-se em Medicina e
cedo ocupa o cargo de médico dos Hospitais de Lisboa. No entanto, a paixão pelas ciências biológicas leva-o a abandonar o
exercício da Medicina, para se dedicar, primeiro à Botânica, e depois à Zoologia. Em 1911 entra como assistente da
recentemente criada Faculdade de Ciências de Lisboa. Sob a orientação de G. Sampaio inicia-se no estudo da flora
liquenológica portuguesa. É um precioso auxiliar do professor portuense na edição da exsicata «Lichenes de Portugal» (ver
Capítulo X). Passa a naturalista em 1919. Em 1921 rege cadeiras de Zoologia. Foi Ministro da Instrução em 1926 durante
um curto período de tempo. Abandona o cargo de naturalista em 1928. Organiza o Congresso Internacional de Zoologia em
1935 (GEPB).
172
A diferença de idades e de estatuto era apreciável e A. Ricardo Jorge assumir-se-á sempre como o aluno do mestre G.
Sampaio.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
148
apresentação de um trabalho de investigação original. Decide-se pelos líquenes, mas ter-se-á
apercebido tarde da sua situação profissional. Em carta dirigida a G. Sampaio, datada de 23 de Janeiro
de 1918, A. Ricardo Jorge escreve que «Estou desde que vim do norte a estudar lichens, tenho muitos –
sobretudo de Côja, S. Martinho e Obidos – de que não tenho duplicados para a Polytecnica. Vou
estudá-los com a rapidez que me fôr possivel. Já mandei vir alguns bons tratados ingleses. [...] Parecelhe bem assim?! E cá me vai ter á perna para levar a empresa a final, o mais rapidamente que eu
puder. Para isso o que preciso é de saber onde encontra para cada especie descripção satisfatoria.
Tenho o Nylander [...] Com isto puderei aguentar-me em auctor do trabalho? O meu amigo me dirá e,
como sabe quais as especies colhidas, indicar-me-ha como deverei começar e prosseguir, se devo
limitar-me a Obidos (cujas especies são todas de dificil determinação), ou antes fazer uma lista das
especies com algum interesse colhidas por mim no Gerez [...] Enfim entrego-me nas suas mãos [...]». A
resposta de G. Sampaio foi muito rápida. Escreve uma carta a 24 de Janeiro de 1918, concordando com
o estudo de líquenes: «Fiquei espantado com a partida que lhe fizeram; nós não exigimos aqui
trabalho algum original para a recondução. Mas até foi bom para o obrigar a cortar o pêlo,
decidindo-se a publicar um trabalhinho. Acho bem sôbre liquenes, como diz. Pode contar com tudo em
que eu o posso auxiliar. […] Faça como quizer: ou noticia sôbre os liquenes mais curiosos colhidos
por si, em varias localidades, ou só sobre os de Obidos. Mas parece-me melhor uma noticia sobre
liquenes novos ou mais raros do paiz, porque lhe dá margem a indicar mais novidades. Uma memória
sobre Obidos também era bonita, mas precisava de voltar á localidade para tornar a lista mais
completa. Claro está que os desenhos são sempre bons, mas só se justificam em obras de ensino ou
divulgação (a que não se dirige o seu trabalho); nas obras de interesse meramente scientifico só se
admitem os desenhos sobre coisas novas para a sciencia ou extremamente raras. Estes, se os fizer, são
muito bem cabidos e mais interessantes tornam a sua publicação» (BN A/2093).
A. Ricardo Jorge efectivamente decide-se pelo estudo dos líquenes portugueses e elabora o
trabalho académico em tempo recorde (JORGE, 1918)173. No entanto, passa da carreira docente para a
173
O trabalho é um catálogo de 50 táxones de líquenes da flora portuguesa. Na introdução, A. Ricardo Jorge salienta o
deficiente conhecimento da flora liquénica portuguesa, em comparação com a flora vascular: «Explorada e conhecida como
se encontra atualmente a flora fanerogâmica do país, é para o vasto campo da criptogamia, tão incompletamente estudada
ainda em Portugal, que se impõe a atenção do sistemata com a garantia de mais seguras e proveitosas descobertas». Esta
frase parece revelar uma consonância de opiniões com o seu orientador, G. Sampaio (ver Capítulo XIII.4). Seguidamente, as
palavras de A. Ricardo Jorge confirmam a urgência da elaboração do trabalho: «porque se trata duma aprendizagem, facil se
torna descupar-lhe o modesto ambito, desde logo revelado no cuidado com que foram evitados certos grupos de mais difícil
determinação, ao estudar as colheitas que ha mêses tenho realizado em diferentes pontos do país [...] enumeração das
especies, feita segundo Zahlbruckner, duma curta descrição das novas para o país, e da sinonímia correspondente á
bibliografia de que dispus, - as obras existentes na Biblioteca do Gabinete Botanico de Lisboa -, acrescentada ultimamente
por uma rapida consulta realisada nas Bibliotecas dos Gabinetes Botanicos de Coimbra e Lisboa». O trabalho segue um
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
149
de naturalista. Continua com o estudo dos líquenes e parece optar definitivamente pela botânica em vez
da medicina. Em carta datada de 12 de Novembro de 1919, escrevia para G. Sampaio: «Não sei se sabe
que fui em Julho nomeado naturalista do Gabinete. Fui-o por proposta dos meus profs. [...] Foi-me util
porque larguei os meus afazeres de medico sanitario, e desde então estou dedicando muito mais tempo
aos trabalhos de botanica. [...] Foram todos estes factos que me obrigaram á publicação do folheto
[...] de me vêr na situação de não poder receber os seus conselhos e ensinamentos. [...] Estou agora a
estudar a valer os liquenes, tendo começado é claro pelos grupos mais faceis».
A exsicata de G. Sampaio «Lichenes de Portugal» culminará de forma excepcional o seu estudo
dos líquenes portugueses. A ideia de organizar esta exsicata parece datar dos inícios do «período
liquénico» de G. Sampaio. Em carta dirigida a A. Ricardo Jorge, datada de 1 de Maio de 1918, G.
Sampaio formalizava a sua ideia e o seu empenhamento em concretizá-la: «Vou começar a organizar
uma colecção dos “Liquenes selectos de Portugal” com etiquetas impressas, para distribuir no
estrangeiro em fasciculos de 50 especies. Para ficar uma colecção de futuro, talvez classica, pelo
cuidado que nela vou pôr. O primeiro fasciculo será distribuido ainda este ano, para o que ando a
organizar alguns números. Quer o meu amigo colaborar nela, recebendo em troca uma colecção? No
caso afirmativo terá de enviar-me 25 exemplares de cada espécie»174 (BN A/2001).
Após a sua libertação da prisão, ocorrida no Verão de 1919 e até Maio do ano seguinte, G.
Sampaio vive na Póvoa de Varzim. Neste período, a actividade da preparação da exsicata «Lichenes de
Portugal» é febril e a participação de A. Ricardo Jorge solicitada insistantemente. Em carta datada de
11 de Março de 1920, escrevia G. Sampaio a A. Ricardo Jorge: «Já tenho colados nos cartões quasi
todos os líquenes (50 espécies) que devem constituir o 1.° fasciculo das minhas exsicatas numeradas
figurino semelhante aos trabalhos de G. Sampaio sobre líquenes. Para cada espécie são indicadas as citações nas obras
clássicas de liquenologia, os sinónimos e os locais de colheita. Alguns táxones são novos para a flora portuguesa: cinco
espécies e duas variedades. Para estes é também feita uma descrição sumária do taxon. O trabalho terá sido provavelmente
impresso em Junho de 1918, dado que existe um exemplar com a seguinte dedicatória escrita pelo autor: «Á Biblioteca do
Gabinete de Botânica da Universidade do Porto. Homenagem de, Junho de 1918».
174
Como será referido ao longo deste capítulo, a exsicata «Lichenes de Portugal» nem será distribuída em 1918, nem terão
sido elaborados 25 exemplares, mas antes 15-16. Sobre a exsicata de líquenes ver Anexo I. No início da sua carreira, G.
Sampaio terá tido a ideia de criar uma exsicata sua. J. S. Tavares, numa carta datada de 10 de Janeiro de 1902 e escrita no
Colégio de S. Fiel, escrevia a G. Sampaio: «Quanto ao concorrermos para a distribuição das exsicata do herbário da
Academia, era coisa que muito desejaríamos; mas não podemos prometer já; pois é provável que o Sr. Zimmermann tenha
de ir continuar a sua formação no estrangeiro este anno e não sei ainda quem o substituirá no trabalho árduo da
herborização». Poucos dias depois, G. Sampaio recebe uma outra carta do Colégio de S. Fiel, agora de C. Zimmermann,
datada de 17 de Janeiro: «Desculpe V. Exa. que só hoje accuse a recepção dos Lichens. Foram trabalhos impreteriveis que
não me deixaram fazel’o mais cedo. Muito agradeço a collecção e isto tanto mais por ser a primeira que adquire este
Collegio. Desde já me alegro com outros Lichens que V. Exa. com sua bondade prometter. Eu da minha parte não faltarei
enviar-lhe fungos. Dentro de umas 3 semanas poderei mandar uns 60, dos quaes todos são novos para Portugal. Já se
entende que boa vontade auxiliarei a V. Exa. na publicação da sua exsicata». Que tipo de exsicata tinha G. Sampaio em
mente? Seria uma exsicata de criptogâmicas?
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
150
dos “Lichenes de Portugal”. Muito brevemente vão ser impressas as etiquetas e o folheto que
acompanha cada fascículo. Portanto se quer colaborar nos fasciculos, tem de mandar 10 a 12 espécies
pelo menos, quanto antes. De cada espécie mande para 16 colecções, que são as que se fazem apenas.
Em Portugal só fica uma colecção no Porto, outra em Coimbra e outra na sua mão, se quizer
colaborar. As restantes vão para os herbários estrangeiros. Neste 1.° fasciculo vão, pelo menos, essas
15 espécies que o meu amigo não deve ter, algumas delas novas para o país ou para a sciencia, até:
[…] Carlosia viridescens, Samp. (género novo para a sciência, dedicado á memoria de D. Carlos I)
[175, […] Se mandar liquenes para a colecção do 1.° fasciculo tenho interesse em que mande […]»
(BN A/2087). A esta carta respondeu positivamente A. Ricardo Jorge, em carta datada de 29 de Março
de 1920: «Recebi passados 15 dias a sua carta da Povoa. Convida-me a colaborar na sua 1ª.
distribuição de liquenes. Excusado dizer-lhe que com o maior gosto desejo contribuir para ela e na
realidade de poder tornar-me merecedor dum exemplar. Pena é que me mande pedir as especies com
tamanha urgencia. Vou já esta semana meter-me a caminho para lhes obter. Como tem pressa irei
buscar aquelas que conheço localidades. Assim desde já comprometo-me a enviar-lhe: [...] Farei as
necessarias colheitas ainda nesta e em proxima semana, enviando-lhas [...] Não quero [...] alguma
deixar de vir a possuir um exemplar de tão precioso fasciculo». A. Ricardo Jorge terá enviado os
líquenes para a exsicata de G. Sampaio, porque no mês seguinte, no dia 16, G. Sampaio escrevia para
A. Ricardo Jorge pensando na continuação da exsicata, mas também no estudo dos líquenes
portugueses: «Dou-lhe a novidade de que os seus liquenes já hoje ficaram colados nos cartões. Com
êles atingo o numero de 30 especies para as distribuições, já colhidas e preparadas. No entanto, como
vê, faltam-me ainda 70 para poder distribuir em junho o 1.° e o 2.° fasciculo. Como lhe disse, cada
fasciculo compreende 50 numeros e vai numa pasta especial, etiquetada na lombada. Colha tudo
quanto poder, porque em troca vai receber excelentes liquenes, que fazem parte da colecção, entre os
quais […] especies novas, como a Lecidea Chodati Samp., a Lecidea Duartei Samp. e a Acarospora
varzinensis Samp., etc. Alem dos liquenes que colhi em quantidade para a colecção outros novos para
Portugal tenho colhido ultimamente, mas em numero de exemplares bastante limitado. Se quizer obter
algum destes eu poderei trocar consigo por espécies das que me faltam e são citadas pelo Coutinho.
Para essas trocas ofereço: […] Por cada liquen que quizer enviar-me, dos que vou indicar na
desiderata, pode escolher dos mencionados o que quizer. Desejo receber os seguintes: [segue-se uma
lista de espécies] Todos estes liquenes me interessam, porque desejo saber do que realmente se trata.
Alguns deles nunca os encontrei e não creio na sua existencia no paiz, outros possuo-os mas creio que
175
G. Sampaio designará de Carlosia lusitanica Samp. no trabalho que publica em 1923 (SAMPAIO, 1923b)
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
151
o Coutinho se refere a plantas diversas delas.[…] Ora muitos dos que desejo são-lhe faceis de obter,
porque são dos arredores de Lisboa. Eu vou precipitar a redacção do Catalogo dos liquenes
portugueses, porque o dr. Julio Henriques insta constantemente pelo original para o Boletim da
Sociedade Broteriana. Por isso tenho agora o maior empenho em ver as plantas que o Coutinho cita e
das quais eu ponho em duvida a boa determinação. Espero que se não descuide com as colheitas para
a colecção» (BN A/2089). A 12 de Maio deste mesmo ano, A. Ricardo Jorge informava G. Sampaio do
andamento das colheitas, escrevendo num bilhte-postal: «Ha dias mandei-lhe uma 2ª. remessa de
liquenes com [...] Hoje envio-lhe um 3º. pacote com [...] No 1º. pacote ia um liquene de Obidos que
não sei determinar e que lhe pedi para me dizer o que era, bem como se os 2 pacotes chegaram e os
exemplares são bons e são admitidos para a distribuição. [...] Brevemente irei a Cintra, donde trarei
um bom numero de especies para a distribuição. Pode contar que lhe colherei 20 a 25 especies da sua
lista, 20 pelo menos com segurança. Muitas das outras especies não as possuo e não as conheço. [...]
Brevemente lhe escreverei de novo sôbre os seus desiderata de liquenes de que já em tempos lhe enviei
alguns exemplares. Continuarei agora, procurando obter todos os que deseja, sendo alguns muito
dificeis». Recebidos os líquenes, G. Sampaio escrevia a A. Ricardo Jorge, numa carta datada de 16 de
Maio de 1920, rejubilado com os exemplares: «A sua colaboração nos 2 fasciculos promete ser
excelente» (BN A/2088). Poucos dias depois, num bilhete-postal datado do dia 19, escrevia G. Sampaio
a A. Ricardo Jorge: «Os seus exemplares já estão colados nos cartões» (BN A/2047). No dia 28 de
Maio deste ano, ainda na Póvoa de Varzim, escrevia G. Sampaio a A. Ricardo Jorge: «Não se esqueça
de mandar liquenes, com força. Já tenho preparados os do 1.° fasciculo; ando agora com os do 2.°
fasciculo e espero distribuir 3 ou 4 fasciculos juntos este ano, sem falta alguma» (BN A/2044). Já
regressado ao Porto, escrevia G. Sampaio a 2 de Junho de 1920: «Não se esqueça de colher sempre
liquenes para as distribuições. Espero distribuir 4 fasciculos de 50 especies e para isso ainda preciso
de muitos, tendo de fazer algumas herborizações para fora do Porto. Com eles vai o meu amigo
receber espécies excelentes, verá. De resto as colecções são apenas 15 – o que as tornará de futuro
mais valiosas; por oferta apenas cedo 7, sendo as outras fornecidas por venda ao preço de 100
escudos cada fascículo. Só museus ricos ou americanos as poderão adquirir, e para eles vai ser aberta
assignatura brevemente. São caras?» (BN A/2086). Alguns meses depois, a 23 de Novembro de 1920,
G. Sampaio escrevia a A. Ricardo Jorge, continuando entusiasmado com a exsicata «Lichenes de
Portugal»: «O 1.° e 2.° fasciculos estão definitivamente organizados faltando apenas as etiquetas. Já
estão a fazer as respectivas pastas. Estes fasciculos contem muitos liquenes interessantes, não poucos
novos para Portugal e alguns para a sciencia. Vai gostar de os receber» (BN A/2042).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
152
A 20 de Dezembro de 1920, A. Ricardo Jorge dirigia-se a G. Sampaio, «Escrevo-lhe de viagem
para o norte, a caminho de Leiria onde vou ficar hoje para colher algumas especies de liquenes
interessantes para a sua distribuição», e logo no dia a seguir escrevia, «Em Leiria colhi algumas
coisas boas para os seus fasciculos, com as quais ficará decerto contente». A 3 de Janeiro de 1921, G.
Sampaio escrevia a A. Ricardo Jorge, em tom de extremo jubilo com as colheitas do colega de Lisboa:
«Não se esqueça de ir a Cintra colher liquenes! E colha as Toninias! E colha as Collemaceas! E colha
as Verrucariaceas! E colha tudo!» (BN A/2099). A 19 de Setembro deste ano, o estado de espírito e
entusiasmo de G. Sampaio mantinham-se elevados, e escrevia a A. Ricardo Jorge: «Como vê a
colecção a distribuir vai progredindo a olhos vistos, contendo já 200 especies de liquenes, deve ficar
uma colecção excelente, com muitos liquenes novos ou desconhecidos nos herbários estrangeiros. Não
deixe de colaborar nela o mais possível que possa, porque há de no futuro ser uma colecção clássica
dos liquenes portugueses. As suas contribuições são já excelentes, mas podem ser mais abundantes,
desde que queira trabalhar. O sul poderia ficar a seu cargo. Quero organizar mais um fascículo, o 5.°,
para fazer a distribuição muito proximamente. Ajude-me o mais que possa» (BN A/2004). A. Ricardo
Jorge também comunhava da excitação do empreendimento. A 18 de Novembro de 1921, informava G.
Sampaio das suas colheitas para a exsicata, «Vou no entanto fazer o que puder em todo este mês que
dista do Natal, no Cacem, em Bensafrim, em Mafra e Cintra, sobretudo em Cintra, onde irei já para a
semana. De resto já cá tenho algumas coisas para lhe mandar como Teloschistes flavicans Norm.»176.
A 12 de Dezembro de 1921, A. Ricardo Jorge escrevia a G. Sampaio sobre as novas colheitas. «Quanto
a liquenes vou fazer uma encomenda para lhe enviar com algumas espécies para as distribuições,
entre elas: [...] Na proxima 3ª. ou 4ª. feira vou para Cintra [...] colher-lhe liquenes». G. Sampaio
escrevia-lhe a 15 de Dezembro: «Estou já em férias, por determinação dos alunos, e passo os dias a
colar liquenes, com meu filho Joaquim. Vamos no 5.° fasciculo, o que quer dizer que já temos colado
para cima de 30 centos de exemplares» (BN A/2078). Se compararmos a lista de espécies apresentada
por A. Ricardo Jorge nesta carta com a lista final das espécies da exsicata verificamos que nem todos
os exemplares recolhidos por este botânico foram incorporados na exsicata. A. Ricardo Jorge terá sido
informado deste facto, dado que em bilhete-postal datado de 19 de Fevereiro de 1922, pedia a G.
Sampaio para «Não se esqueça também, peço-lhe de me enviar preenchida a lista que lhe enviei das
minhas remessas para as distribuições. Tenho empenho em saber quais as especies aprovadas». A.
Ricardo Jorge prossegue as colheitas. Em bilhete-postal datado de 21 de Março de 1923, informava G.
Sampaio do que tinha recolhido ultimamente e que ansiava por ter a exsicata nas suas mãos, obra na
176
Esta espécie será de facto incluída como o número 129 da exsicata.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
153
qual estava a participar activamente «Participo da sua satisfação pelo que diz respeito ás apreciações
relativas á colecção dos liquenes portugueses; essas noticias mais me crearam agora [...] por receber
a colecção completa que me está reservada e que anciosamente aguardo. [...] Amanhã seguirão os 15
exemplares de Buellia»177. A. Ricardo Jorge continua «a que juntei 15 exemplares da Lecanora»178. E
termina escrevendo «e os exemplares já preparados da Toninia os quais, no caso de não serem
bastantes, serão acrescentados com outros que colherei no proximo Domingo». A. Ricardo Jorge,
numa carta datada de 9 de Abril de 1925, insistia na distribuição da exsicata, «Quando tenciona fazer a
distribuição dos seus «Lichenes exsiccati»? [...] Que especies deseja especialmente que lhe colha aqui
pelos arredores?». Estaria atrasada a distribuição da exsicata?
A quem foram distribuídos os exemplares dos «Lichenes de Portugal»? Existem documentos
que sugerem que foram enviadas colecções para vários Herbários, mas só existe um documento em que
explicitamente se acusa a recepção de parte da exsicata. Para Espanha, poderá ter ido uma colecção
para Madrid e outra para Barcelona. Em carta datada de 7 de Março de 1923, R. G. Fragoso escrevia a
G. Sampaio, «Creo podré hacerse dos suscripciones á su exsicata, una para Madrid y otra para
Barcelona. No olvide escribirme el precio de las mes repastos hechos que supongo será identico al de
los restantes». R. G. Fragoso estaria muito provavelmente referir-se a Font Quer do Museu de Ciências
Naturais de Barcelona. Font Quer iria contactar com G. Sampaio em 1924. Propunha-se trocar
exemplares de plantas, mas também de líquenes. Em carta datada de 5 de Fevereiro de 1924, Font Quer
escrevia a G. Sampaio, «Aprovecho esta oportunidad para remitirle el opúsculo de Llenas sobre
Líquenes de Cataluña. Desde la fecha de publicación de este folleto Llenas no se dedicó ya más al
estudio de los líquenes, y su herbario lo posee este Museo, regalado por aquel autor. Espero que podré
hacer a V. un buen envio de líquenes españoles durante este año; muchos aguardan desde hace tiempo
alguien que quiera estudiarlos». Em Outubro de 1923, no dia 1, R. G. Fragoso insistia na exsicata para
o Jardim Botânico de Madrid, «Le ruego no olvide que el Jardin Botànico de Madrid quiere ser
suscritor a su exsiccata de líquenes de Portugal, para la Catedra del Dr. Arturo Caballero. Como
probablemente seré yo quien tendré que ocuparme de los líquenes en dicho Jardin tengo empeño en
que su linda e interesante colección no falte en el». E mais uma vez, a 27 de Fevereiro do ano seguinte,
insistia junto de G. Sampaio para que «No olvide que el Prof. Caballero del Jardin botánico deseaba
um ejemplar de su exsiccata de líquenes de Portugal». Em 1926, a 12 de Março, L. Crespí escrevia a
177
Devia estar a referir-se a uma das espécies que ficaram na exsicata com os números 177 e 185, respectivamente, Buellia
schaereri De Not. e Buellia myriocarpa var. lusitanica Samp.
178
Deve ser uma das espécies que ficaram na exsicata com os números 78 ou 79, Lecanora hageni for. coerulescens Flag. e
Lecanora crenulata Hook.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
154
G. Sampaio «El Sr. Fragoso me encargó que le dijera que podia enviar un ejemplar de su exsiccata de
líquenes cuando quisiera, diciendole el precio. Respecto al segundo ejemplar habia pensado adquirirlo
para el botánico, pero no está en buena armonía y prefiere aplazarlo, dejando a V. en libertad para
que, si desear, cumpla otros compromisos». Novamente em 1929, a 25 de Fevereiro, R. G. Fragoso
escreve a G. Sampaio, sobre a compra da exsicata de líquenes, «Respecto a la subscripción de la
exsiccata de líquenes de esa flora, desde luego creo poder asegurarle que el Museo, ó el Jardin
botanico, se suscribirán á la totalidad de ella, por un ejemplar. Para hacer la suscripción [...] me diga
el precio total de los tres [...] publicados».
3. Os contactos com Zahlbruckner e A. H. Magnusson
G. Sampaio contacta também com Zahlbruckner e A. H. Magnusson, reputadíssimos liquelógos
da época. Numa carta dirigida a A. Ricardo Jorge, datada de 3 de Janeiro de 1921, G. Sampaio escrevia
sobre os contactos com o liquenologista de Viena: «O dr. Zahlbruckner, de Vienna, é que me escreveu
agradecendo as minhas separatas, pedindo as minhas espécies novas de líquenes e prometendo em
troca a sua colecção completa de “Lichenes rariores” [179] bem como tudo quanto pudesse dar das
suas antigas distribuições […] Já estou em organizar uma colecção para lhe mandar. Ele mandou-me
um grande número dos seus trabalhos e promete-me o seu “Catálogo Universal dos Lichenes”, de que
já está a imprimir o 1.° volume» (BN A/2099). Através de Zahlbruckner, G. Sampaio irá entrar em
contacto com A. H. Magnusson, especialista no género Acarospora. Este liquenologista sueco escreve
a G. Sampaio uma carta datada de 5 de Outubro de 1922. «By a visit this summer to Hofrat
Zahlbruckner, Wien, I have heard that you have a great interest in lichens and I have there seen some
species of Portuguese Acarospora, a genus of which I have just finished a monograph (in English) of
the Scandinavian 30 species. I now intend to continue with the European and should be grateful to get
specimens from you, both from the new ones you have described and from others in your country. As I
have a great many duplicates I am willing to send you some species in exchange other lichens if you
have an interest in Swedish lichens (a great many are from Lappland). At the same time I send you my
small papers. I also read German and French». G. Sampaio terá respondido rapidamente a A. H.
Magnusson, pedindo alguns exemplares para troca. O investigador sueco envia nova carta, datada de 27
de Outubro, em que escreve «I thank you very much for your friendly letter and I have to day sent you
a parcel with 75 lichens mostly from the desiderata list. In my unarranged collections I have most of
179
No herbário de G. Sampaio existe esta exsicata, pelo que é muito provável que tenha sido enviada por Zahlbruckner a G.
Sampaio.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
155
what you have not obtained this time, but I hope to get them ready by and by. I have also many
duplicates from the mountains and am willing to send you a list of between 4 – 500 species if you are
interested in a further exchange. I shall be very much pleased to obtain those you have told me in the
list, because they all are new and certainly not to be obtainable in a Swedish museum. I should also be
very glad if you still had some excerpts of your lichenological papers to send me, because I have
nothing of what you have written, and because there are few botanical periodicals in this town and
none from Portugal. I must try to get the lichenological literatur in antiquaries and in excerpts from
the authors». G. Sampaio envia as suas publicações para A. H. Magnusson e promete enviar líquenes
em troca dos que tinha recebido. A. H. Magnusson escreve a 17 de Dezembro de 1922, que «I am very
much obliged to you for your sending of your interesting lichenological papers and I am very curious
on your sendings of lichens to come». G. Sampaio terá então enviado a A. H. Magnusson alguns dos
fascículos da sua exsicata «Lichenes de Portugal». Escreve a A. Ricardo Jorge, num bilhete-postal
datado de 16 de Março de 1923: «Os lichenólogos a quem tenho mandado exemplares da colecção têm
todos ficado encantados. Um sueco [seguramente que G. Sampaio se refere a A. H. Magnusson] diz-me
que é a mais formosa remessa que tem recebido, apezar de ter trocado lichenes com especialistas de
toda a Europa. Diz que pela colecção completa me enviará todos ou quasi todos os lichenes da Suécia
e Noruega! Outro promete enviar de tudo que colher numa excursão lichenologica á Bulgaria» (BN
A/2053). A 1 de Junho deste ano, A. H. Magnusson escreve a G. Sampaio agradecendo os fascículos da
exsicata180, e naturalmente ansiando por receber o resto da colecção: «I have received your postcard
and am very much obliged to you for your promise to send me the rest of your exsiccata. I have also
received and examined your Acarospora […]. Certainly it is a new species, deserving the name of
picea. It is not identical to any of the Scandinavian ones, the European ones I hope to study more
completely at the end of this summer». SAMPAIO (1923a) propõe uma espécie nova de Acarospora, A.
magnussoni Samp. Será esta espécie a que se refere A. H. Magnusson na carta? G. Sampaio terá
enviado um exemplar a A. H. Magnusson e pedido a sua opinião sobre a sua determinação. A resposta
de A. H. Magnusson terá confirmado a opinião de G. Sampaio de se tratar de uma espécie nova, que
acaba por dedicar ao seu colega sueco.
180
G. Sampaio escreve num bilhete-postal datado de 22 de Março de 1923 enviado a A. Ricardo Jorge: «Vá colhendo o que
puder para o 4.° fasciculo, que desejo publicar sem a menor falta, durante este ano lectivo, para ficarem os primeiros
quatro todos de 1923» (BN A/2052). Os primeiros 150 exemplares da exsicata estariam portanto prontos em Março de
1923. Terão sido provavelmente estes os enviados a A. H. Magnusson. As duas primeiras centúrias terão ficado prontas por
volta de Abril de 1924, como se conclui pelo que G. Sampaio escreve num bilhete-postal enviado a A. Ricardo Jorge,
datado de 4 de Abril de 1924: «De resto, tudo está pronto e anda-se já a colar os do 4.° fasciculo, para o qual espero a sua
colaboração. Não se descuide, não?» (BN A/2062).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
156
4. G. Sampaio e Luis Crespí
Através de R. G. Fragoso, L. Crespí contacta G. Sampaio, em 1924, com o objectivo de receber
ensinamentos em liquenologia, em particular sobre a prática de identificação de líquenes. Escreve então
um bilhete-postal a G. Sampaio com a data de 4 de Novembro de 1924. «Vengo comisionado por el
Gobierno Español a estudiar con V. los líquenes. Traigo una carta de mi querido amigo el prof. G.
Fragoso. Espero hablar con V. para iniciar mis trabajos y para que V. me ayude a resolver el difícil
problema de la vida ¿Seria mais útil que yo fuera a Braga a hablar con V.? Se agradeceria que me
dijera donde y cuando podia hablar con V. mi direccion as, Hotel Lisbonense, Porto». A resposta de
G. Sampaio foi positiva e o estágio de L. Crespí iria concretizar-se. A 12 de Outubro de 1925, Crespi
escreve a G. Sampaio anunciando a sua chegada, «Decididamente llegaremos a Porto el dia 15 de
Octubre en el correo de Valença-Porto que habrá su entrada en Porto alredor de las 7 de la tarde».
Seguidamente refere que lhe tinham indicado o Hotel e restaurante Bastos e a Pensão Portuguesa para
ficar alojado no Porto e pede a opinião a G. Sampaio sobre que local escolher. O estágio de L. Crespi
com G. Sampaio terá durado até ao fim do ano de 1925, dado que a 18 de Janeiro de 1926, L. Crespí
escreve uma longa carta a G. Sampaio endereçada de Madrid. «Mi queridissimo maestro: En este punto
estaba cuando recibí su cariñosa carta del 14. Voy pues a contestar ampliamente. 1º. Le agradeceria
que me enviase los líquenes de Galicia que V. determinó. […] 2º. La lista de líquenes de Galicia se
publicará tan pronto V. me diga si me puede o nó enviar esos líquenes. He querido hacerla con
comentarios pero me es imposible por ahora pues necesito revisar las colecciones del Botánico de
Madrid y […] 3º. He recogido bastantes líquenes del Guadarrama pro no me ocupé aun de ellos hasta
no concluir la formación de la colección de líquenes del Museo. Con las que tenia el Sr. Fragoso, los
que V. envió, los que yo traje de Portugal y de Galicia ya va habiendo una colección regular. Calculo
que de momento llegara los 1500 cartones. No he podido aun inventariar las especies porque sólo
puedo ocuparme en esta labor tres mañanas a la semana». R. G. Fragoso, numa carta dirigida a G.
Sampaio datada de 8 de Março de 1926, também dará conta do êxito do estágio de L. Crespí «Crespí y
familia llegaron bien, y mañana le daré sus recuerdos. Viene encantado y agradecidisimo de Vd. Viene
casi todos los dias a el laboratorio, y ahora se ocupa en tomar nota de los líquenes citados ó descritos
en España, que son numerosos». Mas L. Crespí era professor do «Instituto-Escuela de Segunda
Enseñanza» de Madrid e escasseava o tempo para os estudos de liquenologia. Numa carta com a data
de 13 de Outubro deste ano, L. Crespí informava G. Sampaio que tinha sido nomeado director da
escola «mis colegas tuvieron la mala idea de nombrarme director de este liceo». Pede então algumas
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
157
informações a G. Sampaio para que pudesse acabar o trabalho que tinha realizado no Porto, «No
publiqué aun el trabajo que hicimos en Porto porque espero que V. me envié la lista de los que allí
quedaron. Recordará V. que me envió una lista con las determinaciones que V. hizo después de mi
regreso a Madrid; pero en ella no venía nota alguna de localidades, por lo cual carecen de interés
para publicarse. Si V. conserva los ejemplares le agradecería que los enviara o por lo menos el
número que cada uno lleva, que me indicaría la localidad». A 5 de Outubro de 1928, L. Crespí escreve
novamente a G. Sampaio. «¿Mis líquenes? Tengo muchos, tengo cosas publicables. Tengo cosas que
consultarle. No tengo tempo. Este año vuelvo a ser Director del instituto-Escuela. Sin embargo no
quiero que acabe el año sin publicar alguna nota. Destrozan mi vida las preocupaciones de mi familia
y los enormes quehaceres del Instituto. Necesito una temporada a su lado. No se cuando ni como va a
poder ser». O trabalho sobre os líquenes da Galiza, fruto do estágio de L. Crespí com G. Sampaio seria
finalmente publicado em 1929 no «Boletin de la Real Sociedad Española de Historia Natural»181.
5. O projecto do Catálogo de líquenes de Portugal
G. Sampaio teve o projecto de redigir um catálogo ou uma flora liquénica de Portugal182. Vários
documentos apontam inequivocamente neste sentido. Em 1921 num currículo que redige para apoiar a
sua nomeação como primeiro director do então criado Instituto de Investigação botânica da Faculdade
de Ciências do Porto escreverá no final do currículo, um «Catálogo analítico dos líquenes
portugueses», «em preparação»183. A. Ricardo Jorge escreve numa carta datada de 18 de Novembro de
1921: «Fico radiante com a ideia da sua Flora Descriptiva mas julgue que perderá recorrendo a
estranhos. Tomára tambem ver as suas gravuras. Sobre estes e outros assuntos voltarei a escrever com
mais vagar». Numa outra carta datada de 21 de Abril de 1924, A. Ricardo Jorge escrevia: «E as floras
e o catalogo geral dos liquenes? Que pena tenho que não apresse a sua publicação. Aproveite a
quietude de Braga para lhes dar o ultimo retoque e depois deite-as cá para fora». Estaria a referir-se a
uma flora vascular e um catálogo de líquenes? Ou a uma flora liquénica de Portugal? G. Sampaio terá
mesmo redigido algo desta flora liquénica, porque L. W. Carrisso, da Faculdade de Ciências de
Coimbra escrevia para G. Sampaio a 1 de Fevereiro de 1922: «Diz-me o Quintanilha (que muito lhe
agradece os cumprimentos, que retribue) que V. Exa. elaborou, para seu uso, uma chave para a
181
182
Infelizmente o trabalho terá a deficiência de não apresentar diagnoses dos táxones novos propostos.
Quiçá no início da década de 1920, quando já tinha um conhecimento bastante aprofundado da flora liquénica portuguesa
e publicado diversos trabalhos nesta área.
183
Ver Capítulo XIV.1.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
158
determinação dos liquenes portugueses. Não estará V. Exa. disposto a dar-mo-la, para ser publicada
no volume em impressão do Boletim? Ficar-lhe hiamos mais uma vez muito agradecidos pela honrosa
colaboração».
L. Crespí, numa carta com a data de 12 de Março de 1926, escrevia: «Con reserva le diré que
ya traté con D. Ignacio Bolivar […] su proyecto de escribir una flora de la península en claves. En
principio está acordado invitar a V. a que la haga y […] proyecto es el siguiente: Que V. venga a
Madrid dos meses, para ver los herbarios y recoger materiales: Después trabajaria en esa para la
redacción de la flora, que llevaria los más dibujos posibles, para lo cual dispondríamos de dibujantes
del Museo y de lo que yo pudiera hacer. Hecho el trabajo, la Junta se posesionaria de el, ofreciéndole
el tanto por ciento de la venta. Todo esto son las ideas que existen y que yo trataré de mejorar cuanto
sea posible contando con la buena voluntad de todos para con V. nada definitivo hay; pero nos
reuniremos pronto, se acordarán las bases del acuerdo y si yo me anticipo a darle estas noticias es
para advertirle que cuando reciba las propuestas, vengan de quien vinieren, las estudie y medité y
ponga a ellas cuantos reparos estime oportunos. Dos cosas anhelo a cual más vivamente: que haga la
Flora Vd. y que por ello reciba los mayores beneficios económicos. No tenga V. escrúpulos en
cuestiones económicas y tenga siempre la seguridad de que las ofertas que se le hagan estaran hechas
por personas serias y que procuran encontrar la fórmula […] mas ventajosa para V. y para la cultura
botánica en España». Todavia a ideia não avança. Numa carta com a data de 13 de Outubro de 1926,
L. Crespí informava G. Sampaio que «Me dijo el Sr. Bolivar que no era posible invitarle a V. a venir
este otoño porque la Junta carecía de recursos económicos para ello; pero que confiaba en poderlo
hacer para año nuevo. Ha pasado la Junta situaciones muy difíciles con D. Miguel Primo de Rivera
que justifican en esta imposibilidad actual, aunque vamos mucho los que lamentamos no verle a V.
pronto». Não existe nestes documentos a explicitação do tipo de flora em causa. Seria uma flora
vascular ibérica, na continuação da ideia lançada por R. G. Fragoso e Font Quer?184 Ou seria uma flora
liquénica ibérica? Esta segunda hipótese talvez seja mais plausível, dado que L. Crespí tinha trabalhado
com G. Sampaio unicamente no estudo de líquenes e a correspondência de L. Crespí com G. Sampaio
versava quase exclusivamente a liquenologia.
184
Ver Capítulo VIII.7.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
159
XI. Gonçalo Sampaio e a Micologia Ibérica
G. Sampaio terá conhecido R. G. Fragoso185 no Congresso do Porto de 1921. A partir daí
estabelecer-se-á, entre os dois botânicos, uma troca de ideias, de exemplares de herbário e uma
amizade, que durará até à morte de R. G. Fragoso.
A primeira carta que encontrámos de R. G. Fragoso dirigida a G. Sampaio data de 30 de Maio
de 1922. Nesta carta, em papel timbrado do «Museo Nacional de Ciencias Naturales, Madrid
(Hipódromo), Sección de Botánica», R. G. Fragoso começa por recordar o seu encontro com G.
Sampaio - «Puede tener la seguridad de lo grato y agradable que me ha sido el conocerle y como
deseo que esta amistad sea aun mas intima y amplia. Espero a la primera ocasión que nos sea posible
hacerle una visita en ese hermoso pais del siempre tengo saudades». R. G. Fragoso termina com o
desejo de intercâmbio de «plantas», mostrando R. G. Fragoso especial interesse por fungos, a sua
grande especialidade - «Igualmente todo cuanto envie de Hongos, líquenes, y Fanerogamas, ya le
enviaré Hongos procurando sean interesantes, y cuando regrese de los Pirineos el Sr. Vicioso haré le
envie fanerogamas del Guadarrama, de las que tenemos muchos duplicados, y que sean raras.
Tambien le encargué recolecte cuidadosamente Rubus para Vd., y si no voy este verano a la sierra de
Guadarrama procuraré recoger líquenes».
Pouco tempo depois, a 1 de Julho de 1922, R. G. Fragoso escreve novamente a G. Sampaio a
informar das novidades no Jardim Botânico de Madrid, «Y ocupado tambien con los opositores al
concurso para la catedra vacante del Jardin botánico, el cual ha terminado hoy siendo propuesto por
unanimidad como yo esperaba, el Dr. Arturo Caballero. Comienza con esto una nueva vida para el
185
Romualdo González Fragoso (1862-1928) nasceu em Sevilha. Graduou-se em Medicina pela Universidade de Sevilha.
Em 1911 e 1912 estagia em França, Bélgica e Suíça na área da Micologia. Em 1918 é nomeado naturalista do Museu de
Ciências Naturais de Madrid e, posteriormente, director do Laboratório de Criptogamia deste museu. É nomeado professor
honorário do Museu e do Real Jardim Botânico de Madrid. Estuda a flora micológica espanhola, portuguesa, marroquina e
da República Dominicana. Especializa-se em uredináceas e ustilagináceas (sobretudo parasitas de plantas, musgos e
líquenes), mas também estuda deuteromicetos e basidiomicetos. Conhece pessoalmente G. Sampaio no Congresso do Porto
de 1921, estabelecendo-se desde logo uma colaboração e amizade que perdurarão até à sua morte. Autor de uma vastíssima
obra científica, foi um dos fundadores dos estudos modernos das uredináceas e ustilagináceas. Publica em 1924-1925 a
«Flora Ibérica – Uredales» em dois volumes. Publica em 1927 uma obra de referência sobre os hifomicetos «Estudio
sistemático de los hifales de la Flora española conocidos hasta esta fecha». A colaboração dos botânicos portugueses
permitir-lhe-á estudar a flora micológica portuguesa publicando vários trabalhos: «Algunos hongos de la flora lusitanica»
(Broteria, 1924:128-133), a monumental «Contribución a la flora micológica lusitánica» (Boletim de Sociedade Broteriana,
1923:3-83) e «Adiciones a la micoflora lusitánica» (Congreso de Coimbra, Ciencias Naturales, Asociación Española para el
Progreso de las Ciencias, 1925:5-27). UNAMUNO (1928) escreverá a seu respeito: «porque toda su vida fué eso: trabajo
incesante y fructifero […] merece el nombre de Saccardo español». De acordo com UNAMUNO (1928), do labor científico
de R. G. Fragoso resultaram a publicação de 193 formas e variedades, 544 espécies, 1 subgénero, e 13 géneros novos para a
ciência (UNAMUNO, 1928; SAMPAIO, J., 1948, 1949). J. SAMPAIO (1948, 1949) descreveu pormenorizadamente a obra de R.
G. Fragoso e os seus contactos com G. Sampaio. Transcreveu também algumas das cartas que analisamos neste trabalho.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
160
Botánico de Madrid que vá a renacer de sus cenizas». Seguidamente R. G. Fragoso pede a colaboração
de G. Sampaio e seu filho para as publicações do Museu e Jardim Botânico de Madrid, «Espero que
colabore a nuestras publicaciones del Museo y Jardin con sus trabajos y que acaso mas tarde nos dé
alguna monografía de algun grupo de la flora ibérica. No tiene una sola tasa ni para espacio ni para
ilustraciones, e igualmente su hijo, y todo botánico portugués recomendado por Vd.».
Logo em 14 de Setembro deste mesmo ano, R. G. Fragoso escreve novamente a G. Sampaio.
Pelo conteúdo da carta, compreendemos que G. Sampaio tinha enviado uma remessa de fungos para o
seu colega espanhol, «He determinado ya buena parte de los hongos que tuvo la bondad de enviarme,
y entre ellos encuentro algunas especies y matrices no mencionadas hasta ahora en la flora lusitanica.
Cuando termine con todos le remetiré la lista completa». Como se compreenderá por outras cartas, os
fungos que G. Sampaio envia para R. G. Fragoso eram fungos parasitas de plantas – a maioria,
uredinomicetos e ustilaginomicetos (basidiomicetos, ferrugens e morrões). O conhecimento da flora
portuguesa e espanhola neste grupo de fungos era reduzido. Não admira pois que R. G. Fragoso irá
encontrar muitas espécies novas para a península e até para a ciência186. O reconhecimento de R.
Fragoso a G. Sampaio seria significativo: 1 género e 9 espécies têm nomes associados a Sampaio187.
Para G. Sampaio, a colheita destes fungos era simples, dado que realizava muitas recolhas de plantas
vasculares para os seus estudos taxonómicos.
Os fungos parasitas de líquenes também interessavam a R. G. Fragoso e para G. Sampaio seria
fácil reconhecê-los dado que fazia muitas colheitas de líquenes. Numa carta dirigida a G. Sampaio
datada de 30 de Janeiro de 1923, R. G. Fragoso escreve que «Estoy estudiando los hongos sobre
líquenes, y no son ciertamente fáciles […] Los lindos ejemplares de líquenes que me envia demuestran
cuan seria y concienzudamente ha estudiado esa flora».
O currículo de R. G. Fragoso era impressionante em termos de número e qualidade de
publicações. Só um trabalhador incansável podia produzir tal massa de trabalhos científicos. Em
186
Os fungos enviados por G. Sampaio a R. G. Fragoso serão estudados, na sua maioria, na obra monumental de R. G.
Fragoso publicada no Boletim de Sociedade Broteriana em 1923. São descritos 301 táxones, na sua maioria uredinomicetos
parasitas de plantas, ascomicetos saprófitos e parasitas e deuteromicetos. De estes, 58 eram novos para a ciência: 1 género,
40 espécies e 17 variedades e formas, todos com diagnose em latim. G. Sampaio tinha recolhido os exemplares de 45 destas
novidades taxonómicas. G. Sampaio descrevia a A. Ricardo Jorge a sua colaboração com o micologista madrileno em tom
naturalmente jubiloso, num bilhete-postal datado de 1 de Março de 1923: «Já recebi de Madrid a lista dos centos de fungos
que enviei ao dr. Fragoso, que vai sobre êles publicar um trabalho extenso. Há um género novo, que me dedicou, e cêrca
de 40 especies novas! As especies novas para Portugal são numerosissimas. Veem classificados dois fungos colhidos pelo
meu amigo ahi em Lisboa e que em enviou como lichenes» (BN A/2054).
187
Physalospora sampaioi Gonz. Frag., Gloniella sampaioi Gonz. Frag., Sampaioa Gonz. Frag., Sampaioa pinastri Gonz.
Frag., Discosia sampaioi Gonz. Frag., Comesia sampaioi Gonz. Frag., Nectria sampaioi Gonz. Frag., Phyllosticta
sampaioana Gonz. Frag., Rhabdospora sampaioi Gonz. Frag. e Fusarium sampaioi Gonz. Frag..
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
161
diversas cartas transparece o micologista apaixonado e zeloso que era R. G. Fragoso. Numa carta
dirigida a G. Sampaio datada de 7 de Janeiro de 1923, R. G. Fragoso desabafava «Yo acabo de recibir
del Departamento de Agricultura de los Estados-Unidos 900 especies de hongos parasitas,
exclusivamente Uredales y Ustilaginales, y tengo que prepararles una remesa analoga, lo cual
concluye me deborder de travail, como dicen los franceses».
G. Sampaio, muito provavelmente por iniciativa própria, pede então a diversos dos seus colegas
botânicos portugueses, que enviem fungos parasitas para o seu colega espanhol. G. Sampaio terá
perguntado a R. G. Fragoso se lhe interessava este intercâmbio, dado que em carta datada de 14 de
Novembro de 1922, R. G. Fragoso escreve para o seu colega português que «Con mucho gusto recibiré
los nuevos hongos que me remite y cuantos me envie el Dr. Ruy Palhinha». R. T. Palhinha terá enviado
exemplares para R. G. Fragoso e este terá retribuído com plantas, como se pode ler numa carta datada
de 30 de Janeiro de 1923 de R. G. Fragoso para Sampaio, «Hoy mismo remeto al Dr. Ruy Palhinha dos
paquetes postales conteniendo unas 470 fanerogamas que ha escogido y etiquetado muy bien el Sr.
Carlos Vicioso». Numa carta datada de 15 de Novembro de 1922, C. L. Pereira escrevia para G.
Sampaio que «Vão ainda algumas plantas parasitadas», o que sugere que este colega botânico
minhoto também iria participar no envio de fungos parasitas para R. G. Fragoso. Também J. Henriques
contacta com R. G. Fragoso. Em bilhete-postal com a data de 28 de Novembro de 1922, dirigido para
G. Sampaio, J. Henriques escrevia que «Escrevi ao Sr. Fragoso e recebi dele uma publicação sobre os
fungos do [...] Vou mandar-lhe a publicação feita no Boletim». J. Henriques, sempre preocupadíssimo
com o Boletim de Sociedade Broteriana que dirigia, vê em R. G. Fragoso um potencial novo
colaborador e escreve para G. Sampaio em bilhete-postal datado de 6 de Março de 1923, «Li com
satisfação a noticia sobre os fungos determinados pelo seu amigo. Não serviriam para o Boletim as
espécies novas?». Tal desiderato iria concretizar-se e R. G. Fragoso publicaria um trabalho no Boletim.
J. Henriques escrevia para G. Sampaio a 1 de Abril de 1924, eternamente preocupado com as despesas
da publicação do Boletim, «As separatas do Fragoso seguirão completas por estes dias. Mal sabe os
desgostos que isto me causa. O catalogo dos fungos com a estampa [...] vão passar de um conto! [...]
pois de Lisboa nada se tem recebido e nada se receberá decente».
Da colaboração entre G. Sampaio e R. G. Fragoso nascerá uma admiração e amizade mútuas,
que transparecem por exemplo em nomes de espécies novas para a ciência que um e outro criam e
dedicam ao seu colega e amigo. Numa carta dirigida a G. Sampaio datada de 16 de Março de 1923, R.
G. Fragoso escrevia «Gracias también por su bondadosa dedicatoria del Chiadecton Fragosoi, que
estimo en mucho, y que no sé como agradecerle».
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
162
XII. Gonçalo Sampaio e a nomenclatura botânica
1. A nomenclatura botânica no fim do século XIX
A nomenclatura é um dos aspectos mais importantes do trabalho do sistemata e do taxonomista.
No fim do século XIX, a inexistência de regras bem estruturadas tinha permitido a proliferação
inusitada de nomes, levando a sistemática e taxonomia vegetais a uma situação incontrolável. Perante a
iminência do caos, o Congresso Internacional de Botânica, realizado em Londres em 1866, encarregou
De Candolle de redigir um conjunto de regras. Estas regras foram aprovadas no Congresso de Paris,
realizado em 1867, mas as consequências foram desastrosas. Kuntze, na sua obra «Revisio generum
plantarum» publicada em 1891 criava 30.000 novos binómios, permitidos pelas regras aprovadas
(SAMPAIO, 1921c).
Promovido pela Associação Americana para o Avanço das Ciências, gera-se então, na América
do Norte, um movimento contra o Código de Paris. No Congresso de Rochester, realizado em 1892,
fixava-se a data de 1753 para o início da publicação válida, tanto dos géneros como das espécies. Na
Europa, em Génova, realizava-se neste mesmo ano, um Congresso de Botânica, em que se reconhecia a
prioridade dos nomes genéricos a partir de 1753, mas não impedindo que se restaurassem designações
mais antigas dadas por autores importantes como Adanson, Ludwig e Necker – estes nomes
constituiriam uma lista de excepções188 (SAMPAIO, 1921c).
Os Jardins e Museus Botânicos alemães elaboravam, para seu uso, um conjunto de regras de
nomenclatura que irão ser incorporadas no primeiro Código de Viena de 1905. No volume XIV do
Boletim da Sociedade Broteriana (1897), J. Henriques apresentava uma introdução explicativa a estas
regras e uma tradução das regras para português (HENRIQUES, 1897). Na introdução, J. Henriques
manifesta a sua opinião em relação à nomenclatura botânica. Como todos os botânicos sistematas, J.
Henriques estava preocupado com a situação de indecisão e arbítrio em que se encontrava a
nomenclatura botânica. Escrevia, «Para nós os nomes das plantas são apenas um meio para chegar a
um fim e não um fim para investigações cuja pratica se tornou uma especie de sport. Desejamos fazernos comprehender uns dos outros por meio de nomes e não queremos em vez d’isso fazer esforços
particulares e dispender o nosso tempo em traduzir commum vocabulos desconhecidos». J. Henriques
era adepto dos nomes conservados: «nos leva a ser tão conservadores quanto possivel, e, ao fazer-se
uma reforma, salvar tudo quanto fôr possivel do que anteriormente estava feito. [...] A conservação da
antiga nomenclatura tem na botanica uma significação bem mais importante do que em qualquer outro
188
Designados por nomes conservados.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
163
ramo das sciencias naturaes». Quais as regras utilizadas pelos botânicos nas instituições alemãs?
Podemos resumi-las da seguinte forma189:
A. O nome válido de um género ou espécie é o nome mais antigo, válido de acordo com as
regras – princípio da prioridade.
B. A data de início da publicação válida para nomes de géneros e espécies é a da publicação de
«Species plantarum» de Lineu.
C. Se o nome de um género não se tornar generalizado nos 50 anos posteriores à sua
publicação, este nome deixa de ser válido.
D. Quando uma espécie é transferida de género, deve conservar o seu epíteto específico e o
autor inicial figurar entre parêntesis a seguir ao nome da espécie e antes do nome do autor que
transferiu a espécie de género.
E. Os táxones novos têm de ser acompanhados de uma diagnose publicada em obra impressa.
Referências de táxones novos em etiquetas de exsicatas ou catálogos comerciais não são válidas.
No Congresso de Botânica realizado em Paris, em 1900, reconhecia-se a urgente necessidade de
aprovar um conjunto de regras para a nomenclatura botânica. Foi nomeada uma comissão
internacional, presidida por J. Briquet, com o propósito de elaborar um projecto para o código de
nomenclatura botânica. Este conjunto de normas seria apresentado ao Congresso de Viena, que se
realizava dentro de cinco anos (BRIQUET, 1907). Tal desiderato verificou-se. A comissão presidida por
J. Briquet apresenta ao Congresso de Botânica de 1905 um «Texte synoptique des documents destinés
à servir de base aux débats du Congrès international de Nomenclature botanique de Vienne 1905»
(BRIQUET, 1907). Discutidas, modificadas e aprovadas em Viena, constituíram o primeiro Código
Internacional de Nomenclatura Botânica.
2. O Congresso de Viena de 1905 e a nomenclatura botânica
O Congresso de Botânica realizado em Viena, em 1905, marca uma etapa histórica na
nomenclatura botânica. Elaborado sob a forma de 58 artigos e diversas recomendações, o primeiro
Código era de tal forma coerente e moderno, que, apesar de diversas melhorias e aperfeiçoamentos
posteriores, ainda permanece hoje como o esqueleto do Código Internacional de Nomenclatura
Botânica contemporâneo.
189
Apresentamos as regras de nomenclatura dos Códigos antigos numa linguagem actual. Ver CAMP ET AL. (1947) e
LAWRENCE (1973) para um historial dos Códigos de Nomenclatura Botânica. Pode-se afirmar que estas regras eram
modernas e com excepção da regra C serão todas incorporadas no Código de Viena de 1905 e permanecerão nos Códigos
posteriores e até no actualmente em vigor.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
164
Quais as principais normas estabelecidas pelo Código de Viena? Podemos resumi-las da
seguinte forma:
A. Cada taxon só pode ter um nome válido. Este é o nome mais antigo, válido de acordo com as
regras – princípio da prioridade (artigo 15.º).
B. A data de início da publicação válida para todos os táxones é a da 1.a edição da «Species
plantarum» de Lineu – 1753. Para os géneros referidos nesta obra, são válidas as descrições posteriores
apresentadas na 5.a edição de «Genera plantarum» de Lineu publicada em 1754 (artigo 19.º).
C. Podem existir excepções à aplicação estrita do Código - nomes conservados (artigo 20.º). Por
exemplo, nomes que não têm prioridade, mas que estão tão enraizadas no uso botânico que a sua
supressão poderia causar perturbações e inconvenientes.
D. Todos os nomes de táxones novos têm de ser publicados em obras impressas. Comunicações
orais, nomes colocados em colecções (exsicatas por exemplo) ou em jardins, não constituem
publicação válida (artigos 35.º e 37.º).
E. A partir de 1 de Janeiro de 1908, nomes de táxones novos só serão válidos quando
acompanhados de uma descrição (diagnose) em latim (artigo 36.º).
F. Em publicações anteriores a 1 de Janeiro de 1908, estampas com legenda podem substituir a
diagnose latina (artigo 37.º).
G. No entanto, se se tratar de uma combinação nova, com a categoria de espécie ou inferior
(uma espécie transferida de género, uma espécie convertida em variedade ou vice-versa, por exemplo),
é considerada validamente publicada se se referenciar com precisão a uma descrição anterior. A
simples indicação de um nome anterior não é suficiente (artigo 37.°).
H. As principais categorias infra-específicas são (por ordem decrescente de hierarquia): subespécie, variedade, sub-variedade, forma e sub-forma. Podem ser criadas categorias intercalares «com a
condição de não provocar confusão ou erro» (artigo 12.°).
I. A data de um nome de taxon novo é a da sua publicação efectiva, que se encontra inscrita na
obra (artigo 39.°).
J. O nome de qualquer taxon deve ser acompanhado do respectivo autor (artigo 40.º).
L. Quando se subdivide um género ou uma espécie, um dos novos táxones deve manter o nome
original (artigos 45.º e 47.º).
M. Quando uma espécie é transferida de género, o epíteto específico original tem de ser
mantido, excepto se no novo género já existir esse epíteto (artigos 48.º e 53.º).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
165
N. O nome de um taxon não pode ser rejeitado «sob o pretexto de ter sido mal escolhido, de não
ser agradavel, de que outro é melhor, ou mais conhecido, [...] nem por outro motivo contestavel ou de
pouco valor» (artigo 50.°).
O. Um nome de um taxon deve ser rejeitado, nomeadamente, quando esse nome já tiver sido
validamente utilizado anteriormente, quando o taxon «comprehender elementos completamente
incoherentes ou que possa ser origem permanente de confusão ou de erros», ou quando não obedecer às
regras do Código (artigo 51.°).
P. O nome rejeitado tem de ser substituído pelo válido mais antigo, respeitante ao mesmo taxon
(artigo 56.°).
Q. As regras só podem ser modificadas em Congresso Internacional de Botânica (artigo 58.º).
J. Henriques esteve presente no Congresso de Viena, traduz o Código e publica a versão
portuguesa do Código, no Boletim da Sociedade Broteriana de 1907 (volume XXIII). G. Sampaio
certamente que estudou o Código de Viena e terá escrito a J. Henriques emitindo a sua opinião. Pela
carta de J. Henriques de 11 de Dezembro de 1908 dirigida a G. Sampaio, podemos já antever as
discordâncias de G. Sampaio em relação ao Código de Viena, que ficariam cristalizadas nas suas
listagens do Herbário da Academia e da Faculdade. Nesta carta datada de 11 de Dezembro de 1908, J.
Henriques começa por defender a qualidade deste Congresso e concomitantemente do seu Código,
escrevendo que «Foi este congresso preparado com muita antecedência e com maximo cuidado, sendo
o projecto do codigo visto por uma comissão internacional. Ao congresso assistiram as sumidades
botânicas de toda a Europa e America. [...] é bem melhor que os vogais das juntas de parochia». De
seguida foca o problema da obrigatoriedade da diagnose em latim nos nomes novos criados a partir de
1 de Janeiro de 1908, regra que portanto já estava em vigor e de que G. Sampaio discordaria. J.
Henriques escreve que «A indicação dada no art. 36 é razoavel. A descripção é indispensavel. Não
posso concordar com o meu amigo? [...] Que ella seja escripta em qualquer lingua pode admittir-se.
[...] mas o nome da espécie só com o nome do autor e nada mais, não pode ser. Como poderá ser essa
espécie conhecida por quem não visse a planta sobre a qual o botanico fundou a espécie? Com
relação ao latim poderia citar-lhe o que escreveu o grande botanico Aff. De Candolle. A lingua latina
é [...] de facil compreensão. Todos os naturalistas o entendem. Descriptas as espécies em latim seriam
entendidas por todos. [...] A grande maioria dos botânicos fazem as diagnoses em latim, e completam
ou ampliam na lingua que falam, como há-de ter visto». J. Henriques termina o raciocínio, escrevendo,
acertadamente, «Vê pois que aquela determinação não é rabulica e muito menos picuinhas, é um
principio já anteriormente seguido», e sabendo que G. Sampaio não concordava com todas as regras e
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
166
algumas não as cumpria, diz taxativamente, recorrendo à sua senioridade que «No seu herbário há
alguns nomes que deveriam ser substituidos».
3. G. Sampaio e a nomenclatura botânica
G. Sampaio discordava de algumas das regras do Código de Viena. A sua discordância aparece
formalizada e aplicada pela primeira vez na sua obra monumental «Lista das espécies representadas no
Herbário Portugês» publicada em 1913 e seus três apêndices, publicados no ano seguinte (SAMPAIO,
1913b, 1914a, 1914b, 1914c). Trata-se de uma listagem de todas as espécies de plantas vasculares na
altura existentes no Herbário da Faculdade de Ciências, com os nomes de acordo com as suas regras de
nomenclatura190.
Que regras discordantes apresentava G. Sampaio?191
A. Para os nomes de géneros, restringir o princípio da prioridade a nomes que tenham sido
usados na criação de binómios. Um nome de um género só se torna válido quando for utilizado na
190
Existe um caderno manuscrito de G. Sampaio que sugere que a elaboração destes trabalhos publicados em 1913-1914
teria começado em 1910. Este caderno manuscrito tem escrito na capa: «Rivisão dos géneros da Flora portugueza por
Gonçalo Sampaio, Porto, Setembro 1910». Na contra-capa, o seguinte texto: «Nota – Este livro é um simples borrão, onde
são lançadas diversas notas não ordenadas e sem redacção de carácter definitivo». Nas primeiras páginas estão escritas as
«Regras da nomenclatura dos géneros seguidas n’esta revisão». As regras enunciadas em seguida são as que adoptaria nas
«Listas das espécies». Muitas páginas estão em branco, outras estão preenchidas. Em cada página, G. Sampaio discute dois
géneros. Existem muitas rasuras. A tinta e a caligrafia variam ao longo do manuscrito. É assim provável que este tenha sido
um caderno de apontamentos e rascunhos para a elaboração das «Listas das espécies».
191
Quando G. Sampaio volta a propor alterações ao Código, no Congresso do Porto de 1921, irá insistir na primeira e
quarta destas regras. O carácter moderador e clarificador da primeira destas regras é incontestável. A aplicação da primeira
e quarta destas regras contribuiriam, sem dúvida, para uma maior coerência interna e carácter orgânico do código. No
entanto não foram incorporadas no Código de nomenclatura botânico oficial. Em diversas cartas dirigidas a A. Ricardo
Jorge, G. Sampaio exprimiu a intenção de também aplicar nos líquenes as suas regras pessoais de nomenclatura. Numa carta
datada de 23 de Agosto de 1918, escrevia: «Depois que vim de Coimbra não peguei mais em liquenes e apenas tratei, em
junho, da sua nomenclatura, que tenho quasi toda revista, de harmonia com as minhas regras» (BN A/2027). Alguns
meses depois, numa carta com data de 12 de Dezembro, escrevia: Estou na disposição de publicar a “Lista do Herbario
portugues” II “Lichenes” com a inumeração do que aqui tenho classificado. Era bom, portanto que o meu amigo
publicasse primeiro as suas descobertas para eu inumeral’as também. Porque não publica já um trabalhinho com o titulo
Lichenes novos ou raros de Portugal ou coisa semelhante? Creio que era interessante» (BN A/1989).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
167
formação de um binómio específico, em data posterior a 1753192. No entanto, o autor original do nome
do género deve manter-se193.
B. Tornar válidos sinónimos, quando o nome correcto, por qualquer motivo, deixar de ser
válido.
C. Admitir como válidos nomes criados sem diagnose («nomem nudum»), desde que «haja a
certeza do grupo a que se refere e realize as outras condições exigidas». Para G. Sampaio, sobre um
nomem nudum «ha por vezes muito maior segurança que sôbre o de muitos outros que apareceram
acompanhados de diagnoses imperfeitas».
D. Não aceitar excepções às regras, como os nomes conservados.
Quais as reacções dos seus colegas botânicos a estas regras de nomenclatura originais? B.
Merino numa carta dirigida a G. Sampaio datada de 23 de Março de 1914, em papel timbrado do
«Colegio del Apostol Santiago», La Guardia, reconhecia a importância desta tarefa acometida por G.
Sampaio, escrevendo que «Ante todo le doy mil y mil gracias por el donativo del Herbario Portugués
que supone una copiosa Biblioteca y un trabajo ímprobo para compulsar las fechas de las especies
primeramente binomiadas. Ha tenido V. un arranque de valor al acometer V. tal empresa de reforma
que pocos se atreven á llevar á término, a pesar de todos los Congresos. Yo quise hacer algo en
algunos generos como el Clinopodium pero desistí luego por resultar una innovación radical y por no
disponer de suficientes medios de consulta. Le doy, pues, mi mas calurosa en hora buena, y ojala tenga
V. muchos imitadores entre los botanicos presentes y futuros».
Estas listagens tinham também o grande mérito de restabelecer alguns binómios criados por
Brotero, Link e Hoffmansegg, que tinham prioridade e eram válidos, mas que tinham entrado no
esquecimento pela publicação, por outros botânicos, de nomes novos (mas que afinal eram sinónimos
192
As normas utilizadas pelos botânicos nas instituições alemãs também previam excepções para os nomes de géneros. No
caderno manuscrito de 1910 que referimos em nota anterior («Rivisão dos géneros»), esta regra aparece formalizada da
seguinte forma: «Em botanica, só são validos os nomes genericos depois de empregados em nome binario especifico a
partir de 1753, isto é, da época em que foi publicado o Species plantarum de Lineu (1.a edição)». «Em nomenclatura
binária, um nome genérico só é considerado como válido desde que tenha entrado na formação de um binome específico
em data não anterior á publicação da 1.a edição do Species plantarum de Lineu (1753). Ex. Alisma Dill. [1735] só se
tornou valido para nomenclatura binária em 1753, com Lineu que o binomizou [com a criação de A. plantago e A.
ranunculoides, nomeadamente]». Portanto, para G. Sampaio, os nomes de géneros em que não se definem espécies não são
válidos.
193
No caderno manuscrito de 1910 que referimos em nota anterior («Rivisão dos géneros»), esta regra aparece formalizada
da seguinte forma: «Mas a propriedade dos nomes conserva-se até Rivinius». Pela aplicação desta regra, nas «Listas das
espécies», G. Sampaio irá conferir a autoria de Rivinius a géneros como o Arum e a autoria de Tournefort nomeadamente a
Polypodium, Adiantum, Osmunda, Ophioglossum, Equisetum e Taxus. O género Alisma citado em nota anterior tem a
autoria de Dillenius. No míni-código de nomenclatura de 1921, G. Sampaio irá manter este princípio, mas alterar a sua
formalização escrita.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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de acordo com as regras do Código de Viena). A. Thellung194, num bilhete-postal dirigido para G.
Sampaio, endereçado de Zurique, com a data de 7 de Outubro de 1913, começava por reconhecer a
qualidade do trabalho, mas não concordar com as quatro regras nomenclaturais discordantes
enunciadas por G. Sampaio, «Après avoir étudié de plus près votre important travail «Lista das
espécies representadas no Herbário Portugués», je vois que vous avez élaboré la nomenclature des
espèces, d’une manière régulière, fidèlement aux principes exposés dans l’avant-propos. Les
différences dans les dénominations des plantes, que existent entre vous et moi, sont donc de nature
principielle, de sorte que toute discussion devient inutile». Seguidamente, questiona concretamente
sobre uma espécie, pedindo «Auriez-vous, cher Monsieur, la grande obligeance de me dire ou Link a
publié en 1806 son Orchis sulphurea, et si ce nom a été publié, valablement d’après les règles
internationales ? Nous ne possédons ici presque point d’ouvrages sur la flore portuguaise». De facto,
G. Sampaio havia considerado, correctamente de acordo com as regras de Viena, Orchis sulphurea
Link 1806, como o nome válido, e Orchis pseudo-sambucina Ten. 1815, como sinónimo, dado que
tinha sido publicado posteriormente. Logo no dia seguinte, A. Thellung escreve um outro bilhete-postal
com mais dúvidas nomenclaturais relativas a outros dois géneros. No bilhete datado de 8 de Outubro de
1913, A. Thellung perguntava «Excusez-moi si je m’adresse encore à vous avec deux questions : 1o. Je
ne trouve nulle part la citation du Lythrum meonanthum Link que vous donnez comme nom valable
pour le L. Graefferi Ten ; auriez-vous la bonté de me la faire tenir ? 2o. l’identité du Silene laxiflora
Brot. (1804) avec le S. micropetala Lag. (1816), et celle du S. scabriflora Brot. (1804) avec le S.
hirsuta Lag. (1805) sont elles incontestables ? Vous n’ignorez pas, sans doute, que le S. laxiflora est
rapporté por Rohrbach (Monogr. Sil. [1865] p. 102), avec doute il est vrai, au S. hirsuta Lag., tandis
que le S. scabriflora Lag. est rapporte par le même auteur (p. 111) au S. pendula (d’après la planche
72 du Phytogr. Lusit.) ; il est toutefois possible que Rohrbach n’ait pas eu l’ouvrage de Brotero à la
main». Tratava-se mais uma vez de desconhecimento ou falta de acesso às obras de Link e
Hoffmansegg e também de Brotero, onde tinham sido descritas as espécies Lythrum meonanthum,
Silene laxiflora e S. scabriflora. Rohrbach era uma autoridade botânica, como podia desconhecer a
flora portuguesa? Todavia, G. Sampaio tinha razão nestas questões. Terá respondido ao seu colega
194
A troca de correspondência com A. Thellung seria descrita por G. Sampaio em carta que escreveu a A. Ricardo Jorge,
datada de 2 de Dezembro de 1918: «Estou a braços com a revisão dos autores dos binomes especificos. O meu livrinho
“Herbario portuguez” deu no gôto lá fora e provocou uma correspondência especial entre mim e varios nomenclaturistas.
A pedido d’alguns deles vou expor as minhas doutrinas num artigo em francez. Com Thellung, de Zürich, que eu creio ser o
maior nomenclaturista moderno e que é um seguidor rigoroso das regras internacionais de Vienna, tenho tido longa
correspodencia com respeito a certos nomes. Está hoje em completo acordo comigo em todos esses pontos e tem feito do
meu trabalho uma apreciação que deveras me orgulha» (BN A/2018). Todavia o artigo que G. Sampaio refere não foi
publicado, nem existe no seu espólio seu rascunho ou manuscrito.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
169
suíço explicando as suas razões, que o convenceram. Poucos dias depois, num bilhete-postal datado de
5 de Novembro de 1913, A. Thellung, escreverá «Veuillez vous agréer mes plus vifs remerciements
pour les renseignements précieux que vous avez bien voulu me donner sur les Orchis sulphurea Lk.,
Lythrum meonanthum Lk., Silene scabriflora Brot. et S. laxiflora Brot. Je partage entièrement votre
avis que Orch. sulph. et Lythr. meom. sont valablement publiés et doivent remplacer les noms
respectifs de O. pseudosambucina Ten. et L. Groefferi Ten. Quant aux deux Silene, veuillez bien
excuser les doutes que j’ai prononcées (sans aucune raison sérieuse, il faut en convenir) ; toutefois,
avant d’accepter un changement de la nomenclature admise par Rohrbach, je désirais être entièrement
rassuré !».
Pelas razões que são expostas ao longo deste trabalho, consideramos estas listas como uma das
obras mais importantes de G. Sampaio, pela sua original e inovadora contribuição às regras da
nomenclatura botânica e pelo trabalho de re-avaliação das floras de Brotero, e de Link e
Hoffmansegg195. G. Sampaio também as consideraria como peças fundamentais da sua produção
científica e que iriam marcar o resto da sua vida. Numa carta dirigida a A. Ricardo Jorge, datada de 16
de Maio de 1913, escrevia G. Sampaio: «Se demorar posso mandar-lhe para ahi ou para onde me
indicar, um trabalho que está a imprimir e que o há de interessar bastante, creio eu. Vai nêlle toda a
minha pouco sciencia, mas vai toda. Deve deitar cerca de 100 paginas e deve ficar em impresso este
mez, sem falta» (BN A/2012).
4. O Congresso do Porto de 1921 e a nomenclatura botânica
As questões da nomenclatura botânica serão retomadas por G. Sampaio alguns anos mais tarde,
no Oitavo Congresso da «Asociación Española para el Progreso de las Ciencias» (realizado
conjuntamente com o Primeiro Congresso da Associação Portuguesa para o Progresso das Ciências),
195
No espólio documental de G. Sampaio existem diversos volumes encardenados destas «Listas das espécies» anotados
por G. Sampaio. São documentos valiosos para uma compreensão aprofundada do pensamento de G. Sampaio em relação à
nomenclatura botânica. Um dos exemplares tem escrito na capa «Nomenclatura do Congresso de Viena» e na contra-capa
«Com as correcções apontadas á pena, a nomenclatura fica inteiramente de harmonia com as regras do Congresso de
Viena d’Austria. G. Sampaio». As folhas estão extensivamente anotadas. Corresponderiam às alterações que seria
necessário realizar nas listas para a nomenclatura se adaptar às regras então em vigor. Os autores pré-lineanos como
Dillenius, Micheli, Monti, Rivinus, Royen, H. B. Rupp e Tournefort, estão riscados e substituídos por Lineu. Diversos
géneros estão riscados e substituídos por outros. Outro exemplar tem escrito na capa «Géneros» e na contra-capa «Gonçalo
Sampaio, 1914, Porto». Numa das páginas em branco escreveu: «Nomes de géneros que adopto contra as leis do Congreso
de Vienna» seguida de uma lista com sete nomes. As folhas estão extensivamente anotadas. Na maioria dos nomes dos
géneros, G. Sampaio acrescentou a data da publicação a seguir ao nome do autor, como que a explicitar e justificar a
escolha do nome genérico de acordo com as suas regras. Estes seriam «cadernos» de trabalho de G. Sampaio.
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170
que decorreu no Porto de 26 de Junho a 1 de Julho de 1921196. A sessão de abertura do congresso foi
realizada no Teatro de São João, no dia 26 de Junho de 1921, tendo o discurso inaugural sido proferido
por Gomes Teixeira, Reitor honorário da Universidade do Porto. Os discursos da inauguração das
secções foram também lidos no dia 26 de Junho de 1921. Na 4.ª secção, Ciências Naturais, o discurso
inaugural foi proferido por G. Sampaio e focou precisamente a «Revisão das regras da nomenclatura
botánica» (SAMPAIO, 1921c). G. Sampaio começa por afirmar que no Congresso de Sevilha tinha sido
encarregado de estudar e propor uma revisão das regras da nomenclatura botânica então em vigor, as
aprovadas no Congresso de Viena em 1905197. De seguida salienta que as questões de nomenclatura
biológica «teem uma importância fundamental», porque «existem muitas centenas de milhar de
espécies conhecidas», e os biólogos e paleontólogos «necessitando de designar todos esses grupos,
criam naturalmente uma linguagem tão opulenta pela quantidade de nomes que, a não ser
racionalmente estabelecida e precisamente regrada – o mais metódica, o mais uniforme, o mais
mnemónica e o mais simples possível – tornar-se-ia uma babel na sciência, em vez de ser, como deve
ser, um claro meio de compreensão». Para G. Sampaio, a maior dificuldade, na época, residia na
nomenclatura dos géneros. Faz uma breve história do conceito de género. Refere a formulação pioneira
de Gesner, «são do mesmo género as plantas que teem organização floral idêntica e são de géneros
diferentes as que a teem diversa», de seguida a formulação de Tournefort, «fazendo em certos casos
intervir [...] as características dos orgãos de nutrição». Segundo G. Sampaio, Lineu adoptou a
formulação gesneriana, refundindo «grande número dos géneros de Tournefort e de Ray», mudando
«discricionariamente» as denominações de outros, «sem respeito pela prioridade, e transferiu o
196
G. Sampaio será um dos organizadores deste Congresso, que contribuirá para o seu prestígio internacional.
Naturalmente ocorreram precalços na sua organização. A estes, G. Sampaio faz menção, numa carta que escreveu a A.
Ricardo Jorge, datada de 24 de Março de 1921. Escrevia, no seu tom habitual de contundência implacável e auto-confiança:
«Imagine que há dias recebeu-se d’ahi uma espécie de oficio quasi impondo o adiamento do Congresso e assignado pelo
Celestino, pelo Palhinha, pelo Pedro da Cunha e outros! Como se fosse possivel, depois de tanto dinheiro recebido, e
gasto, e depois de fixada a data com os nossos convidados espanhois, fazer uma coisa dessas! Alegam falta de tempo para
apresentarem trabalhos e a nossa inferioridade perante os espanhois! Falta de tempo para um congresso fixado, para
junho, ha dois annos! Falta de tempo para eles, como se para os outros não fosse o mesmo tempo! Inferioridade perante os
espanhois, como se o adiamento por alguns mezes fosse capaz de nos tornar superior a elles, dado o caso que lhe sejamos
inferiores! O Congresso far-se-á e será honroso para nós, assim como para os espanhois. Se em vez de serem empatas
fossem trabalhadores, melhor fariam e mais concorreriam para fazermos boa figura. […] P. Script – Desejo ter nas salas
de Botânica, pelas paredes, os retratos de todos os que teem publicado trabalhos originais sôbre a flora portugueza.
Mande-me o seu e o mais depressa possivel. Eu desejaria ter tambem o do dr. Pereira Coutinho, mas certamente êle não o
quererá ceder, por embirrar comigo, embora a crítica que eu faça aos seus trabalhos não ser inspiradas senão pelo
interesse pela verdade scientifica. No entanto, reconheço que êle deveria figurar na galeria, como o Mariz, o dr. Júlio, etc.
Se tiver algum retrato d’ele publicado em qualquer revista mande-mo, desde que lhe pareça que isto é bem […]» (BN
A/2097).
197
G. Sampaio referiu-se à sua deslocação a Sevilha para assistir a este congresso num bilhete-postal que escreveu a A.
Ricardo Jorge, datado de 27 de Abril de 1917: «No dia 3 parto d’aqui para Sevilha, para assistir ao Congresso que abre no
dia 6» (BN A/2079).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
171
significado de muitos, creando assim uma homonimia extremamente perturbadora da claresa e da
tradição». G. Sampaio abre aqui um parêntesis para fazer um breve historial das regras da
nomenclatura botânica, terminando com as primeiras regras formais de nomenclatura botânica que
foram aprovadas no Congresso de Viena em 1905 e que estavam em vigor à data do Congresso do
Porto em 1921. Levanta então a questão de saber se as regras em vigor permitiam «obter uma
satisfatória uniformidade na nomenclatura dos vegetais». G. Sampaio formula então a sua opinião
relativa ao princípio da prioridade, concentrando-se nos nomes dos géneros. Aceita o princípio da
prioridade após 1753, mas, para G. Sampaio, o princípio da prioridade nos nomes genéricos não deve
ser absoluto. Sintetiza dizendo que se deve «aceitar como regra que os nomes genéricos não
binomizados são preteridos pelos sinónimos empregados em binomes». G. Sampaio mantinha portanto
em 1921 a sua regra discordante já exposta nas «Lista das espécies» de 1913-1914198. De seguida,
aborda, na sua conferência, o que chama a «separação da validação da autoria dos nomes» dos táxones.
Assim, por exemplo, o género Carlina foi criado por Ray, mas validado por Lineu. Para G. Sampaio,
Lineu não foi o autor do nome, mas «simplesmente validou»-o. Para G. Sampaio, Ray deveria
continuar a ser autor do género. G. Sampaio propõe que então este género seja designado por Carlina
Ray (L.)199. Chama a atenção para o facto de, apesar da genialidade de Lineu, «os géneros e as espécies
que este naturalista descreveu originariamente são em número muito reduzido». Para G. Sampaio, o
facto de muitos nomes terem a autoria de Lineu, resulta de, 1.º «ter passado á forma binária um
elevadíssimo número de designações polinómicas dos antigos», 2.º «de ter mudado arbitrariamente os
nomes de vários géneros, assim como os de muitas espécies já designadas binariamente», 3.º «de lhe
serem indevidamente atribuidos muitos nomes que êle não creou mas apenas adoptou». Na parte final
do seu discurso, G. Sampaio irá ainda fazer uma importante observação. Referindo-se às regras então
em vigor (aprovadas no Congresso de Viena em 1905), dirá que «essas regras não conseguiram ainda
impôr-se, em 16 anos, a uma consideração tal dos botânicos que possa dar esperanças de vir a ser quasi
geral; muitos são os que as não seguem, por desacôrdo com algumas das suas disposições» e, de
seguida, em tom sarcástico, «e em Portugal e Hespanha não conheço um único que as pratique, embora
alguns possam haver que delas se julguem partidários», e, a seguir, «pela minha parte já em 1913
apliquei às vasculares portuguesas uma nomenclatura que, embora pouco afastada da de Viena, é
198
G. Sampaio manterá sempre esta opinião. Em 1931 publica mesmo um trabalho (SAMPAIO, 1931a) exclusivamente
dedicado à questão da nomenclatura dos géneros, em que aplica as suas regras.
199
G. Sampaio mantinha portanto a regra das «Listas das espécies» mas «suaviza» a sua apresentação. Nas «Listas das
espécies», nos géneros pré-lineanos, G. Sampaio só tinha colocado o autor original. Agora sugeria a adição de Lineu como
«validador».
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172
todavia pautada nos casos divergentes por princípios que julgo preferíveis». Termina dizendo que ao
«actual Congresso, onde não faltam autoridade, competência e patriotismo para promover a preparação
de um Código hispano-português de nomenclatura botânica». As propostas de G. Sampaio seriam
formalizadas sob a forma de 9 artigos, a que poderemos chamar de mini-código de nomenclatura
botânica e aprovadas no dia 1 de Julho de 1921, numa reunião da subsecção de Ciências Biológicas do
Congresso (VOTO, 1922).
Que alterações ao Código de Viena eram propostas por G. Sampaio?200 As que tinha enunciado
no seu discurso de abertura. No artigo 1.° afirmava-se que a data do início da publicação válida não
podia ter excepções: «para cada tipo ou grupo taxonómico só se pode adoptar em ciencia uma única
designação (nome ou binome), a qual será sempre a primeira publicada, a partir de 1753, com as
condições de validade exigidas pelas regras». A palavra «sempre» está em itálico no texto, pretendendo
assim reforçar o seu significado. Não eram portanto admitidos os nomes conservados. No artigo 3.°
restringia-se a prioridade dos nomes dos géneros: «os nomes genéricos não se podem considerar
válidos antes de serem empregados na constituição de binomes específicos, a partir de 1753». No artigo
8.º reconhecia-se que o autor de um binome era o primeiro que o utilizava. O validador de um binome
não era necessariamente o seu autor. Lineu utilizou muitos nomes criados por botânicos que o
precederam. Para respeitar e homenagear os verdadeiros autores dos binomes, devia-se indicar, após o
binome, o autor original, seguido de Lineu entre parêntesis.
Quais as reacções dos seus colegas botânicos a estas propostas de alterações das regras
nomenclaturais? C. L. Pereira, numa carta dirigida a G. Sampaio, datada de 29 de Julho de 1921,
escreve que tinha lido «com muito prazer o discurso de V. Exa. e achei inteiramente razoaveis as
regras da nomenclatura apresentada. Felicito-o por ter conseguido descobrir um meio pelo qual os
naturalistas da peninsula se possam intender. Como vae acabar de publicar a sua excelente flora, era
muito conveniente indicar, em appendice, as correcções a fazer em virtude das regras adaptadas no
congresso. Isto era muito util, porque só com as regras adoptadas no congresso, quem não tiver uma
boa livraria fica a ver navio». J. Henriques era muito mais reservado e numa carta datada de 6 de
Agosto de 1921, sem entrar em polémica sobre o assunto propriamente dito, escrevia que «O seu
projecto de modificações das leis da nomenclatura botanica terá de ser discutido e resolvido em
200
A inexistência de nomes conservados e a quebra da prioridade dos géneros binomeados não serão incorporadas no
Código oficial. É interessante que nenhum dos artigos se referia à publicação e à diagnose. Teria G. Sampaio mudado de
opinião, ou, prevendo que seria um assunto em que encontraria um desacordo generalizado, tinha decidido não o mencionar
neste mini-código?
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
173
qualquer congresso geral. Convem que haja um codigo [...] para que todos o sigam. Já o codigo
americano forma partido. Mau será que o exemplo seja seguido».
O Código de Viena estabelecia como início da publicação válida a obra monumental de Lineu.
Mas esta era relativamente pobre em fungos. Durante anos se discutiu qual deveria ser a obra que
marcasse o início da publicação nestes outros grupos «vegetais». O Código de Nomenclatura actual
estabelece que, para as Uredinales, Ustilaginales e Gasteromycetes, é a obra de Persoon - Synopsis
Methodica Fungorum, publicada em 1801 e para os restantes fungos, o Systema Mycologicum de Fries,
publicado em 1821. R. G. Fragoso, em carta dirigida a G. Sampaio datada de 16 de Março de 1923,
focalizada em questões de nomenclatura, já manifestava a opinião sensata de que deveria ser a obra de
Persoon o ponto de partida para a publicação válida, dado ser, para este grupo de fungos, a primeira
obra de grande vulto publicada e escarnecia sobre as rivalidades entre os taxonomistas botânicos desta
forma: «Volviendo á el acento de la nomenclatura, hay en efecto algo de blague, pues los acuerdos de
los Congresos de Viena y Bruxelas no se respectan ni aun por los mismos que firmam los dictámenes,
mas que cuando los conviene. Hay una sola regla no escripta ni adoptada, pero que se sigue bien:
cada auctor da preferencia á los auctores de su pais, y arregla la prioridad para que asi resulte. En
Micologia debe partir de Persoon. Según el acuerdo de Bruxelas, pero esto es así en tanto conviene á
los alemanes que lo propusieron. Los italianos no lo aceptan, la prioridad para ellos parte de
Saccardo, para otros de Linneo, y para nosotros se deberia de partir de Brotero, Lagascas, Cavanilles,
etc., siguiendo el mal ejemplo».
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174
XIII. Gonçalo Sampaio: uma análise retrospectiva da sua obra
1. Cronologia
A obra reflecte o homem. G. Sampaio transmitiu muito dos seus métodos de trabalho,
observações e até sentimentos, ao escrever as suas publicações científicas. A vida, a docência e a
investigação de G. Sampaio encontram-se naturalmente espelhadas nas obras que publica201. Dividimos
a sua produção científica em quatro períodos, que correspondem a diferentes conteúdos e níveis de
elaboração científica e também a fases da vida do investigador portuense: 1895-1908; 1909-1915;
1916-1923; 1924-1937; e ainda obras póstumas. Neste capítulo analisaremos em pormenor a produção
científica em cada um destes períodos202.
2. 1.° Período: 1895-1908
Este período é delimitado pelo primeiro trabalho que G. Sampaio publica, em 1895 (SAMPAIO,
1895) e a «Flora Vascular de Odemira», publicada em 1908 (SAMPAIO, 1908). O primeiro trabalho é
muito particular. G. Sampaio tinha acabado de frequentar a Academia durante três anos. Dedica o
trabalho ao seu professor de Botânica, M. Amandio Gonçalves. Apesar de simples, revela uma invulgar
apetência para a taxonomia vegetal. Terá sido esta paixão precoce a responsável pelo seu abandono do
curso que frequentava na Academia?
Agrupando os trabalhos restantes pelo seu conteúdo e estilo, temos: A. Uma série de quatro
trabalhos que intitula «Estudos de flora local. Vasculares do Porto» (SAMPAIO, 1896a, 1896b, 1897a,
1897b) e uma série de seis trabalhos que intitula «Plantas novas para a Flora de Portugal» (SAMPAIO,
1899b, 1899c, 1900b, 1900c, 1903a, 1903b). B. As «Notas criticas sobre a flora portugueza»
(SAMPAIO, 1905e) e a discussão de Ranunculus gregarius Brot. (SAMPAIO, 1907). C. Diversos
trabalhos monográficos sobre alguns táxones da flora portuguesa: Primulaceae (SAMPAIO, 1899a),
Echium (SAMPAIO, 1900a), Mentha (SAMPAIO, 1901a), Spergularia (SAMPAIO, 1904d), Romulea
(SAMPAIO, 1905b), Epilobiaceae (SAMPAIO, 1905c) e Digitalis (SAMPAIO, 1905d). D. Vários trabalhos
sobre o estudo dos Rubus portugueses (SAMPAIO, 1899b, 1903a, 1903b, 1904a, 1904b, 1904c, 1904e,
1905a). E. Pequenas floras regionais: Torrão (SAMPAIO, 1901b) e Odemira (SAMPAIO, 1908). F. A
primeira listagem das espécies presentes no Herbário da Academia – Criptogâmicas (1902). Como se
podem caracterizar estas seis linhas de publicação?
201
MORAIS (1937) e PIRES DE LIMA (1942) publicaram listas bibliográficas completas das obras de G. Sampaio. Seguimos
no presente trabalho as referências bibliográficas contidas nestes dois trabalhos.
202
Este capítulo pretende ser um complemento e a todo o momento estabelecer o diálogo, com os capítulos anteriores.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
175
2A. As seis publicações da série «Plantas novas» seguem um figurino afim: análise e discussão
crítica de espécies e variedades novas da flora portuguesa. A justificação e o conceito deste tipo de
trabalho são explicitados na introdução ao primeiro trabalho, publicado em 1899: «apezar dos
numerosos trabalhos monographicos publicados nos ultimos annos sobre quasi todas as familias da
flora portugueza [...] bastantes especies e variedades [...] necessitam ainda de ser inscriptas no catologo
das plantas que constituem a nossa rica e interessante vegetação. No intuito, pois, de attenuar um pouco
este incompleto de simples inventario, aponto seguidamente algumas d’essas fórmas omissas». O seu
programa de trabalho era estudar «essas fórmas omissas, e que se encontram archivadas quer na minha
collecção particular [203], quer no hervario da Academia Polytechnica. São umas colhidas por mim em
diversas explorações feitas desde ha quatro annos [204] para cá; outras, porém, foram descobertas pelo
sr. Joaquim Tavares, empregado do Jardim Botanico do Porto, em data anterior á publicação dos
referidos trabalhos». Nas suas herborizações dos primeiros anos, E. Johnston205 era companheiro
frequente de G. Sampaio. Encontramos agradecimentos explícitos ao trabalho do colega amador. G.
Sampaio escreve no trabalho de 1899 ao referir a descoberta da Viola collina Bess.: «foi na volta de um
pequeno passeio botanico com o meu amigo Edwin Johnston que encontrei [...]».
Para a elaboração destas seis publicações não parece existir um plano prévio ordenado de
estudo da flora portuguesa. O estudo de determinados táxones deriva primariamente do material
recolhido em herborizações. Dá portanto prioridade a táxones novos ou mal conhecidos, em detrimento
do estudo sistemático, sequencial e organizado da nossa flora206. Ao estudar os exemplares recolhidos
nas herborizações, verificará que alguns pertencem mesmo a espécies ou variedades novas para a
ciência. Descreve então estes táxones novos, apresentando geralmente uma diagnose em latim. Um
deles, Teucrium Luisieri Samp.207, é dedicado a A. Luisier: «foi seu descobridor o snr. Alphonse
Luisier, do Collegio de S. Francisco de Setubal, a quem devo a amabilidade de remeter-me os
exemplares sobre os quaes estabeleci a presente diagnose»208.
203
A designação expressa da sua «collecção particular» separada do Herbário da Academia é interessante. Onde guardava
G. Sampaio o seu herbário?
204
Portanto G. Sampaio terá iniciado as suas herborizações em 1895. Terá começado a herborizar quando deixa de
frequentar a Academia?
205
Ver Capítulo III.3.
206
Ver Capítulo IX.6.
207
Em publicações posteriores (SAMPAIO, 1905e, 1921b), G. Sampaio irá considerar esta espécie como uma variedade de
Teucrium Haenseleri Bois. - Teucrium Haenseleri var. Luisieri (Samp.) Samp.
208
Este será o início de uma longa e frutuosa colaboração entre G. Sampaio e os jesuítas botânicos fundadores da revista
Broteria. Ver Capítulo VI.6.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
176
No trabalho de 1899, ao descrever várias espécies (Viola collina Bess., Lychnis diclinis Lag.),
podemos constatar que G. Sampaio as cultivava no Jardim Botânico e Experimental da Academia209. A
cultura da Viola collina Bess. era importante porque «as flores de fevereiro são estereis, odoriferas,
com as petalas de um azul lilacineo [...]; as de março, pelo contrario, são ferteis e apetalas».
2B. As «Notas criticas» é um dos trabalhos de G. Sampaio publicados em revista, de maior
fôlego e envergadura210. Trata-se de um trabalho extenso onde discute 113 espécies e variedades da
flora portuguesa. Pela quantidade de informação nele contida revela enorme esforço de trabalho de
investigação bibliográfica e de herbário. No curto trabalho sobre o Ranunculus gregarius Brot., G.
Sampaio segue o formato das «Notas criticas». Nestes trabalhos, G. Sampaio estuda e discute, em
pormenor, um conjunto de espécies e variedades da flora portuguesa, sem seguir uma ordem
determinada. No entanto, enquanto que nas «Plantas novas», G. Sampaio debruça-se exclusivamente
sobre táxones novos para a flora portuguesa, nestas «Notas criticas» vai abranger também táxones mal
conhecidos, confusos na bibliografia, incorrectamente sinonimiados.
Uma das contribuições mais importantes de G. Sampaio para o conhecimento e estudo da flora
portuguesa é a análise crítica das obras fundamentais de Brotero, Link e Hoffmansegg211. Ao estudar
em pormenor as obras clássicas destes botânicos, G. Sampaio presta um grande serviço à botânica
portuguesa, sem o qual uma parte destas obras se teria tornado inutilizável e caíria no esquecimento.
De que forma contribui G. Sampaio para uma reavaliação das obras destes botânicos?
α. Demonstrando a prioridade de várias espécies broterianas e de Link e Hoffmansegg em
relação a propostas posteriores. Para G. Sampaio, Silene scabriflora Brot. tem prioridade em relação a
Silene hirsuta Lag. e Anthoxanthum amarum Brot. tem prioridade relativamente a Antoxanthum
odoratum var. majus de Haeckel.
. Mostrando interpretações erradas de espécies broterianas por botânicos posteriores. Para G.
Sampaio, a planta designada de Saxifraga umbrosa L. por De Candolle no volume IV do seu
«Prodromus» era efectivamente a Saxifraga spathularis Brot.
209
Ver Capítulo III.6.
Este trabalho e a monografia sobre os Rubus portugueses, ambos de 1905, culminou de forma excepcional, 10 anos de
trabalho. O rigor e a maturidade científica destes trabalhos revelam que G. Sampaio evoluiu rapidamente no domínio da
taxonomia vegetal e do conhecimento da flora portuguesa. O estilo de rigor, minúcia e às vezes aspereza crítica e
contundência delineado nestas «Notas criticas» vai ser o formato típico de G. Sampaio, que utilizará nos trabalhos que
publica no período de 1924-1937.
211
Este parece ser o principal desiderato das «Notas criticas» e da «Note sur Ranunculus gregarius, Brot.» e manter-se-á
uma constante a partir daqui. Ver Capítulo IX.6.
210
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
177
. Reavaliando a posição taxonómica de táxones broterianos. G. Sampaio propõe elevar à
categoria específica Cotyledon umbilicus var. praealta Brot., designando-a de Cotyledon praealtus
(Brot.) Samp.
. Restaurando espécies broterianas. Lineu designou de Narcissus triandrus uma planta que
«possue normalmente 6 estames, 3 dos quaes são por vezes muito pequenos e pouco visiveis». Esta
espécie foi designada por Brotero de N. reflexus. Para G. Sampaio o nome lineano «não deve sustentarse porque é redundamente falso e improprio» para as características que a planta apresenta. A
designação broteriana é mais adequada à morfologia da planta, pelo que o nome lineano deve ser
substituído pela designação broteriana.
. Indicando imprecisões cometidas nestes trabalhos. Para G. Sampaio, Brotero designou como
Lythrum hyssopifolium L. uma planta que é de facto o Lythrum meonanthum Link.
Naturalmente que numa flora que se encontrava mal estudada, o seu estudo minucioso revelava
táxones novos para a ciência. Assim como nas «Plantas novas», também destas «Notas criticas»
resultaram táxones novos para a ciência, diversas espécies e variedades. Infelizmente, ao contrário do
que tinha feito nas «Plantas novas», apresenta a diagnose dos táxones novos não em latim, mas em
português212. Assim como nas «Plantas novas», vai escolher, para as espécies novas, epítetos que
homenageiam personagens que considerava relevantes para o seu trabalho e para a botânica
portuguesa: Brassica Johnstoni Samp., em homenagem a Edwin Jonhston; Conopodium Marizianum
Samp.213, em «homenagem aos grandes conhecimentos botanicos e notaveis qualidades de trabalho do
meu amigo e illustre naturalista da Universidade de Coimbra dr. Joaquim de Mariz, a quem se devem
numerosas e importantes monographias sobre a flora phanerogamica do nosso paiz»; Loeflingia
Tavaresiana Samp., dedicada «ao meu amigo P. Joaquim da Silva Tavares, professor do Collegio de S.
Fiel e distincto naturalista bem conhecido pelos seus estudos sobre as zoocecidias de Portugal»; Seseli
Peixoteanum Samp.214, em homenagem «ao meu particular amigo e illustre publicista [...] Rocha
Peixoto, distincto naturalista de mineralogia na Academia Polytechnica do Porto e auctor de
consideraveis trabalhos sobre a ethnographia do povo portuguez»; Spergularia Nobreana Samp.215, em
homenagem «ao meu particular amigo Augusto Nobre [pelo] valor scientifico d’este distincto
naturalista de zoologia na Academia Polytechnica do Porto, bem conhecido pelas numerosas
212
Apesar do actual Código de Nomenclatura considerar como validamente publicados estes táxones, o Código de Viena de
1905, na altura em vigor, exigia a publicação de uma diagnose latina e mesmo antes já esta era a prática corrente dos
taxonomistas.
213
Em SAMPAIO (1946) será considerada como Bunium flexuosum raç. Marizianum (Samp.) Samp.
214
Em SAMPAIO (1913b) será designada de Seseli granatense var. Peixoteanum (Samp.) Samp.
215
Em SAMPAIO (1909a) será considerada como Spergularia media raç. Nobreana (Samp.) Samp.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
178
publicações sobre a fauna do nosso paiz e colonias»; Veronica Carquejeana Samp.216, dedicada ao
«ex.mo sr. Bento Carqueja, illustre professor da Academia Polytechnica que muito se tem interessado a
favor do desenvolvimento dos gabinetes de Historia Natural d’este estabelecimento scientifico».
O curto trabalho sobre o Ranunculus gregarius Brot., exemplifica bem estes diferentes aspectos
da reavaliação da obra broteriana. Brotero descreve uma espécie de Ranunculus que designa de R.
gregarius Brot., uma espécie endémica da península ibérica. Autores posteriores propuseram espécies
novas como Ranunculus olysiponensis Pers., Ranunculus hollianus Rchb. e Ranunculus escurialensis
Bss. & Reut., que de acordo com G. Sampaio são variedades da espécie broteriana e portanto não são
válidas como espécies autónomas. No entanto, para G. Sampaio, Brotero ter-se-ia enganado ao
designar de Ranunculus dimorphorhizus uma planta que era o Ranunculus flabellatus Desf. G.
Sampaio restaura a espécie broteriana e transforma as espécies posteriores em variedades da espécie
broteriana.
2C. Neste período, G. Sampaio publica também estudos monográficos sobre alguns géneros e
famílias da flora portuguesa. Que método de trabalho usa G. Sampaio na abordagem destes estudos
monográficos? G. Sampaio segue o seguinte esquema metodológico sequencial:
α. Percepção de táxones da nossa flora confusos, problemáticos ou mal conhecidos.
. Herborizações e acumulação de material de herbário.
. Permuta com outros Herbários. Estudo cuidadoso e crítico da bibliografia clássica –
verificação, reavaliação e completação de táxones; consulta de floras europeias.
. Proposta de nova abordagem.
Analisemos cada uma destas etapas em pormenor.
α. A motivação de G. Sampaio para elaborar estas monografias parece ser primariamente a
detecção de táxones problemáticos da nossa flora. Não existe uma sequência encadeada de estudo. O
estudo do género Echium parece ter sido desencadeado pela observação da obra broteriana. G. Sampaio
terá reparado que Brotero, na sua Flora lusitanica, descreve um Echium como sendo a espécie lineana
E. italicum, mas, pela descrição que o naturalista coimbrão apresenta, não se tratava da espécie de
Lineu, mas de uma outra planta. G. Sampaio propõe que a planta descrita por Brotero constitua uma
nova espécie deste género que designa, em homenagem ao mestre coimbrão, Echium Broteri Samp.217.
216
Em SAMPAIO (1946) será designada como Veronica officinalis raç. Carquejiana (Samp.) Samp.
Echium Broteri será novamente objecto de discussão por G. Sampaio em trabalho que publicará em 1921 (SAMPAIO,
1921b).
217
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
179
O estudo do género Mentha é justificado por G. Sampaio desta forma: «entre os diversos generos
criticos é o genero Mentha um dos mais imperfeitamente conhecidos na flora portugueza, e o seu
estudo mereceria, sem duvida, a attenção e o cuidado de todos os nossos botanicos herborisadores. Não
só o inventario das especies cardiaes e hybridas – que são complexas e por vezes de estudo bem difficil
está ainda por acabar, mas tambem as condições do seu polymorphismo se desconhecem quasi por
inteiro».
O estudo de género Spergularia foi motivado por ser este género «um dos mais
imperfeitamente conhecidos, mantendo-se ainda uma lamentavel confusão tanto sobre a destrinça das
especies e variedades como sobre o legitimo emprego dos respectivos binomes». G. Sampaio
diagnostica a situação confusa como sendo devida à «demasiada importancia attribuida a caracteres
pouco fixos e indevidamente considerados como especificos, assim como o desprezo dos mais
permanentes e seguros», o que é de facto uma das causas mais vulgares e o que distingue o trabalho de
um bom sistemata do de um medíocre. Este esquema de trabalho, guiado pela novidade (variedades e
espécies novas) é exemplificado pelo trabalho publicado em 1905 sobre o género Digitalis. Em 1895,
encontra no Herbário da Academia, uns exemplares de Digitalis que tinham sido recolhidos em 1887
por Joaquim Tavares, jardineiro do Jardim Botânico da Academia. Reconhece que não pertenciam a
nenhuma das espécies conhecidas do género. Para obter mais exemplares «durante alguns annos
diligenciei em vão descobrir novos exemplares da planta, com o intuito de proceder sobre individuos
vivos a um exame perfeito dos seus caracteres, mas só em agosto de 1903, n’uma viagem que fiz ao
Douro e Traz-os-Montes, é que pude encontrar a planta juncto da foz do rio Tua» escreverá no trabalho
publicado em 1905. Designará esta espécie nova como Digitalis Amandiana Samp. A descoberta da
outra espécie nova descrita neste trabalho é traçada pelo autor: «Descobri esta interessante planta na
serra do Castro-Laboreiro, nos fins de junho de 1903. [...] Apenas pude colher dous exemplares
floridos, não obstante a planta ser abundante pelas bordas dos caminhos».
. Nestes estudos monográficos, G. Sampaio fará uma cuidada observação dos exemplares do
Herbário da Academia (que já existiam ou que tinha recolhido nas suas herborizações), mas também de
exemplares de outros herbários nacionais e estrangeiros. No estudo do género Spergularia, observa os
exemplares «actualmente nos herbarios da Universidade de Coimbra, da Escola Polytechnica de Lisboa
e da Academia Polytechnica do Porto». A revisão da família Epilobiaceae, baseava-se «principalmente
no exame e revisão de uma grande quantidade de exsicatas existentes nos herbarios da Academia
Polytechnica do Porto, da Universidade de Coimbra e da Escola Polytechnica de Lisboa [...] foi,
portanto, muito consideravel a collecção de exemplares facultados ao meu estudo e que me
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
180
permittiram, certamente, não só elaborar um inventario talvez completo das nossas especies, mas
tambem esboçar com uma certa nitidez a área de dispersão de cada uma d’ellas em Portugal».
Como em outros dos primeiros trabalhos, G. Sampaio foi auxiliado pelas colheitas de Joaquim
Tavares, jardineiro do Jardim Botânico da Academia, e de E. Johnston seu «amigo e distincto
botanico». Recorre também ao Jardim Botânico da Academia. No estudo das spergularias escreve:
«pelas observações demoradas a que procedi sobre as nossas diferentes fórmas, em vivo tanto nas
localidades respectivas como em experiencias culturaes».
. G. Sampaio envia exemplares para especialistas estrangeiros para obter uma opinião sobre
determinadas questões taxonómicas. No estudo do género Mentha, envia exemplares para o «ex.mo sr.
Ernesto Malinvaud, o sabio monographo do genero Mentha, a cujo estudo se consagra ha trinta annos»,
e que tinha distribuído uma exsicata de mentas francesas, «Menthae exsiccatae praesertium gallicae».
Do especialista francês recebe «uma amabilissima carta, pela qual me confirmava ser a planta, sem a
menor duvida, um hybrido [...]».
. Novamente alguns táxones novos para a ciência são associados a personagens importantes
para G. Sampaio: propõe um híbrido novo (× Mentha Marizi Samp.) que «com o maximo prazer dedico
[...] ao ex.mo sr. Dr. Joaquim de Mariz, meu amigo e sabio Naturalista da Universidade de Coimbra, em
homenagem pelos seus importantes e numerosos trabalhos sobre a flora portugueza».
2D. A monografia sobre os Rubus portugueses, publicada em 1904, era fruto de oito anos de
trabalho, como escreve G. Sampaio na introdução à obra. O trabalho de 1904 culminava a publicação
de uma série de pequenos trabalhos ou apontamentos dedicados a espécies deste género. Logo no
primeiro trabalho da primeira série «Plantas novas para a Flora de Portugal», publicado em 1899, G.
Sampaio discute alguns rubus. No primeiro e segundo trabalhos da segunda série destas «Plantas
novas», de 1902 e 1904, volta a discutir os rubus. Em 1904, na publicação «A Revista», publica três
trabalhos onde descreve várias espécies de Rubus novas para a ciência. A monografia de 1904 era a
síntese e discussão global do seu trabalho sobre este difícil género de rosáceas.
2E. Neste período publica dois trabalhos que resultam de herborizações regionais, uma no
Torrão, outra em Odemira. Os dois trabalhos são apresentados em formato similar. São listadas as
espécies recolhidas nas herborizações. Em cada espécie, indica o habitat e a abundância. Discute
aspectos taxonómicos relevantes. Em ambos os trabalhos são observadas diversas variedades e espécies
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
181
novas para Portugal. São ainda propostos alguns táxones novos para a ciência e também novas
combinações.
Na introdução ao trabalho sobre a flora do Torrão, publicado em 1901, G. Sampaio explica a
sua razão de ser e como decorreu esta herborização, sem dispensar alguns apontamentos de viagem.
Em Março de 1899, G. Sampaio visita o «Dr. Diniz Neves», seu «particular amigo», na vila do Torrão,
no Alentejo, perto de Alcáçovas. Antes da listagem das espécies observadas na herborização, G.
Sampaio descreve, na introdução, a viagem de ida, em particular o caminho que fez de diligência entre
a estação de caminho-de-ferro das Alcáçovas e a vila do Torrão, distante de 19 quilómetros. As
palavras de G. Sampaio são de puro naturalista extasiado perante a natureza, com uma viva admiração
potenciada pela explosão da Primavera nos campos alentejanos. Segue-se uma listagem de 222
espécies observadas por G. Sampaio durante esta estadia no Torrão.
É patente a preocupação com a «dignificação» e reavaliação dos táxones broterianos e
linkeanos. Muitas das espécies listadas têm binomes criados por Brotero ou por Link e Hoffmansegg.
Ao referir o Colchicum fritillatum Link., G. Sampaio chama a atenção para o facto de ser este o binome
válido. O nome de Brotero - Colchicum lusitanum, é posterior. Ao listar o Alyssum campestre subsp.
colinum Brot., G. Sampaio acrescenta que, «parece-me, não obstante as opiniões em contrario, uma boa
subespecie». Ao indicar o Raphanus silvestris Lamk., G. Sampaio concorda com Rouy e Foucaud que,
na sua flora de França, consideraram o binome lineano R. raphinastrum «vicioso por tautologia»,
sendo portanto necessária a sua substituição. Ao citar a Linaria linogrisea Hoff. & Link, G. Sampaio
faz uma pormenorizada discussão do género, referindo trabalhos do Conde Ficalho, com cujos pontos
de vista concorda e demonstrando que num trabalho do botânico francês Rouy havia «um erro
consideravel, para cuja rectificação aproveito agora o ensejo». Nesta discussão, G. Sampaio recorre às
diagnoses de Brotero, mostrando que conhecia bem as obras do botânico coimbrão.
Neste trabalho, G. Sampaio apresenta espécies novas para a flora portuguesa e algumas
variedades novas para a ciência, em que uma (Narcissus junquilla var. Henriquesii Samp.) dedica ao
«ex.mo sr. Dr. Julio Henriques, sabio lente de botanica na Universidade de Coimbra».
O trabalho sobre a flora de Odemira, de 1908, inicia com uma descrição da região, incluindo
aspectos económicos e culturais. Assim como para o seu trabalho sobre a flora do Torrão, também este
foi proporcionado por uma visita a pessoas amigas, tendo estado na região em 1893, 1899 e 1905 para
«proceder [...] a herborisações mais largas e minuciosas». São listadas 887 espécies.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
182
Propõe algumas variedades novas. Detem-se no género Spergularia, onde propõe duas espécies
novas: Spergularia colorata Samp. e Spergularia modesta Samp.218 No género Carex também propõe
uma espécie nova, Carex intacta Samp.219 Apresenta diagnoses em latim para as espécies novas.
2F. G. Sampaio irá publicar diversas listagens das espécies presentes no Herbário da Academia.
A primeira listagem é de 1902 sobre criptogâmicas. G. Sampaio foi nomeado naturalista-adjunto da
Academia em 1901. O presente trabalho é datado de Maio de 1902. Podemos assim concluir que o
inventário do herbário então existente na Politécnica terá sido uma das suas primeiras tarefas como
naturalista da Politécnica. Tal também se depreende do que escreve na introdução: «o gabinete de
Botanica da Academia Polytechnica do Porto, actualmente dirigido pelo Ex.mo Sr. Dr. M. Amandio
Gonçalves, professor da cadeira de botanica, resolveu fazer a publicação do catalogo do seu Herbario
portuguez, principiando pela enumeração das cryptogamicas». Mas da frase seguinte transparece que
G. Sampaio considerava este trabalho como preliminar, e quiçá, que gostaria de só o ter publicado mais
tarde: «na impossibilidade, porém, de apresentar por óra trabalho definitivo, organisou-se a presente
lista dispondo as plantas não pela sua criação natural, como mais tarde se fará, mas antes pelo ordem
alphabetica dos seus binomes». Termina a introdução escrevendo que algumas das espécies que fazem
parte da listagem são «desconhecidas até hoje na flora do nosso paiz ou, mesmo, na de toda a
peninsula», mostrando que tinha tido o cuidado de verificar para cada espécie a bibliografia que teria
disponível na Academia. Para cada espécie, são mencionados os exemplares existentes, com indicação
da respectiva localização e de quem o colheu.
Quais os colectores dos exemplares de criptogâmicas do Herbário da Academia? Nos fungos, a
maioria dos exemplares são de Barros e Cunha, C. Zimmermann e do próprio G. Sampaio. Nas algas,
líquenes, musgos e hepáticas, a maioria dos exemplares eram de Isaac Newton, sendo um número
reduzido de exemplares do próprio G. Sampaio. Nas pteridófitas, observa-se uma grande diversidade
de colectores, nomeadamente, J. S. Tavares, A. Möller, J. Casimiro Barbosa, J. Daveau, E. Johnston, J.
Henriques, A. X. Pereira Coutinho e do próprio G. Sampaio.
3. 2.° Período: 1909-1915
De 1909 a 1914, é publicado, em 12 fascículos, o «Manual da Flora Portugueza» (SAMPAIO,
1909-1914). Entre 1909 e 1911, é publicado, nos Anais da Academia, o «Pródromo da Flora
218
Estas duas espécies não serão incluídas em SAMPAIO (1946).
SAMPAIO (1921b) considerará esta espécie como sinónimo de Carex helodes Link. Todavia, será considerada válida em
SAMPAIO (1946).
219
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
183
Portugueza», em quatro partes (SAMPAIO, 1909a, 1909b, 1910a, 1911a). Em 1913, é publicado o
«Quadro analítico para a determinação das famílias da flora portuguesa» (SAMPAIO, 1913c). Em 1913 e
1914 são publicadas quatro listagens exaustivas das espécies de pteridófitas e espermatófitas do
Herbário da Faculdade (SAMPAIO, 1913b, 1914a, 1914b, 1914c). A publicação deste conjunto de
trabalhos visava certamente a elaboração de uma flora de Portugal220. O «Manual» é mesmo publicado
no formato de uma flora - famílias ordenadas, com chaves dicotómicas para a determinação genérica e
específica. O ímpeto de publicação era tal que no «Manual» G. Sampaio incorpora muitos táxones
novos para a ciência, sem qualquer diagnose (esta seria feita em publicações posteriores). Todavia, o
«Manual» quedaria irremediavelmente incompleto, no sentido de uma flora portuguesa, dado que
abrangeria 115 das 131 famílias representadas na nossa flora (representando 534 géneros e 1.809
espécies, de acordo com A. Pires de Lima no prefácio à edição da Flora de 1946). A última família
tratada é Plantaginaceae.
G. Sampaio publica também neste período um trabalho sobre espécies de Quercus (SAMPAIO,
1910c). Os «Estudos botanicos. Especies novas e nomes novos», publicado em 1912 (SAMPAIO,
1912a), é dedicado principalmente a publicar espécies novas que tinha considerado no «Manual», mas
que não tinham sido formalmente descritas (só tinham sido enumeradas). Em 1913, publica «Duas
plantas criticas» (SAMPAIO, 1913a). Publica ainda dois pequenos trabalhos da série «Plantas novas»
(SAMPAIO, 1910b, 1915). Nestes trabalhos e à semelhança das «Notas criticas», G. Sampaio analiza e
discute em pormenor as obras clássicas da flora portuguesa de Brotero e de Link e Hoffmansegg. No
estudo sobre espécies de Quercus, G. Sampaio considera que as espécies broterianas Quercus hybrida
Brot. e Quercus fruticosa Brot. são sinónimos de espécies lamarkianas válidas. Refere a incorrecção
cometida por Webb em 1838 ao considerar Quercus faginea Lamk. como uma forma do Quercus
lusitanica Lamk. e sua aceitação por De Candolle no seu «Prodromus Systematicus Regni Vegetabilis»
de 1864. Nos «Estudos botanicos», o escrutínio das obras dos clássicos é cerrado. Para colmatar as
falhas detectadas nestas obras, G. Sampaio proporá algumas espécies novas para a ciência. Citemos
alguns exemplos destas espécies novas que resultam de uma reavaliação das obras de Brotero, Link e
Hoffmansegg: A. Laserpitium thalictrifolium Samp. A planta tinha sido incorrectamente designada por
Brotero de Laserpitium aquilegiaefolium Jacq. Link designou-a de Ligustium trilobum, mas para G.
Sampaio o «restritivo não se pode conservar dentro do genero a que a planta realmente pertence, por
dar origem a um binome já empregado para uma espécie diversa». B. Montia lusitanica Samp. Trata-se
da planta que Brotero identificou como sendo a espécie lineana Montia fontana. C. Paradisia
220
Ver Capítulo XIV.4.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
184
lusitanica (Cout.) Samp.221 Trata-se de uma reavaliação da espécie broteriana Phalangium Liliastruum
Brot. A variedade Paradisia liliastrum var. lusitanica de A. X. Pereira Coutinho é aqui elevada à
categoria de espécie222. D. Peucedanum uliginosum (Link) Samp.223 A planta foi incorrectamente
designada por Brotero de Laserpitium peucedanoides. Link designou-a de Selinum uliginosum. Lange
em 1865 transferiu a espécie para o «genero a que realmente pertence, deu-lhe o nome de Peucedanum
lancifolium, que não deve ser mantido, em presença de direitos de prioridade do restritivo linkeano
mais antigo». Nos «Estudos botanicos. Especies novas e nomes novos», são apresentadas breves
diagnoses em latim e extensas em português.
O trabalho «Duas plantas criticas» trata da discussão de duas espécies de Plantago. A espécie
Plantago radicata Hoff. & Link tinha sido bem descrita pelos botânicos alemães na sua «Flore
Portuguaise». Em 1852, incluído na obra monumental de De Candolle, Decaisne publica uma revisão
da família das Plantagináceas. Neste trabalho, Decaisne considera a espécie dos botânicos alemães
como sendo sinónima da espécie lineana Plantago subulata, e descreve uma espécie nova deste género
– Plantago acantophylla, recolhida nos arredores de Madrid. Para G. Sampaio: Plantago radicata
Hoff. & Link não é sinónimo de Plantago subulata L.; Plantago acantophylla Dec. é sinónimo de
Plantago radicata Hoff. & Link. Como justifica a sua opinião discordante? A. G. Sampaio considera
Plantago radicata, apesar de polimorfa, uma espécie bem distinta de Plantago subulata L.: «um desses
caracteres, absolutamente fixo, consiste em que as sepalas anteriores do calix são igual e largamente
escariosas de ambos os lados, coisa que não se verifica» em Plantago subulata. Não só verifica a
diagnose lineana, como observa «numerosos exemplares de França e Italia». Conclui que Plantago
radicata Hoff. & Link e Plantago subulata L. são espécies distintas, se bem que próximas. A «espécie»
Plantago subulata de Decaisne não era a espécie de Lineu. B. Observa exemplares de P. radicata
«colhidos por diversos herborisadores modernos nos arredores de Bragança, seu logar classico»;
compara «com o máximo cuidado plantas obtidas pelo sr. Moller, em 1884» e por ele recolhidas «em
1903, nos arrabaldes desta cidade»; e ainda com «especimens [...] vindos de diferentes localidades
espanholas, inclusive Madrid, donde eram provenientes os exemplares que serviram para definir a
especie» (Plantago acantophylla). Compara-os e conclui que «são exactamente a mesma coisa», pelo
221
Em SAMPAIO (1931b) será re-nomeada como Anthericum lusitanicum (Samp.) Samp.
As palavras de G. Sampaio são de alguma irritação com o colega professor de Lisboa: «o sr. Pereira Coutinho, a quem
por carta expuz a conveniencia de rever a planta, que eu julgava uma boa especie nova, pondo á sua disposição os meus
exemplares e os da P. liliastrum do Herbario da Faculdade de Sciencias da Universidade do Porto provenientes de diversos
paizes da Europa, respondeu-me mantendo a sua primitiva opinião de a considerar uma mera variedade». Ver também neste
Capítulo 5.D.
223
Em SAMPAIO (1914a) será considerado como sinónimo de Peucedanum lancifolium Lge.
222
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
185
que «não ha que hesitar: os binomes [...] referem-se á mesma especie, devendo ser preferido o
primeiro, em vista do principio da prioridade estabelecido em nomenclatura botânica, como lei».
Plantago radicata é portanto restaurada. Plantago acantophylla deve ser considerada como sinónimo.
A variedade Plantago acanthophylla var. bracteosa tinha sido proposta por Willkomm no seu
«Prodomus» em 1870. Para G. Sampaio, esta forma algarvia «é uma endémica notabilissima, que se
deve manter como espécie autónoma», pelo que propõe erigi-la a Plantago bracteosa (Willk.) Samp.224
4. 3.° Período: 1916-1923
Este período é absorvido no estudo e publicação de trabalhos sobre a flora liquénica portuguesa
(SAMPAIO, 1916a, 1916b, 1917a, 1917b, 1917c, 1917d, 1918a, 1918b, 1920a, 1921a, 1922a, 1923a). O
período termina lapidarmente com a publicação em Março de 1923 da sua exsicata «Lichenes de
Portugal» e do trabalho sobre um novo género de líquenes, Carlosia, Samp. (SAMPAIO, 1923b).
O que terá levado G. Sampaio a dedicar-se afanosamente ao estudo dos líquenes de Portugal?225
Os líquenes portugueses tinham sido muito menos estudados que as plantas vasculares do nosso país. A
flora liquénica portuguesa (e da Península Ibérica) era muito mal conhecida. Dado que a flora ibérica é
rica em endemismos, seria muito provável que um estudo detalhado da flora liquénica de Portugal
revelasse espécies novas para a ciência. O impacto científico (em termos de novidade) seria enorme.
Parecem-nos ser estas as principais razões que terão levado G. Sampaio a bifurcar o seu trabalho de
investigação. Em 1916-1917, A. X. Pereira Coutinho publica um catálogo dos líquenes do Herbário da
Faculdade de Ciências de Lisboa, onde referencia 298 táxones (COUTINHO, 1916, 1917a). Era o mais
recente catálogo dos líquenes portugueses. O escrutínio crítico da obra do colega de Lisboa será
também uma das motivações dos estudos liquenológicos de G. Sampaio. Escrevia a A. Ricardo Jorge
numa carta datada de 3 de Janeiro de 1921: «O que é preciso é resolver-se depressa os outros pontos
obscuros do Catálogo do Pereira Coutinho [226]. Preciso de ver quanto antes os seguintes: [segue-se
uma lista de espécies] As marcadas com + são aquellas em que tenho mais interesse. Pode mandar às
quatro ou cinco de cada vez. Eu examino-as rapidamente e envio-lhas registadas para sua casa. Será
bom que também as mande registadas, para não se perderem. Agora não se demore. Examinadas
224
Em SAMPAIO (1914a) será considerada como sinónima de Plantago algarbiensis (Samp.) Samp.
Encontramos muitos elementos preciosos para a compreensão desta «fase liquénica» de G. Sampaio nas cartas que
escreve a A. Ricardo Jorge. Este facto é compreensível atendendo à colaboração muito próxima entre o médico lisboeta e o
botânico portuense no estudo dos líquenes portugueses.
226
Assim como nas publicações sobre plantas vasculares, nota-se aqui a rudeza crítica com que, a partir dos inícios da
década de 1920, G. Sampaio se refere aos trabalhos de A. X. Pereira Coutinho.
225
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
186
aquelas plantas estão esclarecidos todos os pontos obscuros dos liquenes portuguezes. Já vê que vale a
pena o sacrificio de um pouco de trabalho» (BN A/2099).
Como organiza G. Sampaio a sua investigação da flora liquénica portuguesa?227 Podemos traçar
o seu método pelos comentários que insere nos trabalhos que publica e por uma análise do seu espólio
documental. Em termos de colheita de espécimes, terá um precioso auxílio de A. Ricardo Jorge, mas
também dos botânicos jesuítas. Assim como faz em relação às plantas vasculares, G. Sampaio é
cuidadoso e rigoroso no método de trabalho. Nos seus trabalhos menciona os clássicos da literatura
liquénica e a observação de espécimes de herbários e exsicatas estrangeiros. Consulta também
exemplares do Herbário da Universidade de Coimbra colhidos por A. Möller e J. Henriques. Envia
exemplares para colegas especialistas estrangeiros e troca impressões sobre a sua identidade. G.
Sampaio apresentará a grande maioria das espécies novas de líquenes acompanhadas de uma diagnose
latina, procedimento que já adoptava, desde há alguns anos, para as vasculares.
Assim como em relação às plantas vasculares, G. Sampaio irá estudar a flora liquénica
portuguesa focalizando a sua atenção em determinadas espécies e não seguindo um estudo sistemático
por grupos ou famílias. As suas publicações seguem o seu formato preferido – análise e discussão de
50 – 100 táxones críticos da flora portuguesa. Escrevia numa carta dirigida a A. Ricardo Jorge datada
de 21 de Fevereiro de 1916: «Os liquenes novos para Portugal vou publica-los em duas ou tres series
de cerca 50 especies cada serie» (BN A/2011). Dos trabalhos de G. Sampaio sobre a flora liquénica
portuguesa resultou num número elevado de espécies (e um género) novas para a ciência228. As
espécies novas são geralmente acompanhadas de uma diagnose em latim. Como procedia em relação às
plantas vasculares, G. Sampaio irá homenagear algumas pessoas ao escolher os epítetos específicos
para as espécies novas e o nome do género novo.
Apesar da atenção focalizada nos líquenes, G. Sampaio mantém, neste período, o interesse no
estudo da flora portuguesa. Em 1919 escreve um «Epitome da Flora Portuguesa». Publica ainda uma
espécie nova para a ciência, Centaurea Luisieri (SAMPAIO, 1916c), dois trabalhos sobre as algas
clorófitas Desmidiáceas229 (SAMPAIO, 1920b, 1921d), as «Observações sobre algumas plantas»
227
As colecções liquenológicas de G. Sampaio têm sido objecto de estudos modernos aprofundados (PAZ-BERMÚDEZ, 2003;
PAZ-BERMÚDEZ & CARBALLAL, 2005; PAZ-BERMÚDEZ ET AL., 2002, 2006). O estudo dos líquenes portugueses será
continuado por Carlos das Neves Tavares, professor na Faculdade de Ciências de Lisboa. Entre 1939 e 1956 publica as
«Notes lichénologiques», em 1945 a «Contribuição para o estudo das Parmeliáceas Portuguesas» e em 1950 os «Líquenes
da Serra do Geres». Estuda ainda a flora liquénica das ilhas e de Angola e Moçambique. Como G. Sampaio, C. N. Tavares
também organizou e distribuiu uma exsicata de líquenes portugueses, «Lichens Lusitaniae Selecti exsicatti» (MELO, 1987).
228
Ver Anexo II.
229
Será seu filho, Joaquim Sampaio, quem continuará, de forma brilhante, o estudo das Desmidiáceas portuguesas. G.
Sampaio escreve, orgulhoso, sobre o trabalho de seu filho, numa carta dirigida a A. Ricardo Jorge, datada de 4 de Março de
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
187
(SAMPAIO, 1921b), e os «Apontamentos sobre a flora portuguesa» (SAMPAIO, 1922b), estes dois
portanto já perto do fim do período liquenológico.
O «Epitome da Flora Portuguesa», que permaneceu em manuscrito, é um dos texto-chave na
vida e obra de G. Sampaio. O manuscrito é constituído por páginas numeradas, de caligrafia
homogénea, sugerindo que se trata de um texto elaborado de seguida num espaço de tempo
relativamente circunscrito. Talvez pressionado pelas difíceis condições de vida que teria no cárcere230,
quiçá ecoando na sua mente o quase-completo «Manual» de alguns anos atrás, G. Sampaio lança-se na
redacção de uma flora de Portugal abreviada231. O manuscrito é dedicado a M. Amandio Gonçalves. G.
Sampaio escreve na capa a dedicatória a «meu professor de botânica na antiga Academia Politécnica
do Porto, meu protector e amigo». No prefácio, G. Sampaio escreve que este livro (que no prefácio
chama «livrinho») se destinava «para servir nos trabalhos praticos de classificação [...] nos cursos de
1921: «Meu filho Joaquim anda há dois mezes com as Desmidiáceas, passando todo o dia ao microscopio; agora vai
começar com a cultura de algas microscopicas, que deseja apresentar ao Congresso. Ele apresenta uma memoria sobre as
Desmidiáceas do Porto e tem já algumas novidades para o paiz. O rapaz vai lá, porque tem o vicio e sacrifica tudo a estar
todo o dia a trabalhar. Mas desta maneira deixou de me preparar os liquenes – o que faz muita falta» (BN A/2098). A 31
de Maio deste ano, escrevia a A. Ricardo Jorge: «O meu rapaz está realmente trabalhando bem e com extraordinario
afinco. Tem paixão, e tem geito. O trabalho que apresenta ao Congresso é bom e muito adianta o conhecimento das
Desmidiáceas portuguesas. Continuará com o estudo das algas em que deseja especilizar-se» (BN A/1988). Joaquim
António Ferreira Sampaio nasceu no Porto em 1898. Frequenta a Faculdade de Ciências do Porto. Foi colector do Gabinete
de Botânica, ingressando como naturalista do Instituto de Botânica em 1926. Estudou exaustivamente as cianobactérias e as
desmídias portuguesas (PIRES DE LIMA, 1942).
230
Ver Capítulo VII.8.
231
Todavia parte deste Epitome já poderia estar redigido ou alinhavado. A partir de 1914, em cartas que escreve a A.
Ricardo Jorge, G. Sampaio faz menção da redacção de uma flora abreviada. A 20 de Abril deste ano, escreve numa carta:
«Estou a imprimir uma Flora para os liceus e principiantes, com a nomenclatura em harmonia com […]» (BN A/2083).
Num bilhete-postal datado de Maio de 1914, escrevia: «Quanto á Flora é minha tenção não a concluir. Estou a imprimir
outra mais resumida, com diagnoses de 3 linhas e só com as raças e variedades mais salientes. É para os meus rapazes,
aquem agora obrigo a muitos trabalhos de classificação. De resto, a que imprimo actualmente já vai muito aperfeiçoada e
com a nomenclatura que adoto definitivamente. Mande-me as novidades, pois pode ser que ainda se aproveitem e possam
ser incluidas nesta flora» (BN A/2069). Numa carta datada de 17 de Junho de 1918, escrevia: «Estou agora muito ocupado
a fazer figurinhas para a próxima folha de impressão da Flora. Os liquenes repousam até ao proximo ano lectivo» (BN
A/1992). Alguns meses depois, a 20 de Outubro, escrevia: «A sua vinda ao Pôrto transtornou-me o trabalho da Flora,
fazendo-me derivar outra vez para os liquenes; no entanto, conto em voltar novamente á conclusão do livrinho dentro de
15 dias» (BN A/2029). Terá sido esta mini-flora a base do Epitome? Após a sua libertação da prisão, nas cartas que escreve
a A. Ricardo Jorge, G. Sampaio continuará a referir-se à conclusão da sua «florita». Escrevia a 3 de Outubro de 1920: «Já
estou no Porto e ocupo-me em dar os ultimos retoques na minha Florita, para a entregar á tipografia – o que espero seja
ainda antes do Natal. Tem-me dado um trabalho enorme, não calcula, mas espero que saia bastante perfeita, tanto pela
clareza das chaves e rigoroso inventário das especies, como pela nomenclatura uniforme que sigo. As dúvidas que me
ficam – e são poucas – só as poderia tirar consultando o herbario de Lisboa, que é infelizmente uma colecção
hermeticamente fechada aos que trabalham fora d’ahi coisa mesteriosa, enfim! […] Estas plantas interessam-me muito,
porque tenho duvidas sobre élas, e queria resolver essas duvidas para a minha Florita. São 38 especies, creio eu […] De
Coimbra recebi uma grande porção de boas plantas, algumas das quais eu não tinha […] Preciso com rapidez de acabar a
Flora […]» (BN A/2014). Logo no dia seguinte, escrevia em tom positivo: «As chaves ficaram muito boas, creio eu, não
podendo dar lugar a dúvidas ou a hesitações na determinação das especies. […] Com as modificações que tenho feito
ultimamente na Flora confesso que esta agora me satisfaz» (BN A/2045). Seria esta mini-flora a conclusão do Epitome?
Seria finalmente a flora (abreviada) que substituiria o «Manual» inacabado? Ou trabalharia em ambos os projectos? Quando
menciona «Flora», seria a nova flora resumida ou o Manual concluído?
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
188
botânica». G. Sampaio sublinha que se tratava de um manual escolar e não de um trabalho avançado de
sistemática, «reduzi, além disto, as chaves quasi que á maior simplicidade, indicando apenas os
caracteres diferenciais mais salientes dos diversos grupos [...] e pondo frequentemente de lado os
caracteres classicos para os substituir por outros que permitam uma mais fácil análise e uma mais
rapida determinação». No fim do prefácio, explicita mesmo como devem decorrer os trabalhos
práticos, «o professor [...] deve explicar [...] o modo simples de usar esta Flora, classificando [...] uma
planta de que haja distribuido exemplares a todos os alunos. Cada um destes, munido de uma Flora,
de uma boa lupa e de um escalpelo, vai acompanhando o professor na leitura das chaves e no exame
dos caracteres da planta, até á sua determinação final», «devendo o professôr ter o cuidado de
começar pelos vegetais de flores relativamente grandes, e de classificação pouco dificil [...] de todas
as espécies determinadas deve o aluno secar e preparar um exemplar para o seu herbario [...]».
Termina o prefácio com uma observação interessante, «Devo notar, finalmente, que este género de
trabalhos é ao princípio detestado pela maioria dos nossos estudantes, mas também posso afirmar,
com a experiência de bastantes anos, que passado algum tempo constitui um verdadeiro prazer para
todos eles». Finalmente o prefácio termina com, «Porto, Aljube, 27-5-1919». São tratadas todas as
famílias de plantas vasculares existentes em Portugal Continental. Apesar da família Asteraceae não
estar completa (faltando o tratamento de algumas dezenas de géneros na família, sendo Bellis o último
género estudado), este epitome é uma monumental realização intelectual e um grande avanço em
relação ao «Manual» (mas ver Capítulo XIV).
O trabalho sobre a Centaurea Luisieri é fruto da longa colaboração entre G. Sampaio e os
fundadores da Broteria. Planta descoberta por A. Luisier nos arredores de Salamanca e proposta por G.
Sampaio neste trabalho como uma espécie nova de Centaurea, com um epíteto em homenagem ao seu
colector. Mais uma vez, a história do trabalho é adstrita à descrição científica e na obra se revela o
investigador. Após a descrição da espécie nova, escreve: «colheu a planta nos arredores de Salamanca,
enviando-ma, o meu presado amigo e insigne briologista P.e Alfonse Luisier, em 1915. Não a
conhecendo nem encontrando nos livros à minha disposição diagnose que lhe pudesse convir, suspeitei,
desde logo, que se tratava de uma espécie não descrita; no entanto enviei um exemplar ao dr. Júlio
Henriques, sábio professor de botânica da Universidade de Coimbra, sempre disposto a auxiliar, por
todos os modos, os trabalhos de investigação scientífica. Este meu ilustre colega, a quem muito
agradeço aqui a leal boa vontade com que sempre quiz pôr à minha disposição todos os elementos de
estudo que lhe solicitei, comunicou-me passados alguns dias que, tendo comparado a planta com as
suas congéneres não só do herbário de Willkomm – propriedade do seu instituto – mas tambêm do
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
189
riquíssimo herbário geral da Universidade de Coimbra, nada encontrou com que a pudesse identificar.
Nestas condições, descrevo agora a planta como nova, dando-lhe o nome de Centaurea Luisieri, em
homenagem ao seu descobridor, a quem a fitologia portuguesa deve os mais asinalados serviços». As
dificuldades de G. Sampaio no estudo da planta seriam devidas ao Herbário da Academia não ser na
altura muito rico em espécies extra-portuguesas. O herbário de Willkomm, já na altura integrado no
Herbário da Universidade de Coimbra, dedicado à flora ibérica era uma fonte mais valiosa para o
estudo deste exemplar desconhecido. O trabalho apresenta uma diagnose em latim.
As «Observações sobre algumas plantas» de 1921, segue o seu figurino preferido - discutir
detalhadamente um conjunto de espécies (70 neste trabalho): clarificar sinonímias; precisar descrições;
rever as obras dos clássicos; propor espécies novas. São propostas algumas espécies novas para a
ciência: Brassica nostalgica Samp.232, Carex algarbiensis Samp., Evax lusitanica Samp. e Silene
duriensis (Samp.) Samp. Esta última tinha sido proposta como uma variedade de Silene Boryi, mas
agora após observação cuidada de «bons exemplares da S. Boryi, de Espanha», G. Sampaio reconheceu
que o material duriense era de facto muito diverso desta espécie, pelo que propõe a categoria
específica. As espécies novas são acompanhadas de uma breve diagnose em latim. Em português são
apresentadas as características que as separam de espécies próximas. Volta a discutir Echium Broteri
Samp. que tinha proposto em 1900 como espécie nova. A razão desta insistência prendia-se com a
sinonímia que A. X. Pereira Coutinho tinha estabelecido entre E. Broteri e E. lusitanicum Lin, a qual
não merecia o acordo de G. Sampaio. Propõe ainda algumas variedades novas para a ciência. São
também apresentadas algumas combinações novas.
5. 4.° Período: 1924-1937
Neste período, G. Sampaio irá publicar quatro trabalhos com um estilo muito semelhante e
preocupações afins: «Apontamentos sobre a Flora Portuguesa», 1922233 (SAMPAIO, 1922b), «Adições e
correcções á Flora Portuguesa» (SAMPAIO, 1931b), «Novas adições e correcções á Flora Portuguesa»
(SAMPAIO, 1935a), e «Breves notas sobre algumas plantas» (SAMPAIO, 1937). Em 1931 publica um
trabalho com relevância taxonómica, «Apontamentos sôbre alguns géneros de plantas» (SAMPAIO,
1931a). Publica ainda dois trabalhos monográficos, uma «Revisão das “Ulicíneas” portuguesas»
(SAMPAIO, 1924) e uma revisão do género Iberis (SAMPAIO, 1936b). Duas floras regionais, uma de
Caldelas (SAMPAIO, 1934) e outra de Trancoso (SAMPAIO, 1936a). Deixa ainda dois manuscritos
232
233
Em SAMPAIO (1946) será considerada como sinónima de Brassica oxyrrhina Coss.
Pela datação pertencem ao período anterior, mas pelo estilo integram-se neste período.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
190
inéditos, um datado de Março de 1937, outro sem data. Finalmente, em 1927 é publicado, em
colaboração com L. Crespí, um trabalho sobre os líquenes de Pontevedra (SAMPAIO & CRESPÍ, 1927).
Nas quatro publicações datadas de 1922b, 1931b, 1935a e 1937, que referimos, de estilo
homogéneo, G. Sampaio atinge a sua máxima elaboração e erudição no estudo da flora vascular
portuguesa. Que traços comuns encontramos nestas quatro publicações?
A. Mantem-se a preocupação com o estudo, reavaliação e promoção das obras de Brotero, Link
e Hoffmansegg. Citemos alguns exemplos. No trabalho de 1922b, G. Sampaio discute o género
Juniperus em Portugal. Demonstra por análise da diagnose original que Juniperus rufescens Link, ao
contrário do que era admitido na época, não era sinónimo de Juniperus oxycedrus L., e que era uma
espécie válida. Considera, pelo contrário, que Juniperus oxycedrus Brot. era sinónimo da espécie de
Link. Conclui da existência, no nosso país, de três espécies deste género, apresentando uma chave
dicotómica para a sua identificação. No trabalho de 1931b, G. Sampaio faz algumas correcções
nomenclaturais a variedades broterianas de Avena agraria Brot. Ao discutir o Asplenium palmatum
Lamk., refere que Brotero o terá confundido com Asplenium Hemionitis L., erro que se terá propagado
na bibliografia. Considera que diversas espécies broterianas são sinónimas de espécies já existentes:
Narcissus reflexus Brot. era efectivamente o Narcissus cernuus Salisb. e a Paeonia officinalis Brot. era
a Paeonia lusitanica Mill. Chama a atenção para o facto da espécie de Link - Scilla monophylla - ter
prioridade sobre a espécie broteriana, Scilla pumila. Refere que Brotero, em 1804, identificou
incorrectamente uma planta como sendo a Isatis lusitanica L. Esta planta seria correctamente descrita
por Link em 1806 como uma espécie nova, Isatis platiloba. Assinala a prioridade de diversos táxones
broterianos, em relação a outros posteriores. Por exemplo: Genista triacantha Brot. tem prioridade em
relação a Spartium interruptum Cav. No trabalho de 1935a, demonstra que o binome broteriano Stipa
arenaria tem prioridade sobre um outro utilizado por Link.
B. São incorporadas e reconhecidas as importantes contribuições de C. L. Pereira e J. M.
Miranda Lopes para o estudo da flora portuguesa234. Em relação ao primeiro escreverá no trabalho de
1922b: «que ao estudo da vegetação minhota vem prestando assinalados serviços». Destas
contribuições destaca-se a descoberta ou redescoberta de táxones novos para a flora portuguesa e
sobretudo a descoberta de táxones novos para a ciência. Citemos alguns exemplos. Descoberta ou
redescoberta dos seguintes táxones novos para a flora portuguesa: Potentilla rupestris L. (não era
234
Ver Capítulo IX.8-9.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
191
observada em Portugal desde a referência de Link e Hoffmansegg) (no trabalho de 1922b); Arum
maculatum L., Carex caryophyllea Lat., Paeonia officinalis L., Paeonia microcarpa Boiss. & Reut.,
Trifolium phleoides Pour., Oxalis Acetosella L., Linum narbonense L., Saxifraga carpetana Boiss. &
Reut., Lindernia pixidaria All., Euphrasia hirtella Jord. (no trabalho de 1931b); Carex caryophyllea
Lat. (correcção de localidade anteriormente indicada) (no trabalho de 1935a). Descoberta dos seguintes
táxones novos para a ciência (no trabalho de 1931b): Carex caryophyllea var. fuscata Samp.;
Anthericum Liliago var. transmontanum (Samp.) Samp.235; Gagea pratensis raç. nova Samp.236;
Odontites serotina var. Lopesiana Samp.237; Saxifraga granulata var. Lopesiana (Samp.) Samp.238.
C. São também patentes as trocas de opiniões com os colegas botânicos espanhóis, R. G.
Fragoso e C. Pau. De R. G. Fragoso escreve no trabalho de 1922b: «sábio botânico espanhol e meu
prezado amigo». Citemos alguns exemplos. G. Sampaio salienta a demonstração da seguinte sinonímia
por R. G. Fragoso: Astragalus chlorocyaneus Bois. & Reut. com Astragalus saxatilis Cav. (no trabalho
de 1922b). Deve-se a C. Pau a demonstração dos seguintes sinónimos: Trichodium salmanticum Lag.
com Agrostis pallida DC, Dianthus caespitosifolius Plan. com Dianthus laricifolius Bois. & Reut. (no
trabalho de 1922b); Ononis Picardi Bois. como sinónimo de Ononis subspicata Lag. (no trabalho de
1931b). Deve-se também a C. Pau a indicação de que a planta que tinha designado de Bivonaea
Prolongi em 1931b não pertenceria a esta espécie, mas seria uma espécie nova (no trabalho de 1935a).
D. Tornam-se patentes as discordâncias com A. X. Pereira Coutinho239. São diversas as
divergências. G. Sampaio considera como sinónimos de táxones já existentes, diversos táxones
propostos por A. X. Pereira Coutinho; considera que diversas espécies foram incorrectamente
identificadas por A. X. Pereira Coutinho e que, de facto, não fazem parte da flora portuguesa; considera
ainda que A. X. Pereira Coutinho identificou incorrectamente diversas plantas. Saliente-se no entanto
que no trabalho de 1931b, G. Sampaio assinala também algumas concordâncias com o seu colega
lisboeta.
235
Substituindo Paradisia lusitanica var. transmontana publicada em LOPES (1928).
Substituindo Gagea nova Samp.
237
Será considerado como Odontites rubra var. Lopesiana (Samp.) Samp. em SAMPAIO (1946).
238
Substituindo Saxifraga Lopesiana Samp. publicada em LOPES (1928).
239
A partir dos primeiros anos da década de 1910, emergem divergências profundas entre G. Sampaio e A. X. Pereira
Coutinho. Interrompe-se a correspondência epistolar entre os dois botânicos. Nas suas publicações, G. Sampaio discorda
frequentemente das opiniões de A. X. Pereira Coutinho. O tom é por vezes agreste. Parece-nos que este distanciamento foi
despoletado pela publicação da «Flora de Portugal» pelo botânico lisboeta em 1911. Ver também Capítulo XIII.3 e Capítulo
IX.4.
236
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
192
E. São em número elevado as alterações nomenclaturais propostas. São propostas novas
combinações e táxones novos para a ciência. São ainda reavaliados táxones anteriormente propostos,
por sinonímia de espécies já existentes. É proposta a espécie nova Scilla beirana Samp.240.
Em 1931 são publicados os «Apontamentos sôbre alguns géneros de plantas». Este trabalho tem
relevância taxonómica porque mostra que G. Sampaio, dez anos passados sobre o Congresso do Porto,
parece manter algumas das suas ideias pessoais sobre a taxonomia e nomenclaturas botânicas241. G.
Sampaio insiste na perda de prioridade para géneros que não fossem utilizados para a formação de
binomes específicos. G. Sampaio propõe assim a substituição do género Pteridium Scop. por Cincinalis
Gled. e, concomitantemente, a substituição de Pteridium aquilinum Kunh. por Cincinalis aquilina
Gled.. Também o género mais antigo Kundmania Scop. devia dar lugar ao género Brignolia Bertol.,
pela mesma razão242.
Neste período são também publicados dois trabalhos monográficos, um sobre as ulicíneas, outro
sobre o género Iberis. No primeiro faz uma revisão da família Ulicineae Rouy. Começa por descrever a
morfologia destas plantas, destacando os caracteres que têm maior valor taxonómico. Faz uma breve
referência à utilidade económica dos tojais. Seguidamente aborda a classificação da família, referindo
as contribuições dos botânicos que estudaram a nossa flora, Brotero, Welwitsch e Link e Hoffmansegg.
Para G. Sampaio, a maioria das espécies propostas por estes botânicos são válidas. G. Sampaio
considera que, pelo contrário, algumas das propostas feitas posteriormente por Webb, são de facto
sinónimos de espécies anteriores ou variedades de espécies já existentes. O juízo de G. Sampaio sobre
a obra de Webb é muito negativo, dado que «veio lançar uma perturbação deplorável, pelos seus
multíplices equívocos, no estudo destas leguminosas. Ninguém conseguiu mais entender-se com os
complicados Ulex da península, e a sua classificação foi considerada, por isso, de uma dificuldade
extrema, só capaz de ser vencida por capacidades excepcionais». Ora, para G. Sampaio «essa
classificação nada tem de particularmente custosa ou imprecisa, desde que se atenda só aos caracteres
de real valor taxinómico nestas plantas». No entanto, saliente-se que algumas das espécies propostas
por Webb são consideradas como válidas por G. Sampaio. Já no trabalho publicado em 1922, G.
240
Em SAMPAIO (1936b) será considerada como sinónimo de Scilla lusitanica L.
Ver Capítulo XII.
242
A propósito de estes dois géneros, G. Sampaio salientava a adesão de C. Pau às suas ideias escrevendo: «Foi já de
harmonía com êste modo de pensar que, em 1922, o ilustre botánico español dr. Carlos Pau substituiu o nome genérico
Kundmania pelo de Brignolia, sem dúvida mais novo, mas com prioridade em nomenclatura binária» (SAMPAIO, 1931a:48).
241
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
193
Sampaio tinha considerado uma espécie de Webb (Ulex Jussiaei Webb) como sendo sinónima de uma
espécie já existente (Ulex Galli Planch.). G. Sampaio refere que no Congresso do Porto de 1921 tinha
apresentado uma primeira abordagem desta família. Refere duas combinações novas de Stauracanthus
publicadas em trabalhos anteriores, S. genistoides (Brot.) Samp. (SAMPAIO, 1912a) e S. Boivini (Webb)
Samp. (SAMPAIO, 1914c). Neste trabalho propõe algumas variedades novas. No trabalho sobre o género
Iberis em Portugal, emerge uma das preocupações que acompanharam G. Sampaio em toda a sua
carreira de estudo da flora portuguesa – o estudo de táxones que considerava mal conhecidos ou
envoltos em confusão: «são pouco numerosas as Iberis da flora portuguesa e, no entanto, o seu
conhecimento sistemático tem andado até hoje num lamentável estado de confusão e de incerteza». As
contribuições dos botânicos espanhóis são agradecidas. Conclui pela existência na nossa flora de quatro
espécies deste género. São descritas e discutidas em pormenor as espécies e variedades. Segue o seu
estilo típico, defendendo e argumentando exaustivamente sobre as suas ideias. Reavalia (e de algumas
discorda) as obras clássicas de Brotero, Boissier, Reuter, Jordan, Willkomm. Critica as posições de J.
Mariz e A. X. Pereira Coutinho, umas vezes concordando, outras discordando. Reavalia as suas
próprias posições anteriores. Consulta material de herbário nacional (dos Herbários de Lisboa, Coimbra
e Porto) e estrangeiro (sobretudo espanhóis) e exsicatas. Propõe diversas combinações novas e uma
variedade nova para a ciência.
G. Sampaio publica também, neste período, duas floras regionais, uma de Caldelas, em 1934, e
outra de Trancoso, em 1936. Segue o esquema que tinha utilizado nas floras regionais anteriores,
indicando para cada espécie a sua abundância e habitat típico. Na introdução ao primeiro trabalho
refere que se trata da listagem das espécies encontradas «apenas [no] lugar das termas e seus
arredores». Terá frequentado as termas nestes anos? No segundo trabalho, de acordo com as suas
palavras, o trabalho de campo teria sido realizado em 1908, portanto muito antes da sua publicação.
Além das plantas que colheu nas herborizações de 1908, G. Sampaio reconhece, na introdução, que
estudou exemplares recolhidos por outros colectores, Seabra Couceiro, Manuel Ferreira, e Carlos
Lacerda, alguns dos quais se encontravam no Herbário da Universidade de Coimbra, mas que G.
Sampaio terá analisado. Destes trabalhos resultam poucas novidades nomenclaturais. Propõe a seguinte
espécie nova para a ciência: Carex Broteriana Samp.243, que faz acompanhar de um curtíssimo texto de
diagnose em latim.
A derradeira obra de G. Sampaio é uma flora manuscrita datada na capa de Março de 1937.
Trata-se de um conjunto de cadernos de folhas tipo almaço, escritas com caligrafia e tinta muito
243
Em substituição de Carex caespitosa que tinha proposto no «Manual da Flora Portugueza».
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
194
variável ao longo do trabalho. As folhas estão escritas de ambos os lados, mas a numeração de G.
Sampaio termina na folha 42. Uns cadernos de folhas estão completos e seguidos, outros incompletos.
A obra teria portanto sido escrita em várias ocasiões. Esta flora não está completa, faltando o
tratamento de um número apreciável de famílias: Orchidaceae a Celtidaceae, Phaseolaceae a
Ericacea, e Lamiaceae a Asteraceae. G. Sampaio deixou ainda um manuscrito sem data. O manuscrito
é constituído por 66 páginas numeradas, de caligrafia homogénea. Apresenta o tratamento taxonómico
de 12 famílias. Começa na família Lamiaceae e termina na família Asteraceae, género Bellis (esta
família ficou portanto incompleta). As famílias abordadas neste manuscrito não tinham sido tratadas no
«Manual da Flora Portugueza», nem se encontram no manuscrito de 1937.
6. Obras póstumas
Após a morte de G. Sampaio são publicadas duas obras fundamentais do professor portuense, a
«Flora Portuguesa» e a «Iconografia selecta da flora portuguesa» (SAMPAIO, 1949). A «Flora» de G.
Sampaio foi publicada, em 1946, sob a direcção de A. Pires de Lima244, que subscreve o prefácio da
obra. A edição foi custeada pelo Instituto de Alta Cultura. A obra apresenta diversas figuras muito úteis
na identificação dos especímenes. É apresentada como sendo a segunda edição da obra. Na realidade a
primeira edição foi a do «Manual da Flora Portugueza» publicado em 1909-1914. Uma análise do
manuscrito de G. Sampaio de 1937 e do manuscrito sem data, e do «Manual da Flora Portugueza» e
das palavras que A. Pires de Lima escreveu no prefácio da Flora, permite traçar o percurso seguido na
elaboração desta edição póstuma da flora de G. Sampaio. Assim o material base foi o manuscrito de
1937. Adicionaram-se as famílias Lamiaceae a Asteraceae (até ao género Bellis) do manuscrito sem
data e que não estavam no manuscrito de 1937. As restantes famílias foram transcritas do «Manual da
Flora Portugueza» com algumas adaptações. Esta 2.ª edição da flora de Sampaio é assim uma síntese
do Manual de 1909-1914 e de dois manuscritos posteriores não-publicados. Os géneros Calendula a
Hieracium da família Asteraceae que G. Sampaio não tratou em nenhuma obra245, terão sido
244
Américo Pires de Lima (1886-1966) era médico pela Escola Médico Cirúrgica do Porto. Entra para a Faculdade de
Ciências do Porto como 2.° assistente em 1913. Em 1919 passa a 1.° assistente, atingindo o topo da carreira docente em
1921. Foi director da Faculdade de Farmácia do Porto de 1929 a 1932, e director da Faculdade de Ciências de 1935 a 1945.
Em 1935, por jubilação de G. Sampaio, sucede-lhe na direcção do Instituto de Botânica. É jubilado em 1956 por atingir o
limite de idade. Publica trabalhos na área da medicina, da Botânica ultramarina e da história da Botânica (PIRES DE LIMA,
1942; FCP, 1969:250-259).
245
G. Sampaio terá tido, recurrentemente, algumas dificuldades em abordar a extensa família das Compostas. Numa carta
dirigida a A. Ricardo Jorge, datada de 13 de Agosto de 1917, G. Sampaio parecia querer definitivamente resolver esta
dificuldade: «Das plantas que me trouxer carregue nas Compostas quanto possa, porque é o que me falta da Flora e desejo
redigir essa parte logo que volte de ferias, de modo a estar o livrinho à venda no fim de dezembro» (BN A/2090). No ano
seguinte, em carta datada de 23 de Agosto, escrevia a A. Ricardo Jorge: «A seguir retomarei a Flora, mas os exames não
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
195
elaborados por A. Rozeira246. A ordenação do índice dos nomes específicos e da sinonímia foi também
inteiramente de A. Rozeira.
A «Iconografia» foi publicada pouco depois da Flora, em 1949, também sob o auspício do
Instituto de Alta Cultura. O prefácio é de A. Pires de Lima que explica a origem da obra. As estampas
(150) são de Sara Cabral Ferreira, que desenhou sob a orientação de G. Sampaio. Alguns desenhos
foram finalizados por Francisco de Sousa. Que espécies se encontram representadas? As que
mereceram especial atenção de G. Sampaio e que foram discutidas ao longo das suas publicações
científicas. Estão representadas muitas espécies de Brotero e de Link. Diversas espécies e variedades
do professor portuense. Naturalmente que é dado destaque aos Rubus – 30 estampas. O volume termina
com uma bibliografia pormenorizada dos autores das espécies representadas e uma lista de sinonímia
organizada por A. Rozeira.
Incluída nas «Publicações do Instituto de Botânica “Dr. Gonçalo Sampaio” da Faculdade de
Ciências da Universidade do Porto» foi publicada em 1970 uma «Miscelânea dos trabalhos sobre
líquenes» de G. Sampaio (SAMPAIO, 1970). A. Rozeira, director do Instituto e das Publicações prefacia
a obra. As obras originais de G. Sampaio são reimpressas sem qualquer correcção. É adicionado um
índice remissivo dos nomes citados por G. Sampaio nas obras incluídas nesta antologia. São incluídos
os seguintes trabalhos: SAMPAIO (1916a, 1916b, 1917a, 1917b, 1917c, 1917d, 1918a, 1918b, 1920a,
1921a, 1922a, 1923a, 1923b) e SAMPAIO & CRESPÍ (1927).
me deixaram fazer nada. Só depois destes é que consegui trabalhar nela regularmente. Estou, portanto, com as Asteraceas
a contas, já fiz a chave dos géneros – que ficou excelente – e já tratei alguns destes. Qualquer Asteracea que não possuo
será muito bem vinda, se porventura tiver novos exemplares» (BN A/2027).
246
Arnaldo Deodato da Fonseca Rozeira era nesta altura professor do 2.o grupo da 3.a secção da Faculdade de Ciências do
Porto (PIRES DE LIMA, 1942).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
196
XIV. Gonçalo Sampaio. A consagração. O drama de uma obra inacabada?
1. A criação do «Instituto de Investigações Botânicas» na Faculdade de Ciências do Porto
Pode dizer-se que o reconhecimento público da obra de G. Sampaio se inicia em 1921 com a
criação, na Faculdade de Ciências do Porto, de três Institutos de Investigação Científica, um dedicado à
Química, um dedicado à Zoologia, e outro à Botânica, sendo o seu director, G. Sampaio. O processo de
criação destes Institutos é descrito em pormenor no próprio Diário do Governo que os institucionaliza
(DG 1921 03 21). A proposta era aprovada em Conselho Escolar da Faculdade, ratificada pelo Senado
da Universidade do Porto e o Reitor, Augusto Nobre, a remetia para o Ministro da Instrução Pública,
António José de Almeida, que a aprovava a 24 de Novembro de 1920. A proposta era
pormenorizadamente justificada. No preâmbulo, elogiava-se a obra de G. Sampaio: «A carreira
scientifica [...] é comprovada pelos numerosos trabalhos de investigação scientifica original [...]
concorrendo desta forma consideravelmente para o reconhecimento da flora portuguesa. Esses
trabalhos vêm sendo publicados, sem interrupção, desde há muitos anos, em revistas scientificas [...]
que muito honram, certamente, a mentalidade portuguesa». Apresenta-se de seguida detalhadamente o
currículo de G. Sampaio. «Tem este professor exercido uma grande actividade em serviço da sciência,
contribuindo com numerosas descobertas e publicações para o estado adiantado em que, com
verdadeira honra para o país, se encontra actualmente o conhecimento da flora portuguesa».
Considerava-se então que a actividade de investigação de G. Sampaio tinha sido particularmente
relevante a três níveis: estudo de plantas vasculares; estudo de criptogâmicas; na nomenclatura
botânica. Em relação aos estudos da flora vascular portuguesa, listavam-se as espécies novas para a
ciência propostas até à data por G. Sampaio. Resumia-se da seguinte forma a sua contribuição para o
conhecimento da flora vascular portuguesa: «a sua iniciativa define-se pela publicação de numerosas
notas críticas sobre plantas portuguesas, pela correcção de classificação de muitas outras, que andavam
erroneamente determinadas, e pela descoberta de grande quantidade de variedades e de mais de cem
espécies cuja existência era ignorada na flora do país». Em relação às criptogâmicas, pode ler-se: «É
porém no estudo dos líquenes portugueses que mais se tem acentuado a sua acção, mencionando até
hoje, em várias publicações, cerca de trezentas espécies inéditas para o país, com bastantes géneros e
famílias que se desconheciam em Portugal. Entre estas plantas são completas novidades para a Sciência
as seguintes espécies do professor Sampaio». A contribuição de G. Sampaio na nomenclatura botânica
era sintetizada da seguinte forma: «Dos seus estudos de revisão e uniformização de nomenclatura,
assunto de tamanha importância [...] tem resultado não só a reposição duma elevada quantidade de
binomes válidos, que andavam desconhecidos em documentos antigos ou eram mal interpretados, mas
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
197
também a formação de muitas combinações binómicas novas, umas de harmonia com as regras
formuladas pelo moderno código de Viena, outras resultantes da aplicação de princípios novos de
nomenclatura estabelecidos originalmente por êste professor»247. De seguida segue-se uma lista dos
trabalhos publicados. A lista termina com a indicação dos trabalhos «em impressão», «em publicação»,
e «em preparação». Esta parte do currículo, contendo simplesmente cinco itens, contém informações
preciosas para a compreensão da vida e obra de G. Sampaio248. Em impressão, assinala-se a revisão das
ulicíneas (que será de facto publicada em 1924). Que obras estavam «em publicação»? O «Manual da
Flora Portugueza» e o «Epitome da Flora Portuguesa». A publicação do «Manual» tinha sido
interrompida em Dezembro de 1914249. O «Epitome» tinha sido escrito durante o seu encarceramento
em 1919. Ao considerar estas obras «em publicação», podemos concluir que G. Sampaio teria em
mente continuar a publicação do «Manual», certamente para o concluir250 e publicar o manuscrito do
247
A nossa análise crítica da bibliografia de G. Sampaio (capítulo XIII) coincide, em larga medida, com esta apreciação,
que terá sido escrita pelo próprio G. Sampaio.
248
Os detalhes destes itens por si sugeririam que o currículo tinha sido escrito por G. Sampaio. Esta asserção é confirmada
por uma carta que escreve a A. Ricardo Jorge e que sugere que terá sido o colega de Lisboa a corrigir as provas da
tipografia do Diário do Governo. A carta não se encontra datada, mas foi seguramente escrita no início de 1921: «Peço-lhe
para ir ao Nobre e dizer-lhe que eu o tinha encarregado de rever as provas do Diario no que diz respeito aos meus
trabalhos scientificos, pois é necessario que isso seja revisto por um botânico. Eu mandei para lá os apontamentos que o
Nobre me pediu muito á pressa. A lista dos meus trabalhos foi incompleta, mas isso pouco importa. […] Trata-se do
processo que cria o Instituto botanico de investigação cientifica no Porto e que vem por estes dias publicado no Diario. O
meu amigo faça-me o favor de ver as provas. Alem disso desejo que na lista das minhas especies corrija o bimone Carlosia
virescens em Carlosia rupestris Samp. que é aquele que acabo de pôr nas provas de página que agora mandei para a
tipografia» (BN A/2038).
249
A não-conclusão do Manual (e de uma Flora de Portugal) terá sido um dos factos que mais influenciaram a vida de G.
Sampaio e terá ecoado na sua mente até à morte. Numa carta datada de 9 de Janeiro de 1913, portanto ainda na fase de
publicação, G. Sampaio escrevia a A. Ricardo Jorge: «Agora vou virar-me á conclusão da Flora, a ver se vai d’esta vez. Já
estão impressas mais 5 folhas, além das que levou. Logo que conclua a impressão da 6.a folha (folha de impressão 23) vou
dar ordens para as dobrar e organizar em fasciculos. […] Com outro fasciculo concluirei a obra, se Deus quizer» (BN
A/2064). A partir de 1914, nas cartas que escreve a A. Ricardo Jorge, surge a menção à redacção de uma flora abreviada.
Terá o projecto do Manual sido pouco a pouco abandonado e G. Sampaio focalizado numa flora mais sintética? Muito mais
tarde, num bilhete-postal datado de 24 de Janeiro de 1929 dirigida a A. Ricardo Jorge, escrevia focalizado na conclusão da
sua flora de Portugal: «No proximo Domingo, 27 do corrente, vou a Coimbra, onde estarei até quarta-feira. Todas as
semanas irei ali resolver o melhor possível um certo numero de duvidas sobre a flora portuguesa. A seguir irei estar oito
dias em Lisboa. Quero empregar o ultimo esforço para produzir com a minha Flora um trabalho honesto. Depois disto
meto-me na aldeia a passar os últimos dias» (BN A/2000). No ano seguinte, a 6 de Agosto, escrevia novamente a A.
Ricardo Jorge: «Aos liquenes só voltarei depois de acabar a nova edição da Flora, em que trabalho com amor. Deus queira
que no próximo ano eu termine este trabalho, como espero! Terei de ir várias vezes a Coimbra e de fazer algumas
herborizações ainda. A revisão da nomenclatura vou-a fazendo aqui no Pôrto. Enfim, estou novamente a trabalhar com
entusiasmo nas fanerogamas, esperando realizar qualquer coisa de geito» (BN A/2066).
250
O conteúdo de algumas cartas que escreve a A. Ricardo Jorge sugere que a revisão da nomenclatura dos taxónes da flora
portuguesa, de acordo com as regras que preconizava, pode estar relacionada com a inconclusão do Manual e a não
publicação de uma Flora de Portugal. G. Sampaio escrevia a 16 de Maio de 1913: «Com o que tenho já posso fazer coisa
aceitável e, por isso, vou deitar mãos á obra de revisão da nomenclatura das vasculares portuguezas, segundo os meus
principios. Estou quasi resolvido a inutilizar toda a parte impressa da Flora e começar uma nova impressão, que irá
rápida, em harmonia com o que desejo. Deste modo sahirá uma obra bonita e da minha affeição. O que está choca-me por
ser heterogeneo e por conter coisas que agora emendaria. Não gosto de obras imperfeitas, desde que se possam fazer
melhor» (BN A/2012).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
198
«Epitome»? Que obras estavam «em preparação»? Um «Catálogo analítico dos líquenes
portugueses»251 e uma «Iconografia selecta da Flora Portuguesa»252. Todavia, nenhuma destas obras
«em publicação» ou «em preparação» seriam publicadas em vida de G. Sampaio. Também não se
concretizaria o projecto da Flora Ibérica253. Porquê? Quais as consequências da sua não publicação?
2. A fundação do «Instituto de Botânica Dr. Gonçalo Sampaio
251
Ver Capítulo X.5. Existem diversos documentos que não deixam dúvidas que G. Sampaio teve o projecto de elaborar um
catálogo ou flora de líquenes de Portugal e que efectivamente a começou. Como em relação à flora de plantas vasculares,
esta ideia de um catálogo ou flora dos líquenes portugueses parece ecoar durante muitos anos na mente de G. Sampaio. Nas
cartas que escreve a A. Ricardo Jorge, são frequentes as menções à redação deste catálogo dos líquenes portugueses. A
primeira referência que encontrámos data logo do início da sua «fase liquénica». Numa carta datada de 17 de Maio de 1917,
escrevia: «O catalogo dos liquenes só sairá para o ano, no Boletim da Sociedade Broteriana, a pedido do Julio Henriques»
(BN A/2025). Alguns meses depois, a 13 de Dezembro de 1917, escrevia: «Logo que acabe a Flora e os compendiozinhos
de botanica para os liceus, recomeçarei com os liquenes, para redigir o catalogo definitivamente. Nessa ocasião é que terei
maior interesse em ver as suas colheitas, á cata de coisas novas […] Enfim, não trate por ora de nomenclatura definitiva
porque o Zahlbruckner está muito longe de estar bem. Para o ano, se Deus quizer, […] saude, terá a nomenclatura dos
liquenes tratada creio que regularmente no meu catalogo.» (BN A/2021). Poucos dias depois, a 22 de Dezembro,
novamente o catálogo: «O meu catalogo só será publicado no Boletim da Sociedade Broteriana lá para 1919, embora em o
entregue, como penso, nos fins de 1918. Se o meu amigo começasse já a tentar a classificação dos liquenes ainda poderia,
antes do meu trabalho, publicar algumas listas das suas colheitas, em que desse as suas descobertas» (BN A/2023). No
ano seguinte, a 18 de Março de 1918, escrevia: «Com a doença que me invadiu a casa não pude redigir o artigo sôbre os
liquenes para a Broteria. Nestas condições desisto de publicar qualquer outra serie e tudo o que tenho de novo será
publicado no Catalogo geral, no Boletim da Sociedade Broteriana. Até lá nem mesmo pulbicarei mais nada sôbre liquenes.
Deste modo tambem o Catalogo será muito mais interessante, porque terá um grande numero de novidades para o paiz e
algumas para a sciencia» (BN A/2017). Numa carta datada de 16 de Abril de 1920, escrevia: «Eu vou precipitar a
redacção do Catalogo dos liquenes portugueses, porque o dr. Julio Henriques insta constantemente pelo original para o
Boletim da Sociedade Broteriana» (BN A/2089). Numa carta datada de 18 de Novembro de 1921, A. Ricardo Jorge
escrevia a G. Sampaio: «Fico radiante com a ideia da sua Flora Descriptiva mas julgue que perderá recorrendo a
estranhos. Tomára tambem ver as suas gravuras. Sobre estes e outros assuntos voltarei a escrever com mais vagar». O
projecto foi mesmo começado. L. W. Carrisso escrevia a G. Sampaio a 1 de Fevereiro de 1922: «Diz-me o Quintanilha (que
muito lhe agradece os cumprimentos, que retribue) que V. Exa. elaborou, para seu uso, uma chave para a determinação
dos liquenes portugueses. Não estará V. Exa. disposto a dar-mo-la, para ser publicada no volume em impressão do
Boletim? Ficar-lhe hiamos mais uma vez muito agradecidos pela honrosa colaboração». Efectivamente, G. Sampaio, num
bilhete-postal escrito a R. G. Fragoso e datado de 7 de Novembro de 1922, mas que não foi enviado, escrevía: «No próximo
número de “Boletim da Sociedade Broteriana” começo a publicar o “Catálogo analítico dos líquenes de Portugal”, com
chaves dicotómicas para a determinação das famílias, géneros e espécies. Já tenho redigido os géneros Cladonia,
Tubercularia, Stereocaulon, Ramalina, Usnea, Cetraria, Parmelia, Physcia, Peltigera, Lobaria e Sticta». Porquê não foi
esta missiva enviada? Porque não se concretizou este projecto? No entanto a ideia não morria no pensamento dos seus
colaboradores, talvez por ser de importância extrema. Em 1924, a 21 de Abril insistia A. Ricardo Jorge: «E as floras e o
catalogo geral dos liquenes? Que pena tenho que não apresse a sua publicação. Aproveite a quietude de Braga para lhes
dar o ultimo retoque e depois deite-as cá para fora».
252
A «Iconografia» estaria até avançada nesta data. Em carta dirigida a A. Ricardo Jorge, datada de 4 de Março de 1921, G.
Sampaio escrevia: «Como deve saber, o Nobre arranjou-me o primeiro subsídio para a publicação da Iconografia. A
desenhista está novamente a trabalhar nella com tôda a força. Para ficar mais barato resulveu-se que as estampas sejam
impressas a preto e coloridas á mão, como as do Willkomm. Mas ainda assim fica carissima, porque só a chapa custa 40
mil réis, fora papel cartolina, que é caro, e impressão. Vou tentar a coisa na Alemanha a ver se é mais barato, vindo de lá
já as estampas promptas. Um rapaz alemão vai tratar-me disso. Eu quero que dentro de dois mezes já algumas estampas
estejam executadas. O texto, começo a imprimi-lo brevemente» (BN A/2098). Este documento confirma que os desenhos
foram feitos sob a orientação de G. Sampaio. Todavia, a Iconografia só seria publicada postumamente em 1949. Porquê?
253
Ver Capítulo VIII.8.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
199
Em Março de 1935, a homenagem pública ao professor portuense cristalizava na criação de um
Instituto com o seu nome. No Diário do Governo de 8 de Março de 1935 era publicado um Decreto que
transformava o «Laboratório e Museu de Botânica da Faculdade de Ciências da Universidade do
Porto» em «Instituto de Botânica Dr. Gonçalo Sampaio» (DG 1935 03 08).
3. Drama de uma obra inacabada?
G. Sampaio morrerá em Julho de 1937, sem ter publicado nenhuma das quatro obras que em
1921 tinha planeado. G. Sampaio deixou, no seu espólio, um volume encadernado, em que escreveu na
primeira página, a tinta: «Manual da Flora portuguesa, por Gonçalo Sampaio, Novembro de 1936».
Que obras fez G. Sampaio encadernar neste volume? Por esta ordem: o «Quadro Analítico», o «Manual
da Flora portugueza», o «Quadro dichotomico para a determinação das famílias» e a «Lista das
espécies representadas no Herbário português» e seus apêndices. Com este agrupamento de obras254,
seria este o testamento científico de G. Sampaio?
Por que razão G. Sampaio não concretizou os seus planos de trabalho tão eloquentemente
discriminados em 1921? Propomos as seguintes causas explicativas principais:
A. Ao estudar a flora de Portugal, G. Sampaio não seguiu um plano metódico e sequencial. Foi
sendo absorvido pelo estudo de táxones que achava mais interessantes – os mais mal conhecidos, ou
confusos na bibliografia, ou os que eram novos para a ciência. A minúcia e o rigor com que levou a
cabo esta tarefa - o estudo moderno da flora -, consumiam muito tempo. Dificilmente seria possível
rever toda a nossa flora vascular com este detalhe.
B. Dispersão de interesses. O interregno que fez nos seus estudos da flora vascular, para se
dedicar aos líquenes, que o absorveram quase totalmente entre 1916 e 1923, agravou ainda mais o
problema anterior. Mas G. Sampaio abandona totalmente o estudo dos líquenes portugueses em 1923
para novamente se dedicar à flora vascular255. Se tivesse continuado até 1937 no estudo dos líquenes,
teria elaborado uma Flora de Líquenes de Portugal?
254
A encadernação é seguramente anterior às palavras de G. Sampaio. Teria sido feita por sua iniciativa?
Esta dispersão de interesses poderá estar associada a uma certa instabilidade psíquica-emocial. A carta que escreve a A.
Ricardo Jorge, datada de 4 de Fevereiro de 1922, apoia esta interpretação e antevê o seu abandono do estudo dos líquenes
portugueses: «Estou cheio, até á medula, de liquenes novos, cujo estudo se torna muito demorado. Mas quando acabarão
estas pragas, santo Deus! Começo a não ter paciencia. O meu amigo, se quizer continuar a minha tarefa dos liquenes, tem
ainda muito que fazer. Isto é obra muito extensa e um tanto dificil. Dei-lhe um avanço bom e se o meu amigo continuar o
255
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
200
C. G. Sampaio empreendeu uma remodelação profunda no ensino da Botânica da Academia.
Logo após a sua entrada como naturalista da Academia em 1901, G. Sampaio dá aulas, reforma e
moderniza programas. Novo impulso na modernização do ensino da Botânica é dado quando se cria a
Faculdade de Ciências do Porto e entra como professor ordinário da Faculdade.
D. G. Sampaio levou também a cabo uma renovação profundíssima do Herbário da Academia.
Herborizou intensamente. Trocou exemplares. Adquiriu exsicatas.
meu trabalho, ficará o paiz, dentro de poucos anos com o estudo dos liquenes tão adiantado como em qualquer dos que
mais bem conhecida tem a sua flora liquenologica» (BN A/2034).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
201
XV. Resumo e conclusões
1.
J. Henriques, A. X. Pereira Coutinho e G. Sampaio foram os mentores de uma revolução
na Botânica portuguesa, que ocorreu nas primeiras décadas do século XX.
2.
Nesta transformação participaram activamente outros investigadores, dos quais se
destacam:
2A. Botânicos associados aos Herbários de Coimbra, Lisboa e Porto, em particular J. Mariz, A.
Möller, J. Daveau, A. Ricardo da Cunha, E. Johnston, I. Newton, J. Casimiro Barbosa, A. Machado e
A. Ricardo Jorge.
2B. Botânicos amadores, com destaque para C. L. Pereira, J. M. Miranda Lopes, e também C.
França.
2C. Os padres jesuítas ligados à Broteria, em particular A. Luisier e J. S. Tavares.
2D. Botânicos espanhóis, em particular B. Merino, C. Pau, Fr. Sennen, Font Quer e R. Fragoso.
3.
Esta renovação profunda na Botânica portuguesa ocorreu tanto ao nível do estudo da
flora portuguesa como do ensino da Botânica. Desta transformação resultaram as primeiras floras
modernas de Portugal e um ensino da Botânica, finalmente de cariz moderno, tanto a nível universitário
como liceal.
4.
O Boletim da Sociedade Broteriana e a Broteria foram os porta-vozes da renovação da
Botânica portuguesa.
Os Herbários de Coimbra, Lisboa e Porto e também dos Colégios jesuítas, em particular do
Colégio de S. Fiel e do Colégio de Campolide foram instrumentos indispensáveis para concretizar esta
renovação.
A Sociedade Broteriana, através das distribuições de plantas aos sócios e da «Flora lusitanica
exsiccata», promoveu activamente o enriquecimento dos herbários nacionais.
5.
As mais importantes contribuições de G. Sampaio para a renovação da botânica
portuguesa centraram-se no estudo da flora portuguesa de líquenes e de plantas vasculares.
5A. No estudo da flora liquénica portuguesa destaca-se a criação de um elevado número de
táxones novos para a ciência, a elaboração e distribuição de uma exsicata de líquenes portugueses e a
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
202
elaboração de uma Flora ou Catálogo, que todavia não foi concluído, nem se encontraram os seus
manuscritos ou rascunhos.
5B. No estudo da flora vascular portuguesa destaca-se:
α. Análise e discussão crítica de táxones mal conhecidos, confusos na bibliografia ou
incorrectamente sinonimizados.
. A criação de um grande número de táxones novos para a ciência e novas combinações, em
particular no género Rubus.
. A análise crítica e reavaliação das Floras de Brotero e de Link e Hoffmansegg, em particular:
demonstrando a prioridade de várias espécies destes autores e interpretações erradas destas espécies por
botânicos posteriores; reavaliando a posição taxonómica de táxones destes autores; restaurando
espécies criadas por estes botânicos; indicando imprecisões contidas nestes trabalhos.
. A elaboração de uma Flora e de uma Iconografia de Portugal, que no entanto, deixou por
concluir e publicar.
5C. Destacam-se também as contribuições de G. Sampaio para a nomenclatura botânica,
propondo regras divergentes do Código oficial, mas de carácter moderador e clarificador incontestável,
que não terão merecido a atenção crítica que mereceriam.
5D. Salienta-se ainda a contribuição de G. Sampaio para o estudo dos fungos portugueses
realizado por R. Fragoso.
5E. Assinala-se também que G. Sampaio foi convidado pelo governo espanhol para dirigir a
elaboração de uma Flora Ibérica, que todavia não se concretizou.
6.
A importante contribuição de G. Sampaio para a fundação da Botânica moderna em
Portugal assentou no génio individual e na capacidade para estabelecer e manter activa uma teia de
contactos no país e no estrangeiro.
Desta rede de colaboradores destacam-se:
α. A. Ricardo Jorge, L. Crespí, M. Bouly de Lesdain, Zahlbruckner e A. H. Magnusson, no
estudo dos líquenes.
. N. Boulay, M. Bouly de Lesdain, W. O. Focke, A. Hayek, W. R. Linton, B. Merino, L. M.
Neuman, W. M. Rogers e H. Sudre, no estudo dos rubus.
. Os padres jesuítas associados à Broteria.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
7.
203
O rigor, a minúcia e a profundidade com que estudou a flora portuguesa, a actividade
docente, aliados a uma dispersão de objectos de estudo, terão sido, quiçá, as determinantes principais
para G. Sampaio não ter almejado as grandes realizações que planeou – a publicação de uma Flora
Vascular e de uma Flora de Líquenes de Portugal.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
Anexo I. «Lichenes de Portugal». A exsicata de G. Sampaio
204
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
205
Anexo I. «Lichenes de Portugal». A exsicata de G. Sampaio
A edição da exsicata «Lichenes de Portugal» por G. Sampaio culmina a sua excepcional carreira
no estudo dos líquenes portugueses.
Em capítulos anteriores discutimos a elaboração da exsicata – com a participação relevante de
A. Ricardo Jorge e a sua distribuição. Analisamos neste anexo o conteúdo da obra em si256.
Na tabela seguinte apresentamos uma listagem da colecção completa. Dos 300 táxones, 46 são
nomes novos de G. Sampaio (espécies e variedades novas e novas combinações). No entanto, destes,
21 não foram publicados em obra impressa257. Além destes 21, outros sete foram publicados em obra
impressa (SAMPAIO & CRESPÍ, 1927), mas sem obedecer às regras para a publicação válida. Tendo G.
Sampaio proposto, em obra impressa, 101 nomes novos (um género novo, e 100 espécies, variedades e
raças novas e novas combinações), conclui-se que a representação de táxones de G. Sampaio na sua
exsicata é significativa. A etiqueta do número 192 tem a designação de Rinodina sintrana, mas deve
tratar-se de um erro tipográfico, e deveria ser Rinodina cintrana. Existem duas etiquetas com o número
80, uma com o binome Lecanora albescens e outra com Lecanora galactina. Esta etiqueta não terá sido
usada, dado que não consta das colecções consultadas. Existem seis etiquetas em que não existe
nenhum exemplar nas colecções estudadas. Terão sido distribuídos?
Se observarmos a sequência de espécies, verificamos que existe uma ordem na exsicata. As
espécies do mesmo género estão agrupadas em sequência e que os géneros estão geralmente agrupados
em famílias. Algumas famílias muito representadas, como Lecanoraceae e Lecideaceae, estão
segmentadas em vários grupos. A organização geral é descrita por G. Sampaio numa carta que escreve
a A. Ricardo Jorge, datada de 4 de Fevereiro de 1922: «Nesta primeira serie de fasciculos desejo dar
todos ou quasi todos os liquenes foliáceos e fruticulosos, assim como os liquenes mais frequentes do
paiz» (BN A/2034).
Os 300 espécimes estão agrupados em seis fascículos de 50 ou três centúrias de 100. Todos têm
a data de Março de 1923. Através da análise documental concluímos que os primeiros 150 exemplares
estariam prontos em Março de 1923 e as duas primeiras centúrias em Abril de 1924258. Também foi
256
Para tal utilizámos os seguintes elementos: uma colecção completa de etiquetas, as colecções existentes nos herbários
das seguintes instituições: Departamento de Botânica da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto; Colégio de Nuno
Álvares; Real Jardim Botânico de Madrid.
257
Como referimos no capítulo referente à nomenclatura, tal procedimento não era admissível na época para a publicação
válida de novos táxones (mantendo-se na actualidade tal impedimento).
258
Ver Capítulo X.3.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
206
concluído que foram preparados 15-16 exemplares, mas destes não podemos apurar exactamente
quantos foram distribuídos259.
As etiquetas têm ainda a indicação do colector, data de colheita e local de colheita. Quem foram
os colectores dos espécimes? G. Sampaio: 178; Joaquim Sampaio: 43; G. Sampaio e Joaquim Sampaio:
29; Fernando Sampaio: 9; Joaquim Sampaio e M. Pinto: 2; G. Sampaio e Alberto Sampaio: 1; A.
Ricardo Jorge: 37; R. T. Palhinha: 1. A exsicata foi portanto um esforço de colheitas da família
Sampaio, particularmente de G. Sampaio, com uma contribuição importante de A. Ricardo Jorge,
conclusão a que já tínhamos chegado pela análise documental. Quando foram colhidos os espécimes?
Mais de 75% em 1920 e 1921. O mais antigo em 1916 e o mais recente em Março de 1923. Foi
Número
portanto um enorme esforço concentrado num período de tempo relativamente restrito.
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Nome do taxon(*)
Roccella fucoides Wain.
Thelotrema lepadinum Ach.
Leptotrema leiospodium A. Zahlbr.
Glyphis cicatricosa Ach.
Enterographa hutchinsiae Koerb.
Enterographa crassa Fée
Enterographa venosa Mass.
Graphis scripta Ach. (1)
Graphis elegans Ach.
Graphis dendrítica Ach.
Opegrapha varia Pers. var. notha Fr.
Opegrapha turneri Leight.
Opegrapha vulgata Ach. var. devulgata Samp. (2)
Opegrapha zonata Koerb.
Opegrapha duriaei Mont.
Melaspilea lentiginosa Müll.-Arg.
Arthonia gregaria Koerb.
Arthonia impolita Borr. var. algarbica Samp. (4) (Arthonia algarbica Samp.)
Arthonia polymorpha Ach.
Arthonia turbidula Nyl.
Arthothelium taediosum Cout.
Arthopyrenia cerasi Mass.
Porina tenuifera A. L. Sm.
Porina interseptula A. L. Sm.
Pyrenula nitida Ach.
Pyrenula nitidella Müll.-Arg.
Verrucaria maura Wahl.
Microglaena sampaiana B. de Lesd.
Endocarpon pallidum Ach.
Ver Capítulo X.2.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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Dermatocarpon miniatum Mann.
Dermatocarpon aquaticum A. Zahlbr.
Normandina pulchella Nyl.
Sphaerophorus fragilis Pers.
Cyphelium sessile Trev.
Cyphelium lecideinum Trev.
Girardia lanata Samp. (2)
Polychidium muscicolum S. Gray
Lichina pygmaea Ag.
Lichina confinis Ag.
Pyrenopsis triptococca Nyl.
Pyrenopsis anemoides Samp. (8)
Phlylliscum demangeonii Nyl.
Collema fragans Ach.
Collema multifidum Schaer.
Lethagrium multipartitum Arn.
Lethagrium aggregatum Samp. (2)
Lethagrium flaccidum S. Gray
Lethagrium nigrescens S. Gray (1)
Leptogium palmatum Mont.
Leptogium sinuatum Mass.
Leptogium caesium Wain.
Leptogium tremelloides S. Gray
Leptogium chloromelum Nyl.
Leptogium burgessi Mont.
Koerberia lusitanica Samp. (8)
Koerberia biformis Mass.
Massalongia carnosa Koerb.
Pannaria rubiginosa Del.
Parmeliella plumbea Wain. var. myriocarpa A. Zahlbr.
Crocynia lanuginosa Hue
Endocarpiscum guepini Nyl.
Gyalecta cupularis Schaer.
Gyalecta croatica Schul. & A. Zahlbr.
Pachyphiale carneola Arn.
Pachyphiale carneolutea Samp. (6)
Microphiale lutea Strn.
Aspicilia intermutans Arn.
Aspicilia gibbosa Koerb.
Aspicilia recendens Arn.
Lecanora gangaleoides Nyl.
Lecanora pallida Schaer.
Lecanora carpinea Wain.
Lecanora celestini Samp. (5)
Lecanora varia Ach.
Lecanora bracarensis B. de Lesd. & Samp.
Lecanora piniperda Koerb.
Lecanora piniperda Koerb. var. lusitanica B. de Lesd. & Samp.
Lecanora hageni Ach. for. coerulescens Flag.
Lecanora crenulata Hook.
Lecanora albescens Fr. fil. (10)
Lecanora sordida Fr. fil.
Lecanora glauco-lutescens Nyl.
Lecanora limica B. de Lesd. & Samp.
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Lecanora nitens Ach.
Psoroma lisbonense Samp. (2)
Psoroma lentigerum Koerb.
Psoroma crassum Ach.
Ochrolechia parella Arn.
Ochrolechia subtartarea Samp. (2)
Ochrolechia tartarea Koerb.
Lecidea macrocarpa Fr. fil.
Lecidea albocaerulescens Ach.
Lecidea platycarpoides Bagl.
Lecidea lithophila Ach. var. cyanea Arn.
Lecidea fuscocinerea Nyl.
Lecidea fuscoatra Ach.
Lecidea portuensis Nyl.
Lecidea myriocarpoides Nyl.
Lecidea enteroleuca Ach.
Lecidea exigua Schaer.
Lecidea nylanderi Fr. fil.
Lecidea flexuosa Nyl.
Lecidea chodati Samp. (5)
Lecidea lucida Ach.
Lecidea quernea Ach.
Lecidea demissa Fr. fil.
Lepidoma tabacinum Samp. (2)
Lecidea decipiens S. Gray
Lepidoma deceptorium Samp. (2)
Biatorella moriformis Fr. fil.
Biatorella pruinosa Mudd. (1)
Maronea constans Zw.
Acarospora varzinensis Samp. (5)
Acarospora lesdaini Harm.
Acarospora lesdaini Harm. var. Alberti Samp. (9)
Patellaria vitellina Hoff.
Protoblastenia rupestris Stnr. var. calva Stnr.
Blastenia ferruginea Koerb.
Amphiloma murorum Koerb.
Caloplaca cerinella Oliv.
Caloplaca limitosa Oliv.
Caloplaca fuscoatra A. Zahlbr.
Xanthocarpia phlogina Samp. (2)
Xanthocarpia irrubescens Samp. (2)
Xanthoria parietina Fr. fil.
Xanthoria fallax Arn.
Borrera chrysophthalma Ach.
Borrera villosa Ach.
Teloschistes flavicans Norm.
Placodium candellarium Wigg.
Catillaria sphaeroides A. Zahlbr.
Catillaria synothea Belt.
Catillaria melastigma Samp. (9)
Lecania koerberiana Lahm.
Lecania cyrtella Fr. fil.
Lecania lesdaini Samp. (2)
Lecania sampaiana B. de Lesd.
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Lecania citrinella Samp. (3)
Solenopsora vulturiensis Bag.
Solenopsora subdisparata Samp. (Solenopsora subdisparata (Nyl.) Samp.) (6)
Solenopsora candicans Stnr.
Solenopsora olivacea Samp. (2)
Solenopsora holophaea Samp. (6) (Solenopsora holophaea (Mont) Samp.)
Toninia candida Fr. fil.
Toninia caeruleonigricans Fr. fil.
Toninia aromatica Mass.
Bacidia milliaria Samp. (2)
Bacidia umbrina Br. & Rost.
Bacidia atrosanguínea Fr. fil.
Bacidia arceutina Bran. & Rost.
Bacidia albescens Zw.
Bacidia rubella Mass.
Haematomma coccineum Koerb.
Haematomma puniceum Wain. (1)
Pertusaria communis DC.
Pertusaria exalbescens Nyl.
Pertusaria pustulata Nyl.
Pertusaria wulfenii DC.
Pertusaria lutescens Lamy
Pertusaria laevigata Nyl.
Pertusaria globulifera Nyl.
Pertusaria excludens Nyl.
Pertusaria ceuthocarpa Turn. var. variolosa Mudd.
Pertusaria coccodes Nyl.
Pertusaria pseudocorallina Samp. (9)
Pertusaria corallina Arn.
Pertusaria melanochlora Nyl.
Phlyctis agelaea Koerb.
Diploschistes ocellatus Norm.
Diploschistes cinereocaesius Samp. var. violarius Samp. (9)
Diploschistes actinostomus A. Zahlbr.
Rhizocarpon geographicum DC. var. atrovirens Samp. (2)
Rhizocarpon geographicum DC. var. lavatum Samp. (8)
Rhizocarpon viridiatrum Koerb.
Rhizocarpon polycarpon Fr. fil.
Rhizocarpon obscuratum Mass.
Buellia schaereri De Not.
Buellia myriocarpa Mudd. var. lusitanica Samp.
Buellia myriocarpa Mudd. var. aequata Samp. (2)
Buellia Jorgei Samp. (8)
Buellia stellulata Mudd.
Buellia aethalea Fr. fil.
Buellia lactea Koerb.
Buellia Duartei Samp. (5)
Diploicia canescens Mass.
Rinodina discolor Arn.
Rinodina demissa Arn.
Rinodina pyrina Arn.
Rinodina exigua S. Gray
Rinodina horriza Koerb.
Rinodina roboris Arn.
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Rinodina sintrana Samp. (7) (Rinodina cintrana (Samp.) Samp.)
Rinodina confragosa Koerb.
Rinodina confragosa Koerb. raç. Olivieri Samp. (8)
Rinodina plumbella Oliv.
Rinodina atrocinerella Boist.
Rinodina isidioides Oliv.
Rinodina confinis Samp. (8)
Rinodina intermedia Bagl.
Dimelaena castanoplaca Samp. (2)
Physcia fusca A. L. Sm.
Physcia ciliaris Ach.
Physcia leucomela Ach.
Physcia hypoleuca Tuck.
Physcia aipolia Nyl.
Physcia hispida Tuck. raç. leptalea Samp. (9)
Physcia pulverulenta Nyl. var. venusta Oliv.
Physcia grisea A. Zahlbr.
Physcia caesia Nyl.
Physcia astroidea Nyl.
Physcia tribacoides Nyl.
Physcia tribacia Nyl.
Physcia orbicularis D. Torre & Sar.
Physcia sciastrella Harm.
Umbilicaria pustulata Hoff.
Gyrophora spodochroa Ach.
Gyrophora hirsuta Ach.
Gyrophora grisea Turr. & Borr.
Gyrophora polyrrhiza Koerb.
Sticta fuliginosa Ach.
Sticta sylvatica Ach.
Sticta dufourii Del.
Sticta limbata Ach.
Stica aurata Ach.
Lobaria scrobiculata Ach.
Lobaria mollissima Samp. (5)
Lobaria pulmonaria Hoff.
Lobaria laciniata Wain.
Lobaria laetevirens A. Zahlbr.
Peltigera canina Willd.
Peltigera spuria DC.
Peltigera scutata Sm.
Peltigera polydactyla Hoff.
Peltigera horizontalis Hoff.
Nephroma lusitanicum Schaer.
Nephroma parile Ach.
Hypogymnia physodes Nyl.
Hypogymnia tubulosa Samp. (9)
Parmelia stygia Ach.
Parmelia prolixa Carr.
Parmelia isidiotyla Nyl.
Parmelia exasperata De Not.
Parmelia fuliginosa Nyl. var. laetevirens Nyl.
Parmelia subaurifera Nyl.
Parmelia glabra Nyl.
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Parmelia conspersa Ach.
Parmelia soredians Nyl.
Parmelia caperata Ach.
Parmelia carporrhizans Tayl. (1)
Parmelia scortea Ach.
Parmelia laevigata Ach.
Parmelia dissecta Nyl.
Parmelia revoluta Floerke
Parmelia dubia Schaer.
Parmelia cetrarioides Nyl.
Parmelia trichotera Hue.
Parmelia cetrata Ach.
Parmelia sulcata Tayl.
Parmelia saxatilis Ach.
Parmelia omphalodes Ach.
Parmeliopsis hyperopta Arn.
Evernia prunastri Ach.
Evernia furfuracea Mann.
Platysma glaucum Nyl.
Platysma chlorophyllum Arn.
Cetraria aculeata Fr.
Cornicularia tristis Hoff.
Cornicularia intricata Samp. (2)
Setaria jubata Ach. var. chalybeiformis Samp. (2)
Setaria variegata Samp. (1) (2)
Letharia soleirolii Hue
Usnea florida Web.
Usnea articulata Hoff.
Ramalina farinacea Ach.
Ramalina subfarinacea Nyl.
Ramalina portuensis Samp. (8)
Ramalina calicaris Fr.
Ramalina fraxinea Ach.
Ramalina populina Wain.
Ramalina evernioides Nyl.
Ramalina siliquosa A. L. Sm.
Ramalina cuspidata Nyl.
Ramalina tinctoria Ach.
Leprocaulon nanum Nyl.
Stereocaulon pileatum Ach.
Stereocaulon coralloides Fr.
Stereocaulon denudatum Floerke
Tubercularia rufa O. Kz.
Tubercularia ericetorum Wigg.
Cladonia sylvatica Hoff.
Cladonia uncialis Web. var. gracilima Samp. (2)
Cladonia furcata Schrad. for. grandescens Nyl.
Cladonia rangiformis Hoff.
Cladonia crispata Flot.
Cladonia squamosa Hoff.
Cladonia parasitica Hoff.
Cladonia verticillata Hoff. raç. cervicornis Samp. (9)
Cladonia foliacea Willd.
Cladonia foliacea Willd. raç. convoluta Samp. (9)
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A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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Cladonia coccifera Willd.
(*) Nome transcrito da etiqueta. A seguir, entre parêntesis, o nome que G. Sampaio utilizou quando
publicou o nome. A ortografia correcta actual dos nomes novos propostos por G. Sampaio encontra-se
na tabela do Anexo II.
(1) Existe a etiqueta, mas não existe nenhum exemplar nas colecções estudadas.
(2) Taxon não publicado em qualquer obra impressa.
(3) Publicado em «Espécies novas de líquenes» (SAMPAIO, 1917c).
(4) Publicado em «Contribuições para o estudo dos líquenes portugueses» (SAMPAIO, 1918a).
(5) Publicado em «Liquenes inéditos» (SAMPAIO, 1920a).
(6) Publicado em «Novas contribuições para o estudo dos líquenes portugueses» (SAMPAIO, 1921a).
(7) Publicado em «Materiais para a liquenologia portuguesa» (SAMPAIO, 1922a).
(8) Publicado em «Novos materiais para a liquenologia portuguesa» (SAMPAIO, 1923a).
(9) Publicado em «Líquenes de la Provincia de Pontevedra» (SAMPAIO & CRESPI, 1927).
(10) Existe uma etiqueta impressa com Lecanora galactina Ach., mas que não terá sido usada, dado
que não consta das colecções consultadas.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
Anexo II. Táxones novos de líquenes publicados por G. Sampaio
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A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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Anexo II. Táxones novos de líquenes publicados por G. Sampaio
Na tabela seguinte apresentamos uma lista dos novos táxones publicados por G. Sampaio. Esta
lista foi elaborada com base nos trabalhos que publicou e no estudo crítico de PAZ-BERMÚDEZ ET AL.
(2002). Os táxones novos validamente publicados em obra impressa totalizam 101, sendo um género e,
os restantes, espécies, variedades ou raças novas para a ciência assim como novas combinações de
nomes. Em primeiro lugar encontra-se o nome com a ortografia moderna (de acordo com PAZBERMÚDEZ ET AL., 2002). As datas dos nomes referem-se à data real da publicação da revista, que nem
sempre coincide com a data impressa na revista. A seguir entre parêntesis encontra-se o nome tal como
se encontra na obra publicada. Finalmente, quando aplicável, segue-se o nome correcto actual. Os
táxones novos que G. Sampaio propôs na sua exsicata, «Lichenes de Portugal» mas que não publicou
em obra impressa, não foram incluídos (constam no entanto da tabela do Anexo I).
Acarospora alberti Samp. (1920) (Alberti) (1)
Acarospora flavorubens Bagl. & Car. var. angulosa Samp. (1917) (4)
Acarospora granatensis Samp. (1917) (1)
Acarospora lesdainii Harm. Ex A. L. Sm. var. alberti Samp. (1927) (5)
Acarospora lesdainii Samp. (1927) (5)
Acarospora magnussonii Samp. (1924) (Magnussoni ) (1)
Acarospora varzinensis Samp. (1920) (1)
Acarospora zahlbruckneri Samp. (1921) (Zahlbruckneri) (1)
Alectoria dichotoma (Hoffm.) Samp. (1917) (A. dichotoma (Usnea dichotoma Hoff.; Alectoria sarmentosa Ach.) var. variegata nob.) (2)
Alectoria dichotoma (Hoffm.) Samp. var. variegata Samp. (1917) (4)
Amphiloma lobulatum (Florke) Samp. (1927) (A. lobulatum Samp. (Caloplaca lobulata Oliv.)) (3)
Arthonia algarbica Samp. (1918) (1)
Arthopyrenia cinereopruinosa (Schaer.) A. Massal. var. olivetorum Samp. (1927) (A. cinereopruinosa Koerb. var. olivetorum Samp.) (3)
Aspicilia transmontana Samp. (1924) (1)
Bacidia sulphurella Samp. (1924) (1)
Blastenia subarenaria Samp. (1917) = Lecanora subarenaria (Samp.) Samp. (1917) (1)
Buellia duartei Samp. (1920) (Duartei) (1)
Buellia jorgei Samp. (1924) (Jorgei) (1)
Buellia pseudosaxatilis Samp. (1917) = Lecidea pseudosaxatilis (Samp.) Samp. (1917) (1)
Buellia subcinerascens (Nyl.) Samp. (1917) (B. subcinerascens nob. in herb.) (5)
Calicium brunneolum Ach. var. stemonoides Samp. (1917) (4)
Caloplaca herminica Samp. (1917) = Lecanora herminica (Samp.) Samp. (1917) (1)
Caloplaca lallavei (Clem.) Samp. (1918) (Caloplaca Lallavei Samp. (comb. nov.)) = Caloplaca lallavei (Clem.) Flagev (1886) (5)
Caloplaca lesdainii Samp. (1916) (Lesdaini) = Lecanora lesdainii (Samp.) Samp. (1916) (4)
Caloplaca peregrina Samp. (1917) = Lecanora peregrina (Samp.) Samp. (1916) (1)
Carlosia lusitanica Samp. (1924) (1)
Carlosia Samp. (1924) (1)
Catillaria melastigma (A. Zahlbr.) Samp. (1927) (C. melastigma Samp. (Lecidea chalybaea Borr)) (5)
Chiodecton fragosoi Samp. (1924) (Fragosoi) (1)
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
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Cladonia foliacea Willd. raç. convoluta Samp. (1927) (5)
Cladonia subturgida Samp. (1918) (1)
Cladonia verticillata Hoff. raç. cervicornis Samp. (1927) (5)
Collema anemoides Samp. (1918) (1)
Collema harmandii Samp. (1918) (Harmandi) (4)
Collemopsidium stenosporum Samp. (1918) (1)
Coniocybe brunneola (Ach.) Samp. (1922) (C. bruneola Samp. (Chaenotheca brunneola Mull-Arg)) (3)
Coniocybe chrysicephala (Ach.) Samp. (1922) (C. chrysocephala Samp.; Chaenotheca chrysocephala Fr. Fil.) (2)
Cyphelium zahlbruckneri Samp. (1924) (Zahlbruckneri) (1)
Diploschistes cinereocaesius (Sw.) Samp. (1927) (D. cinerocaesius Samp.) (5)
Diploschistes cinereocaesius (Sw.) Vain. var. violarius Samp. (1927) (D. cinereocaesius Samp. var. violarius Samp.) (5)
Girardia cantabrica Samp. (1927) (5)
Gyalecta decipiens Samp. (1918) (1)
Gyalecta deminuta Samp. (1924) (1)
Gyalecta limica Samp. (1916) = Lecidea limica (Samp.) Samp. (1916) (4)
Koerberia lusitanica Samp. (1924) (1)
Lecania badiella Samp. (1920) (1)
Lecania citrinella Samp. (1917) = Lecanora citrinella (Samp.) Samp. (1917) (1)
Lecanora calvosina Samp. (1924) (1)
Lecanora celestinoi Samp. (1920) (Celestini) (1)
Lecanora circumrubens Samp. (1917) (1)
Lecanora citrinella (Samp.) Samp. (1917) (1)
Lecanora conimbricensis (Samp.) Samp. (1916) (1)
Lecanora conimbricensis (Samp.) Samp. var tumidula (Samp.) Samp. (1916) (2)
Lecanora gerezina Samp. (1921) = Lecanora tristis Samp. (1917) (2)
Lecanora herminica (Samp.) Samp. (1917) (1)
Lecanora lesdainii Samp. (1916) (Lesdaini) (1)
Lecanora lisbonensis Samp. (1921) (1)
Lecanora pachycarpa Samp. (1917) (1)
Lecanora peregrina (Samp.) Samp. (1917) (1)
Lecanora pruinella (Bagl.) Samp. var. cintrana Samp. (1916) = Rinodina cintrana (Samp.) Samp. (1922) (3)
Lecanora rustica Samp. (1924) (1)
Lecanora subarenaria (Samp.) Samp. (1917) (1)
Lecanora tristis Samp. (1917) = Lecanora gerezina Samp. (1921) (1)
Lecidea chodatii Samp. (1920) (Chodati) (1)
Lecidea flavigrana Samp. (1922) (1)
Lecidea limica (Samp.) Samp. (1916) (1)
Lecidea machadoi Samp. (1924) (Machadoi) (1)
Lecidea macrocarpoides Samp. (1917) = Lecidea platycarpoies (Bagl.) Samp. (1922) (1)
Lecidea nigrescens (Anzi) Samp. (1916) (L. nigrescens Samp. (Toninia nigrescens Anzi)) (2)
Lecidea populicola Samp. (1918) (1)
Lecidea pseudosaxatilis (Samp.) Samp. (1917) (1)
Lecidea rigata Samp. (1924) (1)
Leciographa fragosoi Samp. (1924) (Fragosoi) (1)
Leiophloea biformis (Borrer) Samp. (1927) (Lejophlea biformis Samp. (Acrocardia biformis Oliv.))) = Leiophloea biformis (Borrer) Trevis (1860) (5)
Leiophloea sphaeroides (Wallr.) Samp. (1924) (L. sphaeroides Samp. (comb. nov.)) (2)
Lemmopsis affinis Samp. (1918) (affine) (1)
Lepraria candelaris (L.) Samp. (1927) = Lepraria candelaris (L.) Fr. (1824) (5)
Leptorhaphis epidermis (Ach.) Th Fr. var. olivetorum Samp. (1924) (4)
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
Leptorhaphis pinicola Samp. (1924) (1)
Lobaria mollissima Samp. (1920) (1)
Lopadium athalloides (Nyl.) Samp. (1921) (L. athalloides Samp. (comb. nov.)) (2)
Lopadium newtonii Samp. (1920) (Newtoni) (1)
Microglaena corderoi (Harm.) Samp. (1922) (Cordeiri Samp.) (2)
Omphalaria granitica Samp. (1916) (1)
Pachyphiale carneolutea (Turner) Samp. (1921) (P. carneolutea Samp. (comb. nov.)) (2)
Pachyphiale limica Samp. (1922) (5)
Parmelia conspersa Ach. raç. lusitanica Samp. (1927) (5)
Parmelia stygia Ach. var. herminica Samp. (1917) (4)
Pertusaria aspicilioides Samp. (1917) (1)
Pertusaria lutescens Lamy var. conimbricensis Samp. (1917) (4)
Pertusaria pseudocorallina (Lilj.) Samp. (1927) (P. pseudocorallina Samp. (P. Westringii Leight)) = P. pseudocorallina (Lilj.) Arnold (1887) (5)
Pertusaria pseudocorallina Samp. var. concreta Samp. (1927) (5)
Physcia caesia Nyl. var. perrugosa Samp. (1922) (4)
Physcia hispida Tuck. raç. leptalea Samp. (1927) (P. hispida Tuck. (Ph. tenella Ach. (1798), DC. (1805)) r. leptalea Samp.) (5)
Physma hispanicum Samp. (1917) (1)
Pilocarpon leucoblepharum (Nyl.) Vain. var. chloroticum Samp. (1924) (4)
Polyblastia exigua Samp. (1922) (1)
Psoroma murale (Schreb.) Samp. (1927) (P. murale Samp. (Lecanora saxicola Ach.)) (5)
Psorotichia henriquesii Samp. (1918) (Henriquesi) (1)
Psorotichia macrospora Samp. (1924) (1)
Pyrenopsis anemoides Samp. (1924) (1)
Pyrenopsis calvosina Samp. (1924) (1)
Ramalina portuensis Samp. (1924) (1)
Rhizocarpon discrepans Samp. (1917) (1)
Rhizocarpon geographicum DC. var. lavatum Samp. (1924) (4)
Rinodina atrocinerella (Nyl.) var. macrospora Samp. (1918) (2)
Rinodina cintrana (Samp.) Samp. (1922) (1)
Rinodina confinis Samp. (1924) (1)
Rinodina confragosa (Ach.) Korb. var. oliveri Samp. (Olivieri) (1924) (4)
Rinodina conimbricensis Samp. (1916) = Lecanora conimbricensis (Samp.) Samp. (1916) (4)
Rinodina conimbricensis Samp. var. tumidula Samp. (1916) (tumídula) (4)
Rinodina lesdainii Samp. (1924) (Lesdaini) (1)
Schismatomma diplotommoides (Bagl.) Samp. (1917) (S. diplotommoides nob. (Lecania diplotommoides Bagl.)) (2)
Schismatomma graphidioides (Leight.) Samp. (1917) (S. graphidioides nob. (Platygrapha rimata (Nyl.)) (5)
Solenospora holophaea (Mont.) Samp. (1921) (S. holophaea; Parmelia holophaea Mont.) (2)
Solenospora olivacea (Fr.) Samp. var. spadicea Samp. (1927) (S. olivacea Samp. var. spadicea Samp.) (5)
Toninia abilabra (Dufour) Samp. (1918) (T. albiladra Samp. (comb. nov.))= Toninia albilabra (Dufour) H. Olivier (1911) (5)
Toninia lurida (Arnold) Samp. (1918) (T. lurida Samp. (comb. Nov.))= Toninia lurida (Arn.) H. Olivier (1911) (5)
Toninia sabulosa (Massal.) Samp. (1918) (T. sabulosa Samp. (comb. nov.)) (2)
Verrucaria carrisoi Samp. (1922) (Carrosoi) (1)
Verrucaria limae Samp. (1924) (Limae) (1)
Xanthocarpia aurantiaca (Lightf.) Samp. (1927) (X. Aurantiaca Samp. (Placodium aurantiacum Hepp in Fl. Europ. núm. 399)) (3)
Xanthocarpia vitellinula (Nyl.) Samp. (1927) (X. vitellinula Samp. (Lecanora vitellinula Nyl.)) (3)
(*)
(1) Nome validamente publicado. Diagnose latina original.
216
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
217
(2) Nome validamente publicado. Nova combinação. Diagnose em português.
(3) Nome validamente publicado. Nova combinação.
(4) Nome originalmente não validamente publicado, porque não acompanhado de uma diagnose latina,
exigida pelo Código de Nomenclatura então em vigor. Hoje considerado validamente publicado de
acordo com o Código de Nomenclatura actual, porque acompanhado de uma diagnose em português.
(5) Nome não validamente publicado. A maioria destes nomes foi incluída em «Líquenes de la
Provincia de Pontevedra» (1927), sem qualquer descrição ou diagnose.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
218
Bibliografia citada260
1. Fontes manuscritas
Departamento de Botânica da Faculdade de Ciências do Porto261
1A. Correspondência recebida por G. Sampaio262
De Bouly de Lesdain, M.:
1902 01 05 (BP)
1902 11 30 (C)
1904 02 20 (BP)
1905 01 09 (C)
1922 02 22 (BP)
De Carrisso, Luis W.:
1922 02 01 (C)
De Crespí, Luis:
1924 11 04 (BP)
1925 10 12 (C)
1926 01 18 (C)
1926 03 12 (C)
1926 10 13 (C)
1928 10 05 (C)
De Daveau, Jules:
1901 12 21 (BP)
1905 11 08 (BP)
1905 12 12 (BP)
1905 12 28 (C)
1913 08 07 (BP)
1916 07 24 (BP)
De Du Pré, F.:
1904 03 11 (C)
1904 04 04 (BP)
De Flahault, Ch.:
1903 01 30 (BP)
1905 12 11 (BP)
De Focke, W. O.:
1904 08 12 (BP)
1904 08 15 (C)
1904 09 08 (C)
1904 12 31(C)
1905 03 30 (BP)
1905 05 30 (C)
De Font Quer:
1924 02 05 (C)
260
As datas encontram-se no seguinte formato: ano mês dia. C, carta; BP, bilhete-postal não-ilustrado; BPI, bilhete-postal
ilustrado.
261
O espólio documental de G. Sampaio encontra-se no Departamento de Botânica (FCUP) onde pode ser consultado a
pedido.
262
A documentação epistolar de G. Sampaio encontra-se arquivada em pastas, organizadas por ordem alfabética de autores
e, em cada autor, por ordem cronológica, de forma a facilitar a sua consulta.
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
1935 02 18 (C)
De Fragoso, Romualdo Gonzalez:
1922 05 30 (C)
1922 07 01 (C)
1922 09 14 (C)
1922 11 14 (C)
1923 01 07 (C)
1923 01 30 (C)
1923 03 07 (C)
1923 03 16 (C)
1924 10 01 (C)
1924 02 27 (C)
1926 03 08 (C)
1929 02 25 (C)
De França, Carlos:
Não datada 1 (C): datação provável 1919-1920
Não datada 2 (C): datação provável 1919-1920
1920 12 03 (BP): datação atribuída
1921 03 29 (C)
De Gandoger, Michel:
1902 01 29 (BP)
1902 08 24 (C)
1902 12 02 (BP)
De Hayek, August:
1904 02 13 (BP)
1906 04 10 (C)
De Henriques, Júlio:
1892 06 10 (C)
1893 08 28 (C)
1896 06 23 (C)
1896 08 04 (C)
1896 08 19 (BP)
1902 11 04 (C)
1902 11 24 (C)
1904 05 03 (C)
1904 08 01 (BP)
1904 12 20 (C)
1905 01 16 (C)
1906 06 02 (C)
1908 04 13 (BP)
1908 06 23 (C)
1908 09 03 (C)
1908 12 11 (C)
1909 01 23 (C)
1909 02 08 (C)
1909 02 19 (BP)
1909 07 27 (C)
1910 06 08 (C)
1910 06 30 (C)
1910 08 24 (C)
1910 11 14 (BP)
1910 12 27 (C)
1911 02 26 (C)
1911 03 10 (C)
1911 03 25 (C)
1911 07 12 (C)
1911 08 14 (BP)
1911 09 19 (BP)
219
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
1911 12 11 (C)
1912 10 07 (C)
1913 04 06 (C)
1913 04 11 (BP)
1915 02 05 (C)
1915 03 18 (C)
1915 03 22 (BP)
1915 07 13 (C)
1917 08 09 (C)
1920 02 09 (C)
1920 12 06 (C)
1921 05 25 (C)
1921 08 06 (C)
1921 08 09 (C)
1922 02 06 (BP)
1922 02 23 (BP)
1922 10 24 (C)
1922 11 28 (BP)
1922 12 22 (BP)
1923 01 02 (C)
1923 03 06 (BP)
1923 11 14 (C)
1924 04 01 (BP)
De Hiersemann, Karl:
1906 02 22 (C)
De Johnston, Edwin:
1905 07 10 (C)
1913 06 03 (BP)
De Linton, William R.:
1904 09 11 (C)
1907 09 22 (C)
De Lopes, José Manuel Miranda:
1927 11 18 (C)
1927 11 29 (C)
1928 05 21 (C)
1928 07 04 (C)
1929 05 14 (C)
1929 05 20 (C)
1929 06 10 (C)
1929 06 15 (C)
1929 06 21 (C)
De Luisier, Alphonse:
1901 09 30 (C)
1907 06 12 (BP)
1907 09 20 (C)
1907 09 27 (BP)
1910 01 04 (BP)
1910 07 07 (BP)
1910 07 19 (C)
1910 09 01 (BP)
1914 02 28 (C)
1915 03 14 (BP)
1915 06 04 (BP)
1916 07 22 (BP)
1921 04 15 (C)
1921 05 07 (C)
1922 01 30 (C)
1922 03 25 (BP)
220
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
De Machado, António:
1912 03 10 (C)
1912 03 23 (C)
1912 11 16 (C)
1913 04 21 (C)
1913 04 30 (C)
De Magnusson, A. H.:
1922 10 05 (C)
1922 10 27 (C)
1922 12 17 (C)
1923 06 01 (C)
De Mariz Júnior, Joaquim de:
1895 07 18 (BP)
1901 12 29 (C)
1904 04 09 (BP)
1904 04 14 (C)
1906 07 03 (C)
De Merino, Baltasar:
1902 11 20 (C)
1902 12 22 (C)
1905 02 19 (BP)
1905 02 27 (C)
1905 03 07 (C)
1905 10 08 (C)
1909 10 27 (C)
1914 03 23 (C)
De Müller, Gustav:
1908 10 22 (C)
De Neuman, L. M.:
1904 02 20 (C)
1904 03 26 (BP)
De Palhinha, Ruy Telles:
1922 10 26 (C)
De Pau, Carlos:
1902 08 25 (C)
1902 09 11 (C)
1903 01 05 (C)
1903 11 04 (C)
1905 01 19 (C)
1905 03 22 (C)
De Pereira, Clemente Lourenço:
1921 04 13 (C)
1921 07 21 (C)
1921 07 29 (C)
1921 08 23 (C)
1922 01 25 (C)
1922 07 27 (C)
1922 11 15 (C)
1923 11 02 (C)
1923 11 29 (C)
1927 11 03 (C)
1930 05 22 (C)
1932 08 27 (C)
221
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
1933 04 27 (C)
De Pereira Coutinho, A. X.:
1902 06 23 (C)
1902 06 30 (C)
1904 02 01 (C)
1904 02 05 (C)
1904 02 29 (C)
1905 02 13 (C)
1906 02 24 (C)
1906 04 27 (C)
1906 05 08 (C)
1906 05 13 (C)
1906 06 09 (C)
1906 06 16 (C)
1906 06 22 (C)
1906 12 31 (C)
1907 02 19 (C)
1907 04 23 (C)
1907 05 09 (BP)
1907 05 15 (BP)
1907 05 20 (C)
1907 07 02 (C)
1907 08 06 (BP)
1908 06 02 (C)
1908 11 20 (C)
1908 12 27 (C)
1909 01 15 (C)
1909 01 21 (C)
1909 05 25 (C)
1909 05 29 (C)
1909 06 07 (C)
1909 06 11 (C)
1909 06 14 (C)
1909 06 16 (C)
1909 07 03 (C)
1909 07 15 (C)
1909 08 21 (C)
1909 08 22 (C)
1909 10 24 (C)
1909 11 20 (C)
De Ricardo Jorge, Arthur:
1902 01 08 (C)
1906 04 16 (C)
1912 12 04 (C)
1918 01 23 (C)
1918 05 10 (BPI)
1919 11 12 (C)
1920 03 29 (C)
1920 05 12 (BP)
1920 12 20 (BP)
1920 12 21 (BP)
1921 11 18 (C)
1921 12 12 (BP)
1922 02 19 (BP)
1923 03 21 (BP)
1924 04 21 (C)
1925 04 09 (C)
De Rogers, William M.:
1902 08 20 (C)
1902 12 29 (C)
222
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
1904 01 25 (C)
1904 10 07 (BP)
De Sennen, Fr.:
1912 03 23 (BPI)
1913 08 12 (BP)
1914 01 15 (BPI)
1914 02 22 (BP)
1914 06 13 (BPI)
1914 08 14 (BPI)
1915 03 26 (BPI)
1915 04 20 (BPI)
1915 12 11 (BPI)
1916 01 06 (BPI)
1916 06 12 (BPI)
1918 11 21 (BPI)
1919 11 05 (BPI)
1921 03 28 (BPI)
1922 01 04 (BPI)
De Sudre, H.:
1904 12 02 (BP)
1905 11 25 (BP)
1906 02 13 (BP)
1910 04 23 (BP)
De Tavares, Joaquim da Silva:
1902 01 10 (C)
1905 06 15 (C)
1905 06 16 (C)
1905 07 09 (BP)
De Thellung, A.:
1913 10 07 (BP)
1913 10 08 (BP)
1913 11 05 (BP)
De Zimmermann, Carlos:
1902 01 17 (C)
1B. Correspondência de G. Sampaio não-expedida ou rascunho de expedida
1902 09 08: Para William M. Rogers.
1906 06 03: Para o Director da Academia Politécnica do Porto.
1906 06 06: Para o Governador Civil de Vila Real.
1912 05 07: Para o Director Geral das Colónias.
1921 02 01: não identificada: provavelmente para Artur Ricardo Jorge.
1922 11 07: Para R. Fragoso (BP).
1C. Manuscritos de G. Sampaio de obras suas não-publicadas
1910 06 01: Diário de Viagem.
1919 05 27: Epitome da Flora Portuguesa.
1937 03 : Manuscrito.
sem data : Manuscrito.
1D. Manuscritos diversos de G. Sampaio
Manuscrito com comentários à edição do Manual da Flora Portugueza.
Contém o editor e as datas das publicações dos fascículos.
223
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
224
Caderno de apontamentos.
Na capa escrito: «Observações botânicas, Porto, 1898, Gonçalo Sampaio».
Caderno de apontamentos.
Na capa escrito: «Rivisão dos géneros da Flora portuguesa por Gonçalo Sampaio, Porto, Setembro - 1910»
1E. Outros documentos
De Boulay, N.:
1891 06 20: «Liste méthodique des Rubus distribués par l’Association rubologique en 1890».
De Gandoger, M.:
1917 03 00 «Catalogue des plantes récoltées en Espagne et en Portugal pendant mes voyages de 1894 à 1912» destinado à publicação na
editora Hermann.
Factura de Otto Leonhardt, Nossen, referente à venda de exemplares de herbário:
Data de G. Sampaio de Maio de 1908.
Recibos de renda de casa de G. Sampaio:
Referentes a Abril de 1912 a Dezembro de 1912: Rua da Constituição, 986.
1F. Comentários em obras impressas
Comentários de A. Ricardo Jorge:
em JORGE (1918)
A monografia tem uma dedicatória do autor na folha de rosto: «Á Biblioteca do Gabinete de Botânica da Universidade do
Porto. Homenagem de, Junho de 1918».
Comentários de G. Sampaio:
em FOCKE (1877)
Volume encadernado com dois carimbos na página de rosto: Academia Polytechnica (azul) e Biblioteca do Instituto de
Botânica (verde). Anotações de G. Sampaio em diversas páginas.
em SAMPAIO (1904e)
Exemplar assinado pelo autor na folha de rosto. Na folha seguinte, uma anotação de G. Sampaio.
num volume encadernado contendo SAMPAIO (1913b, 1914a, 1914b, 1914c)
O volume tem escrito na capa: «Nomenclatura do Congresso de Viena».
num volume encadernado contendo SAMPAIO (1913b, 1914a, 1914b, 1914c)
O volume tem escrito na capa: «Géneros. Pertence a Gonçalo Sampaio». Na contra-capa: «Gonçalo Sampaio, 1914, Porto»
num volume encadernado contendo SAMPAIO, (1913c, 1909-1914, 1895, 1913b, 1914a, 1914b e 1914c)
Todas as obras têm a assinatura do autor na capa. O volume tem escrito na primeira página: «Manual da Flora portuguesa,
por Gonçalo Sampaio, Novembro de 1936».
Biblioteca Nacional de Portugal
1G. Correspondência expedida por G. Sampaio para A. Ricardo Jorge
(Esp. A/1987-2099)
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
225
1902 11 23 (C) A/2007
1902 12 17 (C) A/2096
1904 06 29 (C) A/2095
1912 06 02 (BP) A/2072
1913 01 09 (BP) A/2064
1913 05 16 (C) A/2012
1914 04 20 (C) A/2083
1914 05 00 (BP): não datado: carimbo: 1[ilegível o segundo número]-5-14 19H A/2069
1916 02 21 (C) A/2011
1917 04 27 (BP) A/2079
1917 05 17 (C) A/2025
1917 08 03 (C) A/2094
1917 08 13 (C) A/2090
1917 12 13 (C) A/2021
1917 12 22 (C) A/2023
1918 01 24 (C) A/2093
1918 03 18 (C) A/2017
1918 05 01 (C) A/2001
1918 06 17 (C) A/1992
1918 08 23 (C) A/2027
1918 10 20 (C) A/2029
1918 12 02 (C) A/2018
1918 12 12 (C) A/1989
1920 03 11 (C) A/2087
1920 04 16 (C) A/2089
1920 05 16 (C) A/2088
1920 05 19 (BP) A/2047
1920 05 28 (BP) A/2044
1920 06 02 (C) A/2086
1920 10 03 (C) A/2014
1920 10 04 (BP) A/2045
1920 11 23 (BP) A/2042
1921 00 00 (C): não datado: mas seguramente de final de 1920 – início de 1921 pelo seu conteúdo. A/2038
1921 01 03 (C) A/2099
1921 03 04 (C) A/2098
1921 03 24 (C) A/2097
1921 05 31 (C) A/1988
1921 09 19 (C) A/2004
1921 12 15 (BP) A/2078
1922 02 04 (C) A/2034
1923 03 01 (BP) A/2054
1923 03 16 (BP) A/2053
1923 03 22 (BP) A/2052
1924 04 04 (BP) A/2062
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1889-1890, 1890-1891, 1891-1892, 1892-1893, 1893-1894, 1894-1895, 1895-1896, 18961897, 1898-1899, 1899-1900, 1900-1901, 1901-1902, 1902-1903, 1903-1904, 1904-1905,
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(Augusto); Mariz Júnior (Joaquim); Möller (Adolfo Frederico); Newton (Isaac); Pereira
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1897b
1899a
1899b
1899c
1900a
1900b
1900c
1901a
1901b
1902
1903a
1903b
1904a
1904b
1904c
1904d
1904e
1905a
1905b
1905c
1905d
1905e
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Estudos de flora local. II. Vasculares do Porto (continuação). Revista de Sciencias Naturaes
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Plantas novas para a Flora de Portugal. II. Annaes de Sciencias Naturaes, 6: 141-151.
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Plantas novas para a Flora de Portugal. III. Annaes de Sciencias Naturaes, 7: 7-14. [Datado
pelo autor de Janeiro de 1901]
Plantas novas para a Flora de Portugal. IV. Annaes de Sciencias Naturaes, 7: 111-121.
[Datado pelo autor de Agosto de 1901]
Nota sobre as especies do genero Mentha dos arredores do Porto. Boletim da Sociedade
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Um passeio botanico ao Torrão. Boletim da Sociedade Broteriana, 18: 47-79.
Herbario Portuguez da Academia Polytechnica do Porto. I. Cryptogamiae. Annuario da
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Plantas novas para a Flora de Portugal (2.a série). I. Annaes de Sciencias Naturaes, 8: 5-16.
[Datado pelo autor de Outubro de 1902]
Plantas novas para a Flora de Portugal (2.a série). II. Annaes de Sciencias Naturaes, 8: 115122. [Datado pelo autor de Janeiro de 1904]
Rubus Henriquesii, Samp. A Revista, 1(4): 57-59. [Publicado em 15 de Outubro de 1903]
Alguns Rubus novos para a flora portuguesa. I. A Revista, 2(3): 41-44. [Publicado e
distribuído em 15 de Setembro de 1904]
Alguns Rubus novos para a flora portuguesa. II. A Revista, 2(4): 54-57. [Publicado e
distribuído em 15 de Outubro de 1904]
Estudos sobre a flora dos arredores do Porto. Gen. Spergularia. Annuario da Academia
Polytechnica, 27: 147-171. [Datado pelo autor de Março de 1904]
«Rubus portuguezes». Contribuições para o seu estudo. Typ. de A. F. Vasconcellos, Porto,
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«Rubus portuguezes». Contribuições para o seu estudo. Annaes de Sciencias Naturaes, 9:
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Contribuições para o estudo da flora portugueza. Gen. Romulea. Boletim da Sociedade
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Contribuições para o estudo da flora portugueza. Epilobiaceae. Boletim da Sociedade
Broteriana, 21: 182-208.
Duas especies novas de Digitalis. A Revista, 3(2): 21-24. [Publicado e distribuído em 15 de
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Notas criticas sobre a flora portugueza. I. Annaes de Sciencias Naturaes, 10: 5-78.
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1909-1914 Manual da Flora Portugueza. Tipografia Occidental; Porto; 416 pp. [Obra publicada em
fascículos datados em SAMPAIO (1949) e num manuscrito de G. Sampaio: páginas (ano mês): 1-16 (1909
05), 17-32 (1909 08), 33-48 (1909 12), 49-176 (1910 05), 177-208 (1910), 209-320 (1911 12), 321-336 (1912
01), 337-353 (1912 11), 354-368 (1912 12), 369-384 (1913 11), 385-400 (1914 11), 401-416 (1914 12)]
1909a
1909b
1910a
1910b
1910c
1911a
1911b
1911c
1912a
1912b
1913a
1913b
1913c
1914a
1914b
1914c
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1916b
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Prodromo da flora portuguesa. (I). Annaes da Academia Polytechnica do Porto, 4(1): 3664. [táxones 1-195]
Prodromo da flora portuguesa. (II). Annaes da Academia Polytechnica do Porto, 4(2): 116128. [táxones 196-270]
Prodromo da flora portuguesa. (III). Annaes da Academia Polytechnica do Porto, 5(1): 4464. [táxones 271-409]
Plantas novas para a flora portugueza. Annaes da Academia Polytechnica do Porto, 5(3):
157-160.
Nota a proposito dos Quercus Lusitanica, Lamk., Q. humilis, Lamk. e Q. faginea, Lmk.
Annaes da Academia Polytechnica do Porto, 5(3): 161-165.
Prodromo da flora portuguesa. (IV). Annaes da Academia Polytechnica do Porto, 6(1): 3957. [táxones 410-557]
Programa do curso de microscopia vegetal. Academia Polytechnica do Porto, trabalhos
práticos de Botanica. Livraria Moderna, Porto, 13 pp.
Programas descritivos de Botânica geral. Universidade do Porto, Faculdade de Sciências.
Tipografia Costa Carregal, Porto, 58 pp.
Estudos botanicos. Especies novas e nomes novos. Annaes da Academia Polytechnica do
Porto, 7(1): 51-54.
Sem comentarios. Tipografia Costa Carregal; Porto; 2 pp. [apesar de não estar datada, a
publicação é seguramente de 1912; ver Capítulo VII.6]
Duas plantas criticas. Annaes da Academia Polytechnica do Porto, 8(2): 79-82.
Lista das espécies representadas no Herbário Português. Pteridófitas e Spermatófitas.
Universidade do Porto, Faculdade de Sciências, Gabinete de Botânica. Tip. Costa Carregal,
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Quadro analítico para a determinação das famílias da flora portuguesa. Tip. da
Enciclopédia Portuguesa, Porto, 31 pp.
Apêndice à lista das espécies representadas no Herbário Português. Universidade do
Porto, Faculdade de Sciências, Gabinete de Botânica. Tip. Costa Carregal, Porto, 10 pp.
[Publicado a 3 de Janeiro de 1914]
Segundo apêndice à lista das espécies representadas no Herbário Português. Universidade
do Porto, Faculdade de Sciências, Gabinete de Botânica. Tip. Costa Carregal, Porto, 9 pp.
[Publicado a 14 de Fevereiro de 1914]
Terceiro apêndice à lista das espécies representadas no Herbário Português. Universidade
do Porto, Faculdade de Sciências, Gabinete de Botânica. Tip. Costa Carregal, Porto, 15 pp.
[Publicado a 18 de Novembro de 1914]
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Tres liquenes novos. Revista dos Estudantes da Universidade do Porto, 1(2): 37-39.
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1917c
1917d
1918a
1918b
1920a
1920b
1920c
1921a
1921b
1921c
1921d
1922a
1922b
1923a
1923b
1924
1931a
1931b
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Subsídios para o estudo das “Desmídeas” portuguesas. Boletim da Sociedade Broteriana,
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Apontamentos sobre a flora portuguesa. Boletim da Sociedade Broteriana, série II, 1: 124136. [Datado pelo autor de Agosto de 1922]
Novos materiais para a liquenologia portuguesa. Boletim da Sociedade Broteriana, série II,
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Carlosia, Samp. Novo género de líquenes. Nota apresentada ao Congresso de Salamanca.
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Revisão das “Ulicíneas” portuguesas. Broteria, série Botânica, 21(3): 142-168. [Publicada
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2B. Catálogos de exsicatas
«Catalogue des Plantes que l’Institut de Botanique de Montpellier peut distribuer» para os anos de
1902, 1904, 1905 e 1906. Organizado por Ch. Flahault. Os catálogos apresentam
marcações presumivelmente de G. Sampaio.
«Doubletten Verzeichnis des Berliner Botanischen Tauschvereins» da firma Leonhardt, para os anos de
1906/1907 e 1912/1913. Os catálogos estão extensivamente marcados por G. Sampaio.
2C. Etiquetas de exsicatas
«Lichenes de Portugal» – Dr. Gonçalo Sampaio. Colecção de 300 etiquetas datadas de Março de 1923,
organizadas em três fascículos (I, II e III), com 100 cada. Em cada etiqueta está indicada o
nome do taxon e respectivo autor e a localidade, habitat, colector e data de colheita do
espécime.
«Plantes d’Espagne» – Fr. Sennen. Etiquetas de exemplares recolhidos ou verificados por G. Sampaio.
N.° da etiqueta (data de colheita: ano, mês): 2116 (1914 05), 2494 (1915 05), 2498 (1915
04), 2925 (1916 06), 2926 (1916 08), 2927 (1916 05), 2928 (1916 06), 2929 (1915 04),
2930 (1916 06), 2931 (1916 08), 2932 (1916 08), 2933 (1916 05), 2934 (1916 08), 29235
(1916 03), 29236 (1916 sem mês), 2937 (1916 08), 2938 (1915 04), 2939 (1916 09), 2940
(1915 09), 3294 (1917 04), 3301 (1917 09), 3303 (1917 06), 3308 (1917 07), 3310 (1917
06), 3312 (1917 10), 4308 (1918 04), 4309 (1915 06), 4310 (1918 05), 4311 (1918 05),
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
240
4312 (1920 03), 4314 (1918 08), 4315 (1917 05), 4316 (1917 06), 4317 (1916 07), 4319
(1918 05), 4320 (1916 06), 4321 (1920 03), 4323 (1920 07), 4324 (1920 03).
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
241
Índice remissivo
A
A. C. Oliveira Pinto, 78, 83
A. H. Magnusson, 154, 155
A. Hayek, 41, 42, 43, 44, 50, 56, 59
A. Luisier, 7, 78, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 87, 129, 130, 175, 188
A. Luso da Silva, 66
A. Machado, 85, 130, 132, 133, 140, 141
A. Möller, 28, 66, 68, 182, 186
A. Pires de Lima, 16, 183, 194, 195
A. Quintanilha, 72
A. Ricardo da Cunha, 27
A. Ricardo Jorge, 6, 7, 34, 37, 38, 97, 98, 100, 107, 108, 113,
146, 147, 148, 149, 151, 152, 154, 155, 157, 160, 166, 168,
169, 170, 185, 186, 187, 194, 197, 198, 199, 205, 206
A. Rozeira, 195
A. Thellung, 168
Academia Politécnica, 11, 12, 15, 17, 18, 19, 20, 22, 23, 25, 28,
29, 31, 32, 66, 72, 84, 93, 94, 95, 101, 119, 187
Academia Polytechnica, 15, 33, 37, 48, 72, 80, 89, 96, 175,
177, 179, 182
Academia Real da Marinha e Comércio, 11
Acarospora, 98, 150, 154, 208, 214
Acarospora alberti Samp., 214
Acarospora flavorubens Bagl. & Car. var. angulosa Samp., 214
Acarospora granatensis Samp., 214
Acarospora lesdaini Harm. var. Alberti Samp., 208
Acarospora lesdainii Harm. Ex A. L. Sm. var. alberti Samp.,
214
Acarospora lesdainii Samp., 214
Acarospora magnussonii Samp., 214
Acarospora varzinensis Samp., 208, 214
Acarospora zahlbruckneri Samp., 214
Alberto Sampaio, 206
Aldrovandia, 143
Alectoria dichotoma (Hoffm.) Samp., 214
Amphiloma lobulatum (Florke) Samp., 214
Anthericum Liliago var. transmontanum (Samp.) Samp., 140,
191
Anthericum lusitanicum (Samp.) Samp., 184
Argoselo, 131
Arthonia algarbica Samp., 206, 214
Arthonia impolita Borr. var. algarbica Samp., 206
Arthopyrenia cinereopruinosa (Schaer.) A. Massal. var.
olivetorum Samp., 214
Aspicilia transmontana Samp., 214
Association Rubologique, 42, 44, 45
Augusto Nobre, 93, 97, 177, 196
B
B. Merino, 38, 51, 57, 104, 128, 167
Bacidia milliaria Samp., 209
Bacidia sulphurella Samp., 214
Barcelona, 43, 105, 109, 111, 153
Batotheca Europaea, 42, 43, 44, 50, 59
Blastenia subarenaria Samp., 214
Boletim da Sociedade Broteriana, 23, 25, 64, 72, 116, 118, 119,
125, 142, 198, 201
Bouly de Lesdain, 41, 42, 44, 45, 55, 56, 146
Brassica Johnstoni Samp., 177
Brassica nostalgica Samp., 189
Brignolia Bertol., 192
Broteria, 28, 58, 72, 74, 75, 76, 77, 78, 79, 82, 83, 84, 87, 98,
159, 175, 188
Brotero, 4, 6, 11, 19, 38, 39, 54, 64, 65, 74, 107, 113, 124, 127,
167, 169, 173, 176, 177, 178, 181, 183, 190, 192, 195
Buellia duartei Samp., 214
Buellia Duartei Samp., 209
Buellia jorgei Samp., 214
Buellia Jorgei Samp., 209
Buellia myriocarpa Mudd. var. aequata Samp., 209
Buellia myriocarpa Mudd. var. lusitanica Samp., 209
Buellia pseudosaxatilis Samp., 214
Buellia subcinerascens (Nyl.) Samp., 214
Bunium flexuosum raç. Marizianum (Samp.) Samp., 177
C
C. França, 142, 143
C. L. Pereira, 131, 132, 133, 134, 135, 161, 172, 190
C. M. Azevedo, 77, 86
C. Pau, 47, 51, 52, 53, 56, 57, 58, 104, 111, 128, 191, 192
C. Torrend, 78, 83, 87
C. Zimmermann, 75, 76, 78, 79, 83, 87, 149, 182
Caballero, 111, 153, 159
Caldas da Saúde, 74, 84
Caldelas, 189, 193
Calicium brunneolum Ach. var. stemonoides Samp., 214
Caloplaca herminica Samp., 214
Caloplaca lallavei (Clem.) Samp., 214
Caloplaca Lallavei Samp., 214
Caloplaca lesdainii Samp., 214
Caloplaca peregrina Samp., 214
Carex algarbiensis Samp., 189
Carex Broteriana Samp., 193
Carex caryophyllea var. fuscata Samp., 191
Carex intacta Samp., 182
Carlos das Neves Tavares, 186
Carlosia, 98, 150, 185, 197, 214
Carlosia lusitanica Samp., 150, 214
Castelo de Paiva, 4, 5, 12, 17
Catálogo, 130, 154, 157, 185, 198
Catálogo analítico dos líquenes portugueses, 157, 198
Catillaria melastigma (A. Zahlbr.) Samp., 214
Catillaria melastigma Samp., 208
cecídias, 77
Centaurea Luisieri, 82, 186, 188
Ch
Ch. Flahault, 102
Chiodecton fragosoi Samp., 214
C
Cincinalis Gled., 192
Cintra, 62, 80, 151, 152
Cladonia foliacea Willd. raç. convoluta Samp., 215
Cladonia foliaceae Willd. raç. convoluta Samp., 211
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
Cladonia subturgida Samp., 215
Cladonia uncialis Web. var. gracilima Samp., 211
Cladonia verticillata Hoff. raç. cervicornis Samp., 211, 215
Código de Viena, 162, 163, 164, 165, 166, 168, 172, 173, 177
Colégio de Campolide, 77, 78, 79, 80, 83, 84, 85, 86, 130
Colégio de S. Fiel, 58, 69, 74, 75, 76, 77, 78, 80, 81, 83, 86,
119, 149
Colégio de Setúbal, 77, 80, 83
Colegio del Apostol Santiago, 84, 167
Colegio del Pasaje, 78, 82, 84
Colégio do Barro, 80, 83
Colégio Nuno Álvares, 74, 77, 85
Collema anemoides Samp., 215
Collema harmandii Samp., 215
Collemopsidium stenosporum Samp., 215
Comesia sampaioi Gonz. Frag., 160
Conde de Ficalho, 4, 5, 6, 26, 27, 28, 37, 38, 54, 55, 66
Congresso de Viena, 163, 165, 169, 170
Congresso do Porto, 112, 132, 145, 159, 166, 171, 192, 193
Coniocybe brunneola (Ach.) Samp., 215
Coniocybe chrysicephala (Ach.) Samp., 215
Conopodium Marizianum Samp., 24, 177
Cornicularia intricata Samp., 211
Cotyledon praealtus (Brot.) Samp., 177
cursos livres, 89, 90, 91, 93
Cyphelium zahlbruckneri Samp., 215
D
Decreto de 15 de Maio de 1911, 92, 95, 97
Decreto de 22 de Abril de 1911, 90
Desmidiáceas, 186, 187
Diccionario dos Termos Technicos de Historia Natural, 4
Digitalis, 118, 174, 179
Digitalis Amandiana Samp., 179
Dimelaena castanoplaca Samp., 210
Diploschistes cinereocaesius (Sw.) Samp., 215
Diploschistes cinereocaesius (Sw.) Vain. var. violarius Samp.,
215
Diploschistes cinereocaesius Samp. var. violarius Samp., 209
Discosia sampaioi Gonz. Frag., 160
Dr. C. Baenitz Herbarium Europaeum, 43, 44
Drosophyllum, 142, 144
Du Pré, 41, 42, 45, 56
E
E. Johnston, 28, 66, 127, 175, 180, 182
Echium, 24, 26, 118, 174, 178, 189
Echium Broteri Samp., 27, 178
Epilobiaceae, 174, 179
Epitome, 99, 186, 187, 197
Escola Politécnica, 5, 6, 9, 10, 11, 13, 18, 26, 27, 29, 54, 61, 85,
117, 118, 127, 142
Escola Polytechnica, 61, 85, 89, 179
espécies broterianas, 176, 177, 183, 190
espólio documental, 6, 7, 169, 186
Eugenio Schmitz, 28, 66
Evax lusitanica Samp., 189
exsicata, 25, 28, 42, 44, 45, 50, 59, 68, 69, 101, 102, 105, 106,
107, 108, 109, 110, 147, 149, 151, 152, 153, 154, 155, 180,
185, 186, 204, 205, 206, 214
242
exsicatas, 6, 25, 39, 43, 68, 101, 102, 109, 149, 163, 164, 179,
186, 193, 200
F
Faculdade de Ciências do Porto, 16, 35, 93, 95, 130, 134, 157,
187, 194, 196, 200
Faculdades de Ciências, 89, 90, 92, 94
Filosofia Natural, 13, 130
Flora do Mondego, 126
Flora Germanicae bor., 42
Flora Ibérica, 111, 159, 198
Flora iberica selecta, 109
flora liquénica, 148, 157, 158, 185, 186, 201
Flora lusitanica, 24, 25, 67, 68, 178
Flora lusitanica exsiccata, 24, 25, 67, 68
Flora Portuguesa, 99, 122, 186, 187, 189, 193, 194, 197
Flore Portuguaise, 5, 64, 127, 184
Folha Democratica, 33
Font Quer, 104, 109, 111, 153, 158, 201
Fr. Sennen, 42, 101, 102, 104, 105, 106, 107, 108, 129
Francisco de Salles Gomes Cardoso, 17, 20, 32, 66
Fusarium sampaioi Gonz. Frag., 160
G
G. Genevier, 43, 50
G. Müller, 50, 110
Gabinete de Historia Natural, 12
Gagea nova Samp., 131, 191
Gagea pratensis raç. nova Samp., 191
Genera plantarum, 164
Girardia cantabrica Samp., 215
Gloniella sampaioi Gonz. Frag., 160
Gyalecta decipiens Samp., 215
Gyalecta deminuta Samp., 215
Gyalecta limica Samp., 215
H
H. Sudre, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45, 50, 56, 59
Herbário da Universidade de Coimbra, 23, 24, 26, 28, 54, 65,
66, 68, 86, 87, 115, 186, 189, 193
Herbarium Dr. August v. Hayek, 43
Herbarium Ruborum rariorum, 43
Hoffmansegg, 4, 5, 6, 64, 113, 127, 167, 169, 176, 181, 183,
190, 191, 192
Hypogymnia tubulosa Samp., 210
I
Iberis, 189, 192
Iconografia, 194, 195, 198
Ignacio Bolivar, 158
Insalde, 131, 133, 134
Instituto de Botânica Dr. Gonçalo Sampaio, 199
Instituto de Investigações Botânicas, 98
Isaac Newton, 28, 66, 85, 182
J
J. Briquet, 163
J. Casimiro Barbosa, 28, 66, 182, 201
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
J. Daveau, 27, 28, 54, 66, 82, 102, 103, 129, 182
J. M. Miranda Lopes, 131, 136, 137, 138, 140, 141, 190
J. Mariz, 24, 25, 27, 28, 29, 30, 31, 66, 68, 69, 141, 193
J. S. Tavares, 7, 58, 77, 78, 79, 80, 83, 84, 87, 149, 182
Jardim Botânico da Ajuda, 4, 5, 15, 27
Jardim Botânico e Experimental, 5, 12, 15, 16, 17, 20, 28, 32,
33, 176
João Franco, 33
Joaquim Sampaio, 186, 206
Joaquim Tavares, 175, 179, 180
José Ramos Preto, 86
Juniperus, 190
K
K. Hiersemann, 127
Koerberia lusitanica Samp., 207, 215
Kundmania Scop., 192
L
L. Crespí, 153, 156, 158, 190
L. M. Neuman, 41, 43, 51, 55
L. W. Carrisso, 72, 141, 157, 198
La Guardia, 52, 58, 78, 82, 84, 85, 167
Laserpitium thalictrifolium Samp., 183
Lecania badiella Samp., 215
Lecania citrinella Samp., 209, 215
Lecania lesdaini Samp., 208
Lecanora bracarensis B. de Lesd. & Samp., 207
Lecanora calvosina Samp., 215
Lecanora celestini Samp., 207
Lecanora celestinoi Samp., 215
Lecanora circumrubens Samp., 215
Lecanora citrinella (Samp.) Samp., 215
Lecanora conimbricensis (Samp.) Samp., 215, 216
Lecanora gerezina Samp., 215
Lecanora herminica (Samp.) Samp., 214, 215
Lecanora lesdainii (Samp.) Samp., 214
Lecanora lesdainii Samp., 215
Lecanora limica B. de Lesd. & Samp., 207
Lecanora lisbonensis Samp., 215
Lecanora pachycarpa Samp., 215
Lecanora peregrina (Samp.) Samp., 214, 215
Lecanora piniperda Koerb. var. lusitanica B. de Lesd. &
Samp., 207
Lecanora pruinella (Bagl.) Samp. var. cintrana Samp., 215
Lecanora rustica Samp., 215
Lecanora subarenaria (Samp.) Samp., 214, 215
Lecanora tristis Samp., 215
Lecidea chodati Samp., 208
Lecidea chodatii Samp., 215
Lecidea flavigrana Samp., 215
Lecidea limica (Samp.) Samp., 215
Lecidea machadoi Samp., 215
Lecidea macrocarpoides Samp., 215
Lecidea nigrescens (Anzi) Samp., 215
Lecidea platycarpoies (Bagl.) Samp., 215
Lecidea populicoa Samp., 215
Lecidea pseudosaxatilis (Samp.) Samp., 214, 215
Lecidea rigata Samp., 215
Leciographa fragosoi Samp., 215
Leiophloea biformis (Borrer) Samp., 215
243
Leiophloea sphaeroides (Wallr.) Samp., 215
Lejophlea biformis Samp., 215
Lemmopsis affinis Samp., 215
Leonhardt em Nossen, 110
Lepidoma deceptorium Samp., 208
Lepidoma tabacinum Samp., 208
Lepraria candelaris (L.) Samp., 215
Leptorhaphis epidermis (Ach.) Th Fr. var. olivetorum Samp.,
215
Leptorhaphis pinicola Samp., 216
Lethagrium aggregatum Samp., 207
Liceu Camões, 85, 129, 130
Liceu de Castelo Branco, 86
Lichenes de Portugal, 147, 149, 150, 204, 205, 214
Lineu, 4, 9, 11, 64, 163, 164, 167, 169, 170, 171, 172, 173, 177,
178, 184
Link, 4, 6, 64, 102, 113, 127, 144, 167, 169, 176, 177, 181, 182,
183, 184, 190, 191, 192, 195
Lista das espécies, 166, 168, 171, 199
Lobaria mollissima Samp., 210, 216
Loeflingia, 84, 120, 123, 124, 177
Loeflingia Tavaresiana Samp., 84, 177
Lopadium athalloides (Nyl.) Samp., 216
Lopadium newtonii Samp., 216
M
M. Amandio Gonçalves, 17, 20, 21, 23, 25, 31, 94, 96, 174,
182, 187
M. Gandoger, 47, 109
Madrid, 111, 120, 153, 156, 158, 159, 160, 184, 205, 231, 232,
237
Manual, 61, 62, 97, 116, 122, 129, 132, 182, 183, 187, 193,
194, 197, 199, 224
Meniarth, 83, 87
Mentha, 24, 26, 120, 174, 179, 180
Mesembryanthemum, 120
Microglaena corderoi (Harm.) Samp., 216
mini-código de nomenclatura, 172
Monarquia do Norte, 99
Montia lusitanica Samp., 183
N
N. Boulay, 41, 43, 44, 45
Narcissus junquilla var. Henriquesii Samp., 181
Nectria sampaioi Gonz. Frag., 160
nomem nudum, 167
nomenclatura botânica, 112, 162, 163, 169, 185, 196
nomes conservados, 162, 164, 167, 172
Notas criticas, 81, 128, 174, 176, 177, 183
O
O Commercio do Porto, 99
O Primeiro de Janeiro, 99
Ochrolechia subtartarea Samp., 208
Odemira, 125, 128, 174, 180, 181
Odontites rubra var. Lopesiana (Samp.) Samp., 191
Odontites serotina var. Lopesiana Samp., 191
Omphalaria granitica Samp., 216
Opegrapha vulgata Ach. var. devulgata Samp., 206
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
P
Pachyphiale carneolutea (Turner) Samp., 216
Pachyphiale carneolutea Samp., 207
Pachyphiale limica Samp., 216
Paradisia lusitanica var. transmontana Samp., 140
Paredes de Coura, 63, 131, 132, 133, 135
Parmelia conspersa Ach. raç. lusitanica Samp., 216
Parmelia stygia Ach. var. herminica Samp., 216
Pertusaria aspicilioides Samp., 216
Pertusaria lutescens Lamy var. conimbricensis Samp., 216
Pertusaria pseudocorallina (Lilj.) Samp., 216
Pertusaria pseudocorallina Samp., 209, 216
Peucedanum uliginosum (Link) Samp., 184
Phyllosticta sampaioana Gonz. Frag., 160
Physalospora sampaioi Gonz. Frag., 160
Physcia caesia Nyl. var. perrugosa Samp., 216
Physcia hispida Tuck. raç. leptalea Samp., 210, 216
Physma hispanicum Samp., 216
Phytographia Lusitaniae selectior, 4
Pilocarpon leucoblepharum (Nyl.) Vain. var. chloroticum
Samp., 216
Plantae Scandinavicae, 43
Plantago, 184, 185
Plantago algarbiensis (Samp.) Samp., 185
Plantago bracteosa (Willk.) Samp., 185
plantas carnívoras, 142, 143
Plantes d’Espagne, 43, 107
Polyblastia exigua Samp., 216
Póvoa de Varzim, 100, 108, 149
princípio da prioridade, 163, 164, 166, 171
Pródromo, 182
Psoroma lisbonense Samp., 208
Psoroma murale (Schreb.) Samp., 216
Psorotichia henriquesii Samp., 216
Psorotichia macrospora Samp., 216
Pteridium Scop., 192
Pyrenopsis anemoides Samp., 207, 216
Pyrenopsis calvosina Samp., 216
Q
Quercus, 28, 183
R
R. bifrons var. duriminius Samp., 60
R. brigantinus Samp., 42, 60
R. caldasianus Samp., 60
R. Coutinhi Samp., 54, 60
R. discerptus var. maranensis Samp., 60
R. G. Fragoso, 71, 111, 153, 156, 158, 159, 160, 161, 173, 191,
198
R. Henriquesii Samp., 42, 53, 60
R. herminicus Samp., 60
R. incurvatus var. minianus (Samp.) Samp., 60
R. koehleri var. gerezianus Samp., 60
R. Lespinassei Clav., 54
R. lusitanicus var. signifer Samp., 60
R. mercicus var. castranus (Samp.) Samp., 60
R. minianus Samp., 60
R. nitidus var. lusitanicus Samp., 60
R. obtusangulus raç. beirensis (Samp.) Samp., 60
244
R. peculiaris Samp., 42, 60
R. peratticus Samp., 41, 60
R. portuensis Samp., 42, 60
R. rhamnifolius var. australis Samp., 60
R. Sampaianus Sud., 42
R. subincertus Samp., 42, 60
R. T. Palhinha, 26, 118, 129, 161
R. trifoliatus Samp., 60
R. vagabundus Samp., 60
R. villicaulis raç. beirensis Samp., 60
Ramalina portuensis Samp., 211, 216
Ranunculus, 102, 114, 127, 174, 176, 178
revolução de 28 de Maio de 1926, 34
revolução de 5 de Dezembro de 1917, 34
Rhabdospora sampaioi Gonz. Frag., 160
Rhizocarpon discrepans Samp., 216
Rhizocarpon geographicum DC. var. atrovirens Samp., 209
Rhizocarpon geographicum DC. var. lavatum Samp., 209, 216
Rinodina atrocinerella (Nyl.) var. macrospora Samp., 216
Rinodina cintrana (Samp.) Samp., 210, 215, 216
Rinodina confinis Samp., 210, 216
Rinodina confragosa (Ach.) Korb. var. oliveri Samp. (Olivieri),
216
Rinodina confragosa Koerb. raç. Olivieri Samp., 210
Rinodina conimbricensis Samp., 216
Rinodina lesdainii Samp., 216
rio Minho, 135
Romulea, 102, 128, 174
Rubus portuguezes, 37, 39, 58, 62
S
Sabransky, 42, 43, 50, 59
Salamanca, 77, 78, 81, 82, 84, 129, 188
Sampaioa Gonz. Frag., 160
Sampaioa pinastri Gonz. Frag., 160
Saxifraga granulata var. Lopesiana (Samp.) Samp., 138, 191
Saxifraga Lopesiana Samp., 131, 138, 191
Schistomma diplotommoides (Bagl.) Samp., 216
Schistomma graphidioides (Leight.) Samp., 216
Seseli granatense var. Peixoteanum (Samp.) Samp., 177
Seseli Peixoteanum Samp., 177
Set of British Rubi, 42, 43
Setaria jubata Ach. var. chalybeiformis Samp., 211
Setaria variegata Samp., 211
Sevilha, 159, 170
Silene, 102, 117, 120, 121, 122, 124, 168, 176, 189
Silene Boryi, 120, 121, 122, 123, 124, 189
Silene Boryi var. duriensis Samp., 121
Silene duriensis (Samp.) Samp., 189
Sociedade Broteriana, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 44, 45, 52, 54, 62,
64, 65, 66, 67, 68, 69, 70, 72, 73, 79, 82, 83, 86, 101, 117,
120, 125, 130, 131, 132, 135, 136, 137, 138, 141, 142, 151,
159, 160, 161, 162, 165, 198
Sociedade Portuguesa de Ciências Naturais, 72, 77
Solenopsora holophaea Samp., 209
Solenopsora olivacea Samp., 209
Solenopsora subdisparata Samp., 209
Solenospora holophaea (Mont.) Samp., 216
Solenospora olivacea (Fr.) Samp. var. spadicea Samp., 216
Species plantarum, 163, 164, 167
Spergularia, 102, 174, 177, 179, 182
Spergularia colorata Samp., 182
Spergularia modesta Samp., 182
A fundação da Botânica moderna em Portugal - Júlio Henriques, A. X. Pereira Coutinho e Gonçalo Sampaio
Stauracanthus, 193
T
táxones broterianos, 177, 181, 190
Teucrium Haenseleri var. Luisieri (Samp.) Samp., 175
Teucrium Luisieri Samp., 175
Tirol, 59, 77, 83, 84
Toninia abilabra (Dufour) Samp., 216
Toninia lurida (Arnold) Samp., 216
Toninia sabulosa (Massal.) Samp., 216
Torrão, 174, 180, 181
Tournefort, 9, 113, 144, 167, 169, 170
Trancoso, 189, 193
U
Ulex, 73, 80, 106, 108, 115, 128, 192
ulicíneas, 192, 197
Universidade de Mompilher, 27, 102
Utricularia, 143
V
Valério Cordeiro, 83
Vandelli, 4
Veronica Carquejeana Samp., 178
245
Veronica demissa, 102, 118
Veronica officinalis raç. Carquejiana (Samp.) Samp., 178
Verrucaria carrisoi Samp., 216
Verrucaria limae Samp., 216
Vimioso, 118, 131, 136, 137, 138, 139, 140, 141
Voyage au Portugal, 5
W
W. M. Rogers, 40, 41, 42, 43, 44, 46, 55, 60
W. O. Focke, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 48, 49, 50, 54, 55, 56,
61
W. R. Linton, 40, 41, 43, 44, 46, 47, 56, 60
Welwitsch, 5, 54, 64, 106, 117, 121, 124, 192
Willkomm, 23, 31, 37, 54, 65, 66, 111, 122, 123, 125, 185, 188,
193, 198
X
Xanthocarpia aurantiaca (Lightf.) Samp., 216
Xanthocarpia irrubescens Samp., 208
Xanthocarpia phlogina Samp., 208
Xanthocarpia vitellinula (Nyl.) Samp., 216
Z
Zahlbruckner, 98, 148, 154, 198